Luciana de Oliveira Chianca*
Em 1995 chegava ao público Linhas Apagadas, publicado pela editora da UFPB e com um prestigioso Prefácio de Manuel
Correia de Andrade. Esta obra explicita a dinâmica do desaparecimento
progressivo e definitivo dos bondes na cidade do Recife pelos anos 40 do século
XX.
Ao contrário daquelas, este livro tem linhas obstinadas, que
hoje se renovam nesta segunda edição (ed. Clube de autores, 2013).
Linhas Apagadas repousa numa sensível reflexão sobre
o "misterioso caso" da extinção dos bondes no Brasil. Revelando como
o discurso das classes dirigentes é reproduzido pelos meios de comunicação de
massa num diálogo sem interlocução, Gilvando Sá Leitão Rios, sociólogo e
professor da UFRPE, revela como se deu o investimento da imprensa recifense na
formação de uma opinião pública que deveria acreditar que o sistema o bonde era
"transporte de pobre". Qual a
íntima convicção e os verdadeiros interesses destes dirigentes? Como se constrói um imaginário onde o
combustível fóssil substitui a eletricidade, e o veículo de transporte
individual aos poucos suplanta o coletivo?
Sem saudosismos, Gilvando Rios responde essas e outras
perguntas, dialogando em completa abertura com conceitos sociológicos e
filosóficos cruciais neste debate: a modernidade, o individualismo e o
progresso por exemplo, são apreendidos em sua análise através de uma
convincente contextualização atingida através de noticias de jornal, propagandas impressas,
crônicas e uma entrevista com Barbosa Lima Sobrinho, ex-governador de
Pernambuco.
Através de Linhas
Apagadas percebemos como algumas categorias nativas foram progressiva e ideologicamente
construídos através da mídia escrita, para suportar um projeto nacional de
substituição progressiva do capital inglês pelo norte americano, consolidando
um modelo de industrialização e urbanização nacional cujas marcas conhecemos em
nosso cotidiano contemporâneo.
Enfrentando o seu tempo, Gilvando Rios mostra também que
apesar de apagados, silenciados, esquecidos ou ainda romantizados ou
folclorizados noutras realidades e estados brasileiros, o bonde elétrico subsiste
como um importante ícone da racionalidade e da sustentabilidade no transporte coletivo
urbano em muitas partes do mundo.
Por estas e outras razões melhor explanadas para um leitor
atento, Linhas Apagadas é hoje uma
referencia nos estudos sobre a cidade, pois discute o transito, o transporte, a
mobilidade, a urbanização e o direito à cidade no Brasil.
Obrigada Gilvando Rios, por nos proporcionar esta apaixonante
e deliciosa leitura que recomendo a todos que se interessam sinceramente por
esses temas.
João Pessoa, 25/10/2013
*Dra. em Antropologia, profa. da UFPB
Um comentário:
bacana a resenha da professora da UFPB, Luciana de Oliveira Chianca, instiga-nos a leitura e bastante atual para pensarmos não só a cidade, mais o modo de vida individualizante que nos atravessa.
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