quinta-feira, 27 de novembro de 2008

Uma semana difícil

Durante toda a semana estou envolvido no concurso para professor do Departamento de Ciências Sociais da UFRN. É uma trabalheira danada! Fiquei sem nenhum um tempinho para alimentar este blog. Voltarei à carga assim que possível.

segunda-feira, 24 de novembro de 2008

Racismo em discussão


Um último material da Folha Online, repercutindo pesquisa sobre o preconceito racial no Brasil. Depois, assim que possível, transcreverei mais material da referida pesquisa.

Obra desvenda a construção e o funcionamento do racismo no Brasil; leia capítulo da Folha Online

O Brasil não é um país racista, mas é um país onde existe racismo. Em uma pesquisa da Universidade de São Paulo (USP), 97% dos entrevistados afirmaram não ter preconceito, mas 98% disseram conhecer pessoas que manifestavam algum tipo de discriminação racial.

A questão é um tema ainda difícil para o último país das Américas a abolir a escravidão, em 1888. Aqui, o debate sobre racismo é sempre atual, com todos os seus paradoxos e mitos, como o da democracia racial.

O estudo é citado no livro "Racismo no Brasil", da coleção "Folha Explica" da "Publifolha", que revela a maneira como se construiu, historicamente, o racismo à brasileira. Leia a introdução do livro, reproduzida abaixo, que leva o título de "Da Cor do Bronze Novo".

A autora é a antropóloga Lilia Moritz Schwarcz, da USP. Ela explica quais os principais debates das teorias raciais no século 19, como teorias justificaram a miscigenação, os efeitos da escravidão no imaginário racial brasileiro, o "apartheid" social", a questão da identidade e confusão e a raça projetada no outro. Ela também explica a formação do conceito de raça no país.

O livro também traz explicações, em comparação ao Brasil, de alguns aspectos do sistema de classificação racial dos Estados Unidos. A autora discute o mito da democracia racial e toca em uma questão vizinha ao racismo, a discriminação racial.

*
Introdução: "Da Cor do Bronze Novo"

"Uma feita o Sol cobrira os três manos de uma escaminha de suor e Macunaíma se lembrou de tomar banho. Porém no rio era impossível por causa das piranhas vorazes que de quando em quando na luta pra pegar um naco da irmã espedaçada pulavam aos cachos para fora d"água metro e mais. Então Macunaíma enxergou numa lapa bem no meio do rio uma cova cheia d"água. E a cova era que nem a marca dum pé de gigante. Abicaram. O herói depois de muitos gritos por causa do frio da água entrou na cova e se lavou inteirinho. Mas a água era encantada porque aquele buraco na lapa era marca do pezão de Sumé, do tempo que andava pregando o Evangelho de Jesus pra indiada brasileira. Quando o herói saiu do banho estava branco louro de olhos azuizinhos, água lavara o pretume dele [à]. Nem bem Jiguê percebeu o milagre, se atirou na marca do pezão de Sumé. Porém a água já estava muito suja do pretume do herói e por mais que Jiguê esfregasse feito maluco atirando água para todos os lados só conseguia ficar da cor do bronze novo [à]. Maanape então é que foi se lavar, mas Jiguê esborrifara toda a água encantada para fora da cova. Tinha só um bocado lá no fundo e Maanape conseguiu molhar só a palma dos pés e das mãos. Por isso ficou negro bem filho dos Tapanhumas. Só que as palmas das mãos e dos pés dele são vermelhas por terem se limpado na água santa [à]. E estava lindíssimo no Sol da lapa os três manos um louro, um vermelho, outro negro, de pé bem erguidos e nus [à]."1

Nos idos de 1928, Mário de Andrade recontou, à sua maneira, a famosa fábula das três raças. Depois de terem sido tão iguais, os irmãos acabavam ganhando as cores das "gentes locais", por conta de um milagre da natureza ou de um atributo de não se sabe quem. Nesse caso, porém, a narrativa surgia em meio a uma série de outras aventuras e desventuras de Macunaíma, esse herói "sem nenhum caráter". De toda maneira, no conjunto do livro, destacava-se uma intenção de incorporar culturas não-letradas indígenas, caipiras, sertanejos, negros, mulatos, cafuzos e brancos, cujo resultado era menos uma análise das raças e mais uma síntese das culturas locais. Afinal, a fórmula "herói de nossa gente" veio substituir expressão anterior "herói de nossa raça", numa clara demonstração de como o romance dialogava com o pensamento social de sua época e buscava se contrapor à versão pessimista, de finais do século 19, que entendeu a miscigenação como uma espécie de mácula nacional.

