Um interessante artigo, publicado no último número da Revista Brasileira de Ciências Sociais, assum o desafio de tentar apreender as múltiplas faces do lulismo. Vale a pena conferir! Leia alguns trechos abaixo:
As bases do Lulismo: a volta do personalismo, realinhamento ideológico ou não alinhamento?*
Lúcio Rennó; Andrea Cabello
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RESUMO
O artigo busca caracterizar o eleitor de Lula em 2006. O objetivo é analisar os fatores que diferenciam o voto em Lula do voto no PT, de modo a esclarecer quem são os eleitores que compõem a maioria que Lula construiu ao longo de seu governo e que não demonstra preferência por seu partido. Conclui-se que o lulista se assemelha ao eleitor não-alinhado que não demonstra preferências políticas ou ideológicas fortes e que vota, até certo ponto, baseado na sua avaliação retrospectiva do desempenho do governo.
Palavras-chave: Lulismo; Petismo; Voto retrospectivo; Determinantes do voto.
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Introdução
Em outubro de 2006, Lula foi reeleito com margem considerável de votos. Tal feito seria impensável um par de anos antes. No meio de seu primeiro mandato, a administração petista viu-se às voltas com o envolvimento de sua alta cúpula em escândalos sucessivos de corrupção. Deu-se por certa, principalmente pela oposição, a derrota do governo nas eleições de 2006. Chegou-se, inclusive, a cogitar a hipótese de um pedido de impeachment, mas não se foi adiante com a ameaça apostando em que a sina eleitoral de Lula estava traçada pelos escândalos de corrupção. Como, então, um desacreditado Lula conseguiu a reeleição em 2006, com confortável margem de votos no segundo turno das eleições?
A resposta passa por uma constatação inicial básica: desde a sua primeira candidatura à presidência, em 1989, Lula e o Partido dos Trabalhadores(PT) sedimentaram seu papel na política brasileira– mas não necessariamente na mesma intensidade. Inicialmente, o PT conseguiu consolidar-se como uma alternativa viável no Poder Legislativo no nível federal e nos níveis Executivos municipais. O partido cresceu de forma inconteste. Enquanto isso, Lula sofria derrotas eleitorais consecutivas, primeiro para Fernando Collor, em 1989, e depois para Fernando Henrique Cardoso, nas eleições de 1994 e 1998.
Em 2002, Lula renasce das cinzas eleitorais como candidato não só dos petistas, mas de uma parcela maior da população brasileira. O PT também se torna o maior partido na Câmara dos Deputados. Dessa forma, podemos afirmar que até 2002, o eleitorado de Lula não era assim tão distinto daquele do PT (Hunter e Power, 2007; Zucco, 2008).
Em 2006, no entanto, a diferença entre os eleitorados de PT e Lula tornou-se mais profunda, principalmente em sua dimensão geográfica (Idem, ibidem). Portanto, parece haver, principalmente a partir de 2002, um descolamento maior entre o voto em Lula e o voto no PT. O objetivo deste trabalho é traçar o perfil predominante, se houver algum, da parcela da população que votou em Lula em 2006, mas que não simpatiza ou tem preferência pelo PT. Em outras palavras, pretendemos explorar o que diferencia os lulistas dos petistas. Assim sendo, nossa pergunta é: o lulismo, entendido como aprovação e lealdade ao líder Luis Inácio Lula da Silva, que transcende a identificação partidária com o PT, é motivada por quais fatores? Quais são as bases do lulismo? Este artigo, portanto, contribui para o crescente debate sobre esse tema no Brasil (Samuels, 2004a; Singer, 2009).
