O Kischnerismo oscila entre uma centro-esquerda moderna e o populismo autoritário. Foi assim com o falecido Néstor Kirscher, o iniciador da "tradição", e tem sido assim no atual mandato da Presidente Cristina. Tudo se passa como se uma ponte ligasse a atual Argentina ao norte do continente, mais precisamente à Venezuela.
Por isso, creio eu, vale a pena analisar o entrevero entre o Prêmio Nobel de Literatura Mário Vargas Llosa e um dos lugares-tenentes do kischnerismo. Confira na matéria abaixo, publicada no TERRA MAGAZINE.
Os Kirchneristas e o escrivinhador
Carol Pires
De Buenos Aires
Minha primeira Feira Internacional do Livro em Buenos Aires - a 37ª da cidade - já se pronunciava interessante o suficiente por ter o Nobel de Literatura 2010, Mario Vargas Llosa, na abertura. Mas os políticos argentinos, e seu habitual drama para lidar com tudo e todos, deixaram minha expectativa ainda mais palpitante.
Para quem não acompanhou a polêmica envolvendo o governo argentino e o autor de "Travessuras de Menina Má" e "Pantaleão e as Visitadoras", relembro aqui:
O entrevero foi detonado por Horácio González, diretor da Biblioteca Nacional (cargo outrora ocupado pelo escritor Jorge Luís Borges).
Em carta à organização da feira, definiu o convite a Mario Vargas Llosa para fazer a primeira conferência da festa literária como inoportuno; chamou o escritor peruano de messiânico autoritário; e pediu a substituição dele por um escritor argentino, porque o peruano não era "adpeto à corrente de ideias que abriga a sociedade argentina".
Llosa é um crítico árduo e contumaz ao peronismo e à gestão do casal Kirchner, a qual considera "um desastre total". Daí o rancor de Horácio González e dos demais governistas que o apoiaram.
Mas a tentativa dele de censurar Vargas Llosa fracassou. E não só a presença de Vargas Llosa foi mantida, como a venda dos seus livros aumentou nas livrarias portenhas. E o escritor pôde compilar alguns motivos a mais pelos quais falar mal dos kirchneristas.
"Que tipo de Argentina querem os intelectuais kirchneristas? Uma nova Cuba, onde, de fato, os liberais e democratas não podem jamais dar uma conferência, nem participar de um debate, e onde só têm a palavra os escritores a serviço do governo?", questionou, em artigo publicado no jornal El País. Llosa já teve livros seus censurados pela ditadura argentina nos anos 1970.
Llosa continua, no El País: "O Peronismo, apesar de ter impulsionado alguns progressos de ordem social e sindical, feitos os cálculos, contribuiu da maneira decisiva para a decadência econômica e cultural do único país da América Latina que chegou a ser um país de primeiro mundo".
No mesmo dia da divulgação da carta de Horácio González, Mario Vargas Llosa declarou a jornais que mantinha sua ida à Feira do Livro de Buenos Aires. E o eco dos demais intelectuais e políticos governistas acabou aplacado pela presidente Cristina Kirchner, que forçou González a baixar o tom das críticas.
Vargas Llosa - pelo Nobel, pela abertura da Feira do Livro e pela sua tentativa de censura - já vinha sendo seguido com atenção pela imprensa argentina. Mas, nos últimos dias, ele voltou ao alto das páginas com suas árduas críticas. Desta vez, ao Peru.
Com a proximidade do primeiro turno da eleição presidencial, que ocorreu no último dia 10, ele havia dito que seria "verdadeiramente uma catástrofe para o Peru" um possível segundo turno entre o esquerdista Ollanta Humala e populista de direita Keiko Fujimori, filha de Alberto Fujimori, contra quem disputou - e perdeu - a presidência do país em 1990.
A disputa entre os dois no segundo turno foi confirmada, e o Nobel foi ainda mais cáustico: "É como escolher entre Aids e câncer terminal".
Somado o desgosto com a política do próprio país, é de se esperar que Mario Vargas Llosa chegue ainda mais impetuoso a Buenos Aires. Ao jornalista espanhol Juan Cruz Ruiz, o escritor disse que não pretendia falar de política na abertura de um evento literário, mas que, agora, o cenário é outro:
"Agora eles (intelectuais que criticaram sua escolha para a Feira do Livro) criaram uma situação muito difícil, porque seria uma terrível fraude se eu não falasse sobre as minhas opiniões e minhas ideias quando queriam me proibir que as fizesse. É uma questão de dignidade, coerência".
