Flaubert Mesquista é aluno do doutorado em Ciências Sociais. É um cara que procura sempre intervir no debate, apontando as suas posições, sem medo de nenhuma patrulha. Transcrevo abaixo um posicionamento dele sobre as cotas.
Edmilson, vou te mandar o que escrevi para o blog do Alon, com alguns acréscimos.
Caro Alon,
Você não acha que o problema é a escola pública?
Não seria a pobreza e péssima escola pública que causam o impedimento à universidade pública? Pena que vivemos num país bizarro onde é quase impossível encontrar alguém com bom senso. Realmente, parece que o Brasil não tem mesmo vocação para a ciência. Há cada minute se confunde causa com conseqüência.
A defesa do raciocínio de cotas raciais é tão absurda que, como todo absurdo, só poderia levar à injustiça mesmo... Se essa proposta vencer (no país bizarro, tudo é possível), teremos uma situação curiosa: negros de classe média entrando pelas cotas e pardos e tons mais claros de pele (mas pobres) sendo excluídos do processo. Teremos duas classes de pobres: os com cotas e os que devem se submeter ao vestibular, porque são se consideram nem são considerados negros. Alguém poderia dizer: “mas os negros de classe média não escolheriam as cotas”. E a teoria do menor esforço? Cada um procura o que lhe é mais conveniente.
Se os negros não entram para a universidade porque são pobres, por que não cotas sociais? Uma vez que a o debate político esvazia a questão do mérito para ocupar os espaços da universidade, seria, pelo menos, uma forma alternativa de remediar a questão.
De fato, quando entrei na universidade imagina que lá seria o lugar dom mérito e da competência. Porém, como já nos avisava Max Weber, quem pensar assim se decepcionará. E agora, mais uma vez o Brasil inaugura uma nova forma de latifúndio: cotas.
Não acha o senhor que essas cotas são puro oportunismo militante?
Pelo menos dá pra ver que os comentadores de seu blog são bem mais sensatos e ponderados que os nossos políticos e pseudo-intelectuais.
O mais interessante é que os pro-cotas se baseiam numa teoria racista para combater o racismo! Invenção nacional! Juridicamente é bem mais estapafúrdio: vamos supor que numa universidade um estudante se dirija a outro pela palavra “negro” por este ser cotista. Apesar de ter tido algo que o cotista terá confirmado via sua inclusão na universidade, o estudante que assim o chamou poderá ser processado e preso por ser supostamente racista. Ou seja: só que pode usar o argumento da raça são os que se autodeclaram negros. Só um negro pode chamar outro de negro.
Os argumentos do Marcos Nobre são ridículos. É um obscurantismo de primeira. Desviou o completamente o debate. Substituiu a ciência pela política. Parece um militante apaixonado. Como sabemos, os pseudo-cientistas vivem que estudantes ineptos. Marcos Nobre deve estar querendo criar uma base de pesquisa com os próximos cotistas que entrem na universidade. Será mais fácil para ele disfarçar a incompetência.
Um abraço, Edmilson!
Flaubert
quarta-feira, 10 de março de 2010
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3 comentários:
Poxa Flaubert,
não quero nem entrar no mérito da discussão. Penso só que você foi injusto com o Marcos Nobre. O texto dele fala sobre a "cota do dem", uma pseudo reserva moral, que vem se mostrando cada vez mais frágil. O rei está nu e, para nossa felicidade, ao contrário do conto, as pessoas estão vendo. O professor pouco toca na questão das cotas para negros.
Penso que, nesta questão, sua mira estava desfocada.
Daniel
Caro Edmilson,
Segue abaixo minha resposta ao comentário de Flaubert. Também pretendo reproduzir o texto em meu blog.
A forca dos argumentos e os argumentos da violência
Há várias maneiras de se construir um debate de idéias na esfera pública. Algums optam pelo confrontamento de argumentos e outros pelo ataque desmedido e truculento. Dito isso, gostaria de comentar uma das posturas hoje em volga nas entranhas da academia brasileira: a retórica de desqualificacäo.