Embasados em pesquisa de opinião pública realizada ao final das eleições de 2006, acrescentamos dois elementos ao estudo do tema ainda ignorados pela literatura especializada (Idem, ibidem). Primeiro, decompomos o voto em Lula, além de diferenciá-lo do voto nos demais candidatos. Os estudos anteriores sobre lulismo, tanto de Samuels (2004a) como de Singer (2009), não atentam para as possíveis diferenças internas no interior do dito lulismo. Samuels diferencia petistas dos demais eleitores; Singer analisa apenas cruzamentos de ideologia e renda com intenção de voto. Aqui, matizamos as potenciais diferenças entre lulistas novos, que passaram a votar em Lula em 2006, e lulistas antigos, que votaram em Lula em 2002 e 2006. Ambos os grupos são formados por eleitores que declararam voto em Lula, mas não se identificam com o PT. Iremos, portanto, desagregar o eleitorado brasileiro em diversas categorias – lulistas antigos, lulistas novos, petistas e demais eleitores Desta forma poderemos identificar o impacto de diferentes variáveis políticas, econômicas e sociais na diferenciação entre esses grupos. 1
Nossas hipóteses serão derivadas não só dos dois estudos supracitados (Samuels, 2004a; Singer, 2009), como também de uma extensa literatura sobre os determinantes de curto e longo prazo do voto. Nossas conclusões distanciam-se das alcançadas por Samuels e Singer. Os resultados indicam que os lulistas não representam um novo realinhamento político-ideológico, com base em classe e ideologia, como argumenta Singer, nem uma nova forma de personalização da política, como defende Samuels. O lulista, na verdade, é um eleitor pouco informado politicamente e desatento a campanhas eleitorais, que não apresenta afinidades partidárias de qualquer tipo ou intensas rejeições a partidos, e tampouco, identificações personalistas fortes. Contradizendo os estudos anteriores, detectamos que os eleitores que declaram identificação com o PT, os aqui chamados petistas, simpatizam mais fortemente com a pessoa de Lula do que os eleitores lulistas.
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segunda-feira, 22 de novembro de 2010
quarta-feira, 7 de outubro de 2009
Homicídios e políticas públicas
Gláucio Ary Dillon Soares dispensa maiores apresentações. É um dos cientistas sociais que analisa com mais desassombro e menos concessão ao politicamente correto as temáticas do crime e da violência no nosso país. Por isso, republico, mais abaixo, artigo de sua autoria. Confira!
Quem vai morrer assassinado?
Gláucio Ary Dillon Soares
Algumas características aumentam o risco de morrer assassinado, ao passo que outras o diminuem. Características demográficas, como idade e sexo, contam muito. Características sociais como a educação e o estado civil também. Até características geo-políticas (em que unidade da federação) onde a pessoa mora também contam. E, como veremos, o bom uso do dinheiro público é essencial.
Não pensem que esse risco diferenciado é de hoje, dos últimos anos. Há muito tempo que é assim. Por isso, busquei dados sobre as vítimas de homicídios dos anos de 1991 e 1992 - há quase duas décadas.
No Distrito Federal houve, em 1991 e 1992, 938 homicídios, somando os dois anos. Oitocentos e quarenta eram homens, ou 89,6%. No Brasil como um todo é um pouco mais: 91,1%. Aproximando, nove em cada dez vítimas eram homens. Poucos dados sobre homicidas mostram que a grande maioria dos autores também é masculina.
As crianças têm risco baixo relativamente aos adolescentes e jovens adultos. De todas as mortes, apenas 6% eram de menores de 15 anos. Porém, aos 15 a mortalidade começava a disparar. Nos vinte anos seguintes, estão 52% dos assassinados. A frequência cumulativa mostra que aos 35, já haviam falecido 78% dos assassinados. Esse é o grupo-alvo, no qual devemos concentrar boa parte da atenção protetora das instituições e os serviços de prevenção.
O estado civil também conta e muito. O casamento protege. Ser solteiro aumenta o risco: no Distrito Federal, três de cada quatro vítimas eram solteiras. É bom saber quais as probabilidades: o x2 nos diz que a probabilidade de que essa relação seja devida ao acaso é menor do que uma em mil. O coeficiente phi, de 0,19, confirma a associação.
A educação mostra o caráter de classe dos homicídios: 93% das vítimas tinham primeiro grau ou menos, muito mais do que na população como um todo. A vitimização é um fenômeno de classe social, confirmando o encontrado em diferentes países: são pobres os que morrem, e são pobres os que matam.
Os dados nacionais permitiram análises extremamente rigorosas que demonstram que a idade, a unidade da federação e o sexo, influenciam a probabilidade de que uma pessoa seja assassinada. Estas três variáveis aumentam esta probabilidade tanto diretamente quanto em interação com as demais, duas a duas (idade x UF; idade x sexo; UF x sexo) e as três (idade x UF x sexo).
