O título aí de cima bem que poderia ser o de um curso para noivos, não é? Achastes piegas? Eu também, mas não encontrei outro melhor. Fiquemos com ele, então.
Você está acompanhando a discussão política neste segundo turno? Nossa! Como a temática da família está em voga, não? Bom, já que vai se discutir o assunto, já que é o ponto de pauta, então vamos ajuntar alguns elementos para fazer essa discussão sair do atoleiro.
Vejam só! Hoje, na edição eletrônico do EL PAÍS, foi publicada uma pesquisa sobre como os espanhóis pensam a família e os papéis dentro dela. Aporta elementos para uma reflexão. Confira abaixo!
Casi la mitad de los ciudadanos cree que el papel principal de la familia es "criar y educar a los niños"
El 67,6% considera que la familia ideal es la formada por una pareja en la que trabajan los dos y se reparten las tareas del hogar y el cuidado de los hijos, según el CIS.- El 45% opina que es la mujer quien debe reducir su jornada laboral para atender el hogar
EL PAÍS - Madrid - 11/10/2010
El papel más importante de la familia en la sociedad actual es, a juicio de casi la mitad de los españoles, el de "criar y educar a los niños". Así lo cree el 49,3%, frente al 27,7% que opina que su rol principal es el de "proporcionar amor y afecto"; el 7,3% que considera que es el de "mantener los valores culturales y morales"; y el 5,9% que piensa que es el de "cuidar la salud de sus miembros". Son datos de la última encuesta del Centro de Investigaciones Sociológicas (CIS) conocida hoy y realizada a 2.500 personas mayores de 18 años.
El ideal de familia para el 67,6% de los ciudadanos es la formada por una pareja con un trabajo remunerado similar y en la que ambos se repartan las tareas del hogar y el cuidado de los hijos, si los hay. En caso de que uno de los dos tenga que trabajar menos horas para ocuparse de las labores domésticas y de la descendencia, el 45,7% piensa que ese miembro de la pareja debería ser la mujer; frente al 20,9% que opta por "cualquiera, indistintamente"; el 10,2% que opina que quien tenga el trabajo peor remunerado; o el 1,8% que cree que debería ser el hombre. Un 14,7% defiende, como ideal, la familia en la que solo trabaja un integrante de la pareja y el otro se encarga de atender el hogar y de la eventual prole.
El 30,6% de los consultados vive en un hogar formado por dos personas; son tres en el 26,1% de los casos; cuatro en el 23,1%; y una sola persona en el 10,3%. Con independencia de su situación actual, si pudiera elegir, el 51,4% preferiría vivir con su pareja (casado o no) y con sus hijos; el 28,3% con su pareja (casado o no); y el 10,8%, solo. El 64,9% vive con su cónyuge, frente a un 9% que lo hace con su pareja sin estar casado. En ambos casos, con una media de convivencia de 22,3 años.
Cuando está con su familia, el 67,8% se siente "casi siempre cómodo"; el 22,5% la "mayoría de las veces"; y el 8%, "algunas veces cómodo y otras a disgusto". Cuando habla de su familia, el 66% se refiere a los hijos; el 65,5%, al cónyuge o pareja; el 63,9%, a los hermanos; el 61,5%, al padre o la madre; el 17,5%, a los abuelos; y el 16,6%, a los tíos. En el 29,2% de los casos, la mayor parte de la familia vive en la misma localidad del encuestado; en el 28,3%, toda la familia; y en el 18,6%, aproximadamente la mitad, con la otra mitad viviendo fuera de esa localidad.
La salud y la familia, lo primordial
Los españoles consideran lo más importante de su vida la salud y la familia, por este orden, al puntuarlas con un 9,64 y un 9,54 en una escala del cero al 10, respectivamente. De hecho, el 44% sostiene que la familia es lo fundamental, seguida de la salud (33,4%) y el trabajo (12,2%). Las relaciones de pareja solo las destaca el 4,7%. Sin embargo, al preguntar sobre a quién acudiría en primer lugar en caso de encontrarse enfermo, el 47,5% recurriría a su pareja y el 23,4% a la madre, que también es la elegida por un 36,6% de los consultados para cuidar de los hijos menores. En caso de necesidad económica, un 23% pediría ayuda al padre y un 17,7% a la madre.
