Notícia publicada hoje no jornal Folha de São Paulo informa-nos da aquisição da Casas Bahia pelo Grupo Pão de Açúcar. Trata-se de uma transação com grandes impactos na configuração do capitalismo no país. Confira abaixo trechos da matéria.
GIGANTE DO VAREJO
Grupo Pão de Açúcar adquire o controle da Casas Bahia
União dos dois gigantes do varejo cria o maior empregador privado do paísConcorrentes temem concentração em eletrônicos, principalmente em SP; para Diniz, todos saem ganhando com negócio.
MARIANA BARBOSADA REPORTAGEM LOCAL
O Pão de Açúcar adquiriu ontem o controle da Casas Bahia, em uma transação que não envolveu desembolso de dinheiro. A operação, que depende de aprovação dos órgãos de defesa da concorrência, transforma o grupo na quinta maior empresa do país em faturamento bruto, com R$ 40 bilhões. Perde apenas para Petrobras, Vale, Gerdau e AmBev.
(...)
Ele reforça a atuação do grupo Pão de Açúcar no segmento de bens duráveis (móveis, eletrônicos e linha branca) e amplia sua presença junto ao consumidor de baixa renda. Com a forte presença da Casas Bahia em São Paulo, concorrentes temem que a concentração em eletrônicos possa chegar a 70% no Estado."Essa é uma operação em que todos ganham", declarou o presidente do Conselho de Administração do Pão de Açúcar, Abilio Diniz. "Somos originários de alimentação, estamos crescendo em não alimentos. A Casas Bahia é uma grande oportunidade para nós, e essa é também uma grande oportunidade para eles", afirmou.
(...)
Para ficar com o controle (51%) da nova empresa, o Pão de Açúcar entrou com a rede Ponto Frio, avaliada na operação em R$ 1,23 bilhão, e com a rede Extra Eletro, avaliada em R$ 120 milhões.A Casas Bahia entrou com ativos e passivos operacionais, incluindo 25% da fábrica de móveis Bartira e uma dívida líquida de curto prazo no valor de R$ 950 milhões. Já contabilizada a dívida, a parte da Casas Bahia (49%) foi avaliada em R$ 1,290 bilhão. A nova empresa nasce avaliada em R$ 2,6 bilhões. Não entraram na operação, permanecendo com a família Klein, a propriedade dos imóveis (lojas) e dos centros de distribuição, 75% da Bartira e mais quase R$ 1 bilhão em créditos recebíveis.
A família Klein vai receber pelos aluguéis das 513 lojas por um prazo de dez anos prorrogável por mais dez (que renderão R$ 130 milhões/ano) e também ficou com um contrato de fornecimento de móveis por três anos, uma conta de R$ 18 milhões/ano. A conclusão da operação deve levar seis meses. A Globex é listada na Bovespa, mas só 4,5% de seu capital é negociado em pregão; destes, cerca de 70% pertencem à Fundação Pão de Açúcar. A empresa fez uma oferta de aquisição dessas ações para poder estruturar a operação. A empresa continuará listada na Bovespa.A expectativa é que faça uma oferta pública de ações, que não deve acontecer antes de 2011.Iniciativa de DinizAs conversas duraram menos de três meses e começaram por iniciativa de Diniz. "Eu liguei para o Michael [Klein] e fiz a proposta", afirmou.
(...)
Segundo Diniz, a integração da Casas Bahia deve seguir o exemplo da incorporação da rede de atacado e varejo Assai, adquirida pelo Pão de Açúcar há dois anos. O fundador do Assai, Rodolfo Nagai, permaneceu um ano e meio na gestão.Michael Klein ficará na presidência do Conselho de Administração da nova empresa, e seu filho Raphael Klein será o presidente-executivo, com mandato de dois anos.O Conselho de Administração terá nove integrantes, cinco indicados pelo Pão de Açúcar e quatro pela Casas Bahia. Pelo acordo, os donos da Casas Bahia não poderão se desfazer das ações pelo prazo de 12 meses. A partir desse prazo, eles poderão vender parte das ações progressivamente, chegando a 100% a partir do sexto ano. Já o Grupo Pão de Açúcar pode vender ações a partir do terceiro ano.
