sexta-feira, 24 de junho de 2011

Informação é poder...

Confira abaixo interessante artigo do Alon, transcrito do seu blog.

Inferno lotado
Alon Feuerwerker

O modelo em que todo mundo sabe de tudo é defensável. O em que ninguém sabe de nada também é. Na vida real, entretanto, sempre será realista considerar a possibilidade de um terceiro modelo. Em que alguns vão ficar sabendo e outros não


O modelo em que todo mundo sabe de tudo é defensável. O em que ninguém sabe de nada também é. Na vida real, entretanto, sempre será realista considerar a possibilidade de um terceiro modelo. Em que alguns vão ficar sabendo e outros não

É possível que o governo use o rolo compressor para aprovar no Senado a claúsula que permite informar apenas aos órgãos de controle -e não ao público- quanto de orçamento existe para determinada obra, ou serviço.

O governo considera tal mecanismo útil, diz que vai reduzir o dispêndio, pois os concorrentes deixam de ter uma referência para, inclusive, acertarem-se na preliminar.

Diz o governo que a claúsula permitirá fazer obras mais baratas. A ver. A tradição nacional nesse terreno é as belas ideias serem sucedidas por frustração.

Mesmo a lei em vigor, das mais detalhistas e regulamentadoras, não é definitiva para impedir irregularidades.

Não discuto as intenções da presidente da República. Podem até ser boas. Nas Minas e Energia e na Casa Civil Dilma Rousseff ficou conhecida por lutar para reduzir o custo dos empreendimentos.E o custo dos serviços para o consumidor.

Mas uma coisa são as intenções, de que, como se sabe, o inferno está lotado. Outra coisa é a vida real.

Escrevi dias atrás sobre a necessidade de um balanço detido das recentes concessões de estradas federais. A impressão não é boa. Agora o governo vai passar aeroportos ao capital privado. Será melhor? Para o público, esclareço.

Na inércia, há boas razões para suspeitar que vamos pagar mais caro por um serviço igualmente ruim. Se na telefonia e na energia elétrica, por exemplo, é assim, por que será diferente nos aeroportos?

As privatizações brasileiras estacionaram no pior de dois mundos. O monopólio estatal virou monopólio, ou oligopólio, privado. Financiado com dinheiro do trabalhador a juros camaradíssimas. A concorrência é em boa medida ficção. E quem deveria regular não regula.

Há alguma explicação razoável para que paguemos tarifas na lua ao usar celular e internet? Isso década e meia depois da privatização. E depois de quase uma década de governo de um partido que antes criticava essas deformações.

Então, quando governos argumentam com boas intenções, é sempre prudente buscar os focos potenciais de problema. Até para antecipar problemas.

Tem lógica o argumento de que se ninguém souber o montante orçamentário aumentará a possibilidade de ofertas bem abaixo. Onde está a dúvida? Exatamente no “ninguém”.

O modelo em que todo mundo sabe de tudo é defensável. O em que ninguém sabe de nada também é. Na vida real, entretanto, sempre será realista considerar a possibilidade de um terceiro modelo. No qual alguns vão ficar sabendo e outros não.

O segredo na administração pública costuma ser de polichinelo para quem tem o mapa do poder. Por isso se preza tanto a transparência. Dado o irrealismo da segunda opção, a sociedade tem o hábito de buscar refúgio na primeira.

Nem sempre consegue, mas gosta de tentar. Para não abrir espaço à terceira.

Sem falar na lacuna lógica. Se o novo modelo é melhor que o velho, por que não universalizar? Por que mudar só as regras para um empreendimento específico?

De duas uma. Ou a licitação “secreta” atende melhor ao interesse público, e portanto todas devem ser feitas assim, ou atende a uma circunstância, e portanto será necessário analisar como a mudança irá impactar negativamente o interesse público.

Num país normal o tema seria democraticamente debatido por meio de um projeto de lei, enviado com antecedência suficiente ao Congresso Nacional.

Isso num país normal.
Limite
Não se sabe se os líderes governistas no Legislativo já informaram ao Planalto a real temperatura da insatisfação nas Casas, especialmente no Senado, com a brutalidade das medidas provisórias transformadas em árvores de Natal.

É a liquidação pura e simples do processo legislativo. Ou o governo percebe que precisará discutir o assunto para valer ou corre risco de grave atropelamento.

quinta-feira, 23 de junho de 2011

Dias cinzas em Natal

Nem sol, nem chuva, um cinza toma conta da paisagem na maior cidade da esquina do continente neste final de junho. Nas calçadas, sujeira. Nas ruas, pelo menos ontem, carros. Carros em excesso.

Nas margens da BR-101, edifícios em construção. Monstrengos horrorosos. Gaiolas para a classe c, disse-me, meio gaiato um amigo. Pode ser. Mas quem irá pagar mensalidades de salário mínimo para morar naqueles “apertamentos”? Não sei, mas, certamente, será alguém com carro. E dá-lhe carros na cidade...

Mobilidade urbana? Por aqui, é sintagma bonito para significar coisa nenhuma. Pura retórica...

De vez em quando, eu troco o carro pelo ônibus. Relaxo mais. Até me programa para tomar, com tranquilidade, uma cerveja. O tempo é que não ajuda. O cinza daqui, não raro, é prenúncio de dilúvio...

Mas, como eu ia dizendo, vale a pena deixar o carro em casa e vagabundear por aí. Mesmo tendo como companhia apenas os jornais que baixo no meu e-reader (olha aí o habitus de classe média, dirá a minha prima). Nada disso, o aparelhinho me custou trezentas pratas e é um achado. Faço o download, através do Calibre, do EL PAÍS e do LE MONDE. Depois disso, é só pegar o busão para uma praça de alimentação mais vaga, pedir uns chopes e uns pastéis e se deliciar com boas leituras. A classe C também vai ao paraíso...

quarta-feira, 22 de junho de 2011

Fique em boa companhia neste final de tarde...

Uma boa análise da conjuntura econômica

Você é daqueles, como eu e mais alguns gatos pingados, que, em não estando em cargos no governo e nem em consultorias para o tal do mercado, preocupa-se com a vida econômica? Bueno, então gostas de quem escreve bem e sem papas na língua, não é? Aproveite e leia o artigo abaixo. Você vai encontrar um conjunto de informações fundamentais para pensar a conjuntura econômica que atravessamos no nosso país.


A taxa de juro natural e a Amazônia
O Brasil está com sinais vitais razoáveis, mas tem de aumentar o emprego e a poupança e gerir melhor o setor público
Antônio Delfim Netto*

A mais óbvia razão pela qual os economistas não foram capazes de antecipar a tragédia que se preparava no mercado financeiro internacional, e que se concretizou em 2008, talvez resida no fato que a Teoria Macroeconômica e a Teoria da Economia Financeira foram separadas, a ponto de se ignorarem, contrariamente ao sugerido por Keynes e Fisher. James Tobin chamou a atenção para isso em meados dos anos 80 do século passado. Uma provocação curiosa a respeito dessa questão. Aquela separação não encontrou eco na conflagrada economia marxista (Hilferding, Luxemburgo, etc.). Marx, aliás, já advertira que “quando há um colapso total do crédito, nada mais conta, só o pagamento em moeda…e que legislações bancárias como a de 1844-45 (na Inglaterra) podem intensificar a crise monetária. Profeticamente, acrescentou, “nenhuma legislação bancária pode eliminar a crise”, como mais um século depois estamos aprendendo…

O Brasil está vivendo um momento interessante depois de ter superado muito bem a crise. Há, entretanto, uma dúvida ampla, geral e irrestrita sobre: 1) a natureza do processo inflacionário que atinge, em grau maior ou menor, todos os países do mundo e 2) as consequências no longo prazo da supervalorização do Real que está destruindo a sofisticada indústria nacional.

Todo processo inflacionário se explica por uma combinação variável de três causas: 1) um desequilíbrio persistente entre a oferta e a demanda global de bens e serviços; 2) uma desancoragem (por múltiplas razões, inclusive a anterior) da “expectativa” inflacionária, e 3) um “choque de oferta” interno ou externo. No caso brasileiro é preciso incluir a indexação ainda generalizada que sobrou como resíduo do bem-sucedido Plano Real e para cuja eliminação se fez muito pouco (de fato, acrescentou-se mais veneno) nos últimos oito anos.

