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quinta-feira, 29 de abril de 2010

A queda da taxa de homicídios e o narcotráfico

Do Ex-Blog do César Maia transcrevo a matéria abaixo. Fornece dados para uma análise mais profunda. Vale a pena conferir!

HOMICÍDIOS CAEM NO SUDESTE E SUL COM DESLOCAMENTO DA EXPORTAÇÃO DE COCAÍNA PELA ÁFRICA!

César Maia

1. O uso do índice de homicídios dolosos por cem mil habitantes como indicativo de violência deve ser analisado num contexto geral de criminalidade. Sempre que há um elemento exógeno aos níveis internos de violência e este se relaciona diretamente com os homicídios dolosos, há que se avaliar essa condição para não se cometer equívocos. Foi o caso das máfias antes e, nas últimas três décadas e meia, do tráfico de drogas na América Latina.

2. A correlação do tráfico de drogas com mortes violentas é direta e a correlação com outros tipos de criminalidade é indireta. E quanto maior o índice por habitantes, maior a correlação. Se algum fato novo alterar a dinâmica do tráfico de drogas, a análise da criminalidade deve ser mais abrangente que a circunscrita às mortes violentas. Incluindo, portando, os demais delitos e, em especial, Roubos e Furtos, que afetam a percepção de insegurança da população.

3. O índice de homicídios dolosos vem caindo nos últimos anos no sudeste e no sul do Brasil. Há um caso especial, que é o de S. Paulo, em que à razão geral se agrega a unificação das facções que operam no tráfico de drogas, o que acentuou a queda daquele índice. A razão geral mencionada é o deslocamento do corredor de exportação de cocaína para a Europa, que, em parte, saiu dos portos e aeroportos internacionais do Sudeste e Sul para o Nordeste.

4. Isso ocorre pela mudança da porta de entrada da cocaína na Europa, que sai da Península Ibérica e passa para a África Ocidental. Por exemplo: Guiné Bissau se transformou num narcoestado. Com isso, as plataformas por ar e por mar se deslocaram para o Nordeste, facilitadas por aeronaves e barcos de médio e pequeno porte atravessando o Atlântico.

5. Os índices de homicídios dolosos cresceram em geral no Nordeste, sendo exponenciados em cidades como Salvador e Maceió, que passaram a liderar as estatísticas entre as capitais. Recife mantém esta condição desde antes, pois seu aeroporto internacional e base portuária acompanhavam a lógica do Sudeste.

6. Por isso, ao se constatar a curva decrescente dos homicídios dolosos no Sudeste e Sul nos últimos anos, deve-se, antes de qualquer conclusão precipitada (como tem ocorrido), verificar outros indicadores, entre eles os Roubos e Furtos, que evidenciam, mais ainda que os homicídios, a exposição da população à violência e ao delito.

7. A secretaria de segurança do ERJ divulgou dias atrás, para publicação da imprensa, os números relativos a Homicídios Dolosos e mostrou a curva decrescente que vem desde quase 10 anos atrás, com oscilações eventuais. A tendência tem sido essa. De forma precipitada os números foram divulgados com manchetes favoráveis, como se houvesse uma reversão do quadro de violência. Infelizmente não foi assim. Faltaram cuidados e análise das razões e do conjunto dos indicadores

sexta-feira, 5 de março de 2010

Cinema, eleições, juventude e eleições

Assisti, não faz muito tempo, ao documentário "Pro dia nascer feliz". Minha enteada, de quinze anos, também assistiu. E se identificou bastante com as alegrias, dramas e incertezas que os adolescentes expressaram no filme. Hoje, ao entrar no Blog do Alon, vi que ele fez uma ótima relação entre o documentário, a crise da juventude e o processo eleitoral que se aproxima. Meio passional, mas, vá lá!, acertando em cheio o que é substancial, o Alon aborda algumas das questões mais importantes da nossa agenda contemporânea. Assista ao trailer do ótimo documentário. Depois, leia o texto do Alon.



Um soco em boa hora (05/03)
Alon Feuerwerker
Brasília, DF - Brasil


Será que nossos modelos de eleição e de cobertura jornalística da dita cuja não estão a reproduzir na circunstância eleitoral exatamente o desenho econômico e social excludente que os políticos sem exceção dizem querer combater? E que o jornalismo teoricamente deveria criticar?

Circunstâncias profissionais fizeram eu estar sentado na noite da quarta-feira diante de um filme não propriamente novo, mas ao qual eu deveria ter dado bola antes: “Pro dia nascer feliz”, de João Jardim, lançado há três anos. Tomei um soco no estômago. E veio em boa hora.

O filme dura o tempo de um jogo de futebol e capta as realidades contrastantes de adolescentes nas extremidades sociais e regionais do Brasil. Na pauta, a educação (ou a falta dela), a cultura, a sexualidade, a violência. Bom de passar na televisão aberta em horário nobre. Logo depois da novelinha “como é verde meu vale” da vez.

Quando o comentarista político senta diante do teclado, especialmente no ano eleitoral, a tentação quase irresistível é escrever sobre a politicagem, sobre os joguinhos. “Oposição acusa Dilma de fazer campanha antes da hora”, “Ciro mantém mistério sobre se vai ser candidato a presidente ou a governador”, “PSDB não se entende sobre a vice”, “Lula diz que a eleição não vai ter terrorismo”.

E daí?

Tem também as pesquisas, E lá se vão páginas e mais páginas, manchetes sobre manchetes. As eleições transformaram-se nisto: um mar de politicagem pontilhado aqui e ali por levantamentos estatísticos de intenção de voto e escândalos –reais ou convenientemente fabricados. Só.

Parece-lhe até aqui pueril, um adjetivo incompatível com a função de colunista? Talvez seja mesmo. Mas vou correr o risco, para tentar abrir cartas novas no baralho. Uma: será que os modelos de eleição e de cobertura jornalística da dita cuja não estão a reproduzir na circunstância eleitoral exatamente o desenho econômico e social excludente que os políticos dizem querer combater? E que o jornalismo teoricamente deveria criticar?

Qual é a maior tragédia nacional? Todos têm uma opinião. Na minha modesta, é a distância galáctica entre, de um lado, a beleza de escola frequentada pelo filho do rico e do classe média e, de outro, a tristeza da “escola” oferecida ao filho do pobre. Se você discorda dessas minhas aspas, assista “Pro dia nascer feliz”.

Querem uma segunda desgraça? A expansão ainda muito lenta da rede de água e esgoto para as regiões que o eufemismo nacional chama de “carentes”. Uma terceira? A deplorável situação do transporte coletivo nas grandes cidades. Metrô escasso e ônibus caindo aos pedaços, enquanto empresários espertos, além de muito bem relacionados e sortudos em licitações, faturam os tubos.

Uma quarta? A impunidade crônica dos autores de crimes de morte. O Brasil é o país da boa relação custo-benefício para o homicida. Especialmente se é “de menor”.

Assuntos há de monte. Mas é como se os temas “populares” pertencessem a uma casta inferior. Perto da eleição, o marqueteiro talentoso e maravilhosamente bem pago com o dinheiro de doações ocultas dos sócios do Estado vai dar um jeito de mostrar como o candidato dele, sempre sorridente, “já fez muito, e fará muito mais pelas pessoas, pelos que precisam”. Quais vão ser as prioridades? “Educação, Saúde e Segurança!”. O fulano se dará inclusive ao trabalho de apresentar um “programa de governo”. Ah bom.

Pronto. Já desabafei e estou novamente em condições de voltar à rotina. Antes, fica uma pergunta aos presidenciáveis. “Quais medidas o senhor (ou senhora) adotará para igualar a qualidade da escola pública à da particular nos níveis fundamental e médio? E em quanto tempo o senhor (ou senhora) acredita que a defasagem estará superada? O senhor (ou senhora) assume esse compromisso?”

quinta-feira, 4 de março de 2010

Violência entre adolescentes

Transcrevo abaixo preocupante matéria publicada no site do CLAM. Confira!

Violência precoce


A violência entre casais no Brasil está mais precoce, menos unidirecional e assume também, nos dias atuais, um caráter mais virtual. Pesquisa recente, realizada pela Fundação Oswaldo Cruz em 10 capitais de todas as regiões do país, revelou que nove em cada 10 jovens na faixa etária entre 15 e 19 anos sofrem ou praticam variadas formas de violência – dentre as quais a exposição de fotos íntimas na internet como forma de humilhação.


Os dados coletados com 3,2 mil adolescentes expõem um elemento que se choca com o senso comum de que os homens são, geralmente, os agressores. Agressões verbais, como provocações, cenas de ciúmes e tom hostil, e investidas sexuais – como forçar o beijo ou tocar sexualmente o parceiro sem que este queira – fazem parte do arsenal de violência utilizado por ambos os sexos.


A pesquisadora do Centro Latino-Americano de Estudos de Violência e Saúde Jorge Careli (CLAVES/Fiocruz) Kathie Njaine, que coordenou a pesquisa “Violência entre namorados adolescentes: um estudo em dez capitais brasileiras”, destaca que o panorama deve ser refletido a partir de múltiplas causas. “A violência pode vir da família, da comunidade em que o jovem vive e da escola”, afirma.


Segundo o estudo, as garotas são, ao mesmo tempo, as maiores agressoras e vítimas de violência verbal. Por outro lado, em termos de violência sexual, os rapazes encabeçam as estatísticas como os maiores agressores. Enquanto 49% dos homens relatam praticar esse tipo de agressão, 32,8% das moças admitem o mesmo comportamento.


Na categoria das agressões físicas, que inclui tapa, puxão de cabelo, empurrão, soco e chute, os relatos revelam que os homens são mais vítimas do que as mulheres – 28,5% delas informam que agridem fisicamente o parceiro, enquanto 16,8% dos homens relataram o mesmo.


A violência manifestada em tom de ameaça – como provocar medo; ameaçar machucar; ou destruir algo de valor – já vitimou 24,2% de jovens, ao passo que 29,2% admitiram ter perpetrado este tipo de agressão. De acordo com os números, 33,3% das meninas assumem que ameaçam mais seus parceiros, e 22,6% destes confessam cometer o mesmo tipo de violência.


Uma das razões apontadas para a eclosão da violência entre os jovens casais é o machismo. A coordenadora da pesquisa afirma que nenhuma pessoa nasce machista, mas pode aprender e assumir esse papel dentro de um contexto cultural.


Ressaltando que o estudo teve como finalidade fazer um diagnóstico, e não buscar as causas, Kathie Njaine argumenta que a agressão cometida pelas meninas pode ser compreendida como uma maneira de reproduzir um modelo de comportamento que está no gênero masculino. “Em muitos momentos da pesquisa, havia meninas que falavam ‘se ele pode fazer, eu também posso’”, exemplifica, acrescentando que as agressões, neste caso, tornam-se uma moeda de revide.


A socióloga Bárbara Soares, pesquisadora do Centro de Estudos de Segurança e Cidadania (CESeC/UCAM) e ex-subsecretária de Segurança da Mulher do governo do Estado Rio de Janeiro, elogia o viés da pesquisa de jogar luz sobre a violência praticada por mulheres e por descartar o modelo esquemático que vilaniza apenas os homens e vitimiza as mulheres. Em geral, ela afirma, as pesquisas têm o hábito de ouvir muito pouco as pessoas que vivem e praticam violência. “Os técnicos e ideólogos definem o que é a violência e, a partir daí, imprimem esse discurso no outro que não é ouvido. A violência não é uma abstração na vida de quem sofre ou pratica. Ela é situada, significada, tem um sentido. Eu acho que é aí que você pode desconstruí-la”, diz a especialista.


De acordo com a pesquisadora do CESeC, é comum o pressuposto de que somente as mulheres apanham, mesmo que, pelas pesquisas nacionais e internacionais, elas sejam vítimas das violências mais graves. “Não quero dizer que não exista um componente de dominação. Ele existe, mas não é uma dominação do homem contra a mulher, é uma sociedade de dominação machista em que os homens também são dominados por essa lógica”, argumenta.


Violência virtual

A eclosão precoce de violência entre os casais adolescentes revela que, desde cedo, as agressões ocupam papel importante no ambiente das relações afetivas. Nos dias atuais, é ponto pacífico que o aprimoramento das técnicas e dos meios de circulação das informações contribua decisivamente para a emergência de novos tipos de violência. A internet, nestas circunstâncias, adquire relevância e torna-se uma arma virtual nas relações entre os jovens.


Fatos e comportamentos que aconteceriam no mundo real, no dia-a-dia, acompanham essa tendência e são transportados para a rede virtual. Exposição de fotos e vídeos íntimos e publicação de hostilidades em sites e redes de relacionamento – como o orkut – são alguns dos métodos que compõem o quadro de violência existente na internet. Em conseqüência, os jovens tornam-se vulneráveis socialmente, uma vez que, por exemplo, sua relação com amigos ou a procura por empregos podem ser afetadas.


Kathie Njaine enfatiza que o relacionamento via tecnologia de informação é uma constante na vida dos jovens, o que potencializa o risco de agressões. “Na medida em que você publica uma notícia na internet, isso tem uma capacidade de se disseminar amplamente. O impacto de uma humilhação ou de uma fofoca é muito grande. O grau de exposição de uma situação é alto, não só em palavras como em imagens também”, afirma.


Para Bárbara Soares, isso exige novas respostas em termos de prevenção. “Todos os problemas vão se transformando na medida em que os meios de comunicação de relações interpessoais se transformam. Atualmente, muitos problemas se transferiram para a dimensão do espetáculo, da visibilidade, da exposição pública do crime mais banal até as relações íntimas. Então, acho que é preciso repensar em primeiro lugar a própria noção do que seja violência, atualizando o repertório que faz parte do nosso catálogo, e começar a refletir formas específicas de prevenir mais este tipo de violência”, explica a socióloga.


De acordo com ela, a exposição de imagens íntimas afeta mais as mulheres, porque envolve uma cultura de privacidade, pudor e do uso da pessoa como um objeto do prazer. Para os homens, em contraposição, predomina a valorização de sua potência sexual, vista como um troféu a ser exibido.


“O telefone celular e a internet são tecnologias que estão mudando a nossa sociabilidade, nossos comportamentos e pensamentos. Há uma noção de que você só existe se, de alguma forma, for visível. No entanto, há risco de que essa visibilidade seja mais um elemento de violência”, acrescenta Bárbara, reforçando que as campanhas de prevenção precisam ter um olhar mais amplo, menos maniqueísta e menos esquemático e que considerem a violência e suas múltiplas causas e linguagens.


Publicada em: 03/03/2010 às 12:00 notícias CLAM

segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

Como reduzir a violência?

Com trabalho preventivo, responde uma autoridade municipal argentina, o intendente de Villa Gessel, Jorge Rodriguez Erneta, em entrevista concedida ao jornal Página 12. Para nós, no Brasil, que pensamos que, sim, os municípios não só podem, como devem, atuar fortemente na área de segurança pública, a entrevista não deixa de ser interessante. Confira-a aqui (em espanhol).

terça-feira, 5 de janeiro de 2010

O marketing não vence a violência

Nos últimos tempos, especialmente nas eleições, somos bombardeados com propostas de copiar uma suposta fórmula exitosa de enfrentar a violência testada na Colômbia. Pois não é que agora, depois de tanta propaganda, os levantamentos apontam um recrudescimento do número de homicídios? Confira na matéria abaixo. O texto, traduzido do espanhol, foi-me enviado pelo Ex-Blog do César Maia.

CRESCEM OS HOMICÍDIOS EM MEDELLÍN E CALI! NÚMEROS NÃO BATEM COM A PROPAGANDA!

(El Tiempo, 04) 1. O total de assassinatos na Colômbia, em 2009, foi de 15.817 ou 32 mortes por 100 mil habitantes. Em Medellín houve um aumento de 64% e foram 1.432 homicídios (obs.: o que alcança 62 por 100 mil se for na cidade e 41 por 100 mil se for na região metropolitana). Em Cali o aumento foi de 17% alcançando 1.615 homicídios (obs.: 75 por 100 mil se for na cidade e 57 por 100 mil se for na região metropolitana). Na região do 'Valle' (obs.: onde opera o mais violento cartel de cocaína hoje e que tem Cali como capital) foram 2.997 assassinatos ou 52 por 100 mil habitantes.

2. Em essência, o narcotráfico e situações conexas, como os ajustes de contas; o controle das áreas de cultivo; os corredores para sacar a droga; e o manejo das chamadas 'ollas' ou 'plazas' nas cidades são, entre outras, as causas dos homicídios, segundo a Polícia.

3. Oito de cada dez casos de homicídios foram cometidos com armas de fogo. Dos 15.817 assassinatos, 16 por cento destes (2.467) foram provocados com arma branca. O sicariato, que se fez mais visível nas cidades por assuntos de narcotráfico, representou 6.999 mortes (44,2% do total). Outros 768 homicídios ocorreram em assaltos (4,9%), 213 por ataques de grupos armados ilegais, e 139 ocasionados por gangues emergentes. A parte das vítimas mais afetada por idade foi a compreendida entre os 18 e 32 anos. O informe da Polícia não menciona Bogotá, mas em 2009 chagaram a 1.628 (mais 11%), (obs.: 24 por 100 mil), segundo a Medicina Legal.

domingo, 3 de janeiro de 2010

Os garimpeiros brasileiros no Suriname

Dois dos principais jornais brasileiros, Folha e Estado de São Paulo, publicam, nas edições de hoje, reportagens sobre a situação dos garimpeiros brasileiros que buscam ouro nas terras do Suriname. Como você sabe, recentemente os brasileiros foram alvo de um ataque dos maroons ("marrons"), afro-decendentes locais que têm acumulado ressentimentos contra os nossos conterrâneos.

A reportagem da Folha, indisponível para quem não é assinante do jornal ou do UOL, retrata diversos anglos do conflito. E trata, com competência, de uma faces do problema dos garimpos na área: o crescimento do uso do crack pelos mineradores. É uma história aterradora.

Já a matéria do Estadão, dado que disponível livremente no site do jornal, transcrevo mais abaixo.

A saga dos garimpeiros brasileiros
De Serra Pelada ao Suriname, eles vivem em constante deslocamento
Leonencio Nossa, BRASÍLIA

Eles vivem a aventura e o drama da exploração de ouro há pelo menos 40 anos. Os garimpeiros atacados no Suriname no final de 2009 fazem parte de um grupo de brasileiros nômades que estão em constante deslocamento desde a década de 1970. Fugindo das secas, milhares de homens deixaram naquela época o sertão nordestino e os chapadões maranhenses e atravessaram o rio Tocantins em busca de ocupação nas clareiras abertas na Floresta Amazônica.

A primeira parada foi no Sul do Pará, onde trabalharam em canteiros das obras da Transamazônica e da hidrelétrica de Tucuruí. Ainda na região, eles atuaram nos garimpos das margens dos rios Itacaiúnas, Araguaia, Tocantins e Vermelho. Foi precisamente em Serra Pelada, a partir de 1980, que mais de 40 mil deles ficaram conhecidos no Brasil e no exterior. O garimpo, que era controlado por homens do regime militar (1964-1985), encheu os cofres do Banco Central durante uma época de crise econômica internacional.

Com o declínio da mina poucos anos depois e da própria ditadura, os garimpeiros seguiram para as margens do rio Xingu, onde trabalharam no não menos lendário garimpo do Creporizão, em Itaituba. Lá, reinou José Cândido de Araújo, o Zé Arara, um dos tantos personagens que surgiram nos telejornais ostentando pescoços e bocas cheias de ouro. Zé Arara foi mais longe: chegou a contar com uma frota de aviões.

Uma parte dos garimpeiros ficou em volta de Serra Pelada, servindo de massa para entidades políticas que chegaram à região, como o Movimento dos Sem-Terra (MST). Outra leva desses garimpeiros foi mais longe, alcançando as terras dos índios ianomâmis, em Roraima, e as margens do Madeira, em Rondônia.

O aumento da fiscalização de órgãos ambientais nos anos 1990 veio junto com a queda do preço do ouro e da produção dos garimpos da Amazônia brasileira. Esse rigor dos agentes públicos e a presença do Estado nos grotões da região, no entanto, deram novo gás ao êxodo dos garimpeiros. Eles acabaram, então, ultrapassando as fronteiras do País, refugiando-se no Suriname, na Guiana e na Guiana Francesa.

DIÁLOGO

O secretário nacional de Justiça, Romeu Tuma Filho, estima que 18 mil brasileiros vivem em situação precária nos garimpos do Suriname. O governo enviou, ao longo dos anos, diversos representantes para conhecer as minas do país vizinho e a realidade dos imigrantes brasileiros. São homens - e também mulheres - que não têm sua situação regularizada e estão sob controle de milícias e máfias dos garimpos.

O diálogo entre os dois governos é afetado pela fraca estrutura do Estado surinamês. "Tenho a impressão de que o que ocorreu em Albina não foi um caso isolado", afirma Tuma Filho. "Os brasileiros que estão lá vivem em condições sub-humanas", acrescenta. O secretário ressalta que a solução para o problema é sempre demorada por questões diplomáticas. "Não se pode desrespeitar a soberania dos outros", conclui Tuma Filho.

"Eles não conhecem fronteiras", diz a diretora do departamento de Estrangeiros do Ministério da Justiça, Izaura Miranda, que tem acompanhado nos últimos anos a trajetória desses garimpeiros. Ela acompanhou o auge dos garimpos paraenses, conheceu Zé Arara - além de outras dezenas de mitos - e tem na memória relatos sobre uma série de massacres que ocorreram nas minas da região amazônicas nas últimas duas décadas.

Izaura ressalta as dificuldades do Suriname de colocar em prática os acordos firmados com o Brasil com o objetivo de regularizar a situação desses trabalhadores. Ilegais, os garimpeiros são alvos fáceis da máfia do trabalho escravo e do tráfico de pessoas, observa.

terça-feira, 29 de dezembro de 2009

Entrevista com Ignacio Cano

Ignacio Cano, professor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro e pesquisador do Laboratório de Análises da Violência, da mesma instituição, é um dos mais destacados investigadores da criminalidade violenta no Brasil contemporâneo. Na edição de hoje do jornal espanhol El País, ele concede uma interessante entrevista. Nela, dentre outras coisas, posiciona-se em relação à legalização das drogas. Vale a pena conferir (em espanhol)! Acesse aqui.

quarta-feira, 23 de dezembro de 2009

Legalização das drogas: a posição corajosa do Deputado Paulo Teixeira (PT)

O Deputado Paulo Teixeira (PT-SP) tem assumido, com surpreendente coragem se levarmos em conta a média dos políticos brasileiros, a proposta de descriminalizar o uso das drogas. No vídeo abaixo, uma entrevista concedida pelo deputado ao jornalista Alon Feuerwerker. Feuerwerker, como vocês sabem, pilota um blog (Blog do Alon), é colunista do Correio Brasiliense e, de uns tempos prá cá, ancora o programa "Jogo do Poder", que é transmitido pela CNT, mas que você pode encontrar também no you tube.

segunda-feira, 21 de dezembro de 2009

Evangélicos traficantes?

Ficastes espantado? Pois não se trata de ficção, o casamento entre neopentencostais e traficantes é o mais novo dado de determinadas partes do Rio de Janeiro. Confira aqui artigo publicado na Revista Plural, da USP, tratando do assunto.

quinta-feira, 26 de novembro de 2009

Vulnerabilidade juvenil

Reeproduzo mais abaixo o editorial de hoje do jornal Folha de São Paulo. O tema é de interesse de todos nós, preocupados com a cidadania no país.

Violência e juventude

DUAS PESQUISAS realizadas a pedido do Ministério da Justiça ajudam a tornar mais preciso o diagnóstico que relaciona os altos índices de violência do país a seus principais protagonistas e vítimas, os jovens. Dos entrevistados, entre 12 e 29 anos, 30% estão em constante contato com a violência. São agredidos, testemunham assassinatos e abusos policiais, têm fácil acesso a armas de fogo.
O retrato é preocupante, mas é também necessário evitar "a sensação de caos paralisante", na expressão de Renato Sérgio de Lima, secretário do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, que coordenou os levantamentos.
Há motivos ponderáveis para crer na perspectiva de melhora gradual do atual cenário. O fenômeno da violência é intenso, porém localizado, dizem os especialistas. Geograficamente, os jovens são hoje mais vulneráveis em cidades médias do que nas grandes cidades do centro-sul do país, exceção feita ao Rio. No corte de renda, como se sabe, as principais vítimas são pobres.
Mas são sobretudo jovens. Esse fato, por si só perverso, é também o que aponta para a possibilidade de melhorias. Estudos demonstram que a evolução demográfica em curso -com o envelhecimento da população e a consequente diminuição da proporção de jovens- associada ao aumento da escolaridade média e da frequência escolar têm forte impacto negativo nos índices de violência e criminalidade.
Tendências demográficas ajudam, decerto, mas as autoridades também precisam fazer a sua parte. Além de constante investimento em segurança, urge melhorar a qualidade e a atratividade das escolas, atendendo à população desde os anos anteriores à alfabetização até a conclusão do ensino médio.

quarta-feira, 25 de novembro de 2009

Violência contra a mulher: quem denuncia

Transcrevo abaixo interessante matéria, disponível no UOL, a respeito do perfil das mulheres que denunciam a violência de gênero. Vale a pena conferir!

Maioria das mulheres que denunciam violência é negra, casada e tem entre 20 e 40 anos
Paula Laboissière
Da Agência Brasil
Em Brasília

A maioria das mulheres que buscaram a Central de Atendimento à Mulher (Disque 180) entre 2007 e 2009 é negra (43,3%), tem entre 20 e 40 anos (56%), está casada ou em união estável (52%) e possui nível médio (25%).

Os dados, divulgados hoje (25) pela Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres, indicam que 93% do total de denúncias foram feitas pelas próprias vítimas. A maioria dos casos (78%) é de crimes de lesão corporal leve e ameaça. A metade dos agressores são cônjuges das vítimas.

Outro destaque do balanço indica que 69% das mulheres que recorreram ao serviço relataram sofrer agressões diariamente e que 34% delas se sentem em risco de morte. Em meio aos agressores, 39% não fazem uso de substâncias entorpecentes ou de álcool e 33% vivem com a vítima há mais de dez anos.

Dos 86.844 relatos de violência, registrados entre 2007 e 2009, 53.120 foram de violência física, 23.878 de violência psicológica, 6.525 de violência moral, 1.645 de violência sexual, 1.226 de violência contra patrimônio, 389 de cárcere privado e 61 de tráfico de mulheres.

Apenas entre janeiro e outubro de 2009, a Central de Atendimento à Mulher registrou 269.258 denúncias - um aumento de 25% em relação ao mesmo período de 2008, quando houve 216.035. Do total de atendimentos, 47% foram buscas por informações sobre a Lei Maria da Penha, com 127.461 atendimentos.

segunda-feira, 23 de novembro de 2009

Violência contra a mulher na Argentina

A cada 36 horas, neste ano, uma mulher foi morta na Argentina. Ficastes estarrecido? Saibas que os dados do Brasil não são melhores... É um feminicídio. Depois comentamos, com ar de superioridade, a ignomia da violência contra a mulher nos países islamicos.

Leia aqui a matéria sobre a violência contra a mulher na Argentina.

sexta-feira, 20 de novembro de 2009

Por um celular...


A foto que estampa este post, de autoria de Adenilson Nunes, mostra o momento em que um rapaz, que fugia da polícia baiana após ter roubado um celular, pula uma altura de dois metros em uma movimentada rua de Salvador.

quarta-feira, 11 de novembro de 2009

Merecemos a polícia que temos?

Ministrei aulas em academias de polícia e já orientei (bons) trabalhos acadêmicos de policiais civis e militares. Essa aproximação não me fez menos crítico dos (graves) problemas de nossas polícias. Muito pelo contrário! Não perco oportunidades, em contato com policiais (individualmente ou em coletivos), de apontar a necessidade do enfrentamento, por parte da cidadania e dos próprios corpos policiais, desses problemas.

E há, no meio policial, muita gente que se dá conta da necessidade de uma redefinição do trabalho policial para que a instituição conquiste e amplie sua legitimidade social. Tanto é assim que, recentemente, de forma muito corajosa, um oficial da PM do RN escreveu uma dissertação de mestrado estabelecendo uma relação entre a violência policial e a formação que é oferecida aos novos soldados no estado. Fui o orientador desse trabalho.


Por outro lado, mesmo entre os corpos dirigentes, existem os que preferem não "perder" tempo com essas questões. Não é raro que, em conversa com oficiais ou com autoridades policiais, obtenha a seguinte resposta: "mas isso é cultural. A sociedade quer que a polícia seja assim..." Outra vezes: "Não, professor, não é a polícia que é violenta, mas a sociedade brasileira...".

Bom... Mas deixemos de coisa... O que escrevi acima foi apenas uma introdução para levá-lo a tomar em conta o meu convite para que você leia o texto abaixo, retirado do site de Marcos Rolim, especialista em segurança pública.


DESACATO AO CIDADÃO
Marcos Rolim


O 9º Batalhão da Brigada Militar tem pelo menos dois sargentos com pouco serviço. Na última segunda, às 11h30, o repórter do Canal Rural da RBS, Gustavo Bonato, 27 anos, fez o sinal para atravessar a rua na faixa de segurança, no centro de Porto Alegre.
Os carros pararam, menos a viatura nº 6427, onde estavam os Sgs. Alex e Nilo, que se deslocava em baixa velocidade, sirene e giroflex desativados. Obrigado a parar no meio da faixa de segurança, Gustavo disse ao motorista: –“Policial deve dar o exemplo e parar na faixa”. A viatura, então, parou em fila dupla e Gustavo foi abordado: “-O que tu disse (sic), magrão?” - “Disse que os policiais devem dar o exemplo”, respondeu o repórter. – “Palhaço...viaturas têm preferência em atendimento à ocorrência”. – “Se vocês estão atendendo a uma ocorrência, então estão perdendo tempo”, disse Gustavo. – “Sim, estou perdendo tempo com um palhaço”, disse o Sargento. Aí Gustavo foi “convidado” a entrar na viatura para ir ao batalhão. No deslocamento, ao verem que a identidade do repórter era do Paraná, um dos policiais disse: -“Esse deve ser um meliante do PR que veio aqui chineliá (sic) com a gente”. No batalhão, Gustavo foi revistado, mãos na parede, etc. Meia hora depois, estava “liberado”. Gustavo morou na Suíça, um lugar onde pedestres têm preferência e onde policiais prestam contas do que fazem. Nas horas vagas, os policiais suíços prendem cineastas acusados de estupro ou desmontam versões fantasiosas como a daquela brasileira que se autoflagelou. Na maior parte do tempo, como ocorre com as melhores polícias do mundo, atendem às demandas do público com respeito e extremo zelo. O fazem não apenas porque são mais educados, bem pagos e mais bem formados, mas porque sabem que uma polícia que não for admirada pela cidadania é uma instituição imprestável. A arma mais importante de qualquer polícia é a informação e o povo é a fonte onde se deve buscá-la. Se a população admira sua polícia, presta informações. Quando teme sua polícia e desconfia dela, se cala. Em 1829, Sir Robert Peel, o fundador da Polícia londrina, formulou os 9 princípios que, desde então, orientam o policiamento britânico. O mais conhecido deles assinala: “A polícia deve manter o relacionamento com o público que assegure realidade à histórica tradição pela qual a polícia é o público e o público é a polícia”. Na Inglaterra, certa feita, minha filha mais velha se envolveu em um acidente com sua bicicleta. O erro foi dela e o motorista se comportou corretamente, chamando a ambulância. No fim das contas, sobraram apenas alguns arranhões e o susto. No dia seguinte, dois policiais estiveram em minha casa. Abri a porta, apreensivo, imaginando algum tipo de problema. Eles haviam sido informados do acidente e perguntaram por minha filha. – “Ela está bem?” – “Sim, respondi, está tudo bem”. – “Que bom”, disseram, “somos os policiais deste bairro; se precisar, o senhor pode nos chamar por este número”, me passaram o celular e me desejaram bom dia. A autoridade das polícias britânicas se formou assim e assim é mantida. Policiais são servidores do povo. Informam a população, pedem desculpas quando erram, pedem “por favor”, auxiliam as vítimas. Uma polícia incapaz disto é, na melhor das hipóteses, um desperdício e, na pior, uma ameaça. O que ocorreu com Gustavo Bonato não é um caso isolado, é a regra. Se fosse em uma vila, teria sido muito pior. E se calarmos diante de coisas assim, então tudo será sempre pior.

sexta-feira, 30 de outubro de 2009

Perplexidade

Discutimos, hoje, em sala de aula o fato noticiado nas matérias abaixo colocadas. A discussão em pauta era a "dominação masculina", embalada pela leitura do conhecido livro de Pierre Bourdieu. Quando tomei conhecimento do assunto, fiquei entre o choque e revolta impotente. Confira!

Aluna é vítima de assédio em massa
Ela foi acuada em universidade em São Paulo por um grupo de estudantes por causa do vestido que usava
Ana Bizzotto – O Estado SP

Uma estudante do 1º ano de Turismo do período noturno do câmpus ABC da Universidade Bandeirantes de São Paulo (Uniban), em São Bernardo do Campo, foi xingada e acuada por um grupo expressivo de estudantes no prédio onde estuda por causa do comprimento do vestido que usava. O fato ocorreu no dia 22 e ganhou repercussão nesta semana pelo YouTube, onde foram publicados vídeos que registraram o episódio. O conteúdo foi retirado a pedido da universidade.
Segundo as cenas e os depoimentos de presentes, o tumulto começou quando a aluna subia por uma rampa até o terceiro andar e os alunos começaram a gritar. Ela ficou trancada em uma sala e, com a ajuda de um professor e colegas, chamou a polícia, que a escoltou até a saída da universidade. A estudante, de 20 anos, pediu para que seu nome não fosse divulgado.
“Costumo usar vestidos curtos e calças apertadas, assim como outras meninas. Naquele dia, tinha pegado ônibus, andado na rua e ninguém disse nada”, contou a estudante. “Eles estavam possuídos, fiquei com muito medo”, relatou.


A Uniban, em nota, disse que instaurou sindicância. “Alunos, professores, seguranças e também a aluna estão sendo ouvidos individualmente”, informou. A universidade “pretende aplicar medidas disciplinares aos causadores do tumulto, conforme o regimento interno”.
O comandante da 2ª Companhia do 6º Batalhão da PM, capitão Cotta, informou que a polícia foi chamada porque a estudante “estava sendo impedida de sair da sala”. Quando os policiais chegaram, a aluna já estava com um jaleco branco que tampava a roupa que usava. “Ela não quis registrar boletim de ocorrência nem ir à delegacia, só queria ser acompanhada até sua casa. A Uniban também não solicitou ocorrência.”


“Ela veio com um vestidinho rosa da pesada, daqueles que se usa com calça legging, só que sem a calça”, disse o estudante de Matemática Pedro Adair, de 23 anos. “Os três andares da faculdade subiram atrás dela. O pessoal parecia estar no tempo das cavernas, só faltou arrastá-la pelos cabelos”, completou Pedro, que considera que o episódio foi uma “brincadeira que passou dos limites”.


Uma estudante de Pedagogia que se identificou como Simone estava no prédio na hora. “Eles ficaram gritando “puta” para ela. Fui lá ver também e até tomei spray de pimenta que a polícia jogou”, contou.


VIOLÊNCIA DE GÊNERO

Especialistas ouvidos pela reportagem disseram que, se tivesse ficado nua, a estudante poderia ter cometido crime de atentado ao pudor. “Mas nada justifica a reação exagerada. Isso retrata violência de gênero, culpar a mulher pela agressão”, afirma a coordenadora executiva da ONG Rede Mulher de Educação, Vera Vieira.


De acordo com Charles Martins, assessor de educação da ONG Plan Brasil, que estuda a violência nas escolas do país, “ainda que a estudante tenha quebrado padrões de conduta, não pode ser aceitável a agressão como resposta”.
O episódio motivou a criação de fóruns na internet. Entre comentários, pessoas dizem que a aluna foi vítima de intolerância.


Alunos relataram ainda que no início do ano uma outra confusão aconteceu no mesmo câmpus. Uma aluna teria sido agredida por não ter aceitado participar de um protesto contra a mudança nas avaliação da universidade.


”Linchamento” da estudante reflete problemas sociais
Fernanda Aranda – O Estado SP

O “linchamento moral” sofrido pela estudante da Uniban reflete dois problemas sociais, avaliam especialistas. O primeiro é o machismo que justifica a agressão contra a mulher por uma suposta falha. O outro é a invasão da violência nas instituições de ensino.
“O episódio pode mostrar a bagagem que estes alunos trazem da fase escolar”, acredita Charles Martins, assessor de educação da Plan, entidade internacional que trabalha contra violência nas escolas. “Toda forma de violência tem histórico e o nosso mostra que a quebra de valores começa na escola.”
A coordenadora do Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária (Cenpec), Eloísa de Lasis, também afirma que o caso da Uniban não pode ser encarado de forma isolada. “Enxergar e debater o ocorrido como um sintoma social pode nos ajudar a entender como um espaço de ensino se torna um espaço de violência”, conclui.


"Fiquei muito assustada, chorei, entrei em desespero”
Entrevista – Estudante, de 20 anos, do 1.º ano do curso de Turismo da Uniban
Afra Balazina – O Estado SP

O que aconteceu?
Eu estava com um vestido curto, que já havia usado outras vezes na aula. Sempre recebi elogios, nunca nada ofensivo. Quando estava na rampa e vi o pessoal assobiando e elogiando, fiquei com vergonha. Depois, quando fui ao banheiro, começou o tumulto. Cada vez chegava mais gente. Ameaçaram invadir a sala, chutaram a porta, quebraram a maçaneta. Tentaram passar a mão em mim, tiraram fotos e ficaram gritando que iam me pegar.
Como você se sentiu?
Fiquei muito assustada, chorei, entrei em desespero. Eles estavam possuídos. Fui ofendida por gente que nem me conhece e por meninas que moram perto de mim.
O que você pretende fazer agora?
Não estou indo à aula por medo, mas quero voltar – e de cabeça erguida. Quero ouvir o que a faculdade tem a dizer, porque eles não pensaram em nos proteger. Dependendo do que eles disserem, eu vou processá-los, sim.

segunda-feira, 19 de outubro de 2009

Mais um capítulo da luta de classes nas escolas de Natal

Sexta-feira passada, na abertura oficial dos Jogos Estudantis do RN (JERNs), novos confrontos envolvendo estudantes de escolas públicas de Natal. Havia postado, dias antes, um comentário sobre esse tipo de evento (confira aqui). Prometo voltar logo que tiver mais. Por enquanto, convido-te a ler o texto abaixo, escrito por Alysson Thiago, bolsista do PET de Ciências Sociais da UFRN.

Vândalos?
Alysson Thiago

Mais uma vez, hoje, em virtude das já esperadas confusões na abertura dos JERN’s, a imprensa local aproveitou para destilar o pânico da desordem, provocada por grupos de adolescentes “descontrolados” à procura de baderna.

Em sua breve
análise, você apontou coisas interessantes que, na maior parte das vezes, escapam aos analistas e apresentadores da imprensa norte-rio-grandense. Pelo fato destes - talvez pelo ímpeto de emitir juízos e a obrigatoriedade de elaborar opiniões rápidas e de fácil e imediata absorção – tenderem a olhar para a realidade como algo imediatamente apreensível, óbvio, que basta bater os olhos em alguma reportagem, ouvir alguns relatos oculares e, pronto; o mundo, seus eventos e questões estão devidamente compreendidos pelo “conhecimento imediato”.

Deixando de lado a epistemologia de botequim. O que me parece curioso nessa tida “onda de baderna” é confrontar a compreensão imediata e apressada da imprensa com uma compreensão mais paciente e minimamente orientada do ponto de vista teórico.

Em nome da defesa da integridade da boa sociedade, dos bons valores amistosos do esporte e da escola e da crença na racionalidade destes últimos, a primeira coisa que alguns analistas fazem, é enquadrar as torcidas organizadas ou as gangues colegiais como irracionais, semi-bárbaras, isto é, como o “outro” da racionalidade do Estado, dos cidadãos comportados e etc.

Porém,nada me parece mais falso do que avaliar as T.O., ou essas “gangues escolares” como irracionais. Ora, as relações de agressividade e de inimizades que esses grupos estabelecem são orientadas, reflexivamente, por códigos, signos e “repertórios culturais”, como você bem assinalou, mas que, a meu ver, não só mediam suas reinvidicações por “um lugar no mundo”. Esses esquemas definem também os que são amigos e os inimigos - qualquer semelhança com a noção do político de Carl Schmmitt não é um abuso. Isto significa que, em vez da violência ser o resultado dos impulsos de uma horda juvenil descontrolada que ameaça a integridade do laço social e do poder das autoridades paternas. Na verdade, ela é orientada, dirigida e racionalizada pelas relações que os envolvidos estabelecem entre si, com suas insatisfações e expectativas, com o território, com as roupas e seus corpos, com os eventos de visibilidade local e etc.

Obviamente, que a recorrência dessas brigas entre adolescentes, em nossa cidade, está relacionada a um contexto de insegurança social e precariedade. Mais isso não explica tudo. A exigência de visibilidade, de sucesso e de se destacar, cada vez mais explícita e ofensiva, que nossa sociedade intima, sedutoramente, a todos, tem suas conseqüências não intencionais. Ora, como as brigas nos estádios diminuíram, em virtude do maior policiamento e do trabalho das próprias Organizadas, o foco do conflito se deslocou e se recompôs em sua visibilidade. Os adolescentes encontraram um novo espaço e cenário para suas performances.

As T. O. entram como uma forma de justificação, classificação e orientação para a ação. Pois, para o “Floca” ser inimigo do Ateneu é preciso uma razão que justifique para os agentes os motivos da inimizade e do porquê “eles devem apanhar”. As T.O. fornecem os esquemas de construção desses sentidos para a violência através da definição da política de amizade e de inimigos. A relação com as torcidas organizadas é, a um só tempo, um simulacro e uma relação com o "pré-reflexivo" que organiza os consensos, as condutas e etc.

Acabei me alongando por demais, porém, ainda cabe uma provocação; e se os jovens envolvidos fossem alunos do Marista, do Salesiano ou do CEI, será que os nossos jornalistas, estes advogados da gorda civilidade, os chamariam de bandidos e bárbaros? Será que a idéia de jovens pobres juntos não assusta mais, como que invocasse aquele pavor primitivo dos bandos? Bem, o que parece é que alguns adjetivos são mais corretos quando aplicados sobre determinadas classes.

quarta-feira, 7 de outubro de 2009

Homicídios e políticas públicas

Gláucio Ary Dillon Soares dispensa maiores apresentações. É um dos cientistas sociais que analisa com mais desassombro e menos concessão ao politicamente correto as temáticas do crime e da violência no nosso país. Por isso, republico, mais abaixo, artigo de sua autoria. Confira!


