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sexta-feira, 17 de julho de 2009

O ingresso dos negros na UFRN

Como se já não estivesse com muitas coisas prá fazer, movido pelo resultado de uma pesquisa que concluí recentemente sobre a inserção da população negra no SUS do Rio Grande do Norte, fui dar uma conferida nas estatísticas que a COMPERVE (a gerenciadora do vestibular na UFRN) coloca à disposição de qualquer um (basta visitar o site e solicitar os dados que você quiser - claro que você tem que estar disposto a mastigá-los...)... Bom. Um dado me chamou particular atenção: o número de candidatos que se declaram negros e quantos desses candidatos são aprovados no vestibular. Adianto para vocês (vou colocar o estudo completo aqui, espero, dentro em breve) que o resultado é, no mínimo, preocupante. Especialmente quando você olha o conjunto. Ou faz uma comparação com o desempenho dos brancos. É como se a Universidade ainda continuasse vedada aos afro-descendentes. Vou voltar a esse assunto. Prometo!

quinta-feira, 18 de junho de 2009

O ProUni e as cotas: a avaliação de Elio Gaspari.

Gaspari: a cota de sucesso do ProUni

Na edição de hoje da Folha de São Paulo, um ótimo artigo do jornalista Elio Gaspari sobre o ProUni.

A DEMOFOBIA pedagógica perdeu mais uma para a teimosa insubordinação dos jovens pobres e negros. Ao longo dos últimos anos o elitismo convencional ensinou que, se um sistema de cotas levasse estudantes negros para as universidades públicas, eles não seriam capazes de acompanhar as aulas e acabariam fugindo das escolas. Lorota. Cinco anos de vigência das cotas na UFRJ e na Federal da Bahia ensinaram que os cotistas conseguem um desempenho médio equivalente ao dos demais estudantes, com menor taxa de evasão. Quando Nosso Guia criou o ProUni, abrindo o sistema de bolsas em faculdades privadas para jovens de baixa renda (põe baixa nisso, 1,5 salário mínimo per capita de renda familiar para a bolsa integral), com cotas para negros, foi acusado de nivelar por baixo o acesso ao ensino superior. De novo, especulou-se que os pobres, por serem pobres, teriam dificuldade para se manter nas escolas.
Os repórteres Denise Menchen e Antonio Gois contaram que, pela segunda vez em dois anos, o desempenho dos bolsistas do ProUni ficou acima da média dos demais estudantes que prestaram o Provão. Em 2004, os beneficiados foram cerca de 130 mil jovens que dificilmente chegariam ao ensino superior (45% dos bolsistas do ProUni são afrodescendentes, ou descendentes de escravos, para quem não gosta da expressão).
O DEM (ex-PFL) e a Confederação Nacional dos Estabelecimentos de Ensino foram ao Supremo Tribunal Federal, arguindo a inconstitucionalidade dos mecanismos do ProUni. Sustentam que a preferência pelos estudantes pobres e as cotas para negros (igualmente pobres) ofendiam a noção segundo a qual todos são iguais perante a lei. O caso ainda não foi julgado pelo tribunal, mas já foi relatado pelo ministro Carlos Ayres Britto, em voto memorável. Ele lembrou um trecho da Oração aos Moços de Rui Barbosa: "Tratar com desigualdade a iguais, ou a desiguais com igualdade, seria desigualdade flagrante, e não igualdade real".
A "Oração aos Moços" é de 1921, quando Rui já prevalecera com sua contribuição abolicionista. A discussão em torno do sistema de acesso dos afrodescendentes às universidades teve a virtude de chamar a atenção para o passado e para a esplêndida produção historiográfica sobre a situação do negro brasileiro no final do século 19. Acaba de sair um livro exemplar dessa qualidade, é "O jogo da Dissimulação - Abolição e Cidadania Negra no Brasil", da professora Wlamyra de Albuquerque, da Federal da Bahia. Ela mostra o que foi o peso da cor. Dezesseis negros africanos que chegaram à Bahia em 1877 para comerciar foram deportados, apesar de serem súditos britânicos. Negros ingleses negros eram, e o Brasil não seria o lugar deles.
A professora Albuquerque transcreve em seu livro uma carta de escravos libertos endereçada a Rui Barbosa em 1889, um ano depois da Abolição. Nela havia um pleito, que demorou para começar a ser atendido, mas que o DEM e os donos de faculdades ainda lutam para derrubar:
"Nossos filhos jazem imersos em profundas trevas. É preciso esclarecê-los e guiá-los por meio da instrução".
A comissão pedia o cumprimento de uma lei de 1871 que prometia educação para os libertos. Mais de cem anos depois, iniciativas como o ProUni mostraram não só que isso era possível mas que, surgindo a oportunidade, a garotada faria bonito

