sexta-feira, 25 de setembro de 2009

DNA e a privacidade

Transcrevo mais abaixo material enviado pelo Ex-Blog do César Maia. Trata-se de interessante artigo, publicado inicialmente no jornal argentino La Nacion. A responsabilidade da tradução é do César Maia. Confira!

DNA: INTIMIDADE E IDENTIDADE! QUEM DECIDE? COMO?
Trechos do artigo de Viviana Bernarth, doutora em biologia molecular. (La Nacion, 19/09)


1. Em 2001, E.V. foi notificada pela Justiça Argentina para que se submetesse a um teste de DNA. Existiam elementos para se suspeitar que era filha de pessoas desaparecidas. A jovem, que já tinha atingido a maioridade, negou submeter-se ao exame. Argumentou que os resultados poderiam afetar as pessoas que a criaram. Para sustentar sua recusa, ela recorreu ao direito à privacidade. O caso de E.V. abriu um precedente. Pela primeira vez o STF privilegiou o direito à privacidade em relação ao direito à identidade. É compreensível que, no caso desta menina, a lei tenha considerado essencial garantir seu direito à privacidade.

2. O que é o direito à privacidade? É o direito que toda pessoa tem de decidir se torna público ou não a sua privacidade. E o que é o direito à identidade? É aquele que tem qualquer pessoa de ter um nome e uma nacionalidade, a conhecer seus pais e a ser cuidada por eles. Aonde nos leva esta distinção entre os dois direitos? A uma questão controversa que nos faz pensar sobre qual deles dever ser respaldado pela lei em cada caso, se o direito à privacidade ou o direito à identidade. Tanto a Declaração dos Direitos Humanos (1948), como a Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança (1989), argumentam que o direito à privacidade e o direito à identidade deve ser invioláveis.

3. São inúmeros os homens que através de exames de DNA, descobrem que não são os pais biológicos das crianças que criaram. O que ocorre então com o vínculo amoroso desenvolvido entre eles? E com essas mães que, conscientemente, atribuíram a seus filhos paternidades fraudulentas? Deveriam ser punidas? Em qual dos dois direitos à lei deve se fundamentar para decidir a quem proteger? Na França, é difícil realizar um teste de DNA só porque você deseja resolver uma dúvida pessoal. Somente uma petição judicial pode autorizar a realização destes testes. Esta prática é ilegal na esfera privada.

4. Na Espanha, Inglaterra e Argentina, o teste de paternidade pode ser feito particularmente e extra judicialmente. Qualquer pessoa tem a liberdade para solicitá-lo. Por outro lado existem leis, como a alemã, que também levam em conta efeitos psicológicos que podem recair sobre os homens que suspeitam terem sido enganados por suas esposas em relação à sua paternidade, e recentemente uma lei torna mais fácil, para os pais que duvidam da sua paternidade, o processo para esclarecer a origem de seus alegados filhos. Para isso, não precisam necessariamente romper os vínculos legais com o filho não biológico, caso se confirme a suspeita da não paternidade.

5. A qual direito deve ser dada prioridade: o direito a intimidade, ou a identidade? O que deve prevalecer: a consideração da família biológica ou o vínculo emocional? O teste de DNA não deve ser a única variável levada em conta no momento de se decidir se o homem envolvido tem que continuar agindo ou não como pai, devendo ir além do eventual vínculo biológico com seu filho. O problema decorrente do exame de DNA não é apenas jurídico ou científico. Também não é apenas um problema psicológico. É todo esse conjunto.

6. Portanto, estabelecer uma jurisprudência geral, implica correr o risco de subestimar ou ignorar as especificidades. Cada pessoa envolvida em caso de DNA deveria ser capaz de decidir de forma autônoma, se prefere preservar o direito à privacidade ou o direito à identidade. Isso sempre que a sua decisão não prejudique terceiros ou envolva a ocultação de um crime. Generalizar, nesse sentido, é extremamente difícil e pode vir a ser arbitrário. Portanto a Justiça, antes de se decidir, deve incluir todas as variáveis em jogo e contemplar a singularidade no momento de avaliar o que será preservado: se o direito à privacidade ou identidade.

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