Com PAULO ARAÚJO , colaboração para a Folha.
Assinante Uol lê a matéria completa aqui.
Mostrando postagens com marcador Empresas. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador Empresas. Mostrar todas as postagens
sábado, 5 de dezembro de 2009
segunda-feira, 22 de setembro de 2008
Responsabilidade socioambiental: a perspectiva da NSE
Ricardo Abramovay, professor titular da FEA/USP, escreve regularmente no jornal Valor Econômico. Leia, abaixo, artigo de sua autoria publicado na edição do último final de semana intitulado "A dimensão estratégica da responsabilidade socioambiental". Abramovay tem tabalhado na perspectiva analítica da Nova Sociologia Econômica.
A responsabilidade socioambiental do setor privado envolve um paradoxo básico, em torno de cuja explicação a literatura científica se polariza e os atores sociais se dividem. Para uns trata-se de contradição nos termos, ilusão que ignora a essência mesmo do que é o sistema capitalista.
A expressão emblemática deste ponto de vista está na célebre afirmação do prêmio Nobel de Economia, Milton Friedman, segundo o qual qualquer companhia voltada a controlar a poluição além do exigido por lei, para contribuir com a melhoria do meio ambiente, estaria praticando socialismo puro e simples ("pure and unadulterated socialism").
Mais recentemente (e a partir de argumentos diferentes dos de Friedman), Robert Reich, ex-ministro do Trabalho de Bill Clinton, em Supercapitalism, denuncia a noção de responsabilidade social corporativa como uma espécie de cortina de fumaça que obscurece o papel imprescindível do Estado na organização social.
Nefasto desvio das finalidades para as quais a empresa existe ou ilusão perniciosa de que o setor privado pode conduzir transformações sociais significativas, em ambos os casos a conclusão é a mesma: a busca do lucro (no respeito à lei, é claro) resume a essência do que fazem os componentes de uma economia descentralizada.
As unidades individuais operam a partir dos sinais que recebem do mercado e cabe ao Estado corrigir e impor às firmas o ônus das externalidades, isto é, dos efeitos socialmente indesejados de seus atos.
Este ponto de vista padece de dois problemas básicos. Por um lado, ele ignora que o setor privado e as associações empresariais vão muito além do cumprimento da legislação no que se refere aos impactos socioambientais de suas ações.
Não havia qualquer exigência legal para a Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais e a Associação Nacional de Exportadores de Cereais decidissem, em junho de 2006, não mais comprar soja vinda de áreas recentemente desmatadas do bioma amazônico.
Da mesma forma, não foi para obedecer à lei que a indústria farmacêutica criou um "índice de acesso aos medicamentos" (http://www.atmindex.org), de cuja elaboração participaram universidades, movimentos sociais, governos e organizações não-governamentais, e cujo ponto de partida está na constatação de que as chamadas doenças negligenciadas não têm recebido nem de longe atenção suficiente do setor privado.
Ora, dirá o leitor, nos dois casos, as empresas só tomam estas iniciativas por interesse, para ganhar mais, por razões, na verdade, egoístas, e não por uma preocupação socioambiental legítima. Aqui reside o segundo problema ligado ao ponto de vista que julga ilusória ou nefasta a própria idéia de responsabilidade socioambiental do setor privado. É claro que o setor privado age por interesse. A questão consiste em saber de que maneira se formam e se exprimem estes interesses.
A principal crítica que se pode fazer aos que rejeitam, em princípio, o conceito de responsabilidade socioambiental do setor privado é que tratam os interesses empresariais como se fossem imunes à pressão social. Tudo se passa como se os mercados, de fato, fossem mecanismos de equilíbrio, neutros, impessoais e situados, por assim dizer, acima da vida social.
Não são apenas as empresas que estão no meio ambiente, sob a forma de emissões, destruição da biodiversidade, poluição e comprometimento tão freqüente do patrimônio social e natural em que intervêm. O meio ambiente (isto é os ecossistemas dos quais as sociedades humanas são parte integrante e indissolúvel) também está nas empresas. Sua presença aí é cada vez mais importante e nela se encontra um dos caminhos de mudança no mundo contemporâneo.
