O Alon acompanha com distanciamento crítico, e análise geralmente bem humorada, os meandros da política nacional. Lê-lo é sempre muito bom. Confira abaixo artigo sobre os desarranjos tucanos.
Músicos de Titanic (29/04)
Alon Feuerwerker
Enquanto corre a suave melodia, a maior preocupação dos passageiros da nau tucana perece ser arrumar lugar em algum bote salva-vidas
A guerra civil no PSDB é o resultado da tensão entre a necessidade da ruptura e a ausência de mecanismos minimamente democráticos para fazer esse ajuste de contas pela via pacífica.
A ruptura parece necessária porque as três últimas eleições presidenciais evidenciaram o limite da ação política dos tucanos.
O partido vem sofrendo derrotas consecutivas por uma razão singela: a maioria da população brasileira tem hoje reservas à passagem do PSDB pelo Palácio do Planalto.
Nas duas eleições mais recentes, ficou evidente também que o governo de Luiz Inácio Lula da Silva deixa bem para trás o de Fernando Henrique Cardoso no juízo do eleitor. Não se trata aqui de discutir justiças e injustiças. São os fatos da vida.
Ainda que de vez em quando ressurja a tese fantástica de que o eleitor avalia mal o governo FHC porque não lhe explicaram suficientemente como foi bom.
A "necessidade de resgatar a herança de FHC" é um fraseado encontradiço nas lutas internas do PSDB, mas a vida prática tem sido diferente.
O ex-presidente não se dispõe a lutar por um mandato. E os candidatos majoritários do PSDB -inclusive quem no interregno canta as glórias do período de 1995 a 2002- ignoram-no quando chega a hora de pedir voto ao povão.
O maior problema do PSDB não é a luta de facções. É ela transcorrer sem que o distinto público consiga enxergar uma mísera ideia quando
olha para os embates.
Pois o eleitor não tem a legenda em baixo conceito, tanto que lhe deu o comando de vários estados. Só não está convencido de que deve
reconduzi-la a Brasília.
O único esboço de ideia até agora veio do próprio FHC, no já célebre (ainda que não pelas razões planejadas) texto na revista Interesse
Nacional. Mas a FHC e a seu artigo parecem estar reservando o papel de músicos de convés de Titanic.
Enquanto corre a suave melodia, a maior preocupação dos passageiros da nau tucana perece ser arrumar lugar em algum bote salva-vidas.
É possível que o PSDB sobreviva bem, quantitativamente. Tem capital político, e uma hora a carnificina vai acabar.
O problema do PSDB é outro. A ausência de massa crítica programática arrasta-o para a vala comum aos partidos brasileiros: além de desejarem o poder, não se sabe bem para que mais servem.
Por esse caminho, o PSDB ameaça abrir espaço para a despolarização da nossa política, dominada nas duas últimas décadas pela dualidade tucano-petista. A tese de que a política tem horror ao vácuo continua valendo.
Despolarização que pode vir a ser também um incômodo para o PT. Bem ou mal, o partido de Lula terá emplacado em 2014 doze anos de poder federal com base num argumento poderoso. Ou você vota no PT ou vai ter a volta ao passado.
O mundo organizado dessa maneira é conveniente para o PT, pois, seguidamente, três em cinco eleitores demonstram preferir a primeira
opção.
Mas, e se a alternativa não puder ser caracterizada dessa maneira?
Um mundo bipolar é sempre mais simples de administrar. Que o digam os Estados Unidos. Venceram e comemoraram a vitória na Guerra Fria, apenas para contratar depois que manter a hegemonia na nova situação tinha se tornado tarefa bem mais complexa.
O que ele diria
O que impede um aeroporto estatal de alcançar eficiência e rentabilidade? Só a deficiência de planejamento e gestão.
Aeroporto não enfrenta concorrência, é monopólio. E de consumo obrigatório. Se um aeroporto é ruim, isso não vai levar o passageiro a
descer em outra cidade e percorrer a distância adicional, digamos, de ônibus.
Então é planejar e executar. Mas parece que não foi feito.
Por que não foi feito é um mistério. O PT está no governo há quase uma década, já se sabe há muito tempo que o Brasil vai sediar uma Copa do Mundo, mas só agora o Planalto decidiu mexer-se.
Deixou a situação chegar ao ponto crítico para depois agir. Esperou um contexto em que a sociedade lhe daria quase carta branca para resolver o impasse.
Se o PT estivesse na oposição certamente acusaria o governo de ter sucateado os aeroportos para entregá-los a preço de banana aos
capitalistas privados.
Ou até de graça, conforme a coisa for feita.
É o que o PT diria.
Coluna (Nas entrelinhas) publicada nesta sexta (29) no Correio Braziliense.
sexta-feira, 29 de abril de 2011
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