A própria pergunta do título acima, para gestores públicos, políticos e empresários da região, parece já um absurdo. Ora, todos ganham com o desenvolvimento, respondem eles de bate pronto. Será mesmo? Confira abaixo uma notícia a respeito colocada no site da ANPOCS.
Turismo prejudica populações
Nem sempre a Política Nacional de Turismo atende aos interesses das comunidades locais e serve de instrumento para o desenvolvimento econômico, social e distribuição da renda. No roteiro das Emoções, que vai de Jijoca a Jericoacoara, no Ceará, a Barrerinhas, no Maranhão, passando pelo Estado do Piauí, isso está acontecendo e provoca, inclusive, conflitos entre a população e novos empreendimentos. A avaliação é de Lea Carvalho Rodrigues, da UFC (Universidade Federal do Ceará), que apresentou o trabalho “Diretrizes da política nacional de turismo e impactos econômico-culturais sobre populações locais: nas trilhas do roteiro das Emoções”.
Ela participou das atividades do Grupo 10, que trata de Cultura, Economia e Política, durante o 33º Encontro Anual da ANPOCS (Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Ciências Sociais). Este ano, o evento reúne todas às tardes, até quinta-feira, 41 grupos de trabalho que discutem temas variados das ciências sociais.
“Há uma forte contradição entre desenvolvimento e preservação natural, cultural e patrimonial”, disse Lea Rodrigues. Para ela, o desenvolvimento sustentável é uma contradição em relação à dinâmica do capitalismo. “Nos países pobres e emergentes, as políticas de turismo beneficiam grandes grupos que recebem recursos do Estado, enquanto a população local tem poucos benefícios e muitas as comunidades são desestruturadas”, disse. Um exemplo dessa situação, segundo ela, é o México.
No roteiro das Emoções, nos Estados do Maranhão, Piauí e Ceará, estradas estão sendo abertas, com financiamentos de bancos oficiais, que estão prejudicando comunidades pesqueiras, pequenos agricultores, quilombolas e indígenas. No caso dos índios Tremembés, afirmou ela, existe um conflito de terras há 10 anos, inclusive com ações na Justiça, para que os indígenas permanecem em 6 mil hectares, onde estão instalados cinco vilinhas. Com a política de turismo, um grupo de 27 empresários (Nova Atlântica) pretende implantar 50 hotéis na praia da Baleia, no Ceará. “É difícil se harmonizar os conflitos fundiários e ambientais com os interesses dos empresários”, constatou a pesquisadora.
O mesmo problema se repete na praia de Maceió, em Camocim, também no Ceará. Segundo ela, o grupo Marilha pleiteia a regularização das terras, onde estão pequenos produtores rurais, para fazer um projeto turístico. As terras pertencem a União, mas a dona do cartório é mulher de um sócio minoritário (1%) do empreendimento e regularizou as terras para o conglomerado. “Chama a atenção o conluio entre o setor empresarial e o setor público”, disse.
As populações locais, além de serem pouco beneficiadas do ponto de vista econômico, passam ainda por transformações sociais profundas por influência estrangeira como músicas, outros idiomas e acessos a bens de consumo até então desconhecidos. Se esses itens podem ser positivos, também chegam o consumo e o tráfico de drogas, a gravidez de adolescentes por estrangeiros e o turismo sexual. “Há uma mudança completa no padrão de sociabilidades”, afirmou Lea Rodrigues.
segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010
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Um comentário:
Bom ver publicizada uma visão crítica a respeito dos efeitos do turismo em nossa linda e socorrida África brasileira! Profa. Lea Rodrigues coordenou um GT sobre projetos de desenvolvimento e antropologia nesta ultima ABANNE (Natal), e o fará novamente na próxima RBA (Belém). O artigo dela sobre essa pesquisa que coordena na UFC consta nos anais virtuais da última reunião da Anpocs. Mas tanto a antropologia do turismo quanto a do desenvolvimento são minoria no nordeste - quanto mais o cruzamento de ambos os subcampos. Aqui no RN o tema "desenvolvimento e turismo" é mais debatido por geógrafos (o que não é uma coisa ruim, mas as demais áreas poderiam se manifestar mais). Uma grande dificuldade do pesquisador é não deslizar para reproduzir um discurso "balístico" nem um apologético sobre o tema. Impactos ou processos sociais de hibridização; nativos ou residentes; crítica ou elogio? Espero que as ciências sociais estejam apontando direitinho para seus problemas de pesquisa. Lembrando aquela música de Raul: "ai meu Deus que agonia/ com toda esse pontaria/ a bomba escapa - e quem se ferra? - quem se ferra é o urubu."
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