O áspero diálogo e a opinião das ruas
Mauro Santayana*
Publicado no Jornal do Brasil
O diálogo entre o presidente do STF, Gilmar Mendes, e o ministro Joaquim Barbosa, tal como divulgado pelos jornais, não deixa dúvida. Quem tomou a iniciativa da agressão, ao afirmar que o outro não tinha “condições de dar lição a ninguém”, foi o presidente da Corte. O ministro Joaquim Barbosa, tocado em sua dignidade, replicou à altura e, ao fazê-lo, disse o que provavelmente a maioria dos brasileiros gostaria de dizer: o ministro Gilmar Mendes tem contribuído para desacreditar o Poder Judiciário no Brasil.
O presidente do STF, interrompida a reunião, deveria ter deixado seus pares à vontade para examinar o incidente, como fez Joaquim Barbosa, ao ir para casa. Gilmar, ao reunir os colegas em seu próprio gabinete, constrangeu-os com a sua presença. E se não fosse, conforme o noticiário de ontem, a posição da ministra Cármem Lúcia e dos ministros Ricardo Lewandowski e Ayres Britto, Gilmar deles teria obtido manifestação de repúdio a Joaquim Barbosa.
O incidente de quarta-feira reabre a necessária discussão sobre o processo de escolha dos juízes do STF. Selecionado por ato presidencial, o candidato é aprovado ou reprovado pelo Senado – mas não há notícia, no Brasil, de que alguém tenha sido rejeitado. Um juiz do STF dispõe de tal poder que seria necessária outra legitimidade, além da escolha presidencial e da aprovação do Senado, para a sua nomeação.
O Senado norte-americano é mais cuidadoso na aprovação dos candidatos à Suprema Corte, e a imprensa, consciente de sua responsabilidade, os submete ao escrutínio da opinião pública. Um grande jurista conservador, Robert Bork, indicado por Reagan, em 1987, foi rejeitado (58 votos a 42), depois de ampla discussão pública, em que intervieram contra seu nome a União Americana pelas Liberdades Civis (ACLU) e personalidades destacadas, como o ator Gregory Peck. Defensor declarado dos trustes, Bork foi contestado também pelas outras posições conservadoras. Edward Kennedy o arrasou em discurso no Senado. A América de Bork – disse Kennedy – será aquela em que a polícia arrombará as portas dos cidadãos à meia-noite, os escritores e artistas serão censurados, os negros atendidos em balcões separados e a teoria da evolução proscrita das escolas.
A discussão sobre Bork – que havia sido cúmplice de Nixon no caso Watergate – levou o senador Joe Biden, hoje vice-presidente de Obama e então presidente do Comitê Judiciário daquela casa, a recomendar a rejeição de seu nome. O Biden Report foi aceito pelo Plenário, e Bork não foi aprovado. O caso foi tão emblemático que to bork passou a ser verbo.
Mais tarde, em outubro de 1991, o juiz Clarence Thomas por pouco não foi rejeitado, por sua conduta pessoal. Aos 43 anos, ele foi acusado de assédio sexual – mas os senadores, embora com pequena margem a favor (52 votos a 48), o aprovaram, sob o argumento de que seu comportamento não o impedia de julgar com equidade. Na forte campanha contra sua indicação as associações femininas se destacaram. E o verbo “borquear” foi usado por Florynce Kennedy, com a sua palavra de ordem “we’re going to bork him”.
A indicação do ministro Gilmar Mendes, como se recorda, foi contestada por juristas e alguns jornalistas. O jurista Dalmo Dallari foi incisivo: “Se essa indicação vier a ser aprovada pelo Senado, não há exagero em afirmar que estarão correndo sério risco a proteção dos direitos no Brasil, o combate à corrupção e a própria normalidade constitucional”. E lembrou que Gilmar recomendara ao Poder Executivo desrespeitar decisões judiciais.
Os fatos estão demonstrando que Dallari tinha razão. A normalidade constitucional está ameaçada pelos atos autoritários do presidente do STF, que, com arrogância, dita normas aos outros dois poderes da República e não tem sido devidamente contido por eles, que aceitaram firmar um Pacto republicano proposto pelo juiz. Pacto republicano é o da Constituição.
Gilmar foi membro do gabinete de Fernando Collor. Advogado-geral da União no governo de Fernando Henrique Cardoso, criticou o STF e se comprometeu na redação de medidas provisórias discutíveis. Sua aprovação tampouco foi fácil: teve 15 votos contrários, a maior rejeição registrada em indicações semelhantes.
Enquanto não houver critérios mais democráticos para a aprovação de indicados ao STF, o Senado deverá, pelo menos, ouvir a opinião da sociedade em audiências públicas, como faz antes de outras decisões.
* Mauro Santayana é jornalista.
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terça-feira, 28 de abril de 2009
segunda-feira, 24 de novembro de 2008
Lula e o preconceito
Mais da Folha Online.
Lula critica preconceito e diz que teve dificuldade para indicar negro ao STF
REGIANE SOARES
da Folha Online
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva criticou na madrugada desta sexta-feira o preconceito racial e a falta de espaço que os afrodescendentes têm na sociedade brasileira. Lula disse que existem poucos negros advogados ou médicos e que até teve dificuldade para indicar um negro como ministro do STF (Supremo Tribunal Federal).