“Temos hoje, praticamente, uma taxa de câmbio fixa. Trata-se de um mecanismo de legítima defesa.”

No regime de câmbio flutuante, quando o choque externo é um grande aumento das relações de troca, ele é “filtrado” por uma valorização da taxa de câmbio. O cabo de guerra estabelecido entre os “falcões” e o governo parece estar amainando, com o reconhecimento que o ajuste dos juros pelo Banco Central (BC) será suficientemente prolongado para promover a convergência da taxa de inflação para o centro da meta de 2012.

Aparentemente isto está sendo conseguido: a taxa de juros real produzida pela Selic (que importa mais para o custo da dívida pública) tem sido elevada moderadamente, mas a taxa de juros real do setor privado que controla o consumo e boa parte dos investimentos (não privilegiado por programas especiais), tem se elevado mais fortemente. Este ano a despesa com juros da dívida pública deve beirar a R$ 180 bilhões, uma respeitável Bolsa-Rentista.

A comunicação do Banco Central deve ser dirigida à sociedade e não apenas ao sistema financeiro. No fundo, os seus clientes são os cidadãos comuns que só podem ser informados por meio da mídia. São eles (e não apenas os analistas financeiros) que lhe conferem credibilidade. É fundamental para o sucesso da política econômica a informação preventiva, rápida, transparente e honesta do Banco Central, para contrarrestar a natural diversidade de opiniões.

Há muitos anos os economistas reconheceram as estreitas relações que existem entre o movimento de capitais, os regimes da taxa de câmbio e a autonomia monetária de cada país. Teorizando sobre situações limites: 1) liberdade absoluta ou controle absoluto dos movimentos de capitais nas relações externas; 2) taxa de câmbio absolutamente flutuante ou taxa de câmbio absolutamente fixa; 3) liberdade absoluta ou constrangimento absoluto para que a política monetária atenda às condições econômicas domésticas e estabilize a economia; e 4) adicionando a hipótese que os agentes são absolutamente racionais e exploram qualquer oportunidade de lucro que possa ser apropriado pela livre arbitragem, demonstra-se, logicamente, que a política econômica de um país não pode satisfazer, simultaneamente, mais do que duas, das três primeiras condições expostas acima. Essa construção lógica constitui o já velho e famoso trilema que condiciona o exercício da política econômica.

“A ascensão social da última década produz um desequilíbrio entre a demanda e a oferta.”


Em outras palavras, ela pode incorporar quatro situações resumidas a seguir:

1) Liberdade de movimento de capitais e câmbio fixo. Nessa circunstância, o país não pode ter uma política monetária que cuide dos seus interesses internos. Para que haja equilíbrio no longo prazo, a sua taxa de inflação deve ser igual à externa e a taxa real de juros deve ser igual à do “resto do mundo”. Se a taxa de juros interna for maior do que a externa, a acumulação de reservas produzida pela entrada de capital precisa ser neutralizada com o aumento crescente da dívida pública (e do seu custo) e, no limite, será monetizada, criando as condições para a emergência de um processo inflacionário;

2) Controle do movimento de capitais e câmbio fixo. Nesse caso há plena liberdade para a política monetária perseguir os interesses internos do país. Nestas circunstâncias, a taxa de câmbio fixo deve ser o preço relativo que equilibra o valor do fluxo dos bens e serviços exportados com os importados. Se a taxa de inflação gerada pela política monetária autônoma for sistematicamente maior do que a do mundo, a taxa real de câmbio sofre uma lenta valorização e, mais dia, menos dia, acumula-se um déficit em conta corrente. Este regime induz a política monetária a perseguir uma taxa de inflação parecida com a do “resto do mundo”. Trata-se do sistema construído originalmente no Acordo de Bretton Woods que foi erodido pela dominança abusiva do dólar como unidade de conta internacional e moeda reserva;

3) Liberdade de movimento de capitais e câmbio flutuante. Nesse caso a política monetária precisa manter a taxa real de juros interna igual à externa para construir o equilíbrio de longo prazo. Para reduzir a volatilidade da taxa de câmbio ele deve manter também sua taxa de inflação parecida com a de seus parceiros internacionais; e

4) Controle do movimento de capitais e taxa de câmbio flutuante. Nesse caso pode-se ter uma política monetária que atenda aos interesses internos do país. A taxa de câmbio flutuante volta a ser o velho preço relativo que equilibra o valor do fluxo de bens e serviços exportados com o valor do fluxo de bens e serviços importados.

A experiência mostra que nenhum país pratica políticas econômicas com a “pureza” suposta na construção lógica do “trilema”. Todos tendem a acomodar (de acordo com as circunstâncias que enfrentam dentro e fora do país e dos interesses do poder incumbente), uma combinação variável da liberdade do movimento de capitais, do regime cambial e da política monetária.

Assistimos isso agora no Brasil. Com três instrumentos de intervenção, o Banco Central transformou o regime cambial. Temos hoje, praticamente, uma taxa de câmbio fixa. Trata-se de um mecanismo de “legítima defesa” justificado pela destruição interna causada pela supervalorização do Real. Ninguém discute que a tendência do Real é de valorizar-se, se não por outras causas, apenas pela velha teoria e empiricamente reconhecida relação da taxa de câmbio real com a elevação do Produto Interno Bruto (PIB) per capita. No momento essa tendência é ajudada pela enorme melhoria das relações de troca (enquanto durarem). O que se discute é a “super” valorização causada pelo imenso diferencial entre as taxas de juros reais interna e externa.

O “trilema” não é apenas uma proposição logicamente deduzida. Pesquisas empíricas que se vão acumulando, mostram sua relevância. É preciso insistir que não importa qual seja a combinação escolhida pela nossa política
econômica: é pouco provável que ela seja exitosa no longo prazo se a taxa de juro real interna continuar 4 vezes maior que a externa!

Há dezenas de explicações para tal “fenômeno” produzidas por sofisticados e tecnicamente bem apetrechados economistas, às vezes apoiados numa econometria de “pé quebrado”. Em algumas de suas “regressões” só não acrescentaram, ainda, como variável “explicativa”, os quilômetros quadrados desmatados na Amazônia. Todo o resto já foi tentado”.

Do nosso ponto de vista a melhor explicação para o fato é a que tem sido trabalhada e promovida há muito tempo, entre outros, pelo ilustre professor Yoshiaki Nakano: continuamos a praticar as regras operacionais que, também em “legítima defesa”, inventamos no período de hiper-inflação e que foram funcionais naquele momento. Para começar a desmontá-las precisamos reduzir o financiamento da dívida pública com títulos remunerados à taxa Selic, exatamente o objetivo perseguido pela Secretaria do Tesouro Nacional (STN). É preciso criar condições e estímulos para que o mercado reduza em seu portfólio os papéis remunerados pela taxa Selic, o que será muito positivo, inclusive, para aumentar a potência da política monetária convencional.

A notícia mais importante do Plano Anual de Financiamento (PAF) da STN para 2011, é que existe tal possibilidade durante o atual mandato da presidente Dilma Rousseff: 80% da dívida remunerada em Selic vence entre 2011 e 2014. Como afirma a STN, o ajustamento será lento, cauteloso e oportunístico, refletindo o “desenvolvimento do mercado financeiro”. O fundamental é saber que a janela está aí e que o seu aproveitamento depende, apenas, de uma forte coordenação entre um seguro esforço fiscal e uma fina política monetária que deem musculatura à STN para fechá-la.

A nossa situação cambial é ainda mais delicada devido à extrema liquidez proporcionada pelo Federal Reserve (Fed, banco central americano) para acelerar a taxa de crescimento dos EUA, sem o que não haverá solução para sua dívida interna. O problema dos EUA é que sua política econômica não conseguiu, até agora, conquistar credibilidade e reduzir o nível de incerteza que continua a cercá-la. O gráfico tenta mostrar nossas dificuldades.

