Leia abaixo artigo de autoria de Marcos Coimbra. Trata-se de uma análise das investidas críticas do ex-presidente contra Lula, Dilma e o PT. Vale a pena conferir!
Fernando Henrique contra Lula
Autor(es): Marcos Coimbra
Correio Braziliense - 10/02/2010
Com seu cartão de visitas, o Plano Real, Fernando Henrique ganhou a admiração do país. Se não terminou seu período com a imagem que julga condizente com o que fez, ninguém pode ser responsabilizado, fora aqueles que o integraram
Em mais um capítulo da longa batalha que travam há anos, Fernando Henrique e Lula voltaram a se enfrentar no fim de semana. Agora, a iniciativa partiu do ex-presidente, que, em artigo publicado por alguns jornais, se disse “sem medo do passado”. Com isso, afirmou que aceita o desafio do atual, de fazer a comparação entre os governos dos dois na eleição deste ano.
Segundo Fernando Henrique, Lula está em meio a uma “guerra imaginária” em que distorce fatos e, assim fazendo, se glorifica no contraste com ele. Em suas palavras, o presidente quer assustar as pessoas, ameaçando-as com o caos se a oposição vencer.
Quase todo o texto é dedicado à defesa das decisões que tomou e do que fez no Planalto. O cerne de seu argumento é a ideia de que Lula (apenas) “deu passos adiante no que fora plantado por seus antecessores”. Embora falasse no plural, parece que o que ele queria dizer é que o (único) mérito de Lula foi prosseguir o que ele começou.
Nada mais compreensível que a reação de FHC. Não é preciso ter de si uma opinião muito elevada para, em situação semelhante, ficar tão desconfortável quanto ele parece estar. Depois de uma trajetória brilhante como intelectual, entrou na vida política pela porta da frente e chegou aonde chegou, tornando-se, por algum tempo, ídolo de um país que não acreditava mais que a inflação pudesse ser vencida. Hoje, sem que ele o mereça, muitos de seus amigos preferem que ele finja que não existe.
Espicaçado por Lula e Dilma, pelo PT e até por gente que esteve bem aninhada em seu governo, é difícil imaginar que ele fosse ficar quieto em seu canto, sofrendo calado. O artigo foi uma mostra de que ele não vai aceitar de braços cruzados as provocações que a campanha da ministra lhe fará. Aliás, não foi a única, pois, ainda no sábado, já havia dito que Dilma é “um boneco” e Lula seu “ventríloquo”. Em matéria de nível de debate, não se pode dizer que seja elevado.
Fernando Henrique se diz convencido que na campanha haverá um mote (“o governo do PSDB foi neoliberal”) e dois “alvos principais: as privatizações das estatais e a (sua) suposta inação na área social”. Em função disso, contra-argumenta procurando mostrar que melhorou o desempenho das empresas privatizadas em seu governo e reivindicando a invenção do Bolsa Família.
Ainda que concordássemos com o que diz, o problema do raciocínio é que as eleições, para a vasta maioria das pessoas, não são guerras (imaginárias ou reais) entre dados e teses, mas entre imagens. Se existem pessoas que tomam suas decisões de voto apenas depois de ouvir a exaustiva argumentação racional dos candidatos em torno de diagnósticos e propostas, elas são uma minoria. E não apenas aqui, onde, por nossas distorções, o eleitorado é predominantemente constituído por cidadãos de baixa escolaridade e informação. Acontece o mesmo em qualquer lugar, incluindo os mais desenvolvidos. Em todos, os eleitores votam muito mais com imagens que com números na cabeça.
Fernando Henrique teve oito anos de governo para formar uma imagem de si, seus companheiros e ideias. Com seu cartão de visitas, o Plano Real, ganhou a admiração quase unânime do país. Se não terminou seu período com a imagem que julga condizente com o que fez, ninguém pode ser responsabilizado, fora aqueles que o integraram. Basta pensar no investimento em comunicação governamental nada pequeno que foi feito e que de pouco serviu, ao que parece.
O PSDB teve mais duas oportunidades de ouro para refazer a imagem do governo FHC, as campanhas de 2002 e 2006, ambas terminadas no segundo turno. Não foi por falta de tempo de televisão e de recursos que elas foram desperdiçadas.
Serra, sabendo que a grande maioria das pessoas queria a mudança naquela eleição, não pôde assumir o lado do governo de maneira inequívoca. Alckmin preferiu falar de sua gestão em São Paulo e emudeceu quando FHC foi trazido para o palco.
Engana-se quem acha que as privatizações foram um fantasma habilmente inventado por Lula para derrotar o PSDB. Elas não passavam de um símbolo das diferenças entre tucanos e petistas, FHC e Lula, “as elites” e “o povo”, “eles” e “nós”. Denunciando-as, muito mais era expresso, coisas que não são apagadas pelo fato de que “hoje existe celular para todos”.
Toda vez que entra diretamente no debate, FHC faz o que Lula quer. Só que o ex-presidente não consegue e nem deve evitá-lo. Esse é seu drama.
quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010
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