terça-feira, 28 de dezembro de 2010

Tão perto do céu, tão longe de Deus...

É com a frase do título do post que alguns mexicanos definem o seu país. Com uma história rica e permeado por conflitos de alta voltagem, o México enfrenta, hoje, o desafio provocado pelo crescimento do narcotráfico. Na verdade, o tráfico de drogas está fortemente enraizado em muitos setores da sociedade do pais. Tanto assim que a lógica da "guerra contra as drogas" no país parece ter mais efeitos colaterais do que desejáveis.

Nós, brasileiros, também lidamos com o problema do narcotráfico. E, por isso mesmo, podemos aprender alguma coisa e tirar algumas lições do terrível cenário mexicano. Daí que, sempre que posso, transcrevo aqui informações sobre a situação mexicana. Hoje, reproduzo abaixo artigo de autoria de Ignácio Ramonet sobre a guerra contra as drogas. O texto foi publicado inicialmente no Le Monde. A tradução para o português é de responsabilidade do EX-BLOG DO CÉSAR MAIA. Foi neste último que o capturei o que segue. Boa leitura!


MÉXICO: UM ESTADO ENCURRALADO ENTRE TRÁFICO, ZETAS, POLÍCIA, EXÉRCITO, MILÍCIAS, DEA!

Trecho do artigo de Ignacio Ramonet (21), no Le Monde Diplomatique.

1. Há uma guerra interna no México. Ou melhor, três guerras. Numa delas, diferentes cartéis do narcotráfico combatem pelo controle territorial; em outra, grupos Zetas (organizações mafiosas, constituídas por ex-militares e antigos policiais) especializam-se em sequestros e extorsões contra a população; a terceira provém da opressão e abusos cometidos pelos militares e forças especiais contra os civis. Nessas guerras, o número de mortos provocados por elas desde 2003 chega próximo dos 30 mil.

2. O México parece cada vez mais com um “Estado encurralado”, preso em uma armadilha mortal. Todos os tipos de agressores armados desfilam pelo país: as forças especiais do exército e os comandos de elite da polícia; bandos de paramilitares e para-policiais; clãs de assassinos e gangues de todos os tipos; agentes norte-americanos da FBI, CIA e da DEA; e por fim os Zetas, que persistem na perseguição dos imigrantes latino-americanos, na travessia em direção aos Estados Unidos.

3. A cada ano, cerca de 500 mil latino-americanos atravessam o México em direção ao “paraíso norte-americano”, mas antes de alcançá-lo, seu percurso assemelha-se ao inferno. Ataques sucessivos de hordas predatórias depenam-nos no decorrer da trilha, com roubos, sequestros, violações… Oito mulheres entre dez são vítimas de abusos sexuais; grande parte delas é transformada em “serventes escravizadas” por bandos criminais, ou contratadas como prostitutas. Centenas de crianças são arrancadas de seus pais e obrigadas a trabalhar nos campos clandestinos de maconha.

4. Milhares de imigrantes são sequestrados e para liberá-los, os Zetas exigem de suas famílias o pagamento de um “regaste”. “Para as organizações criminais é mais fácil sequestrar durante alguns dias alguns desconhecidos em troca de 300 a 1500 dólares cada um, que correr o risco de sequestrar um grande patrão.” Se ninguém é capaz de pagar o regaste dos sequestrados, eles são simplesmente liquidados.

5. Cada célula dos Zetas possui seu próprio carrasco, muitas vezes responsável pela decapitação e esfolamento dos corpos das vítimas, até por queimá-los dentro de barris metálicos. No decorrer da última década, cerca de 60 mil imigrantes ilegais, cujos familiares não puderam quitar o resgate, “desapareceram” dessa forma…

6. Por outro lado, o governo de Obama considera que o banho de sangue que submerge o México ameaça ser um grande perigo para a segurança norte-americana. A chefe da diplomacia, Hillary Clinton, não hesitou em declarar: “A ameaça que representam os narcotraficantes está crescendo; parecendo cada vez mais com a de grupos de insurgentes políticos (…) O México começa a parecer cada vez mais com a Colômbia dos anos 1980.”

7. O poder mexicano continua batendo na tecla de que nos últimos anos o viés militar foi a única solução para a desordem e a violência do país. Resultado: cada vez mais os cidadãos parecem concordar com as decisões dos militares diante da situação vigente… Uma solução encorajada sem dúvida pelo Pentágono, apesar de o Departamento e Estado e a Presidência do EUA manterem a velha retórica dos “princípios democráticos”.

8. São as máfias norte-americanas que tiram a maior vantagem de todo o narcotráfico latino-americano: cerca de 90% do lucro total, 45 bilhões de euros por ano… Enquanto todos os cartéis da América Latina juntos compartilham apenas os 10% restantes…

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