A falta de confiança tem levado a uma recuperação lenta de economia americana (particularmente no nível de emprego). Isso produziu uma política monetária extremamente laxista – o “quantitative easing” 1 e 2 (QE1 e QE2) – que levou a taxa de juro nominal a zero, o que tende a desvalorizar o dólar. Como ele é a unidade de conta no mercado internacional, a sua desvalorização aumenta ainda mais os preços nominais das commodities (petróleo, metais e alimentos), já pressionados por uma aceleração da demanda global dos emergentes (China, Índia etc.). O aumento do petróleo por sua vez, corta a renda dos americanos e diminui o consumo de outros bens, dificultando ainda mais a recuperação. Além do mais, deteriora o saldo comercial dos EUA e exige maior desvalorização do dólar.

Quais os efeitos disso sobre a nossa taxa de câmbio? Primeiro, uma valorização do Real pela melhoria das nossas relações de troca. Paralelamente, os preços externos são internalizados pela taxa de câmbio. Quando o câmbio não pode mais valorizar-se pelo estrago que está produzindo, aumenta a taxa de inflação interna. Isso leva o Banco Central a aumentar a taxa de juro real, o que estimula ainda mais o fluxo de capitais que vem arbitrar a diferença de juros e reforça a valorização do Real. A arbitragem não termina porque o juro real interno não cai devido à política monetária que absorve os reais vendendo papéis do governo à taxa Selic. Estamos presos numa armadilha. Ela se agravará ainda mais se o FED, diante da fraqueza da economia americana, decidir por um terceiro “quantitative easing” (QE3).

Com relação à inflação, a política econômica destina-se a controlar diretamente a demanda global e ajustá-la à oferta global, e, indiretamente (por sua credibilidade), fixar a expectativa de inflação que ancora a formação dos preços e dos salários. Trata-se de um processo não trivial, cheio de armadilhas conceituais e largamente determinado pelas crenças sobre o estado da economia e sobre as respostas dos agentes à própria política (o efeito do déficit fiscal nominal, os efeitos da relação dívida/PIB os efeitos das manobras de juros etc.), de forma que os efeitos diretos e indiretos se auto-estimulam.

Choques internos, rapidamente superados, como é o caso de uma quebra de safra em que os preços têm a tendência de retornar à média, precisam de um tratamento cauteloso porque, se incorporados pela indexação aos salários, elimina-se o papel principal do aumento dos preços que é cortar temporariamente a demanda física para ajustá-la à oferta física. O mesmo acontece quando se trata de desequilíbrios estruturais produzidos por uma redistribuição de renda que altera a demanda de serviços. É exatamente o aumento dos seus preços relativos que estimulará a expansão da oferta para atendê-la. Logo, o ajuste deve ser acompanhado por ações não monetárias (”estruturais”) que ajudem e acelerem o efeito das manobras com a taxa de juros.

Toda mudança de preços relativos exerce uma pressão sobre a inflação devido à rigidez para baixo de todos os preços. Um movimento de ascensão social como vimos vivendo na última década, tende a produzir um desequilíbrio qualitativo entre a demanda e a oferta de serviços e nos preços dos produtos consumidos pelas classes em ascensão. Imagine a destruição de PIB, do emprego e o aumento da pobreza que seriam necessários para desconstruir aquele processo civilizatório apenas com manobra da taxa de juros.

Um problema interessante com relação à escassez de mão de obra refere-se, por exemplo, à engenharia. Devido à pequena demanda e baixos salários da profissão nos anos 90 do século passado, quase 40% do estoque de nossos engenheiros trabalham fora da sua especialidade, principalmente na administração e finanças. Para trazê-los de volta (e estimular a formação de novos) o sistema de preços já está funcionando e os salários deverão ajustar-se relativamente às outras atividades. Isso, entretanto, também não é “prova” de que exista um desajuste sério entre a demanda e a oferta globais de mão de obra, o que exigiria uma redução da taxa de crescimento do PIB. É preciso pensar em outras soluções, inclusive estimular a volta ao trabalho dos engenheiros que se aposentaram e dos que abandonaram o País por falta de oportunidades. E por que não importar profissionais estrangeiros oferecendo-lhes condições adequadas de vida e de trabalho como fazem vários países? Isso fez inteligentemente o Canadá (inclusive conosco).

O Brasil está com sinais vitais bastante razoáveis. Seu problema principal, entretanto, é preparar a nossa estrutura produtiva interna para dar emprego de boa qualidade a 145 milhões de brasileiros – com idade entre 15 e 64 anos – em 2030. Isso não será feito apenas com o nosso modelo agrominerador extremamente eficiente, mas induzido e dependente do crescimento externo. Não tenhamos ilusões. Com tempo suficiente (e que não será coisa muito superior a 4 anos ou 5 anos) a oferta mundial de alimento e petróleo criada pelos próprios países que hoje exercem a pressão de demanda, crescerá estimulada pelo aumento dos preços. Aí tudo mudará.

É hora, portanto, de aproveitar o tamanho e estimular a expansão do nosso mercado interno para ampliar o setor industrial e o de serviços (sem desestimular a agricultura e a mineração) para atender ao crescimento inclusivo que nos impõe a própria Constituição de 1988. Para atender ao aumento da oferta demográfica de mão de obra, o Brasil precisa de um crescimento anual nos próximos 20 anos, da ordem de 5% ao ano, com estabilidade interna e externa.

Para consegui-lo temos de fazer muita coisa. Fundamentalmente, elevar a taxa de poupança interna para qualquer coisa parecida como 24% a 25% do PIB (com um déficit em conta corrente não maior do que 1%), o que exige estímulo à poupança privada e um grande aumento da poupança governamental (sem aumentar a carga tributária), ou seja, cumprir o que foi anunciado pela presidente Dilma: “Fazer um pouco mais com um pouco menos”. Em poucas palavras, gerir mais eficientemente o setor público.
Pode parecer pedestre (e até enganoso), mas todos os nossos problemas (inclusive o cambial) podem ser minorados com tal programa. Ao fim e ao cabo – como insiste em dizer um velho amigo -, tudo se resume em: 1) ter uma rigorosa política fiscal (equilíbrio fiscal cíclico e relação dívida/PIB estritamente controlada; 2) melhorar a qualidade da gestão pública e reduzir o crescimento dos gastos de custeio e transferências abaixo do crescimento do PIB; 3) assegurar a boa regulação concorrencial do mercado e coordenar, com ele, o papel do Estado-Indutor com o uso de estímulos adequados; e 4) resistir à permanente sedução (que costuma cegar o poder incumbente), de tentar violar as identidades da contabilidade nacional.
O resto é creme chantilly para enfeitar a receita…

* Antonio Delfim Netto é professor emérito da FEA-USP, ex-ministro da Fazenda, Agricultura e Planejamento.

Nanotecnologia e desterritorialização

O Professor Jônatas Ferreira, da sociologia da UFPE, já foi devidamente apresentado neste espaço. Bueno, então, direto ao ponto. Se você se interessa pelas discussões sobre territorialidades, nanotecnologia e inovação científica, ou ainda poder e território, não vacile: clique aqui e leia um ótimo artigo sobre esses e outros tópicos.

Ah! O artigo foi publicado no sempre ótimo QUE CAZZO É ESSE?

terça-feira, 21 de junho de 2011

Dê um tempo para o Guerra-Peixe...

Você conhece Guerra-Peixe (caso queira dados sobre ele na Wikipédia, clique aqui), não é? Não! Não afirme isso com tanta certeza. Você já ouviu tantas músicas dele. Quer apostar? "Mourão", por exemplo, eu juro de pés juntos que você já a ouviu.

Bom. Foste na Wikipédia? Agora, clique aqui e acesse um cd de tributo ao grande compositor (você poderá inclusive ouvir algumas músicas, dentre elas, of course, "MOurão").

Mário Vargas Llosa e a derrota do fascismo no Peru

Leia aqui texto fundamental sobre as últimas eleições peruanas. O autor? Mário Vargas Llosa!

Os liberais na vanguarda

Texto do jornalista e consultor sobre segurança pública Marcos Rolim a respeito da posição do STF liberando as marchas da maconha. Confira!