sexta-feira, 26 de dezembro de 2008

Sobre cotas e bolsas para negros

Matéria publicada na edição de hoje do jornal Folha de São Paulo coloca elementos para uma reflexão sobre a defesa de cotas nas universidades.


Cota não altera nº de negros na universidade
Participação de pretos e pardos no ensino superior público variou 1,8 ponto percentual -passou de 36,4% dos alunos para 38,2%

Número de estudantes negros nas universidades particulares passou de 26,2% para 29,5% de 2004 a 2007; Prouni dá bolsas desde 2005

ANGELA PINHO
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

As políticas de ações afirmativas adotadas até agora por universidades públicas e pelo governo federal, por meio do Prouni, tiveram pouco impacto sobre a participação dos pretos e pardos no ensino superior.
Dados da Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio) mostram que, de 2002, quando as universidades começaram a instituir programas de cotas, a 2007, a participação de pretos e pardos no ensino superior público variou 1,8 ponto percentual -passou de 36,4% dos estudantes de graduação do setor para 38,2%. De 2001 a 2002, a variação foi de 2,8 pontos percentuais.
Pretos e pardos são nomenclaturas usadas pelo IBGE para a classificação de raça/cor, a partir da autodeclaração dos entrevistados.
Na rede particular, a presença do grupo passa de 26,2% para 29,5% de 2004 a 2007. A principal ação afirmativa no setor é o Prouni, que desde 2005 concede bolsas a estudantes carentes de escola pública na proporção igual à de pretos, pardos e indígenas de cada Estado.
(...)
No Prouni, os 197 mil pretos e pardos que entraram pelo programa desde sua criação correspondem a 45% dos bolsistas. Considerando os que entraram em 2006, porém, o ingresso representou apenas 1% do total de matrículas no ensino superior.
O impacto de cotas em universidades públicas também é restrito considerando-se que três quartos dos estudantes estão em instituições privadas.
Desde 2002, segundo estudo do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), 33 universidades públicas, de ao menos 250, passaram a adotar algum tipo de cota racial.
O projeto de lei que o governo quer aprovar no Congresso prevê que 50% das vagas nas federais sejam reservadas a alunos de escolas públicas, e que esse percentual seja dividido de acordo com a proporção de pretos, pardos e indígenas de cada Estado.
Mesmo se aprovada, porém, a lei terá reflexo pequeno sobre o quadro geral, embora de fato aumentem a presença de pretos e pardos nas instituições federais em que as cotas forem instituídas.
(...)
Caso as vagas para pretos e pardos correspondessem à sua representação na população brasileira -ou seja, 49,8%-, haveria uma reserva correspondente a 3,1% das matrículas no ensino superior.
"Há todo um engodo em torno desse assunto [lei que cria cotas]", diz José Luiz Petrucelli, pesquisador do IBGE, favorável às cotas. "Mesmo se essa lei tivesse sido aprovada e estivesse sendo cumprida, ela não tem um efeito prático muito importante. Tem um efeito simbólico muito importante, por isso tanta polêmica."
(...)
Segundo frei David, da ONG Educafro, essa reivindicação é planejada para daqui a cerca de três anos, já que, na atual lista de prioridades, vêm antes a aprovação do projeto de lei pelo Senado, a criação de bolsas para os alunos cotistas conseguirem se manter nos cursos e o monitoramento do desempenho acadêmico deles, para, segundo afirma, divulgar os benefícios da política para a população como um todo. A idéia não deve encontrar apoio no Ministério da Educação.

