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quarta-feira, 9 de novembro de 2011

A energia nuclear e o futuro

Para sair do convencional, um pouco de discussão sobre uma temática mais do que importante, especialmente agora que, como diz uma querida amiga, estamos chegando no "pé da China": a energia. Leia abaixo uma entrevista muito da interessante.



'Não vejo o futuro sem energia nuclear'
O Estado de S. Paulo - 09/11/2011

David Cahen defende as usinas nucleares e a taxação de carros poluentes para reduzir as emissões de gases-estufa no mundo. Ele é um dos palestrantes do Fórum Global de Sustentabilidade do festival de música SWU, em Paulínia (SP). A seguir, trechos da entrevista.

O que pode ser feito para reduzir o uso de energia?

Hoje, o melhor é cortar o consumo de energia nos países desenvolvidos e em desenvolvimento. Não há dúvidas de que muitas pessoas de classe média e média alta na China, no Brasil e na Índia podem contribuir para os esforços de conservação, que devem começar primeiro em países como Islândia, Noruega, Finlândia, EUA e Canadá. O consumo de energia em países como a Islândia chega a ser quase dez vezes maior que o do Brasil.

Por causa do frio?

Claramente em parte é por causa do clima. Mas também porque a energia usada no país é muito barata, a geotérmica (obtida a partir do calor proveniente da Terra). A segunda coisa que podemos fazer é tirar das ruas carros a gasolina, promover insolação térmica apropriada nas casas e garantir que elas usem ao máximo a luz natural.

O carro elétrico é a solução?

Pode ser parte da solução. Queremos carros elétricos que possam responder à necessidade de quem precisa dirigir muitos quilômetros sem estação de recarregamento. Podemos também tentar taxar aqueles que consomem muita gasolina e que possuem motores pouco eficientes. E para isso não precisamos de novas tecnologias.

Qual é a dificuldade de aplicar novas tecnologias?

Se eu descobrir algo fantástico hoje, é muito improvável que isso esteja no mercado em menos de 15 ou 20 anos.

O que acha de alguns países, como a Alemanha, abandonarem a energia nuclear depois do acidente de Fukushima?

Eu não vejo como o mundo pode se virar no futuro próximo sem a energia nuclear. Não sou fã de nuclear, e fico feliz que Israel não tenha uma usina nuclear. Mas não vejo como os países em desenvolvimento serão capazes de viver sem ela. Mas o Brasil tem sorte, pode não precisar. Já a China e o Japão não têm escolha.

E a segurança?

Acredito que teremos de desligar os reatores antigos, isso custa, mas deve ser feito. Os reatores modernos são muito mais seguros. Mas existe um elemento-chave para a energia nuclear no futuro que se chama thorium e fica próximo do urânio na tabela periódica. A Índia tem perseguido esse elemento, mas ainda estamos longe disso.

As energias eólica e solar ainda são mais caras que a energia fóssil.

A comparação é injusta, pois não estamos taxando o carvão, o gás e o petróleo de acordo com o peso que eles trazem para a humanidade. Prevejo que o preço da energia eólica continuará a baixar, assim como o da energia solar. Porém, nunca serão tão baixos quanto a energia fóssil porque nós não pagamos o preço real pela energia de uma usina a carvão.

sexta-feira, 26 de setembro de 2008

Um artigo de Washington Novaes

Abaixo, coloco um artigo do jornalista Washington Novaes. Foi publicado hoje no Estadão.


As previsões inúteis e o roteiro possível

Washington Novaes

Não é preciso repetir todos os números. Quem tenha lido o caderno Pnad Especial, que este jornal publicou (19/9), e visto os números terríveis - 14,1 milhões de analfabetos no País, 4,8 milhões de crianças que trabalham, 40 milhões de trabalhadores sem carteira assinada, 8,1 milhões de desempregados -, assim como o índice de desigualdade social (pior que o da Índia) e o da concentração de renda (patamar semelhante ao de El Salvador, Panamá, Zimbábue, Zâmbia, Suazilândia), certamente estará perdendo noites de sono, imaginando caminhos mais alentadores para o futuro. Mas pensando também em como buscar alternativas sustentáveis num mundo mergulhado em crise financeira, social (925 milhões de pessoas passando fome, segundo a ONU, quase metade da humanidade abaixo do linha de pobreza) e ambiental (consumo além da capacidade de reposição do planeta, mudanças climáticas).