DAS LIBERDADES Marcos Rolim

O voto do Ministro Celso de Mello (disponível em: http://bit.ly/jTUZmC) na ADPF 187 que tratou do direito à manifestação pública em favor de uma nova política de drogas no Brasil (caso das “Marchas da Maconha”) deveria ser lido por todos como um documento basilar sobre a democracia.

Ele sustenta a liberdade de reunião (de que são manifestações expressivas o comício, o desfile, a procissão e a passeata) e o direito à livre manifestação do pensamento como prerrogativas essenciais da cidadania “normalmente temidas pelos regimes despóticos que não exitam em golpeá-las”.

Com efeito, a CF, em seu art. 5º, inc. XVI, assinala: “todos podem reunir-se pacificamente, sem armas, em locais abertos ao público, independentemente de autorização, desde que não frustrem outra reunião anteriormente convocada para o mesmo local, sendo apenas exigido prévio aviso à autoridade competente”. Em nosso sistema jurídico, tal direito só pode ser restringido com a decretação do Estado de Defesa ou do Estado de Sítio. É dever, portanto, do Estado proteger os manifestantes e não reprimi-los como vinha se fazendo até então, vergonhosamente, em vários estados brasileiros. Se não por outro motivo, porque não há opinião pública livre sem a garantia do dissenso. A democracia, ao contrário do que imagina o senso comum, não é, apenas, o “governo da maioria”. É também o regime que assegura os direitos das minorias. A liberdade, afinal, é sempre a liberdade de quem pensa diferente, como o disse Rosa Luxemburgo. Por isso, o relator assinalou que apenas no equilíbrio entre a “Majority rule” e os “Minority righ” nos afastamos da ditadura da “opinião pública” e submetemos o Poder à razão e não a razão ao Poder.

Celso de Mello enfrentou, também, os argumentos daqueles que, incrivelmente, ainda sacam do coldre o art. 287 do CP (“apologia de fato criminoso”) para justificar a proibição das marchas, mostrando que este artigo não pode ser interpretado em sentido contrário à Constituição e que reivindicar a mudança da legislação penal é absolutamente diverso de praticar o fato tipificado. Assim, os manifestantes não se reúnem em marchas para consumir maconha (o que segue sendo ilícito), mas para propor novo tratamento ao tema, de ordem não criminal. Se defender a discriminalização de condutas fosse “apologia do crime” a capoeira continuaria sendo criminalizada no Brasil, assim como o “adultério”, a “homossexualidade”, a “sedução” ou o “rapto consensual”. Como que antevendo outro tipo de “argumento” infantil muito em voga, o relator lembrou que a livre expressão de pensamento não constitui direito absoluto, vez que o ódio contra qualquer pessoa ou grupo não está protegido pela Constituição. A Convenção Americana de Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica), aliás, em seu art. 13, § 5º exclui daquela liberdade “toda propaganda a favor da guerra, bem como toda apologia ao ódio nacional, racial ou religioso que constitua incitação à discriminação, à hostilidade, ao crime ou à violência”.

Parece incrível, mas o pensamento liberal clássico – que ampara as decisões do STF – passa a assumir no Brasil uma posição de vanguarda. A política que aqui se pratica, especialmente, é tão conservadora e oportunista que ser coerentemente democrata no Brasil passou a ser um ato de “subversão”. Que coisa.

O fracasso da “guerra contra as drogas”

A política de guerra contra as drogas, concebida pelo reaganismo no começo da década de 1980, custou bilhões de dólares, milhares de vidas e destruiu projetos de vida e de comunidade. Alguém ganha muito com isso. Assim como a delinqüência, o narcotráfico também está enredado nas teias da ordem, sendo manipulado (e, não raro, também a manipulando) por ela. Não por acaso, muitos dos falcões anti-drogas, como se vê não apenas no México, em algum momento, estiveram de braços dados com os barões do comércio de drogas.

A sociedade se movimenta. E isso é muito bom. Há limitações, claro, mas, aos poucos, vamos nos dando conta de que a guerra contra as drogas foi se transformando em um aríete neoliberal para a guerra contra os consumidores de drogas, suas famílias e suas comunidades.

segunda-feira, 20 de junho de 2011

Minha coluna no TERRA MAGAZINE

Acesse aqui a minha coluna da semana no TERRA MAGAZINE.

domingo, 19 de junho de 2011

A culpa é do mordomo... ou do PT. Ops! Culpa?

Na sexta-feira passada, na Biblioteca Central Zila Mamede, tive a oportunidade de participar de um debate sobre o desarmamento. A atividade foi uma promoção da Pró-Reitoria de Extensão da UFRN e do curso de direito.

Foi um bom debate. Marcos Dionísio (ex-Ouvidor da Segurança Pública), Profº Andrew (juiz de direito e docente do curso de direito da UFRN), Kléber (do movimento pelo desarmamento) e eu dividíamos a mesa. Expomos nossas posições com tranquilidade. Na hora do debate, quatro alunos resolveram fazer uma performance: após acusarem, de forma um tanto histérica, a mesa e três dos debatedores de fazerem o “jogo do PT” (desarmamento, diziam eles, é coisa de governo do PT), retiraram-se do auditório. Para mim, nada mais normal. Faz parte do jogo, e do debate público, esse tipo de happening. Houve quem se encrespasse um pouco. Eu, não. Prefiro a reação, mesmo que irada, do que a indiferença.

Mas o fato é que o episódio me fez avivar uma velha proposição: o anti-petismo, esse viés presente no debate político dos últimos anos, especialmente após a ascensão de Lula à Presidência, alimenta-se (do) e alimenta o seu contrário: o petismo acrítico. Um é o reflexo invertido do outro. O festival de besteiras que produzem é tão barulhento que, não raro, ameaça limitar o espaço para uma apreensão mais racional das disputas políticas em curso.

Dentre essas besteiras, destaque deve ser dado às exóticas teorias conspirativas que secretam. Para os petistas todas as denúncias envolvendo trêfegos companheiros em, como direi?, lucrativas empreitadas empresariais (como aquelas propiciadas pela proximidade com a máquina pública) não passariam de um jogo da mídia para desestabilizar o Governo Dilma (ontem, Lula) e para fazer diminuir o capital político do partido. Uma avaliação mais criteriosa do “modo petista de governar” (que, sim, contém virtudes, mas também se traduz em práticas e percepções aparelhistas do Estado) parece fora de qualquer questão. Até porque os embates em torno da defesa da ética, que vitaminaram eleito elitoralmente o partido na década de 1990, foram sufocados pelo pragmatismo governista.

Já o anti-petismo, que se alimenta, em parte, dos ressentimentos de uma classe média moralista de uma certa moral de bolso (na qual a retórica moralista conviveu, e muito bem, com práticas, digamos, heterodoxas, como o pagamento de propinas, as pequenas corrupções e o descumprimento de regras básicas de civilidade), sofre por ter que assistir a ascensão de uma nova elite. Sim, o petismo, se fabricou uma (nova) base social partidária, formada pelos beneficiários de programas de transferência de rendas, não deixou de produzir também uma nova elite. Que, como parte de sua base, ontem se acotovelava em ônibusl, e, hoje, desfila nos mesmos carros da classe média tradicional. Seus filhos, distantes dos “tempos de luta” dos pais, são, como os nossos, bons filhos de classe média. Isso não é negativo; expressa mudança, dinamismo e mobilidade social. Mas aquela classe média tradicional sente-se ameaçada. Em resposta, alimenta-se de um truculento e demofóbico anti-petismo.

Há também o ressentimento de ex-petistas. Como um ex-marido que assiste sua ex-mulher tornar-se mais bela e elegante, e, pior, de braços dados com outro, o ex-petista odeia que aquele partido para o qual buscou, em tempos pretéritos, filiações de casa em casa, ou deu algum troco da mesada paterna para patrocinar a sua consolidação, esteja de bem com a vida, fazendo vexames (tapas, beijos e reconciliações) com esses senhores grisalhos do PMDB, mas também nadando de braçadas ao realizar velhas ambições da esquerda pátria, como incluir milhões de deserdados no admirável mundo do mercado.