Un 44,8% asegura hablar con su familia sobre asuntos personales con bastante frecuencia, y un 46,9% visita a sus familiares bastante a menudo aunque no exista ningún motivo especial para ello. Un 47,2% cree que sin el apoyo de su familia no podría superar las situaciones difíciles y un 50,1% dice celebrar las fechas señaladas (cumpleaños, Navidades) en familia.
Los consulados señalan como actividades habituales con los hijos menores de 14 años: "darles muestras de cariño" (91,5%); cenar (88,9%); "preguntarles por sus cosas o charlar con ellos" (70,7%); comer (68,5%); ver la televisión (68,1%); jugar (59,2%); llevarles al colegio (53,8%); ayudarles en los estudios (52,3%) o leerles un cuento (42,5%).
Solo un 18,1% de los interpelados se declara "completamente satisfecho" con su vida, aunque un 46,5% da una calificación alta a su situación vital, entre siete y ocho puntos sobre 10. Un 29,9% le da un aprobado, entre 4 y 6 puntos. Un 63,4% cree que nunca se es lo suficientemente cuidadoso en el trato a los demás, mientras que el 32,2% opina que se puede confiar en la mayoría de las personas.
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segunda-feira, 11 de outubro de 2010
segunda-feira, 14 de setembro de 2009
Sociologia da criança
Reproduzo mais abaixo matéria publicada no site A página sobre a sociologia da criança. Vale a pena conferir!
Criança tem voz própria
(Pelo menos para a Sociologia da Infância)
Ideia chave que ressalta da entrevista à professora Manuela Ferreira da FPCE da Universidade do Porto
Professora auxiliar da Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação na Universidade do Porto, Manuela Ferreira inicia o seu percurso profissional como educadora de infância, trabalhando em jardins da rede pública. Posteriormente licencia-se em Ciências da Educação na FPCE-UP, onde, desde então, tem leccionado as disciplinas de Ciências Sociais e Sociologia da Educação. Tem desenvolvido investigação na área da Sociologia da Infância - tema da entrevista que se segue - e dos Estudos de Género.
A Sociologia da Infância é uma área das ciências sociais com uma implantação relativamente recente no universo académico. Em que contexto surge?
A preocupação em estudar a criança do ponto de vista da Sociologia não é propriamente recente, basta pensar no conceito de socialização. O que é novo, é uma inversão do olhar que, ao assumir a autonomia conceptual das crianças e da infância, advoga que as suas culturas e relações sociais são dignas de serem estudadas em si mesmas, no presente e não no seu futuro como adultas, a partir da sua própria voz e não apenas através daquilo que os adultos dizem delas. Trata-se de colocar as crianças em equidade conceptual relativamente a outros grupos ou categorias sociais, uma vez que se considera que elas são seres activos na construção e determinação das suas vidas e dos que as rodeiam, adultos e outras crianças. Ora, é fundamentalmente a partir dos anos oitenta, que ganha visibilidade no mundo anglo-saxónico um conjunto de estudos de diversas áreas, desde a História Social, à Antropologia, Economia e Sociologia, que têm em comum a criança como unidade de observação. Claro que esta deslocação do foco para a acção da criança e a sua consideração como actor social não pode ser compreendida se não se entrar em linha de conta com as transformações que ocorreram dentro do próprio campo sociológico, nomeadamente dos debates entre as perspectivas mais estruturalistas e as que põem a tónica na acção social.
De que forma caracterizaria o campo de acção da Sociologia da Infância?