Crescimento
Mesmo com baixo impacto de ações afirmativas, a presença dos pretos e pardos no ensino superior, contando tanto o público como o particular, tem uma trajetória crescente na última década. Em 1998, pretos e pardos eram 18% dos estudantes de graduação. Em 2007, o número já era de 31,5%.
(...)
Isso aconteceu no ensino médio. A participação dos pretos e pardos nessa etapa passou de 42% para 50,5%, aumentando o número de pessoas aptas a cursar o ensino superior.
A qualidade da educação é um fator apontado para melhorar o acesso à universidade pela população mais pobre -e, conseqüentemente, de mais pretos e pardos, geralmente associados a essa faixa econômica.

(...)
ASSINANTE DA FOLHA OU DO UOL LÊ A MATÉRIA COMPLETA AQUI.

segunda-feira, 24 de novembro de 2008

Sobre cotas

Transcrevo abaixo matéria publicada na Folha Online (aquela parte do material jornalístico do jornal Folha de São Paulo de acesso irrestrito). Trata-se de uma discussão sobre pesquisa realizada pelo DATAFOLHA a respeito do preconceito racial no Brasil.

Brasileiros vêem cota como essencial e humilhante, revela Datafolha
ANTÔNIO GOIS
da Folha de S. Paulo, no Rio


Polêmicas desde que começaram a ser implementadas, em 2002, no Brasil, as cotas para negros nas universidades continuam dividindo opiniões. Se, por um lado, 51% da população se diz a favor da reserva de vagas para negros, por outro, 86% concordaram com a afirmação de que as cotas deveriam beneficiar pessoas pobres e de baixa renda, independentemente da cor.

As respostas seguem contraditórias quando 53% dos brasileiros concordam que cotas são humilhantes para negros, mas, ao mesmo tempo, 62% dizem que elas são fundamentais para ampliar o acesso de toda a população à educação. Também 62% dizem que elas podem gerar atos de racismo.

Leituras diversas

Como era esperado, o resultado da pesquisa do Datafolha gerou leituras diversas de críticos e de pessoas favoráveis ao sistema.

A antropóloga Yvonne Maggie, contrária à reserva de vagas por cor ou raça, destaca a incoerência dos resultados do levantamento. Para ela, no entanto, é natural que, dependendo da forma como a pergunta é feita, a população concorde com a idéia de dar vantagens àqueles que se sentem mais discriminados.

"Quem vai negar vantagens aos que dizem ser mais discriminados? As pessoas, no entanto, acreditam no esforço pessoal e também são favoráveis ao mérito, até em percentual maior. Também acham que as cotas podem provocar racismo. Será que estão fazendo o cálculo de que é melhor racismo, contanto que as pessoas ganhem alguns privilégios?", questiona a antropóloga.

Aceitação

Renato Ferreira, do Laboratório de Políticas Públicas da Uerj (Universidade do Estado do Rio de Janeiro) e defensor do sistema, diz não ter dúvidas de que há uma aceitação à política de cotas.

"Os meios de comunicação, via de regra, se manifestam contrariamente. Se sai algo positivo, quase não comentam. Se é negativo, isso reverbera. Dentro desse contexto, acho significativo que a maioria da população hoje concorde com as cotas raciais", afirma.

Ferreira fez um levantamento que mostra que, no Brasil, já há 82 instituições públicas adotando algum critério de ação afirmativa no acesso ao vestibular, seja ele de cotas ou de bonificação extra para alunos por sua cor, renda ou tipo de escola cursada no ensino médio.

As ações afirmativas em exames de ingresso, no entanto, estão sendo contestadas numa ação que ainda não foi julgada pelo Supremo Tribunal Federal. Até agora, essas universidades têm conseguido manter nas instâncias inferiores da Justiça seus sistemas.