Não obstante, um dado mostra como o risco de morte muda de acordo com a unidade da federação levando em conta somente as que foram vítimas de tentativas. Essas diferenças existem há muitas décadas no Brasil. Em 1991/2, 38% das vítimas de homicídios no Distrito Federal morriam fora dos hospitais, em comparação com 63% no Brasil como um todo: morriam na rua, morriam em casa, morriam a caminho dos hospitais. O efeito das instituições governamentais e das instituições públicas se fazem sentir nesse indicador. A rapidez do atendimento é fundamental - isso vale para todas as condições que podem ameaçar a vida, desde picada de cobra, até acidente de trânsito, passando por homicídios e suicídios. A rapidez depende do número e da distribuição das ambulâncias, do fluxo do trânsito (ordenado e fluído vs. desordenado e engarrafado), do equipamento das ambulâncias, do treinamento do pessoal de primeiros socorros, da distribuição espacial dos hospitais e da sua qualidade. Dois estados com taxas de tentativas de homicídios iguais podem ter duas taxas de mortes por homicídios muito diferentes.
Mais uma vez, constatamos que bons governos salvam vidas: uns constroem, equipam seus hospitais e treinam seu pessoal; outros usam os recursos para dar emprego público a amigos, familiares e correligionários. Quem vota nesse tipo de político pode estar assinando a sua própria sentença de morte.
Publicado no Correio Braziliense, 20 de agosto de 2009
Quem vai morrer assassinado?
Gláucio Ary Dillon Soares
Algumas características aumentam o risco de morrer assassinado, ao passo que outras o diminuem. Características demográficas, como idade e sexo, contam muito. Características sociais como a educação e o estado civil também. Até características geo-políticas (em que unidade da federação) onde a pessoa mora também contam. E, como veremos, o bom uso do dinheiro público é essencial.
Não pensem que esse risco diferenciado é de hoje, dos últimos anos. Há muito tempo que é assim. Por isso, busquei dados sobre as vítimas de homicídios dos anos de 1991 e 1992 - há quase duas décadas.
No Distrito Federal houve, em 1991 e 1992, 938 homicídios, somando os dois anos. Oitocentos e quarenta eram homens, ou 89,6%. No Brasil como um todo é um pouco mais: 91,1%. Aproximando, nove em cada dez vítimas eram homens. Poucos dados sobre homicidas mostram que a grande maioria dos autores também é masculina.
As crianças têm risco baixo relativamente aos adolescentes e jovens adultos. De todas as mortes, apenas 6% eram de menores de 15 anos. Porém, aos 15 a mortalidade começava a disparar. Nos vinte anos seguintes, estão 52% dos assassinados. A frequência cumulativa mostra que aos 35, já haviam falecido 78% dos assassinados. Esse é o grupo-alvo, no qual devemos concentrar boa parte da atenção protetora das instituições e os serviços de prevenção.
O estado civil também conta e muito. O casamento protege. Ser solteiro aumenta o risco: no Distrito Federal, três de cada quatro vítimas eram solteiras. É bom saber quais as probabilidades: o x2 nos diz que a probabilidade de que essa relação seja devida ao acaso é menor do que uma em mil. O coeficiente phi, de 0,19, confirma a associação.
A educação mostra o caráter de classe dos homicídios: 93% das vítimas tinham primeiro grau ou menos, muito mais do que na população como um todo. A vitimização é um fenômeno de classe social, confirmando o encontrado em diferentes países: são pobres os que morrem, e são pobres os que matam.
Os dados nacionais permitiram análises extremamente rigorosas que demonstram que a idade, a unidade da federação e o sexo, influenciam a probabilidade de que uma pessoa seja assassinada. Estas três variáveis aumentam esta probabilidade tanto diretamente quanto em interação com as demais, duas a duas (idade x UF; idade x sexo; UF x sexo) e as três (idade x UF x sexo).
Não obstante, um dado mostra como o risco de morte muda de acordo com a unidade da federação levando em conta somente as que foram vítimas de tentativas. Essas diferenças existem há muitas décadas no Brasil. Em 1991/2, 38% das vítimas de homicídios no Distrito Federal morriam fora dos hospitais, em comparação com 63% no Brasil como um todo: morriam na rua, morriam em casa, morriam a caminho dos hospitais. O efeito das instituições governamentais e das instituições públicas se fazem sentir nesse indicador. A rapidez do atendimento é fundamental - isso vale para todas as condições que podem ameaçar a vida, desde picada de cobra, até acidente de trânsito, passando por homicídios e suicídios. A rapidez depende do número e da distribuição das ambulâncias, do fluxo do trânsito (ordenado e fluído vs. desordenado e engarrafado), do equipamento das ambulâncias, do treinamento do pessoal de primeiros socorros, da distribuição espacial dos hospitais e da sua qualidade. Dois estados com taxas de tentativas de homicídios iguais podem ter duas taxas de mortes por homicídios muito diferentes.