Como já referi, a Sociologia da Infância procura tomar as crianças como o seu centro de interesse, a partir de si próprias e não da sua dedução dos quadros instituídos de que estão dependentes. Essa preocupação tem-se traduzido em modos diferentes de construir sociologicamente a infância, tanto do ponto de vista teórico como metodológico. Há perspectivas que têm tido como preocupação mostrar que a infância não é uma realidade finita com uma forma única mas antes uma pluralidade de concepções que co-existem e são produto de uma construção social e histórica. Outras, procuram mostrar que mesmo que a infância varie historicamente e os seus membros mudem continuamente, a infância é uma categoria estrutural distinta e permanente das sociedades humanas. Aqui, a tónica é sobretudo colocada nas características sociais mais uniformes que permitem defini-la como grupo social constitutivo da sociedade, à semelhança de outras categorias estruturais como o género ou a classe social. Outras ainda, procuram enfatizar as crianças como actores sociais competentes, ou seja; com poder de acção e tomada de iniciativa, valorizando a sua capacidade de produção simbólica e a constituição das suas práticas, representações, crenças e valores em sistemas organizados social e culturalmente. Ou seja, as crianças serem reconhecidas como uma estrutura e um grupo social próprio... Exactamente. Não pode haver sociedades sem infância, por isso ela é uma categoria estrutural permanente. Para pensar a infância como categoria estrutural distinta de outras categorias como a classe social, o género ou etnia, a idade torna-se uma variável importante porque singulariza as crianças de acordo com as suas características mais comuns, sejam elas físicas, psicológicas, morais, afectivas, sociais. Isso permite uma maior compreensão da sua situação estrutural por referência ao adultos de quem estão ou são vistas como dependentes e perante quem têm menos poder e uma maior evidência de que também elas estão sujeitas às mesmas possibilidades e constrangimentos que são colocados pelos sistemas e estruturas sociais, geracionais e genderizados. Neste sentido, as crianças são vistas como uma categoria universal, um grupo social, que emerge dos constrangimentos que as estruturas sociais, económicas e determinadas políticas lhes colocam e que sistematicamente as excluem daquelas esferas sociais. De outro ângulo, uma vez que é nas instituições e nas acções sociais que aí desenvolvem que a infância é socialmente construída tanto pelas próprias crianças como pelos adultos, também se pode compreender melhor como é que no quotidiano, quando ali se encontram, jogam e negoceiam as suas diferentes e desiguais posições sociais de classe social, idade, género, estatuto, poder, elas se constituem como grupo social. Refere, em texto recente, que a Sociologia da Infância, abordando a criança como uma construção social, "procura suspender significados tidos como certos, evidentes e inquestionáveis".
A que significados se refere?
Refiro-me fundamentalmente às concepções tradicionais dominantes acerca das crianças e da infância que as definem como um ser irresponsável, imaturo, incompetente, irracional, amoral, a-social, a-cultural, seres em défice, simples objectos passivos e meros receptáculos de uma acção de socialização. Refiro-me também à própria concepção de socialização como um processo singular, progressivo, concertado, unívoco e vertical, reduzido às relações com os adultos que o encimam, localizado numa instituição com objectivos claramente definidos e em prol da reprodução social. Refiro-me à concepção do brincar como uma acção meramente natural e espontânea das crianças, uma espécie de credo e emblema único das actividades da infância que esgota a multiplicidade das suas acções e torna opacos os modos como criam realidade social. Refiro-me à concepção de grupo de pares como forma relação e de organização assente na homogeneidade e de onde estão ausentes relações sociais desiguais e a presença de relações estratégicas, de poder e contra-poder.
Contributos para uma cidadania da infância
Que contributos pode trazer a Sociologia da Infância para a redefinição, entre outras, da prática pedagógica dos educadores?
Quando uma das principais preocupações da sociologia da infância é, por um lado, mostrar que o modo como nós, adultos, vemos e pensamos as crianças interfere no modo como nos relacionamos com elas e, por outro, que as crianças são actores sociais dotados de pensamento reflexivo e crítico, daí que a relevância que se pretende atribuir às suas acções como prova de si e do que são como seres inteligentes, socialmente competentes e com capacidades de realização, dotados de emoções e sentimentos à luz das suas próprias evidências, parece-me que estão dadas as grandes coordenadas. A concretização desta segunda coordenada requer do adulto-educador uma outra atenção além da observação que se preocupe com a escuta das crianças, por forma a tornar-se um intérprete e tradutor competente das crianças, a partir dos pontos de vista delas e dos vários sentidos que estão envolvidos na situação, e isso não é possível sem estar disposto a deixar-se surpreender pelas crianças e a seguir atrás delas para aceder aos seus mundos. Sem esta aceitação de uma inversão das suas posições e papéis tradicionais, o que implica uma reflexão acerca das desiguais relações de poder entre adultos e crianças, não é possível promover a participação das crianças na tomada de decisão e gestão das suas actividades e, muito menos, no planeamento do quotidiano do jardim de infância.