O STF, porém, ainda não julgou uma ação movida pela Confenen (Confederação Nacional dos Estabelecimentos de Ensino) contra o ProUni, programa do governo federal que adota ações afirmativas na distribuição de bolsas para estudo em instituições privadas. Caso declare inconstitucional esse critério, a decisão afetará as instituições públicas.

"A Constituição determina que ninguém terá tratamento desigual perante a lei e que o acesso ao ensino superior se dá por mérito. Na reserva de vagas, há uma discriminação ao contrário, e entendemos que isso é ilegal", diz Roberto Dornas, presidente da Confenen.

Qualidade

Enquanto não há decisão definitiva, as universidades que divulgaram resultados sobre o desempenho acadêmico dos cotistas têm defendido que isso não afetou a qualidade.

Ricardo Vieralves, reitor da Uerj, uma das pioneiras, diz que houve necessidade de criar aulas de reforço, mas que os alunos que se formam saem com a mesma qualidade. Ele afirma também que não foram registrados casos de racismo.

Adriana Pastor, 23, que entrou no curso de odontologia da Uerj graças às cotas, diz não ter percebido diferenças no desempenho entre cotistas e os demais. "Acho que fui uma das melhores alunas de minha turma e não percebi nenhum tipo de preconceito entre meus colegas. Para mim, a maior dificuldade do curso foi que o material era muito caro", diz.

quarta-feira, 16 de julho de 2008

A ÚLTIMA BATALHA DO CAMPO: os intelectuais e as ações afirmativas no Governo Lula




O debate sobre as ações afirmativas e as políticas de enfrentamento ao racismo no Brasil, propostas pelo Governo Lula ou por parlamentares isolados, como é o caso do Senador Paulo Paim (PT-RS), ganhou, a partir do segundo semestre de 2005, proporções jamais imaginada. Uma discussão que, até aquele momento, empolgava muito pouco, e sobre a qual a chamada opinião pública mantinha uma razoável indiferença, adentrou o universo dos mídias e conquistou inaudita visibilidade. O ambiente político de fundo daquele ano, marcado pela emergência do chamado “escândalo do Mensalão”, o plebiscito sobre a proibição da venda de armas e as inquietações provocadas pela reeleição do Presidente Lula, possibilitou uma amplificação significativa do até então modorrento debate sobre a questão. Intelectuais brasileiros, notadamente cientistas sociais, foram, abusemos um pouco aqui da terminologia bourdieusiana, legitimados como produtores legítimos de opiniões legítimas sobre racismo e anti-racismo. Seus artigos, opiniões e rostos assomaram nas revistas semanais, no rádio e na TV. De lá pra cá, a situação não mudou substancialmente.

Nesse ambiente, a produção crítica e distanciada sobre o racismo foi sendo gradativamente engolfada pelas teias do debate político ordinário. Intérpretes aliaram-se aos ditos “formadores de opinião” e, rapidamente, encantaram-se com a condição do que Zigmunt Baumam definiu como “legisladores do social”. E aí o debate assumiu as proporções de confronto. E um manifesto (há sempre um manifesto para marcar um campo!) foi lançado para nos lembrar de antiga e olvidada consigna: a de que “todos têm direitos iguais na república democrática”.

Mais do que questionar a correção ou não dos posicionamentos sobre as cotas, há uma tarefa ainda não realizada pelas Ciências Sociais no Brasil sobre a temática: trata-se de perscrutar o que estava em jogo para além da aparência fática de defesas apaixonadas de posições cristalizadas. Acredito que o poder de nomear, de interpretar e de propor questões e demandas sobre direitos sociais era (e ainda é) o móvel da disputa e que uma análise do debate sobre as cotas pode nos fornecer importantes pistas para pensar as relações de força, posições e estratégias de acumulação de capital científico (prestígio, posições, financiamentos, indicações para comissões, etc.) no campo acadêmico brasileiro.