Mas, se essa é uma história famosa e dileta, não deixa de ser, também, uma "versão". Uma versão que remete a outra estrutura maior, que, de alguma maneira, vem repensando a nação a partir da raça, às vezes nomeada em função da cor. Pode-se afirmar, sem medo de errar, que, na maioria das vezes em que oficialmente se falou sobre esse país, o critério racial foi acionado: ora como elogio, ora como demérito e vergonha. No entanto, assim como se sabe que o nacionalismo é, no limite, uma invenção, é preciso deixar claro, também, que não se trata de um discurso meramente aleatório.

O fato é que não se manipula no vazio e que, apesar de muitas vezes pragmáticos, os rituais, ícones e representações nacionais dificilmente se impõem de forma apenas exterior. Entender as marcas simbólicas do poder político significa perceber como é possível descobrir intencionalidade na cultura política, mas também atentar para o fortalecimento de um imaginário nacional, que buscou raízes nos ditos populares e em certa maneira particular de entender a cor e a raça. Estamos diante, portanto, de representações que, além de estarem ancoradas na estrutura socioeconômica mais imediata, são partilhadas coletivamente, mesmo que reapropriadas segundo padrões nem sempre idênticos. E mais: nesse processo, a composição mestiçada da população sempre pareceu chamar atenção.

É por isso mesmo que este livro procurará acompanhar a trajetória do conceito "raça" em nossa história particular, sem abrir mão de pensar o momento presente e seus desafios.2 No primeiro capítulo, "Raça Como Negociação", o leitor será convidado a viajar pelos diferentes caminhos que o termo percorreu entre nós: desde meados do século 16 até os anos 1930 e depois até o contexto atual, o conceito ganhou visões variadas, que oscilaram entre as leituras mais românticas e as teorias detratoras. Na seqüência "Falando de História: Ser Peça, Ser Coisa", vai-se procurar analisar o impacto da escravidão brasileira na estrutura local e o perfil basicamente conservador do movimento abolicionista brasileiro.

Não se pretende, porém, limitar o problema ao passado. Ao contrário, a forma atual e particular que a questão racial assume aqui será o tema de dois outros capítulos. Em "Frágil Democracia: na Dança dos Números",interpretaremos os dados da demografia censitária, que vêm comprovando a existência de um apartheid social velado no país. Já em "Nomes, Cores e Confusão", a idéia é lidar com cenários paralelos: a "raça social" (que faz com que as pessoas "embranqueçam ou empreteçam", conforme a situação social e mesmo econômica) e o uso escorregadio da cor, que transforma raça em efeito passageiro, ou tema para a exclusiva nomeação. Para complicar ainda mais, no capítulo 5, "Raça Como Outro", estaremos diante dessa modalidade original de preconceito; um preconceito alterativo que localiza no próximo, ou no vizinho ao lado, a discriminação.

Concluímos com "Fechando ou Abrindo Essa História", já que "ninguém é de ferro". Questões desse tipo são melhores para pensar do que para resolver: vale mais incomodar e provocar do que estar à cata de receitas fáceis e prontas, ou poções mágicas que anunciem o final derradeiro do problema. No que se refere ao tema racial, estamos bem longe de um "E viveram felizes para sempre".

1 Mário de Andrade, p. 37-8.
2 Este texto guarda uma formulação original, mas representa, em alguns pontos delimitados, uma nova investida na discussão iniciada no ensaio de minha autoria "Nem Preto, Nem Branco, Muito Pelo Contrário", publicado no livro História da Vida Privada no Brasil, v. 4 (São Paulo: Companhia das Letras, 1998).

Lula e o preconceito

Mais da Folha Online.

Lula critica preconceito e diz que teve dificuldade para indicar negro ao STF

REGIANE SOARES
da Folha Online

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva criticou na madrugada desta sexta-feira o preconceito racial e a falta de espaço que os afrodescendentes têm na sociedade brasileira. Lula disse que existem poucos negros advogados ou médicos e que até teve dificuldade para indicar um negro como ministro do STF (Supremo Tribunal Federal).

Durante o discurso na cerimônia de formatura da Unipalmares --que tem 87% dos alunos afrodescendentes--, Lula contou a história de duas alunas que superaram as dificuldades e se formaram e hoje estão trabalhando em bancos. