sexta-feira, 27 de fevereiro de 2009
Entrevista com Pedro Demo
Leia abaixo trechos de uma entrevista concedida pelo Professor Pedro Demo à revista Desafios do Desenvolvimento, do IPEA.
Desafios - Ao observar a história econômica brasileira, percebemos a aplicação de alguns grandes modelos de desenvolvimento durante determinados períodos de tempo, da substituição de importações e industrialização após a crise de 1929 à abertura de mercados e privatizações da década de 1990. Estamos, nos últimos anos, diante de um novo modelo de desenvolvimento econômico?
Pedro Demo - Vivemos hoje um período com novidades bastante interessantes. Lula e o PT mudaram bastante, mas para mim não deixa de ser uma grande surpresa o governo Lula ameaçado de ser considerado o melhor governo republicano da história do País. Tudo bem, ainda que tenhamos que reconhecer que o êxito dele seja pela direita, e não pela esquerda, e isso seja algo muito interessante que acho que vai dar muita tese de mestrado e doutorado. As idéias que colocaram uma sedimentação forte nessa proposta envolvem, primordialmente, um certo alinhamento da economia com o mercado, com a estabilidade, com o combate à inflação. A própria presença do [presidente Henrique] Meirelles no Banco Central também chama muita atenção. Foi um grande golpe de mestre do presidente Lula não chegar tentando destruir tudo que estava por ai. Pela esquerda, ele tem um êxito relativo, mas também um êxito importante, a idéia de melhorar a distribuição de renda, que é o Bolsa-Família. Ainda que isso não satisfaça, na minha opinião, as necessidades sociais do País. Mas o Bolsa-Família é fundamental, porque atende um monte de famílias. É um grande programa, no sentido de que tem uma grande cobertura, muito diferente de programas anteriores do Fernando Henrique, então ajuda muitas pessoas. Agora isso acaba apenas aliviando a pobreza absoluta. Não se toca na pobreza relativa, porque a concentração de renda continua, também porque é difícil combater isso de maneira mais sistematizada. É um traço histórico de nosso País, infelizmente. Mas eu não poderia negar que houve muita coisa interessante, muito surpreendente, principalmente essa questão do equilíbrio de uma guinada à direita que deu certo e de uma certa presença da esquerda que enfatiza mais, em algumas políticas, as pessoas de baixa renda. Como, por exemplo, é inegável essa abertura de crédito ao pobre. Muita gente comprou carro, nunca se viu tanto carro na rua, gente andando de avião. Então isso realmente deu um certo ar de que nós estamos nos civilizando com um capitalismo menos perverso. Mas não resolvemos os problemas de fundo, que são os problemas de concentração de renda. E hoje, com essa crise toda, já não se fala mais nem em crescimento econômico como se falava.
Desafios - E desenvolvimento envolve um conceito bem mais amplo.
Demo - Claro, em desenvolvimento, temos ai uma tradição grande de pensamento nessa área aqui no Brasil, figuras que tentaram, de certa maneira, trazer mais para frente outras questões, como a cidadania, a possibilidade de redistribuir renda, e não somente distribuir. Quer dizer, nós fazemos apenas a distribuição, que é sempre marginal. O próprio Bolsa-Família, se você olhar no orçamento, consome uma parcela muito pequena. Temos que pensar em algo que fosse redistribuição, e não só distribuição. Mas, mesmo assim, acho que fazer uma boa assistência, efetiva, ampla, para as pessoas que precisam comer é uma coisa muito importante, e esse governo conseguiu isso.
Desafios - O sucesso do governo estaria, então, em conseguir atingir um equilíbrio relativo entre esses dois lados?
Demo - Mas o êxito maior veio da direita, pois as bases da política econômica permaneceram, uma coisa muito surpreendente. O Lula se desvinculou muito do PT. Ele é um petista que assume posturas próprias diferenciadas. Depois dele, no PT não tem mais ninguém para concorrer à presidência. Quer dizer, é uma figura que, realmente, para quem gosta de estudar lideranças, carismas, o Lula trouxe ai um material que acho que vale uma tese de doutorado na academia. (...)
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