Parêntese explicativo (ou, em bom sociologuês, de “auto-objetivação”): sou (ou tento ser) um sociólogo. Faço minha a consigna: “não lamentar, nem se alegrar; mas, sim, compreender”.

O PT deixou a sua adolescência política lá atrás. Isso é bom! O ruim é que nenhuma força política mais à esquerda tenha tido condições (ou competência) para levar adiante os questionamentos éticos que o partido mobilizava. O DEM, pela direita, tenta ocupar esse vácuo. Falta-lhe, entretanto, sustentação para o papel. O partido de Agripino é como aquela socialite que vai fazer trabalho social na favela. Pode até mudar as vestes e relaxar o cabelo, mas os gestos lhe traem. E, logo, alguém lembrará que a viu em uma foto na coluna social. Não cola. Não dá pé...

Essa situação possibilita a emergência de cenários sociais nos quais as velhas récitas conspirativas têm toda força. Petistas e anti-petistas delas se alimentam fartamente. Não é raro que o ridículo predomine. Diante de qualquer obstáculo, os primeiros se valerão dos segundos (e vice-versa) para justificar desventuras produzidas pelas suas incompetências ou descuidos.

E quando o anti-petista é um ex-petista, meu Deus!, aí todo aquele ressentimento de marido traído por uma mulher que, hoje, está mais feliz sem ele, explode. A “máquina do PT” está por trás de tudo, nesses delírios. A fantasia de um polvo, muito mobilizada pelo anti-comunismo da primeira metade do século XX, entra em cena. O intelectual ex-petista perde, de lavada, a eleição para síndico do condomínio? É batata!, a culpa é do PT. Por trás de tudo, em alguma medida, existe uma conspiração petista.Durma-se com um barulho desses!

Essas coisas divertem um pouco, tá certo. Mas cansam, também. Para racionalizar mais a apreensão, talvez valesse a pena lembrar um certo barbudo, que, embora fosse um político de segunda, era um analista de primeira: ao se analisar uma determinada realidade política, devemos focar não naquilo que os homens dizem de si mesmos e dos outros, mas, sim, nas suas práticas.

Uma outra lição, mais simples, é a de que, para o bem e para o mal, o PT, embora pose de “Jurandir” (jura que é demais!) está longe de ser essa máquina azeitada, pronta para articular conspirações de uma hora para outra.

Assim como nos romances policiais, nos quais, quase sempre, o mordomo é o suspeito inicial, mas não é o culpado revelado no final, também é assim na vida real. Por isso, seria melhor se petistas e anti-petistas pisassem mais devagar nos seus aceleradores e procurassem analisar, nos seus próprios atos (presentes e passados), as forças motrizes dos desastres nos quais foram (são e serão) jogados pela inexorável força das coisas.

sexta-feira, 17 de junho de 2011

Final de semana, finalmente.

Semana longa, esta. Batalhas de Itararé pelo meio, fogos de artíficio chinfrins e muita perda de tempo com o que não é essencial. O resultado é que chego na sexta quase pelas tabelas.


E ainda tenho um debate. Agora mesmo. Vou correndo lá para o Auditório da Biblioteca.

Ah! O debate é sobre desarmamento. Sim, precisamos de desarmamento. Muitos, inclusive os espirituais.

Fui!

Uma boa análise de conjuntura

No site da CARTA CAPITAL eu localizei um bom artigo de Juarez Guimarães analisando a conjuntura atual. Confira aqui.

Uma análise sobre a ocupação da Câmara Municipal

No TERRA MAGAZINE, uma análise da ocupação da Câmara Municipal de Natal. A matéria contém uma entrevista com o Professor Gabriel Vitullo, do Departamento de Ciências Sociais da UFRN. Acesse aqui.

OS TROTSKISTAS, OS DISCOS VOADORES E A OCUPAÇÃO DA CÂMARA MUNICIPAL DE NATAL

No livro “O que é o trotskismo?”, publicado há umas duas décadas pela Editora Brasiliense na coleção “O que é?”, muito procurada nos anos 1980, o autor (não lembro o nome) resgata um diálogo do filme italiano “Mimi, o metalúrgico”. Nele, o personagem principal, vivendo o seu processo de iniciação política, é apresentada à extensa fauna da multifacetada esquerda italiana da década de 1960. Quando o seu interlocutor refere-se, com naturalidade, ao trotskismo, Mimi, ingênuo, questiona; “trots o quê?”.

Lembrei dessa passagem porque o trotskismo sempre produziu atores, digamos, exóticos. Alhures, mas também nestas plagas. Lembro-me que, no início da década de 1980, deliciava-me com o jornal “Frente Operária”, editado por uma corrente trotskista seguidora de um argentino chamado J. Posadas. A figura tinha seguidores por aqui, na Cidade do Sol. Um, apenas, mas tinha. Morava na Residência Universitária da UFRN. Quando ele recebia os jornais, nos quais o Camarada Posadas escrevia três ou quatro longuíssimos artigos, passava-me imediatamente um exemplar. Não me lembro o nome do camarada, mas sei que ele era seridoense, do município de São Fernando.

Por que eu me divertia? Porque o Camarada Posadas levava ao escatológico os princípios analíticos do marxismo. Do marxismo mais mecanicista, diga-se de passagem. Posadas, como milhares de outros trotskistas, também tinha uma IV Internacional para chamar de sua. Nessa seara não era original. O que dava singularidade ao pensador e militante era, como eu ia dizendo, a sua radicalização do potencial determinista e mecanicista contido no marxismo. Posadas, como era nada modesto, não se contentava em aplicar o, como direi?, “materialismo dialético” ao globo. Ele era mais do que global, era interplanetário, galáctico... Por isso, elaborava longos ensaios sobre a vida em outros planetas. Era, como muita gente boa por aí, fissurado em discos voadores.

O mais hilário era que os escritos posadistas se levavam a sério. O esquema, que palavra usar?, “teórico” era simples, mas “consistente” com certa versão mecanicista do marxismo: se alguma civilização era tão avançada ao ponto de produzir espaçonaves como os “ discos voadores” era porque tinha forças produtivas avançadas; se tinha forças produtivas avançadas, of course!, era socialista. Qual a conclusão? Ainda não a tirastes, incauto leitor? Banalíssima: se os discos voadores invadissem a terra (e Posadas acreditava na existência deles como você acredita que o Santos derrotará aquele time do Uruguai – como é mesmo o nome? – no jogo da final da Libertadores), como eram socialistas e internacionalistas (ops! Eu quis dizer: interplanetários!), viriam em missão de libertação. Os discos voadores iriam nos livrar do capitalismo e de todas as mazelas que nos afligem (dentre elas, essa coisa terrível e realmente reacionária que é o fato terreno de que tudo que é bom engordar e ter muita caloria...).

Com base nesse esquema, Posadas dissertava sobre tudo e mais um pouco. Lembro-me de um hilário artigo sobre o quanto no qual o incansável pensador marxista discorria sobre o quanto o estômago humano é burocrático... Da guerra no Afeganistão ao parto dentro d’água na então URSS, tudo era objeto de análise do grande líder. Posadas, como muitos trotskistas, acreditava na regeneração do Estado Operário degenerado que predominava, segundo ele, no mundo situado para além do Muro de Berlim, antes de 1988.

O Posadismo sumiu na poeira do tempo. Qualquer dia, quando tiver tempo, vou procurar no wikipedia que fim levou esse candidato a timoneiro da revolução proletária...

O trotskismo é algo maior e mais complexo: tem uma história trágica, que, em parte, traduz as grandezas e erros crassos dessa grande figura histórica do século XX que foi Leon Trostki, um dos líderes da Revolução Russa. Há uma boa literatura histórica sobre ele e sobre o movimento trotskista. A obra de Isaac Deutscher, nesse sentido, é passagem obrigatória para quem queira se inteirar sobre o assunto. Para os amantes da boa literatura, eu aconselho a leitura do último livro do cubano Leonardo Padura, EL HOMBRE QUE AMABA LOS PERROS.