Durante o discurso na cerimônia de formatura da Unipalmares --que tem 87% dos alunos afrodescendentes--, Lula contou a história de duas alunas que superaram as dificuldades e se formaram e hoje estão trabalhando em bancos. Na avaliação do presidente, a formatura dos 126 alunos, sendo 110 negros, demonstra que o Brasil começou a mudar.
"A gente tem que acreditar que o Brasil começou a mudar, porque a gente não via um negro no banco há muito tempo, a não ser se fosse para depositar dinheiro para o seu patrão. A gente não via negro dentista nem médico. Poucos negros são advogados. Eu lembro o esforço que fiz para encontrar um negro para levar para a Suprema Corte desse país", afirmou Lula, em uma referência indireta ao ministro Joaquim Barbosa --o único negro a integrar o STF.
O presidente também criticou o fato de a imprensa sempre mostrar o negro em em situações constrangedoras. Segundo Lula, quando um negro aparece na televisão, "normalmente é sendo preso pela polícia".
"Quero que a imprensa consiga retratar a beleza e a cara desses jovens que estão recebendo seus canudos. Porque muitas vezes o povo não consegue nem conquistar a auto-estima porque algumas pessoas não querem deixar. Ou seja, quando mostram um negro na TV, normalmente, é sendo preso pela polícia", afirmou.
Lula ressaltou a importância de a imprensa registrar a conquista dos estudantes negros, porque, segundo ele o Brasil não é apenas "um mundo de criminalidade que aparece na televisão". "Existem outras coisas importantes que o negro e o pobre fazem nesse país mas que não têm o espaço necessário", disse.
Políticos
A cerimônia de formatura na Unipalmares começou ontem à noite e se estendeu até a madrugada desta sexta-feira. A solenidade reuniu diversos políticos no ginásio do Ibirapuera, em São Paulo. Entre as autoridades estavam o governador de SP, José Serra (PSDB), o prefeito Gilberto Kassab (DEM), o senador José Sarney (PMDB-AP), além de Lula e seis ministros: Fernando Haddad (Educação), Edson Santos (Igualdade Racial), Márcio Fortes (Cidades), Miguel Jorge (Desenvolvimento), Orlando Silva (Esportes) e Luiz Marinho (Previdência).
O ex-governador Geraldo Alckmin (PSDB-SP) e a secretária de Estado do Rio Benedita da Silva (PT) foram os paraninfos dos formandos.
A formatura também contou com a participação de artistas como os cantores Martinho da Vila e Sandra de Sá e o ator Milton Gonçalves.
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REGIANE SOARES
da Folha Online
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva criticou na madrugada desta sexta-feira o preconceito racial e a falta de espaço que os afrodescendentes têm na sociedade brasileira. Lula disse que existem poucos negros advogados ou médicos e que até teve dificuldade para indicar um negro como ministro do STF (Supremo Tribunal Federal).
Durante o discurso na cerimônia de formatura da Unipalmares --que tem 87% dos alunos afrodescendentes--, Lula contou a história de duas alunas que superaram as dificuldades e se formaram e hoje estão trabalhando em bancos. Na avaliação do presidente, a formatura dos 126 alunos, sendo 110 negros, demonstra que o Brasil começou a mudar.
"A gente tem que acreditar que o Brasil começou a mudar, porque a gente não via um negro no banco há muito tempo, a não ser se fosse para depositar dinheiro para o seu patrão. A gente não via negro dentista nem médico. Poucos negros são advogados. Eu lembro o esforço que fiz para encontrar um negro para levar para a Suprema Corte desse país", afirmou Lula, em uma referência indireta ao ministro Joaquim Barbosa --o único negro a integrar o STF.
O presidente também criticou o fato de a imprensa sempre mostrar o negro em em situações constrangedoras. Segundo Lula, quando um negro aparece na televisão, "normalmente é sendo preso pela polícia".
"Quero que a imprensa consiga retratar a beleza e a cara desses jovens que estão recebendo seus canudos. Porque muitas vezes o povo não consegue nem conquistar a auto-estima porque algumas pessoas não querem deixar. Ou seja, quando mostram um negro na TV, normalmente, é sendo preso pela polícia", afirmou.
Lula ressaltou a importância de a imprensa registrar a conquista dos estudantes negros, porque, segundo ele o Brasil não é apenas "um mundo de criminalidade que aparece na televisão". "Existem outras coisas importantes que o negro e o pobre fazem nesse país mas que não têm o espaço necessário", disse.
Políticos
A cerimônia de formatura na Unipalmares começou ontem à noite e se estendeu até a madrugada desta sexta-feira. A solenidade reuniu diversos políticos no ginásio do Ibirapuera, em São Paulo. Entre as autoridades estavam o governador de SP, José Serra (PSDB), o prefeito Gilberto Kassab (DEM), o senador José Sarney (PMDB-AP), além de Lula e seis ministros: Fernando Haddad (Educação), Edson Santos (Igualdade Racial), Márcio Fortes (Cidades), Miguel Jorge (Desenvolvimento), Orlando Silva (Esportes) e Luiz Marinho (Previdência).
O ex-governador Geraldo Alckmin (PSDB-SP) e a secretária de Estado do Rio Benedita da Silva (PT) foram os paraninfos dos formandos.
A formatura também contou com a participação de artistas como os cantores Martinho da Vila e Sandra de Sá e o ator Milton Gonçalves.
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