A organização da feira montou até um plano operacional - não divulgado, claro - para a chegada e saída de Mario Vargas Llosa ao evento. Tudo para evitar um possível alvoroço dos seus desafetos esquerdistas, que o escritor apelidou de "piqueteiros intelectuais".
A 37ª Feira Internacional do Livro de Buenos Aires começa dia 20 de abril e segue até 9 de maio. Vargas Llosa falará ao público no dia 21, às 18h30.
Carol Pires é jornalista. Foi repórter do Estadão, iG, e Blog do Noblat. Hoje mora em Buenos Aires.
terça-feira, 19 de abril de 2011
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2 comentários:
Caro Edmilson,
eu falava de populismo o tempo inteiro, principamente para me referir a Micarla.
Li, no entanto, o texto do Weffort sobre o assunto e um artigo da Maria de Lourdes publicado no último livro do Jessé e a retirei do meu vocabulário.
Ora, concordo com ela: é uma categoria tosca demais, destituída de reflexividade e que costuma ser empregada para expressar etnocentrismos de classe.
Lourdes brinca que a noção de populismo quase chega a ser uma crítica frontal ao fato de uma maioria, por caminhos democráticos, escolher um determinado candidato.
Bem, pode ser uma boa categoria para o ataque político, mas fraca quando se quer pensar mais fortemente as coisas.
O próprio texto do wefort é cheio de argumentos retóricos.
Em determinados momentos fiquei me perguntando quem não seria "populista". Flaubert brincaria, com certeza, chamando de conceito coringa, rs.
abs.
daniel
Es llamativo el título "Vargas Llosa derrota el kirchnerismo... en la Argentina" y lo que llama la atención es la mentira. La Argentina, cuando me refiero a Argentina me refiero a su tejido productivo, su sistema educativo, su sistema de salud, su población, particularmente la clase trabajadora y los jubilados, sus sectores medios y bajos, entre otros aspectos, fue devastada por la implementación de ideas como las pregonadas por Vargas Llosa. La paradoja, en referencia al título mencionado, es que fue justamente el kirchnerismo (como movimiento que surge luego de los cacerolazos y la consigna “que se vayan todos”, con la participación de las fuerzas vivas de la sociedad y acompañamiento mayoritario, que de hecho asegura la reelección de Cristina Kirchner en primera vuelta) fue el que derrotó las ideas que reclamaban, cono lo hace Vargas Llosa, volver al viejo modelo del fracaso. La derrota cultural al antiguo modelo imperante y la construcción de un nuevo relato que hizo hace posible que afloren las potencialidades, renazca la militancia y el enamoramiento con la política reconociéndola nuevamente como herramienta para transformar la realidad (y no la economía, si no la economía subordinada a la política), se realizó revirtiendo el cuadro de una Argentina en estado terminal. Eso despertó el asombro de propios y extraños, y también una enceguecida resistencia a lo nuevo en los divulgadores de lo antiguo (por caso Vargas Llosa). La Argentina actual luce muy diferente a la de hace apenas 8 años. La actual muestra un crecimiento asombroso interanual sostenido y constante durante ese periodo, ha realizado la restructuración de deuda más importante de la historia y en condiciones que muchos, muchos expertos del establishment, decían imposible, ostenta el salario mínimo más alto de Latinoamérica, sostiene una política de Derechos Humanos que es referencia internacional, destina en Ciencia e Investigación el presupuesto más elevado de sus historia, creando incluso un Ministerio de Ciencia y Tecnología, ha promulgado leyes como la de Matrimonio Igualitario o La Ley de Medios que son vanguardia y ejemplo para nuestro continente, implementa, gracias a los fondos de jubilación nacionalizados, el plan Asignación Universal por Hijo, el más ambicioso y de mayor cobertura de todos los planes implementados en esta parte del mundo y tantísimas cuestiones más...entonces, justamente, en la Argentina actual el gran derrotado es Vargas Llosa.
Al margen, quisiera aclarar, para poner las cosas en su justo lugar dado que se omite en el texto, que Horacio González es posiblemente el más importante intelectual argentino y no un irrelevante puntero político del kirchnerismo como pretende figurar la opinión publicada.
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