Ah! Tem também um romance fantástico do Mário Vargas Llosa que tem o trotskismo, e a extrema-esquerda em geral, como pano de fundo. Intitulado “A história de Mayta”, o livro é um tanto quanto escrachado. O que faz com que você também se divirta um pouco com o exótico mundo da extrema-esquerda peruana (aquela mesmo na qual germinou esse fenômeno tenebroso, ainda sobrevivente, que é o Sendero Luminoso).

Fui tão fundo na memória que terminei esquecendo de tocar na ocupação da Câmara Municipal de Natal. Pois, então, vamos lá!. Como você sabe, o legislativo natalense (um monumento à mediocridade legislativa mundial) está ocupado por jovens do movimento #Fora Micarla. Para além dos objetivos expressos pelos atores, esse movimento já espanou o tédio da vida política local neste mês junino. E o movimento é bem organizado, pelo que eu soube. Segue um pouco a estratégia dos jovens espanhóis do SOL. Beleza!

Beleza? Nada disso para um aguerrido grupo político trotskista. Pois é, o Partido Operário Revolucionário, através do seu braço na juventude que é a “Corrente proletária Estudantil” (sic) decidiu romper com o movimento e arribou do acampamento na Câmara Municipal. Este estaria, como de resto todo e qualquer movimento social ao redor do planeta na interpretação da rapaziada da IV Internacional, dominado por uma direção burocrática, que funciona como “apêndice de parlamentares burgueses como Sargento Regina” (retirei a frase de uma nota divulgada pelo “partido”).

Embora a nota reproduza os argumentos utilizados pela Prefeita Micarla para desqualificar o movimento, eu não creio que os revolucionários do POR sejam uma quinta-coluna. Nada disso! Eles realmente acreditam nesse, errr, “caminho”. Tanto assim que a nota afirma peremptoriamente: “o Partido Operário Revolucionário (POR) se retira do acampamento para defender a organização da população nos seus locais de estudo, trabalho e moradia na luta por suas reivindicações”. É uma pena o POR não ser posadista. Se o fosse poderia conta com a ajuda dos ETs no cumprimento dessa tarefa revolucionária.

TERRA MAGAZINE destaca ocupação da Câmara Municipal de Natal

A ocupação da Câmara Municipal de Natal por estudantes do movimento #Fora Micarla repercute nacionalmente. A imprensa de todo o país começa a descbrir o acontecimento. Acesse aqui matéria publicada no TERRA MAGAZINE.

terça-feira, 14 de junho de 2011

Sobre o outono da Borboleta...

Daniel Menezes escreveu:

Caro Edmilson,

a sua recomendação já vem acontecendo. As pessoas estão alertando para esta possível "consequência não intencional".
Todos estão informando quem apoiou Micarla de Sousa, inclusive, além dos políticos, setores empresariais.
Acho que é importante enfatizar algo novo. Se o DEM vinha apagando o fogo com gasolina, agora vem tentando queimar a atuação da esquerda no processo de liderança do movimento.
A impressão que fica é que eles estão temendo o crescimento de figuras vermelhas durante o movimento.
A apoio ao movimento por parte do DEM vem caindo. Em editorial de hoje, Janio Vidal, diretor da Tv Tropical, que no início defendeu o Fora Micarla, passou a criticá-lo.
Há outro fato interessante muitos políticos estão totalmente perdidos com a questão das redes sociais. É quase que diário ver as desastradas ações de secretários nesta seara.
Kalazans Bezerra, Thaisa Galvão e Salatiel de Souza, para ficar apenas nestes três, foram "se trocar" com twitteiros e foram saraivados por críticas e deboches.
O twitter, ao contrário do que tem muita gente dizendo, não faz política. Quem faz política são as pessoas. No entanto, esta ferramenta é fantástica no sentido de forjar novas relações sociais e uma "re-aproximação".
Enquanto que jovens de 20 anos brilham nas redes sociais, vereadores habilidosos patinam.
Há um apagão cognitivo.
O "especialista" em redes sociais está valendo mais do que ouro. Muitos oportunistas estão aproveitando para ganhar muito dinheiro oferecendo este tipo de consultoria. Algo que parece fazer parte.
PS. Micarla acredita que vai virar o jogo "patrocinando" as lideranças comunitárias. Acho que ela não aprendeu com 2010. As pessoas que ascenderam para a "classe C" não são tão facilmente compradas como foram no passado.
O campo mudou rapidamente, com a rápida mobilidade social, e os "especialistas" que fazem as campanhas em Natal ainda não conseguiram perceber. Levaram uma surra da mudança em 2010 e parece que vão levar outra em 2012.
Essa história de receber apoio de 100 lideranças comunitárias como ela alardeou não vai resolver a parada.


abs.

Daniel

segunda-feira, 13 de junho de 2011

No outono da Borboleta, o DEM faz cara de paisagem...

A Prefeita de Natal atravessa um delicado momento político. Vivendo um isolamento que só aumenta com o passar dos dias, abandonada que foi pelos poderosos aliados que ontem se acotovelavam em seu palanque, Micarla de Sousa parece caminhar para o seu ocaso político.

A imprensa local, durante quase dois anos tão amiga da prefeita verde, começa a destacar o caos administrativo que ela ajudou a criar. E dá-lhe destaque aos problemas na saúde pública e na educação. E, aqui e ali, matérias sobre o cabeludo problema dos aluguéis de prédios particulares para a administração municipal.

O aluguel de prédios para servir a órgãos públicos, diga-se de passagem, não é uma criação natalense. Menos ainda, produto exclusivo da gestão Micarla. Brasil afora essa situação escandalosa se repete. Não estou dizendo que existe malversação do dinheiro público em todos os contratos de aluguéis, mas é absurdo que se desperdice tanto dinheiro com alugueis quando temos prédios públicos que, com algumas reformas, poderiam sediar, e bem, muitos órgãos.

Para além dos aluguéis, importa chamar a atenção para o fato de que o Fora Micarla, movimento levado adiante por jovens estudantes natalenses, tem tudo para ser a reedição dos cara-pintadas do “Fora Collor”. Pode funcionar. Até porque existem interesses políticos razoavelmente fortes que seriam beneficiados com a desgraça política da borboletinha.

Dentre esses beneficiários, encontra-se o DEM. Os seus caciques, não se pode esquecer desse detalhezinho, bancaram a candidatura de Micarla em 2008. Com discursos e recursos humanos e materiais. Quando a borboleta fez a sua metamorfose ao contrário e transformou-se em uma pesada e desastrada lagarta, o DEM pulou do barco e fez que não era com ele. Enquanto os caciques demistas fazem cara de paisagem, os órgãos de comunicação a eles subordinados dão vergastadas na prefeita.

O Fora Micarla, para ser conseqüente, deve avivar a memória política dos natalenses. Tem a obrigação de mostrar quem foram os embaladores da borboletinha na última eleição municipal. Do contráio, poderá estar levando águas para o moinho de algum "inho", filho de raposa felpuda.

Mais um atraso

No que diz respeito à instituição de novos valores morais, o Governo Dilma tem sido mais conservador do que o de Lula. Além do recuo no que diz respeito ao kit anti-homofobia, tivemos, na semana finda, a negativa do governo em receber a Prêmio Nobel da Paz Shirin Ebadi. Iraniana, Shirin é um símbolo mundial da luta pelos direitos das mulheres, especialmente no mundo mulçumano. Nota triste essa.

Segurança alimentar

Em um dos blogs hospedados no EL PAÍS encontrei um artigo de interesse de todos quantos se preocupam com a segurança alimentar. Intitulado ¿Cómo alimentar a 9.000 millones de personas?, o texto tem como autor Gonzalo Fajull.

Minha coluna da semana no TERRA MAGAZINE

Acesse aqui a minha coluna desta semana no TERRA MAGAZINE.

quinta-feira, 9 de junho de 2011

NOITE DA AMIZADE COM CUBA

Amanhã, dia 10, no horário das 18 horas, no IFRN, em frente ao Midway Mall, teremos uma importante atividade de solidariedade ao povo cubano. Trata-se da abertura da CONVENÇÃO ESTADUAL DE SOLIDARIEDADE E AMIZADE COM CUBA. O evento é promovido pela Associação Cultural José MartI/RN e Casa de Amizade com Cuba. Na oportunidade, teremos uma palestra proferida por Fabio Simeon, representante do Instituto Cubano de Amizade com os Povos (ICAP).