Michael Porter e Mark Kramer, em artigo de 2006 premiado pela Harvard Business Review ("Strategy and Society - The Link between Competitive Advantage and Corporate Social Responsibility"), insistem na dimensão estratégica da responsabilidade corporativa. Muitas companhias, relatam Porter e Kramer, só acordaram para a importância do tema sob pressão e isso lhes trouxe (como no célebre caso da Nike, acusada de fazer uso de trabalho infantil ou das empresas petrolíferas diante de seus sucessivos acidentes) imensos prejuízos.
Com freqüência, a resposta a estas pressões foi episódica, cosmética e, sobretudo, sem horizonte estratégico. O grande desafio para a empresa é medir as conseqüências de suas ações não só em seu entorno imediato, mas numa perspectiva de longo prazo, em que sejam criadas capacidades para antecipar resultados.
Para isso, é fundamental reconhecer a dependência mútua entre corporações e sociedade. Porter e Kramer falam em valores partilhados (shared values), que abram caminho para reduzir os conflitos potenciais que a firma enfrenta.
As escolhas das empresas não envolvem apenas seleção de tecnologias, preços e procedimentos produtivos. Referem-se também à maneira como vão relacionar-se com as dimensões socioambientais do que fazem, ou, em outras palavras, à qualidade de sua inserção social.
A publicação pelo Global Report Initiative de um documento sobre a biodiversidade (http://www.globalreporting.org/home) é um passo marcante neste sentido. Destinado a tomadores de decisão no interior das organizações, o documento mostra a importância dos ecossistemas para a vida humana e sugere procedimentos concretos para proteger e regenerar os ambientes em que atuam.
São imensas as oportunidades de ganho empresarial que uma atitude não predatória oferece. Mas isso exige, com freqüência, mudanças tanto na visão que a empresa tem de seus recursos, como, sobretudo, de suas relações com os stakeholders.
Estes stakeholders vão desde comunidades locais e grupos preocupados como a biodiversidade até investidores temerosos dos riscos que a destruição dos ecossistemas poderia trazer à própria legitimidade (licença para operar) da companhia. Socioambiental não é um setor à parte, uma equipe de bombeiros convocada quando a temperatura sobe, mas sim o componente estratégico decisivo do qual depende a integridade de qualquer organização contemporânea.
(Valor Econômico, 19/9)
A responsabilidade socioambiental do setor privado envolve um paradoxo básico, em torno de cuja explicação a literatura científica se polariza e os atores sociais se dividem. Para uns trata-se de contradição nos termos, ilusão que ignora a essência mesmo do que é o sistema capitalista.
A expressão emblemática deste ponto de vista está na célebre afirmação do prêmio Nobel de Economia, Milton Friedman, segundo o qual qualquer companhia voltada a controlar a poluição além do exigido por lei, para contribuir com a melhoria do meio ambiente, estaria praticando socialismo puro e simples ("pure and unadulterated socialism").
Mais recentemente (e a partir de argumentos diferentes dos de Friedman), Robert Reich, ex-ministro do Trabalho de Bill Clinton, em Supercapitalism, denuncia a noção de responsabilidade social corporativa como uma espécie de cortina de fumaça que obscurece o papel imprescindível do Estado na organização social.
Nefasto desvio das finalidades para as quais a empresa existe ou ilusão perniciosa de que o setor privado pode conduzir transformações sociais significativas, em ambos os casos a conclusão é a mesma: a busca do lucro (no respeito à lei, é claro) resume a essência do que fazem os componentes de uma economia descentralizada.
As unidades individuais operam a partir dos sinais que recebem do mercado e cabe ao Estado corrigir e impor às firmas o ônus das externalidades, isto é, dos efeitos socialmente indesejados de seus atos.
Este ponto de vista padece de dois problemas básicos. Por um lado, ele ignora que o setor privado e as associações empresariais vão muito além do cumprimento da legislação no que se refere aos impactos socioambientais de suas ações.
Não havia qualquer exigência legal para a Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais e a Associação Nacional de Exportadores de Cereais decidissem, em junho de 2006, não mais comprar soja vinda de áreas recentemente desmatadas do bioma amazônico.