Mas o que exatamente caracteriza a retórica de desqualificacao? Diria, por economia de palavras, que corresponde aquelas modalidades de discurso pseudo-crítico, parcos de reflexao analítica e ricos em distribuicao de ofensas pessoais. Geralmente, por preguica ou limitacao de exercício reflexivo, misturado a uma dose de revolta, ressentimento e, principalmente, uma impaciência um tanto ainda juvenil em responder de maneira rápida e a altura de sua indignacao, muitos bons homens e mulheres de ciência incorrem na armadilha retórica de aderir ao “assassinato de reputacao” de seus pares. É bem verdade que na contenda comunicativa, nao existe acao discursiva gratuíta ou sem justificacao, mesmo entre as mais violentas. Muito menos, o espaco comunicativo está longe de ser aquele paraíso na terra do “ é conversando que a gente se entende” ou ainda, “mede-se a qualidade de um debate pela sua forca em construir consensos cognitvos mínimos”. Balela, acao comunicativa é confrontamento de idéias, “violência simbólica”. Por outro lado, também é verdade que os a prioris de natureza emocional, por mais “legitimos” que sejam, nao deveriam contaminar o equilibrio mínimo da razao critico-sistematica. Em tese, isso mesmo, “em tese”, pede-se que deixemos nossos “pré-conceitos” de lados por algums instantes (o que seria uma grande progresso reflexivo) e procuremos operar analiticamente a caixa de ferramentas que a retórica cientifica nos dispoe. Noutras palavras, jogar conforme as regras do jogo em questao!
Eis que esse cuidado reflexivo para o verdadeiro exame e exercício do conhecimento objetivo vem se tornando pó que ainda teima em persistir, pelo menos, nas páginas amareladas do tempo em nossos livros de biblioteca –daí entre tantas outras, a atualidade dos clássicos: nos ensinar, senao idéias, como travar uma boa luta teórica. Mas nao, nossos academicos tupiniques, inflamados por outros campos de luta (vide o jornalismo brasileiro), resolveram deixar de lado a conduta paróquial e as regras de bom decoro teórico (sim, talvez pela chatice dessas regras) para ingressar no reino das espadas retóricas viris que tanto fazem sucesso nas páginas amarelas (nao pelo tempo) da Veja e de outros folhetins ideológicos.
Cadú
(Continuacao)
O que supreende é - já nao bastasse nossos velhos professores carcumidos por suas insatisfacoes ideológicas - assistir jovens candidatos a renovacao intelectual, repetirem o mesmo jogo de cena truculento que seus pais e tutuores do conhecimento objetivo. E é nesse clima de terra arrasada que, por exemplo, Flaubert Mesquita (doutorando em ciências sociais da UFRN) derigi toda a sua fúria retórica a um artigo de Marcos Nobre, este, filosofo e professor da USP. Conheco Flaubert pessoalmente e de vivência dos tempos de graduacao e pós-graduacao. Compartilhamos a memória de boas contendas retóricas sobre teoria social e outros assuntos do buteco sociológico. E por isso, repito, me supreende a sua infatilidade, insensatez e primarismo analítico na sua crítica a Marcos Nobre. Principalmente pelo desvio de curva na idéia central do texto para se prender a uma discussao pantonosa, tal como é a política de cotas. O mesmo Flaubert que denuncia a escassez de vocacao para ciência nessa regiao equatorial, recorre a termos nada cientificos, a exemplo de “país bizarro”, “militante apaixonado”. Esse último termo, ironicamente, caíria perfeitamente no comentário-resposta de Flaubert. Pois eu procurei, procurei, e nao achei os contra-argumentos que sustentassem o aspecto “rídiculo” do artigo de Marcos Nobre. E nao vale distribuir granadas no terreno intelectual, sem pelo menos, armá-las antes. Deixe isso para o senso comum!
Diante de tudo isso, só posso dizer que a universidade precisa, de fato, repensar urgentemente seus imperativos enquanto produtora e difusora de conhecimento acerca do mundo. Näo apenas para o esclarecimento, mas também, para cumprir o seu papel civilizatório. E para isso, nao é reproduzindo a gramática discursiva incendiária dominante dos campos jornalísticos e político que vai alcancar aquele objetivo. Se assim o fizer, no máximo, vai colher e reproduzir, na forma refinada e escolástica, novas seitas autoritárias com inclinacoes estigmatizantes e resistentes ao reconhecimento do outro.
Cadú.
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