Ou seja, levar a sério o actor social que ela de facto representa e reconhecer o seu direito à palavra...
Sim. Só que não basta reconhecer o direito à palavra das crianças. É preciso ter consciência de que essa palavra é dominada, dita e manipulada diversa e desigualmente pelas diferentes crianças. Se pensarmos, por exemplo, que os momentos de reunião colectiva no jardim de infãncia são um encontro público em que as crianças têm oportunidade de exprimir as suas opiniões, interesses, conhecimentos, etc, e que o seu modo privilegiado é a palavra oral, não é difícil imaginar do ponto de vista sócio-cultural quem serão as crianças que, muito provavelmente e em grande parte do tempo, ocuparão e dominarão esse espaço! O mesmo acontece quando as crianças brincam e desenvolvem acções comuns entre elas: não é a mesma coisa ser-se menino ou menina, ser da classe média ou de um grupo social com parcos recursos económicos, ser mais velho ou mais novo, veterano ou novato!… Isto para dizer que o contributo da Sociologia da Infância para pensar a redefinição da prática pedagógica dos educadores passa, sobretudo pelo desenvolvimento de uma sensibilidade aos processos sociais que impregnam o quotidiano do jardim de infância, tanto nas relações entre as crianças como entre adultos e crianças e pelo exercício do espírito crítico e da reflexividade como instrumentos para uma intervenção pedagógica avisada, capaz de desconstruir as subtilezas de que se revestem as relações de poder e dominação.
A Sociologia da Infância é apenas mais um contributo para o estudo da criança ou assume-se como uma dimensão inovadora nesse campo?
A Sociologia da Infância com os seus estudos das crianças deseja contribuir para o alargamento do campo das Ciências da Educação e das Ciências Sociais, não tanto por via do seu espartilhar com o acréscimo de mais uma disciplina e de um objecto, mas antes pelo participar na sua recomposição, uma vez que se considera que a sua inclusão obriga ao exercício crítico da própria sociologia, em particular, da sociologia da educação. Por exemplo: a inclusão das crianças e do seu ponto de vista no seio das problemáticas da sociologia da educação convida à ruptura com as concepções sociológicas tradicionais e normativas que, ao tomarem a escola ou o jardim de infância como os seus objectos de estudo, deduziram as crianças mais dos quadros instituídos do que das suas acções; a consideração das crianças como unidade de observação pode contribuir para pôr em diálogo áreas da sociologia como a educação, família ou lazer, por exemplo, e assim dar conta dos meandros nos quais se movem as crianças e de qual é o seu papel dentro e entre elas. O mesmo, em relação à articulação de diferentes disciplinas das Ciências Sociais. Trata-se de indagar a teoria disponível a partir dos problemas particulares colocados por este objecto/sujeito e de mobilizar uma heterogeneidade de olhares para compreender os fenómenos, de combinar várias abordagens teóricas, recorrer a conceitos provenientes de escolas de pensamento diferentes… Trata-se também de realizar estudos não apenas sobre as crianças, de como é que os adultos disseram as crianças, mas agora, com crianças para descobrir o actor-criança e a sua agência "escondida", dando-lhes voz, isto é: reconhecê-las como produtoras de sentido, com o direito de se apresentarem como sujeitos de conhecimento e assumir como legítimas as suas formas de comunicação e relação. Claro que para isso é necessário o recurso a metodologias interpretativas e etnográficas que convocam os adultos a desafiarem as barreiras do seu próprio adultocentrismo.
Como tem sido aceite esta área de investigação no meio académico?