Da mesma forma, não foi para obedecer à lei que a indústria farmacêutica criou um "índice de acesso aos medicamentos" (http://www.atmindex.org), de cuja elaboração participaram universidades, movimentos sociais, governos e organizações não-governamentais, e cujo ponto de partida está na constatação de que as chamadas doenças negligenciadas não têm recebido nem de longe atenção suficiente do setor privado.
Ora, dirá o leitor, nos dois casos, as empresas só tomam estas iniciativas por interesse, para ganhar mais, por razões, na verdade, egoístas, e não por uma preocupação socioambiental legítima. Aqui reside o segundo problema ligado ao ponto de vista que julga ilusória ou nefasta a própria idéia de responsabilidade socioambiental do setor privado. É claro que o setor privado age por interesse. A questão consiste em saber de que maneira se formam e se exprimem estes interesses.
A principal crítica que se pode fazer aos que rejeitam, em princípio, o conceito de responsabilidade socioambiental do setor privado é que tratam os interesses empresariais como se fossem imunes à pressão social. Tudo se passa como se os mercados, de fato, fossem mecanismos de equilíbrio, neutros, impessoais e situados, por assim dizer, acima da vida social.
Não são apenas as empresas que estão no meio ambiente, sob a forma de emissões, destruição da biodiversidade, poluição e comprometimento tão freqüente do patrimônio social e natural em que intervêm. O meio ambiente (isto é os ecossistemas dos quais as sociedades humanas são parte integrante e indissolúvel) também está nas empresas. Sua presença aí é cada vez mais importante e nela se encontra um dos caminhos de mudança no mundo contemporâneo.
Michael Porter e Mark Kramer, em artigo de 2006 premiado pela Harvard Business Review ("Strategy and Society - The Link between Competitive Advantage and Corporate Social Responsibility"), insistem na dimensão estratégica da responsabilidade corporativa. Muitas companhias, relatam Porter e Kramer, só acordaram para a importância do tema sob pressão e isso lhes trouxe (como no célebre caso da Nike, acusada de fazer uso de trabalho infantil ou das empresas petrolíferas diante de seus sucessivos acidentes) imensos prejuízos.
Com freqüência, a resposta a estas pressões foi episódica, cosmética e, sobretudo, sem horizonte estratégico. O grande desafio para a empresa é medir as conseqüências de suas ações não só em seu entorno imediato, mas numa perspectiva de longo prazo, em que sejam criadas capacidades para antecipar resultados.
Para isso, é fundamental reconhecer a dependência mútua entre corporações e sociedade. Porter e Kramer falam em valores partilhados (shared values), que abram caminho para reduzir os conflitos potenciais que a firma enfrenta.
As escolhas das empresas não envolvem apenas seleção de tecnologias, preços e procedimentos produtivos. Referem-se também à maneira como vão relacionar-se com as dimensões socioambientais do que fazem, ou, em outras palavras, à qualidade de sua inserção social.
A publicação pelo Global Report Initiative de um documento sobre a biodiversidade (http://www.globalreporting.org/home) é um passo marcante neste sentido. Destinado a tomadores de decisão no interior das organizações, o documento mostra a importância dos ecossistemas para a vida humana e sugere procedimentos concretos para proteger e regenerar os ambientes em que atuam.
São imensas as oportunidades de ganho empresarial que uma atitude não predatória oferece. Mas isso exige, com freqüência, mudanças tanto na visão que a empresa tem de seus recursos, como, sobretudo, de suas relações com os stakeholders.
Estes stakeholders vão desde comunidades locais e grupos preocupados como a biodiversidade até investidores temerosos dos riscos que a destruição dos ecossistemas poderia trazer à própria legitimidade (licença para operar) da companhia. Socioambiental não é um setor à parte, uma equipe de bombeiros convocada quando a temperatura sobe, mas sim o componente estratégico decisivo do qual depende a integridade de qualquer organização contemporânea.
(Valor Econômico, 19/9)
Marcadores:
Abramovay,
Empresas,
Meio Ambiente,
Nova Sociologia Econômica,
Responsabilidade social
Assinar:
Postagens (Atom)