A justificativa para o exercício de objetivação do campo intelectual brasileiro aqui proposto é a assunção de que a forma como a discussão sobre as ações afirmativas foi (e está sendo conduzido) no Brasil não apenas é reveladora das regras do jogo nesse campo, mas, o que é mais significativo e duradouro, que essa forma teve (e terá) grandes e graves conseqüências na construção de uma pauta de discussão e de demandas em torno do enfrentamento do racismo e das desigualdades no país. A realização de tal tarefa, desaconselhável para quem se orienta na vida acadêmica pela cuidadosa acumulação de divisas, também pode contribuir para desmistificar a quase naturalizada suposição de que existiria uma vocação progressista da intelectualidade brasileira pós-democratização.

Para realizar tal tarefa, acredito, deve-se buscar analisar não apenas as produções discursivas, mas, o que nos parece inseparável, os contextos políticos e os ambientes institucionais nos quais aquelas emergem e ganham força. Assim, os posicionamentos que clamaram contra as cotas para afro-descendentes em nome de um universalismo que estaria sendo “apunhalado” pelos defensores de “políticas identitárias” só podem ser compreendidos se levarmos em conta tanto as matrizes discursivas que ancoraram as disputas políticas e ideológicas da sociedade brasileira nos últimos anos quanto os interesses em disputa no próprio campo intelectual brasileiro (e, particularmente, no campo acadêmico).

O percurso analítico, esboçado acima, aponta também para a necessidade de uma problematização das estratégias de acúmulo de prestígio e força no campo da produção cultural no Brasil contemporâneo. Até porque, adianto essa intuição, essa talvez seja uma das pistas para a explicação do inusitado fato de prestigiados antropólogos aparecerem publicamente como organizadores de um livro como “Divisões perigosas”. Essa obra, uma coletânea de artigos, a maior parte publicadas em jornais como “O Globo” e a “Folha de São Paulo”, é repleta não apenas de rotulações (as mais brandas são as de “essencialistas” e “revisionistas”), mas também de insultos contra os adversários reais ou imaginários construídos pelos autores. Na verdade, causa espanto o fato de o tema das ações afirmativas ter se constituído, no Brasil, em expressão maior da degradação do debate público e, em particular, das discussões no campo acadêmico do país.

Essa degradação intelectual, tradução “pós-moderna” de antiqüíssima estratégia de desqualificar, se possível com formulações genéricas e “irrespondíveis” (essa a sutileza da violência simbólica da mobilização do “universal” como recurso argumentativo contra os defensores das cotas), é algo significativo. Não por traduzir o “estado da arte” das ciências sociais no Brasil, mas por expressar forma nova de traço estruturante da vida social no nosso país: a condenação do “outro” (no caso, aquele que não pertence ao círculo dos iniciados e que, portanto, não tem um “lugar de fala” legítimo) à condição de sujeito passivo do debate público relevante.

Assim, e na superfície do que realmente era importante, o argumento de autoridade de Pierre Bourdieu, em artigo menor e politicamente sofrível, foi invocado repetidas vezes para (des)qualificar as trocas culturais e políticas transnacionais da diáspora negra. Não raro, estas foram tratadas expressões do enredamento dos atores sociais de países periféricos nas “astúcias da razão imperialista”. Mas não só o grande mestre da sociologia francesa do século XX foi mobilizado para fazer frente às construções e propostas (algumas, sem dúvida, problemáticas) de ações afirmativas no Brasil. Também intelectuais de ponta dos estudos culturais negros, como Paul Gilroy e Kwame Anthony Appiah, tiveram partes de suas obras convenientemente amputadas para servir de base para ataques menores às propostas de ações afirmativas. Dessa forma, posições políticas ou argumentos científicos criteriosos e plenamente justificáveis em seus contextos iniciais, quando transladados para o contexto da disputa política pós-2005 no Brasil, referenciaram menos proposições plausíveis em favor da desconstrução da “Raça” como âncora analítica ou política, e, mais, o “racismo da inteligência” no qual não poucos dos adversários das cotas para afro-descendentes deixaram se enredar.