Mais uma vez, constatamos que bons governos salvam vidas: uns constroem, equipam seus hospitais e treinam seu pessoal; outros usam os recursos para dar emprego público a amigos, familiares e correligionários. Quem vota nesse tipo de político pode estar assinando a sua própria sentença de morte.
Publicado no Correio Braziliense, 20 de agosto de 2009
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segunda-feira, 15 de dezembro de 2008
O Banco Mundial e as políticas de combate à pobreza: o caso da Paraíba
Em um dos últimos números do Caderno CRH, revista da área de ciências sociais publicada pela UFBA, você vai encontrar um artigo de autoria do Professor Flávio Lúcio Rodrigues Vieira, da UFPB, analisando uma política de combate à pobreza apoiada pelo Banco Mundial na Paraíba. Intitulado O banco mundial e o combate à pobreza no nordeste: o caso da Paraíba, o artigo, a partir de um estudo de caso, fornece importantes elementos para uma análise mais larga das políticas de combate à pobreza. Trancrevo abaixo o resumo do artigo. Para ler o artigo completo, clique aqui.
Neste artigo, é estudada a participação do Banco Mundial no financiamento do Projeto Cooperar, um plano de combate à pobreza, em execução pelo Governo da Paraíba desde 1997. Na primeira parte, enfocamos a atuação do BIRD, analisando as mudanças ocorridas nas estratégias aplicadas no Nordeste e a crescente participação dessa instituição internacional no financiamento de políticas de desenvolvimento voltadas para a região. Procuramos enfatizar as mudanças ocorridas na estratégia do Banco Mundial voltados ao financiamento de projetos orientados pela idéia de desenvolvimento rural, experiências que foram fundamentais para o aperfeiçoamento dos mecanismos de atuação do BIRD no Brasil e que constituem elementos antecedentes da estratégia de combate à pobreza no Nordeste durante a década de 1990. Na segunda parte, a análise é orientada para o Projeto Cooperar, exemplar de política de combate à pobreza no Nordeste, quando são examinadas suas origens, sua estratégia e o nível de interferência do Banco Mundial na implementação da estratégia de desenvolvimento.
Neste artigo, é estudada a participação do Banco Mundial no financiamento do Projeto Cooperar, um plano de combate à pobreza, em execução pelo Governo da Paraíba desde 1997. Na primeira parte, enfocamos a atuação do BIRD, analisando as mudanças ocorridas nas estratégias aplicadas no Nordeste e a crescente participação dessa instituição internacional no financiamento de políticas de desenvolvimento voltadas para a região. Procuramos enfatizar as mudanças ocorridas na estratégia do Banco Mundial voltados ao financiamento de projetos orientados pela idéia de desenvolvimento rural, experiências que foram fundamentais para o aperfeiçoamento dos mecanismos de atuação do BIRD no Brasil e que constituem elementos antecedentes da estratégia de combate à pobreza no Nordeste durante a década de 1990. Na segunda parte, a análise é orientada para o Projeto Cooperar, exemplar de política de combate à pobreza no Nordeste, quando são examinadas suas origens, sua estratégia e o nível de interferência do Banco Mundial na implementação da estratégia de desenvolvimento.
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sexta-feira, 7 de novembro de 2008
A sociologia e as políticas de transferência de renda na AL
No último número de uma das mais importantes publicações acadêmicas na área de sociologia, o Annual Review of Sociology, foi publicado um estudo sobre as políticas de transferência de renda na América Latina. De autoria de Enrique Valencia Lomelí, professor titular da Universidade de Guadalajara (México), o artigo, intitulado "Las Transferencias Monetarias Condicionadas Como Política Social en América Latina. Un Balance: Aportes, Límites y Debates", está em espanhol, algo raro no prestigiado periódico. Você pode acessá-lo aqui.
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