domingo, 3 de outubro de 2010

Brazilianista disseca o judiciário brasileiro

Na Folha de hoje, você vai encontrar uma entrevista imperdível sobre o nosso judiciáio.

Judiciário é autoritário, diz brasilianista
Para Anthony Pereira, as Forças Armadas e a Justiça não mudaram durante a transição do país para a democracia

A grande injustiça do processo de transição, afirma Pereira, não é "a falta de punição, mas a falta de informação"

LUCAS FERRAZ
DE BRASÍLIA

A ditadura militar brasileira, que teve um alto grau de judicialização se comparada às do Chile e da Argentina, deixou como um dos mais fortes legados a manutenção do autoritarismo no Judiciário. É o que diz o cientista político inglês Anthony Pereira, um dos mais importantes brasilianistas em atividade.
"Não há Estado de Direito.
Isso por causa das desigualdades extremas em termos de tratamento das pessoas dentro da lei. É uma espécie de autoritarismo social, não somente em termos de sistema político", afirma.
Esse autoritarismo, conta Anthony, aliado ao conservadorismo presente também nas Forças Armadas, é uma ameaça à garantia dos direitos humanos, das minorias.
Estudioso do Brasil desde 1984, quando o visitou pela primeira vez para uma pesquisa sobre a legislação ambiental, Anthony Pereira é Ph.D em Harvard com uma dissertação sobre trabalhadores rurais do Nordeste.
Autor de "Ditadura e Repressão", um dos mais importantes livros sobre ditaduras do Cone Sul, ele analisa como a violência da repressão variava segundo a judicialização dos regimes em Brasil, Chile e Argentina, o que explica o baixo número de mortos no primeiro caso e a guerra suja no último.
Para o professor, o maior problema da transição brasileira não é "necessariamente a falta de punição, mas a falta de informação".



Folha - O Brasil condena, mas não pune a tortura, como ficou evidente no episódio recente do julgamento da Lei da Anistia, pelo Supremo. Qual o reflexo disso para o país?

Anthony Pereira - O Brasil optou por fazer menos do que outras sociedades. Mas gostaria de distinguir entre anistia e investigação. O fato de a anistia ter sido mantida não implica impossibilidade de investigação. A grande injustiça da transição não é necessariamente a falta de punição, mas a falta de informação e de verdade.

Como é possível não julgar torturadores e conseguir a reconciliação nacional?

É contraditório. A punição é mais importante para o futuro, para mostrar que se está construindo uma sociedade de direito. Mas o Brasil não é isolado neste ponto. Há outros casos históricos em que ocorreram violações dos direitos humanos e os vencedores decidiram não punir.
Só após a segunda metade do século 20 é que surge essa força dos direitos humanos para não permitir a impunidade. Isso começou após a Segunda Guerra Mundial, com o processo de Nuremberg, continuando até o caso da África da Sul, uma escolha interessante, de fornecer anistia em troca de informação concreta sobre crimes.

É possível, 25 anos depois, avaliar o impacto dessa conciliação nacional sobre direitos humanos e das minorias?

É um paradoxo e cria problemas. Uma comparação viável é com uma pessoa traumatizada, que se nega a falar sobre determinado assunto porque quer esquecer o trauma. Mas o trauma, inconscientemente, volta. É mais fácil olhar para trás em países onde ocorreu engajamento. É uma certa ameaça para a garantia dos direitos humanos, das minorias.

O traço autoritário ainda é presente no Judiciário?

Sim, e um exemplo é o sistema de Justiça Militar. No nível federal, o militar, cometendo crimes comuns, vai para a Justiça Militar, que tem os traços corporativos. Muitos países limitaram a jurisdição militar. Em nível estadual, policiais militares só são julgados na Justiça comum em casos de homicídio doloso. Outros crimes comuns também vão para a Justiça Militar estadual. Há um conservadorismo forte no Judiciário, como nas Forças Armadas. No Chile, houve uma reforma judicial ampla. No Brasil é tímido.

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