O meio académico, incluindo a própria sociologia, não é impermeável às concepções dominantes da sociedade e, portanto, não é indiferente o desigual conhecimento e reconhecimento das diferentes idades de vida como realidades humanas e sociais relevantes, dos que contam ou não como seres sociais e da sua importância no quadro da hierarquização das categorias sociais: o adulto, o jovem, a criança e os idosos. O lugar marginal e o desinteresse a que têm sido remetidas as crianças, tanto maiores quanto menores são as suas idades, é sintomático disso. Também não é por acaso que mesmo tendo mantido um crescimento sustentado ao longo das últimas três décadas, a Sociologia da Infância tenha sido apenas reconhecida pela Associação Internacional de Sociologia em 1990. De facto, entre um discurso dos direitos da criança e as dificuldades no reconhecimento da sua cidadania epistemológica - o reconhecimento das crianças como protagonistas e repórteres competentes das suas experiências de vida -, aquilo que se sabe acerca dos seus mundos sociais é quase nada… mas é inegável que desde então os progressos vão sendo cada vez mais visíveis.
Criança tem voz própria
(Pelo menos para a Sociologia da Infância)
Ideia chave que ressalta da entrevista à professora Manuela Ferreira da FPCE da Universidade do Porto
Professora auxiliar da Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação na Universidade do Porto, Manuela Ferreira inicia o seu percurso profissional como educadora de infância, trabalhando em jardins da rede pública. Posteriormente licencia-se em Ciências da Educação na FPCE-UP, onde, desde então, tem leccionado as disciplinas de Ciências Sociais e Sociologia da Educação. Tem desenvolvido investigação na área da Sociologia da Infância - tema da entrevista que se segue - e dos Estudos de Género.
A Sociologia da Infância é uma área das ciências sociais com uma implantação relativamente recente no universo académico. Em que contexto surge?
A preocupação em estudar a criança do ponto de vista da Sociologia não é propriamente recente, basta pensar no conceito de socialização. O que é novo, é uma inversão do olhar que, ao assumir a autonomia conceptual das crianças e da infância, advoga que as suas culturas e relações sociais são dignas de serem estudadas em si mesmas, no presente e não no seu futuro como adultas, a partir da sua própria voz e não apenas através daquilo que os adultos dizem delas. Trata-se de colocar as crianças em equidade conceptual relativamente a outros grupos ou categorias sociais, uma vez que se considera que elas são seres activos na construção e determinação das suas vidas e dos que as rodeiam, adultos e outras crianças. Ora, é fundamentalmente a partir dos anos oitenta, que ganha visibilidade no mundo anglo-saxónico um conjunto de estudos de diversas áreas, desde a História Social, à Antropologia, Economia e Sociologia, que têm em comum a criança como unidade de observação. Claro que esta deslocação do foco para a acção da criança e a sua consideração como actor social não pode ser compreendida se não se entrar em linha de conta com as transformações que ocorreram dentro do próprio campo sociológico, nomeadamente dos debates entre as perspectivas mais estruturalistas e as que põem a tónica na acção social.
De que forma caracterizaria o campo de acção da Sociologia da Infância?
Como já referi, a Sociologia da Infância procura tomar as crianças como o seu centro de interesse, a partir de si próprias e não da sua dedução dos quadros instituídos de que estão dependentes. Essa preocupação tem-se traduzido em modos diferentes de construir sociologicamente a infância, tanto do ponto de vista teórico como metodológico. Há perspectivas que têm tido como preocupação mostrar que a infância não é uma realidade finita com uma forma única mas antes uma pluralidade de concepções que co-existem e são produto de uma construção social e histórica. Outras, procuram mostrar que mesmo que a infância varie historicamente e os seus membros mudem continuamente, a infância é uma categoria estrutural distinta e permanente das sociedades humanas. Aqui, a tónica é sobretudo colocada nas características sociais mais uniformes que permitem defini-la como grupo social constitutivo da sociedade, à semelhança de outras categorias estruturais como o género ou a classe social. Outras ainda, procuram enfatizar as crianças como actores sociais competentes, ou seja; com poder de acção e tomada de iniciativa, valorizando a sua capacidade de produção simbólica e a