terça-feira, 29 de julho de 2008

O brilho da candidatura de Obama na leitura de Marcos Nobre


Marcos Nobre, professor de filosofia e colunista da Folha, em artigo publicado hoje, que reproduzo abaixo, faz uma boa análise do fenômeno que deu vida nova à política norte-americana (e não só, se você olha para a foto acima e se dá conta que 200 mil alemães foram ouvi-lo quando da sua recente passagem pelo país).

"MARCOS NOBRE

Obama
MULTIDÕES EM TRANSE por Obama. E a cobertura e as análises da mídia dizem: calma. O candidato democrata leva 200 mil pessoas para a rua na Alemanha (!). E os comentários dizem: isso pode prejudicá-lo.
Parece que está mesmo difícil aceitar a novidade. Depois da devastação conservadora, espalhou-se a sensação de que nada pode mesmo mudar muito, que política é o tédio e os cambalachos de sempre, que democracia é simplesmente a vitória do dinheiro e dos interesses. A candidatura de Obama mostra que o jogo não está jogado. E não só nos EUA.
O que Obama provocou vai muito além de uma candidatura presidencial. É a canalização de energias de transformação que pareciam perdidas.
Se for mesmo eleito, Obama não poderá jamais corresponder a essas expectativas. Mas, na situação atual, o mais importante, em primeiro lugar, é impor uma derrota ao conservadorismo. E, mais que isso, reabrir espaços de discussão e convivência democráticos que ficaram fechados por muito tempo.
Obama sabe bem aproveitar toda essa energia. Tenta colar sua imagem à de Kennedy, usando o paletó pendurado no ombro e discursando em Berlim. Parece o presidente negro daquele filme-catástrofe de Hollywood.
Ao mesmo tempo, o profissionalismo de sua equipe conta com os quadros mais experientes da campanha de Hillary Clinton e do próprio governo Bill Clinton. Diz-se que sua comitiva na visita ao Iraque contava pelo menos 20 carros.
O seu discurso é vago e genérico?
Sem dúvida. Como presidente, terá de fazer composições políticas que vão frear muito desse movimento de renovação? Com certeza. Mas o que parece mais estranho é o esforço para conter as expectativas desde já, como uma preparação para a decepção que virá. A idéia é que muita mobilização vai acabar por produzir uma imagem de arrogância e desprezo pelos EUA, colocando em risco sua eleição.
Para quem não tem qualquer simpatia por Obama, essa é uma maneira sutil de miná-lo sem ter de mostrar sua posição. Procura reforçar a sensação de arrogância ao tratá-lo já como presidente e não como um candidato em início de campanha.
Algo parecido acontece quando se diz que um governo republicano é melhor para os interesses brasileiros porque menos protecionista. Como se o Brasil se reduzisse simplesmente aos interesses das empresas instaladas aqui. Quem tem simpatia pela candidatura deveria pensar antes que o melhor de Obama é o que ele produziu. E que ganhar a eleição é de fato decisivo. Mas não mais importante do que ver as pessoas na rua mostrando sua cara."

2 comentários:

Anônimo disse...

Interessante a reprodução da idéia que Obama, possivelmente, dará credito ao etanol produzido através do milho americano pela imprensa brasileira: parece que todos nós somos investidores de etanol de cana-de-açucar.Ainda é como se essas ideias sorrateiramente chegassem ao discurso do senso comum! interessante o trecho que declara:"Como se o Brasil se reduzisse simplesmente aos interesses das empresas instaladas aqui". Nem de longe as empresas representam o interesse da totalidade da população. Talvez para muitos seja mais interesante vê um negro chegar ao comando da maior potencia capitalista do mundo levando em consideração, que para está sociedade a cor da pele é um elemento de divisões.

Edmilson Lopes Júnior disse...

Embora o Ribamar tenha razão, dado que se nos descuidarmos, podemos cair em um certo essencialismo, acho que há algo de (mesmo que simbolicamente) muito postivo com a candidatura de Barak Obama. É uma leve brisa no árido espaço da vida política contemporânea.