Pilotando o evento, com a competência de sempre, o nosso querido amigo Olavo Queiroz. Eu vou estar lá. Apareça você também!

segunda-feira, 6 de junho de 2011

Coluna no TERRA MAGAZINE

Acesse aqui a minha coluna semanal no TERRA MAGAZINE.

Ollanta ganhou


Ufa! Deu Ollanta Humala para Presidente. Melhor para o Peru. Melhor para a América Latina. Vitória apertadíssima, mas já garantida. Toda a imprensa internacional a confirma.

sexta-feira, 3 de junho de 2011

Senadora manda recado para Herculano

A Senadora Mila Bezerra não abre mão do acompanhamento sistemático do que ocorre na Direção do Centro. Estará de olho na atuação do Professor Herculano. Muito do bom!

quinta-feira, 2 de junho de 2011

Herculano vence a eleição para a direção do CCHLA

O Professor Herculano (Psicologia) venceu a eleição para a escolha da nova direção do CCHLA. Com mais de 50% dos votos, após a aplicação da ponderação, foi vitorioso já no primeiro turno.

Não sei o número exatos de votos, mas, entre os professores, o Professor Herculano teve nada menos que 140 votos, enquanto o Professor Alípio ficou com cerca de 50 votos e a Professora com algo em torno de 30. Como disse, não sei os números exatos.

Herculano venceu também entre os funcionários, porém por uma pequena margem (dois votos a mais em relação ao Professor Alípio, se não me engano). Entre os estudantes, ao contrário do que se imaginava, a vitória do Professor Alípio não passou dos 40 votos a mais do que o Professor Herculano.

Agora,para o bem de todos no CCHLA, é desejar sucesso ao novo diretor!

quarta-feira, 1 de junho de 2011

Ilza Leão no olho do furacão.

Transcrevo abaixo nota publicada no blog da querida mestra.

O caos se instala
Ilza Leão.

Hoje, ouví alguém dizer que o Rio Grande do Norte está se transformando numa nova Alagoas...

O caos se instalou no nosso estado e na nossa cidade. E, tudo isso, resulta da incompetência e da irresponsabilidade dos nossos governantes (e representantes na Assembléia Legislativa).

As greves estouram a cada dia. As escolas estão paradas, o transporte coletivo também, a polícia civil, algumas categorias de funcionários públicos, e os profissionais da saúde ameaçando cruzar os braços... A cidade inundada, a cada novo dia de chuva; o lixo espalhado pelas ruas, e estas, completamente esburacadas. E a cidade novamente na telinha da Globo, dessa vez no jornal nacional. O caos é tão grande que não se fala mais da Copa, a redenção do RN.

É isso que dá quando a incompetência se instala no poder e aí permanece por um tempo. É isso que dá quando a apropriação privada do público se naturaliza perante a sociedade e se gasta dinheiro público como se faz conta na boutique com um cartão de crédito clonado...
Sem controle ou fiscalização...

Num país civilizado, quando o executivo não cumpre o papel a ele designado, o legislativo cumpre a sua função de guardião da sociedade. Isso num país civilizado... acontece que na barbárie, os "representantes do povo" participam das orgias do poder e decidem sem qualquer responsabilidade, muitas vezes para agradar aos governantes ou para dividir as sobras do banquete.

Em que mundo nós estamos....

Glória Pires faz de sua Norma um Ripley

Glória Pires brilha e rouba a cena em Insensato Coração. Há tempos não assistia a uma telenovela. Não agüentava mais, embora seja um noveleiro de primeiro. Cansei de tanta mediocridade. Mas, há uma semana, fiquei vidrado na Norma, personagem da grande atriz.

O personagem de Glória tem um quê de um grande personagem da literatura policial, o “talentoso Ripley”. Se não leu o livro da escritora Patrícia Higsmith, pelo menos deves ter assistido à versão da obra para o cinema...

Pois a Glória Pires empresta à sua personagem a mesma genialidade que o Matt Damon consegue dar ao Ripley. O problema é ter que acompanhar o restante do elenco. Com raras exceções, cada(a) um(a) pior do que o(a) outro(a).



O PT tem um Palocci para chamar de seu

Cada vez mais alto o preço que o Governo Dilma está pagando para blindar o Ministro Antônio Palocci e impedir que o mesmo seja jogado na arena de alguma comissão da Câmara ou do Senado. O PMDB, mais serelepe do que nunca, aumenta a conta. O restante dos aliados, of course, também. Até dentro do PT, embora tardiamente, a situação está ficando insustentável.

Dilma, que já sacrificou a campanha contra a homofobia para impedir que a bancada evangélica convocasse o seu Chefe da Casa Civil, terá que ceder agora ao lobby dos policiais. O Deputado Garotinho (RJ), que representa o setor, sentiu o gosto de sangue, abiscoitou uma vitória (foi ele quem articulou os políticos evangélicos) e quer mais. E vai ter, ao que parece.

Ou Palocci cai ou o Governo Dilma ficará refém de um pato manco.

Triste mesmo é esse espetáculo protagonizado pelo PT. Unir forças para defender o enriquecimento do Palocci, eis uma tarefa partidária que desnuda toda uma força política. Cada vez mais distante do seu sonho infantil de ser uma alternativa ética e política para o país, o PT, no alto dos seus trinta e poucos anos, deixa claro o seu envelhecimento.

É isso. Como diria minha prima: “cada um tem o Palocci que merece para chamar de seu”.

Meu liberal favorito

Mário Vargas Llosa, eis o cara. Prêmio Nobel de Literatura. Escritor consagrado e autor de obras maravilhosas, como "Conversa na Catedral", é também um comentarista arguto da vida política latino-americana. Já adentrou o campo político, concorrendo, no início da década de 1990, ao cargo de Presidente da República. Perdeu para Alberto Fujimori, autor de um inusitado auto-golpe, e, para o bem de todos que amamos a sua escrita, voltou para o mundo da literatura. Mas não abandonou o bom combate em defesa de suas idéias.

Já Fujimori derrotou o terrorismo do Sendero Luminoso, mas instalou uma ditadura corrupta e sangrenta. Entrou para a história como um ditador caricato e corrupto.

Agora, o Peru está dividido entre um candidato nacionalista e de esquerda (um militar seguidor meio enrustido do Hugo Chaves) e nada mais nada menos do que a filha de Fujimori, a Keiko. Llosa, com o desassombro dos que não temem escolhas díficeis, optou pelo militar de esquerda, apesar de seu compromisso ético e político com o liberal ilustrado e de ser um combatente feroz do populismo rasteiro que grassa em nosso continente. No que importa, não ficou em cima do muro. Em nome da democracia, passou a defender a candidatura de Ollanta Humala.

O problema é que os meios de comunicação do Peru, prá variar, estão do lado da direita. Do lado de Keiko e do fujimorismo. Llosa, que escrevia regularmente para o jornal EL COMÉRCIO, decidiu romper com o periódico pelo comprometimento deste com a candidatura da Keiko. O seu texto de rompimento com o EL COMÉRCIO, publicado na edição eletrônica do EL PAÍS, é um exemplo de lucidez política. Confira abaixo!


TRIBUNA: MARIO VARGAS LLOSA
Retorno a la dictadura, no
PIEDRA DE TOQUE. Elegir presidenta a Keiko Fujimori sería la más grave equivocación cometida por los peruanos. Equivaldría a legitimar el régimen que envileció la política y sembró de violencia nuestro país

Cuando los tres candidatos que representan la defensa del sistema democrático y liberal se dedican a destrozarse unos a otros, como ocurrió en las recientes elecciones peruanas -me refiero a Luis Castañeda, Alejandro Toledo y Pedro Pablo Kuczynski-, el resultado es previsible: los tres se autodestruyen y abren el paso de la segunda vuelta electoral a dos candidatos que, desde los extremos, representan una amenaza potencial para la supervivencia de la democracia y el desarrollo económico que, desde hace 10 años, había convertido al Perú en el país que progresaba más rápido en toda América Latina. El poeta César Moro no exageraba demasiado cuando escribió: "En todas partes se cuecen habas, pero en el Perú solo se cuecen habas".