constituição das suas práticas, representações, crenças e valores em sistemas organizados social e culturalmente. Ou seja, as crianças serem reconhecidas como uma estrutura e um grupo social próprio... Exactamente. Não pode haver sociedades sem infância, por isso ela é uma categoria estrutural permanente. Para pensar a infância como categoria estrutural distinta de outras categorias como a classe social, o género ou etnia, a idade torna-se uma variável importante porque singulariza as crianças de acordo com as suas características mais comuns, sejam elas físicas, psicológicas, morais, afectivas, sociais. Isso permite uma maior compreensão da sua situação estrutural por referência ao adultos de quem estão ou são vistas como dependentes e perante quem têm menos poder e uma maior evidência de que também elas estão sujeitas às mesmas possibilidades e constrangimentos que são colocados pelos sistemas e estruturas sociais, geracionais e genderizados. Neste sentido, as crianças são vistas como uma categoria universal, um grupo social, que emerge dos constrangimentos que as estruturas sociais, económicas e determinadas políticas lhes colocam e que sistematicamente as excluem daquelas esferas sociais. De outro ângulo, uma vez que é nas instituições e nas acções sociais que aí desenvolvem que a infância é socialmente construída tanto pelas próprias crianças como pelos adultos, também se pode compreender melhor como é que no quotidiano, quando ali se encontram, jogam e negoceiam as suas diferentes e desiguais posições sociais de classe social, idade, género, estatuto, poder, elas se constituem como grupo social. Refere, em texto recente, que a Sociologia da Infância, abordando a criança como uma construção social, "procura suspender significados tidos como certos, evidentes e inquestionáveis".
A que significados se refere?
Refiro-me fundamentalmente às concepções tradicionais dominantes acerca das crianças e da infância que as definem como um ser irresponsável, imaturo, incompetente, irracional, amoral, a-social, a-cultural, seres em défice, simples objectos passivos e meros receptáculos de uma acção de socialização. Refiro-me também à própria concepção de socialização como um processo singular, progressivo, concertado, unívoco e vertical, reduzido às relações com os adultos que o encimam, localizado numa instituição com objectivos claramente definidos e em prol da reprodução social. Refiro-me à concepção do brincar como uma acção meramente natural e espontânea das crianças, uma espécie de credo e emblema único das actividades da infância que esgota a multiplicidade das suas acções e torna opacos os modos como criam realidade social. Refiro-me à concepção de grupo de pares como forma relação e de organização assente na homogeneidade e de onde estão ausentes relações sociais desiguais e a presença de relações estratégicas, de poder e contra-poder.
Contributos para uma cidadania da infância
Que contributos pode trazer a Sociologia da Infância para a redefinição, entre outras, da prática pedagógica dos educadores?
Quando uma das principais preocupações da sociologia da infância é, por um lado, mostrar que o modo como nós, adultos, vemos e pensamos as crianças interfere no modo como nos relacionamos com elas e, por outro, que as crianças são actores sociais dotados de pensamento reflexivo e crítico, daí que a relevância que se pretende atribuir às suas acções como prova de si e do que são como seres inteligentes, socialmente competentes e com capacidades de realização, dotados de emoções e sentimentos à luz das suas próprias evidências, parece-me que estão dadas as grandes coordenadas. A concretização desta segunda coordenada requer do adulto-educador uma outra atenção além da observação que se preocupe com a escuta das crianças, por forma a tornar-se um intérprete e tradutor competente das crianças, a partir dos pontos de vista delas e dos vários sentidos que estão envolvidos na situação, e isso não é possível sem estar disposto a deixar-se surpreender pelas crianças e a seguir atrás delas para aceder aos seus mundos. Sem esta aceitação de uma inversão das suas posições e papéis tradicionais, o que implica uma reflexão acerca das desiguais relações de poder entre adultos e crianças, não é possível promover a participação das crianças na tomada de decisão e gestão das suas actividades e, muito menos, no planeamento do quotidiano do jardim de infância.
Ou seja, levar a sério o actor social que ela de facto representa e reconhecer o seu direito à palavra...