Pode haver caminhos interessantes para o País. Como, por exemplo, os indicados pelo professor Ignacy Sachs, da Escola de Altos Estudos em Ciências Sociais da França, uma das pessoas que mais têm estudado as nações ditas em desenvolvimento. No livro Inclusão Social pelo Trabalho (Garamond/Sebrae/Pnud, 2003) ele já apontava para o Brasil a possibilidade de estratégias prioritárias em favor dos pequenos produtores (8,6 milhões) e empreendedores informais (4,3 milhões). E lembrava que 3,6 milhões de pequenas e microempresas já absorviam 44% da mão-de-obra com registro no País e respondiam por quase 20% do produto interno bruto (PIB). No País todo, havia 8,6 milhões de pessoas que trabalhavam nas cidades por conta própria, 4,3 milhões em empresas informais, 4,53 milhões de agricultores familiares trabalhando por conta própria, 4,76 milhões não remunerados e 4,54 milhões de "operários agrícolas". As soluções teriam de passar por essas sendas, onde estão os "arquitetos potenciais do futuro".

Em síntese, já propunha o professor Sachs um "crescimento puxado pelo emprego", e não apenas crescimento de números absolutos do PIB a qualquer custo. E esse caminho pressupunha consolidação e expansão da agricultura familiar (que continua a expulsar mão-de-obra), promoção das pequenas e microempresas, ampliação das oportunidades de trabalho autônomo no meio urbano. Os setores prioritários para geração de trabalho e renda deveriam ser os de obras públicas e de infra-estrutura, serviços sociais, educacionais e sanitários, construção habitacional e gestão de recursos naturais. Preconizava o autor, com ênfase, a transformação do meio rural, porque esse espaço não é só agricultura e esta não é apenas plantio de grãos - deve incluir industrialização de matérias-primas, associação com várias áreas (como a de produção de biocombustíveis, entre outras), turismo rural, assistência a idosos e deficientes (que teriam no espaço rural mais qualidade de vida e segurança, além de gerarem trabalho). Muitos caminhos que, na sua quase totalidade, não estão sendo trilhados hoje.

Mas haverá tempo e condições para as mudanças nestes tempos em que "o ritmo de melhora é exasperantemente lento", como disse a este jornal o economista Eduardo Giannetti da Fonseca (19/9)? Em 2001, o livro Previsões (Editora Record) reuniu o pensamento de alguns luminares a respeito do futuro no século que se iniciava. É curioso relembrar alguns deles.

Noam Chomsky, por exemplo, um dos pensadores mais radicais destes tempos, dizia que "qualquer previsão sobre questões sérias provavelmente será errada, exceto por acidente". E se perguntava, cético, se "os seres humanos são uma espécie de mutação letal". Stephen Jay Gould, cientista muito respeitado, observava que "é inútil pensar que as tendências do passado profetizarão os padrões futuros". É preciso "inventar o futuro", advertia ele. E com esse pensamento concordava Arthur C. Clarke, inventor de tantos futuros nos livros e no cinema, transformados pelas novas tecnologias. Mesmo ele, entretanto, achava que a internet "pode significar o fim do Estado único e o desenvolvimento de tribos que possuem somente uma lealdade mínima a seus país de origem". Mas "ninguém pode prever o futuro", apenas "esboçar possíveis futuros", dizia.

Um dos diagnósticos mais interessantes foi o do economista e pensador John Kenneth Galbraith, talvez no auge de sua fama naquele momento. Para ele, "somente os que erram são lembrados". E talvez tenha contribuído para o relativo ostracismo de seu pensamento, agora, haver ele entendido, há oito anos, antes da hora, que "os Estados Unidos estão passando por uma especulação extrema do mercado de ações, com mais fundos mútuos do que seria inteligente administrar". E, a seu ver, um dos problemas estaria em que, nas crises, costuma-se "punir os trabalhadores", e não os responsáveis, alguns banqueiros. "Nos anos à frente", dizia ele, "deve haver um procedimento pelo qual uma ONU fortalecida suspenda a soberania de países cujos governos estejam destruindo seus povos." Parece pouco provável que se enverede por aí. Não só porque nem Hércules daria conta de tantos governos calamitosos no mundo, como porque, até aqui, nem mesmo as convenções da ONU conseguem avançar na prática (vide mudanças climáticas, diversidade biológica, etc.), diante de tantos interesses divergentes e da impossibilidade de conseguir o indispensável consenso. Mas Galbraith também advertia que "o capitalismo ainda se presta à instabilidade que deriva de erros inconseqüentes (...) e que pode acontecer se houver um fim para a bolha de Wall Street, nos Estados Unidos".

Revendo tantos diagnósticos, verifica-se que, de fato, a profecia é tarefa quase impossível, como os dias de hoje estão mais uma vez provando com a perplexidade geral. Melhor, então, atermo-nos ao possível. E os caminhos apontados pelo professor Sachs para o Brasil podem ser um bom roteiro.


Washington Novaes é jornalista
E-mail: wlrnovaes@uol.com.br