Bien, no es cuestión de suicidarse, porque el suicidio no resuelve los problemas para los que se quedan vivos, de modo que, ahora, por lo menos la mitad de los peruanos debemos elegir entre dos opciones que habíamos descartado: Ollanta Humala y Keiko Fujimori. Algunos amigos míos han decidido viciar su voto, pues rechazan a ambos candidatos por igual. Ésa es una decisión respetable desde el punto de vista individual y moral, pero nada efectiva en términos colectivos y prácticos, pues no votar equivale siempre a votar por el que gana, ya que se renuncia a hacer algo -aunque sea tan mínimo como lo que representa un solo voto- para impedirlo.

Creo que es preferible elegir, haciendo un esfuerzo de racionalidad y aceptando las tesis del compromiso sartreano, según las cuales siempre hay una opción preferible a las otras, aunque semejante elección implique inevitablemente un riesgo y la posibilidad del error.

No tengo duda alguna de que elegir presidenta del Perú a Keiko Fujimori sería la más grave equivocación que podría cometer el pueblo peruano. Equivaldría a legitimar la peor dictadura que hemos padecido a lo largo de nuestra historia republicana. Alberto Fujimori no sólo fue un gobernante asesino y ladrón, tal como estableció el tribunal que, en un proceso modélico, lo condenó a 25 años de cárcel. (Según la Procuraduría, sólo se han repatriado unos 184 millones de dólares de los 6.000 que por lo menos se birlaron durante su régimen de las arcas públicas). Fue, además, un traidor a la legalidad constitucional que le permitió acceder al poder en unos comicios legítimos, dando el golpe de Estado que acabó con la democracia en el Perú el 5 de abril de 1992. Keiko Fujimori ha reivindicado ese hecho bochornoso y su entorno está plagado de colaboradores de la dictadura. Como han comprobado los medios de comunicación, el propio ex dictador ha coordinado la campaña presidencial de su hija desde su cárcel dorada.

El pueblo peruano no puede haber olvidado lo que significaron esos ocho años en que Fujimori y Vladimiro Montesinos perpetraron un saqueo sistemático de los recursos públicos, la corrupción que cundió por todos los mecanismos e instituciones del poder en la más absoluta impunidad, los tráficos de armas, de drogas, la manera como políticos, empresarios, directores de canales de televisión, iban a venderse a la dictadura por bolsas y fajos de billetes, escenas de escándalo que han quedado registradas en los vídeos que el propio Montesinos grababa sin duda para chantajear a sus cómplices.

Tampoco puede olvidar los innumerables crímenes, desapariciones, torturas, ejecuciones extrajudiciales y toda clase de violaciones de derechos humanos de campesinos, estudiantes, sindicalistas, periodistas, que marcaron esos años de horror, y contra los que el pueblo peruano reaccionó, a fines de la década de los noventa, cuando, con movilizaciones como la Marcha de los Cuatro Suyos, consiguió derrotar a la dictadura y devolver la libertad al Perú. No es posible que en tan pocos años en la memoria de los peruanos se haya borrado esta ignominia histórica y una mayoría decida ahora con sus votos que se abran las cárceles y las decenas de ladrones y asesinos de la dictadura salgan de nuevo a gobernar el Perú. Todo lo que queda de digno en el país debe impedir, valiéndose del civilizado recurso de las ánforas, semejante vergüenza para nuestra patria.

Votar por Ollanta Humala implica un riesgo para todos quienes defendemos la cultura de la libertad, lo sé muy bien. Su antigua simpatía por las políticas catastróficas de la dictadura del general Velasco y del dictador venezolano Hugo Chávez justifican los recelos de que su subida al poder pudiera significar una ola de estatizaciones que hundiera nuestras industrias y ahuyentara a las empresas e inversores que, en los últimos 10 años, han contribuido de manera decisiva al notable crecimiento de nuestra economía, a la creación de tantos miles de empleos, a la reducción de la pobreza de más de 50% a un tercio de la población y a la buena imagen que se ha ganado el Perú en el extranjero. Asimismo, es lícito el temor de que aquellas antiguas simpatías puedan inducir a su Gobierno a desaparecer una vez más en nuestra historia la libertad de prensa en el país.

Sin embargo, la verdad es que en esta campaña Ollanta Humala ha moderado de manera visible su mensaje político, asegurando que se ha separado del modelo autoritario chavista e identificado con el brasileño de Lula. Por lo demás, en esta campaña ha tenido asesores brasileños cercanos al Partido de los Trabajadores. Ahora asegura que respetará la propiedad privada, que no propiciará estatizaciones, que no recortará la independencia de la prensa ni la inversión extranjera y que está dispuesto a renunciar a la idea de una Asamblea Constituyente que (como lo hizo Chávez en Venezuela) reemplace a la actual Constitución que prohíbe la reelección presidencial.

¿Son estas las convicciones genuinas de alguien que ha evolucionado ideológicamente desde el extremismo hasta las posiciones democráticas de la izquierda latinoamericana que encarnan un Ricardo Lagos, en Chile, un José Mujica en el Uruguay, un Lula y una Dilma Rousseff en Brasil, o un Mauricio Funes en El Salvador? ¿O es una mera postura táctica para ganar una elección, ya que Ollanta Humala sabe muy bien que sólo vencerá en esta segunda vuelta si un importante sector de la clase media peruana vota por él? Creo que la respuesta a esta pregunta que se hacen hoy día tantos peruanos que votaron por Castañeda, Toledo y Kuczynski, no depende tanto de las secretas intenciones que pueda tener el candidato en el fondo de su conciencia, sino de los propios electores que decidan apoyarlo y de la manera en que lo hagan.

Este apoyo no puede ser una abdicación sino un apoyo exigente y crítico, a fin de que Ollanta Humala nos dé pruebas fehacientes de su identificación con la democracia y con una política económica de mercado sin la cual el Perú entraría en una crisis y un empobrecimiento que condenaría al fracaso todos los programas de redistribución y de combate a la pobreza que figuran en el plan de gobierno de Gana Perú. Para que aquellos programas sean exitosos es indispensable que el Perú siga creciendo como lo ha hecho estos últimos años, ya que si no hay riqueza no hay nada que redistribuir. Eso lo han entendido los socialistas chilenos, brasileños, uruguayos y salvadoreños y por eso, aunque se sigan llamando socialistas, aplican o han aplicado en el Gobierno políticas socialdemócratas (no digo liberales para no espantar a nadie, pero si dejara esa palabra no mentiría). Si Ollanta Humala persevera en esta dirección que parece haber emprendido, la democracia peruana estará a salvo y continuará el progreso económico, acompañado de una política social inteligente que devolverá la confianza en el sistema a quienes, por sentirse marginados y frustrados de ese desarrollo que no los alcanzaba, optaron por los extremos.

Cuando escribo este artículo, buena parte de votantes por el partido de Alejandro Toledo, Perú Posible, parece haber optado por ese apoyo exigente y crítico a Ollanta Humala que yo propongo. Mi esperanza es que los otros partidos democráticos del Perú, como Acción Popular, el Partido Popular Cristiano y el APRA, que, con tantos miles de independientes, combatieron con gallardía a la dictadura fujimorista y ayudaron a derrotarla, se sumen a este empeño, para evitar el retorno de un régimen que envileció la política y sembró de violencia, delito y sufrimiento a nuestro país y para asegurarnos que la llegada de Ollanta Humala al poder fortalezca y no destruya la democracia que recobramos hace apenas 10 años.

Hoje é dia de eleição...

Hoje é dia de eleição no Centro onde trabalho aqui na UFRN, o CCHLA. Três chapas disputam a direção, o que é muito bom. Muito embora, nos últimos dias, e-mails agressivos demonstrem que os ânimos estão acirrados além do limite esperado em uma eleição desse tipo. Há um quê de ridículo nessa tensão. Ou sou eu que ando blasé além da conta. Vá saber, não é?