Sim. Só que não basta reconhecer o direito à palavra das crianças. É preciso ter consciência de que essa palavra é dominada, dita e manipulada diversa e desigualmente pelas diferentes crianças. Se pensarmos, por exemplo, que os momentos de reunião colectiva no jardim de infãncia são um encontro público em que as crianças têm oportunidade de exprimir as suas opiniões, interesses, conhecimentos, etc, e que o seu modo privilegiado é a palavra oral, não é difícil imaginar do ponto de vista sócio-cultural quem serão as crianças que, muito provavelmente e em grande parte do tempo, ocuparão e dominarão esse espaço! O mesmo acontece quando as crianças brincam e desenvolvem acções comuns entre elas: não é a mesma coisa ser-se menino ou menina, ser da classe média ou de um grupo social com parcos recursos económicos, ser mais velho ou mais novo, veterano ou novato!… Isto para dizer que o contributo da Sociologia da Infância para pensar a redefinição da prática pedagógica dos educadores passa, sobretudo pelo desenvolvimento de uma sensibilidade aos processos sociais que impregnam o quotidiano do jardim de infância, tanto nas relações entre as crianças como entre adultos e crianças e pelo exercício do espírito crítico e da reflexividade como instrumentos para uma intervenção pedagógica avisada, capaz de desconstruir as subtilezas de que se revestem as relações de poder e dominação.
A Sociologia da Infância é apenas mais um contributo para o estudo da criança ou assume-se como uma dimensão inovadora nesse campo?
A Sociologia da Infância com os seus estudos das crianças deseja contribuir para o alargamento do campo das Ciências da Educação e das Ciências Sociais, não tanto por via do seu espartilhar com o acréscimo de mais uma disciplina e de um objecto, mas antes pelo participar na sua recomposição, uma vez que se considera que a sua inclusão obriga ao exercício crítico da própria sociologia, em particular, da sociologia da educação. Por exemplo: a inclusão das crianças e do seu ponto de vista no seio das problemáticas da sociologia da educação convida à ruptura com as concepções sociológicas tradicionais e normativas que, ao tomarem a escola ou o jardim de infância como os seus objectos de estudo, deduziram as crianças mais dos quadros instituídos do que das suas acções; a consideração das crianças como unidade de observação pode contribuir para pôr em diálogo áreas da sociologia como a educação, família ou lazer, por exemplo, e assim dar conta dos meandros nos quais se movem as crianças e de qual é o seu papel dentro e entre elas. O mesmo, em relação à articulação de diferentes disciplinas das Ciências Sociais. Trata-se de indagar a teoria disponível a partir dos problemas particulares colocados por este objecto/sujeito e de mobilizar uma heterogeneidade de olhares para compreender os fenómenos, de combinar várias abordagens teóricas, recorrer a conceitos provenientes de escolas de pensamento diferentes… Trata-se também de realizar estudos não apenas sobre as crianças, de como é que os adultos disseram as crianças, mas agora, com crianças para descobrir o actor-criança e a sua agência "escondida", dando-lhes voz, isto é: reconhecê-las como produtoras de sentido, com o direito de se apresentarem como sujeitos de conhecimento e assumir como legítimas as suas formas de comunicação e relação. Claro que para isso é necessário o recurso a metodologias interpretativas e etnográficas que convocam os adultos a desafiarem as barreiras do seu próprio adultocentrismo.
Como tem sido aceite esta área de investigação no meio académico?
O meio académico, incluindo a própria sociologia, não é impermeável às concepções dominantes da sociedade e, portanto, não é indiferente o desigual conhecimento e reconhecimento das diferentes idades de vida como realidades humanas e sociais relevantes, dos que contam ou não como seres sociais e da sua importância no quadro da hierarquização das categorias sociais: o adulto, o jovem, a criança e os idosos. O lugar marginal e o desinteresse a que têm sido remetidas as crianças, tanto maiores quanto menores são as suas idades, é sintomático disso. Também não é por acaso que mesmo tendo mantido um crescimento sustentado ao longo das últimas três décadas, a Sociologia da Infância tenha sido apenas reconhecida pela Associação Internacional de Sociologia em 1990. De facto, entre um discurso dos direitos da criança e as dificuldades no reconhecimento da sua cidadania epistemológica - o reconhecimento das crianças como protagonistas e repórteres competentes das suas experiências de vida -, aquilo que se sabe acerca dos seus mundos sociais é quase nada… mas é inegável que desde então os progressos vão sendo cada vez mais visíveis.
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