Quem vai morrer assassinado?
Gláucio Ary Dillon Soares

Algumas características aumentam o risco de morrer assassinado, ao passo que outras o diminuem. Características demográficas, como idade e sexo, contam muito. Características sociais como a educação e o estado civil também. Até características geo-políticas (em que unidade da federação) onde a pessoa mora também contam. E, como veremos, o bom uso do dinheiro público é essencial.

Não pensem que esse risco diferenciado é de hoje, dos últimos anos. Há muito tempo que é assim. Por isso, busquei dados sobre as vítimas de homicídios dos anos de 1991 e 1992 - há quase duas décadas.

No Distrito Federal houve, em 1991 e 1992, 938 homicídios, somando os dois anos. Oitocentos e quarenta eram homens, ou 89,6%. No Brasil como um todo é um pouco mais: 91,1%. Aproximando, nove em cada dez vítimas eram homens. Poucos dados sobre homicidas mostram que a grande maioria dos autores também é masculina.

As crianças têm risco baixo relativamente aos adolescentes e jovens adultos. De todas as mortes, apenas 6% eram de menores de 15 anos. Porém, aos 15 a mortalidade começava a disparar. Nos vinte anos seguintes, estão 52% dos assassinados. A frequência cumulativa mostra que aos 35, já haviam falecido 78% dos assassinados. Esse é o grupo-alvo, no qual devemos concentrar boa parte da atenção protetora das instituições e os serviços de prevenção.

O estado civil também conta e muito. O casamento protege. Ser solteiro aumenta o risco: no Distrito Federal, três de cada quatro vítimas eram solteiras. É bom saber quais as probabilidades: o x2 nos diz que a probabilidade de que essa relação seja devida ao acaso é menor do que uma em mil. O coeficiente phi, de 0,19, confirma a associação.

A educação mostra o caráter de classe dos homicídios: 93% das vítimas tinham primeiro grau ou menos, muito mais do que na população como um todo. A vitimização é um fenômeno de classe social, confirmando o encontrado em diferentes países: são pobres os que morrem, e são pobres os que matam.

Os dados nacionais permitiram análises extremamente rigorosas que demonstram que a idade, a unidade da federação e o sexo, influenciam a probabilidade de que uma pessoa seja assassinada. Estas três variáveis aumentam esta probabilidade tanto diretamente quanto em interação com as demais, duas a duas (idade x UF; idade x sexo; UF x sexo) e as três (idade x UF x sexo).

Não obstante, um dado mostra como o risco de morte muda de acordo com a unidade da federação levando em conta somente as que foram vítimas de tentativas. Essas diferenças existem há muitas décadas no Brasil. Em 1991/2, 38% das vítimas de homicídios no Distrito Federal morriam fora dos hospitais, em comparação com 63% no Brasil como um todo: morriam na rua, morriam em casa, morriam a caminho dos hospitais. O efeito das instituições governamentais e das instituições públicas se fazem sentir nesse indicador. A rapidez do atendimento é fundamental - isso vale para todas as condições que podem ameaçar a vida, desde picada de cobra, até acidente de trânsito, passando por homicídios e suicídios. A rapidez depende do número e da distribuição das ambulâncias, do fluxo do trânsito (ordenado e fluído vs. desordenado e engarrafado), do equipamento das ambulâncias, do treinamento do pessoal de primeiros socorros, da distribuição espacial dos hospitais e da sua qualidade. Dois estados com taxas de tentativas de homicídios iguais podem ter duas taxas de mortes por homicídios muito diferentes.

Mais uma vez, constatamos que bons governos salvam vidas: uns constroem, equipam seus hospitais e treinam seu pessoal; outros usam os recursos para dar emprego público a amigos, familiares e correligionários. Quem vota nesse tipo de político pode estar assinando a sua própria sentença de morte.

Publicado no Correio Braziliense, 20 de agosto de 2009

terça-feira, 1 de setembro de 2009

Um livro para referenciar o debate sobre violência e economia


No edição do último final de semana do jornal Valor Econômico, o Professor Ricardo Abramovay (FEA-USP) fez uma competente resenha de um livro do qual Douglas North é um dos autores. Com a verve de sempre, Abramovay nos convence da necessidade de comprar e ler imediatamente a obra.

terça-feira, 11 de agosto de 2009

Para não esquecer...

Transcrevo mais abaixo matéria publicada na Radioagência (está também disponível em áudio). Trata da Chacina da Candelária, uma das páginas mais tristes da violência contra crianças e adolescentes no Brasil.

Chacina da Candelária completa 16 anos, Polícia continua com ações truculentas
A chacina da Candelária completa 16 anos nesta quinta-feira (23). O massacre que chocou o país aconteceu na madrugada do dia 23 de julho de 1993, quando policiais militares executaram oito meninos que dormiam próximos à Igreja da Candelária, localizada no centro da cidade do Rio de Janeiro. Nesta sexta-feira (24), um ato ecumênico vai homenagear os mortos. Até hoje, o motivo do massacre não foi esclarecido.

Um dos diretores da Associação de Moradores do Morro do Estado, Sebastião José de Souza, concorda que todo ano é preciso lembrar acontecimentos como esse, pois, segundo ele, a polícia continua agindo de forma truculenta.

“Nós queremos não só justiça, como chamar [a atenção] dos brasileiros e do mundo de como a pobreza é discriminada, massacrada e exterminada nesse país chamado Brasil.”

Souza ainda lamentou dizendo que não existe uma política clara de segurança no país.

Também nesta sexta, a população da favela do Morro do Estado, em Niterói (RJ), organiza um ato para exigir que sejam punidos os policiais que, em dezembro de 2005, executaram cinco moradores da favela – entre eles quatro menores.

O laudo do Instituto de Criminalística Carlos Éboli (ICCE) comprovou que os cinco foram mortos com disparos à curta distância, o que configura indícios de execução. O julgamento dos militares está marcado para o dia 28 de julho.

Esta semana, um estudo da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ) revelou que o estado do Rio tem o maior número de adolescentes assassinados em todo o país.

De São Paulo, da Radioagência NP, Desirèe Luíse.

segunda-feira, 13 de abril de 2009

A instigante e questionadora arte de Kara Walker


Ela foi apontada pela revista Time como uma das cem pessoas mais influentes do mundo, em 2008. Nascida em 1969, a artista plática Kara Walker se notabilizou pela produção de obras que tematizam a violência contra os negros e as mulheres. Veja mais abaixo alguns dos seus quadros!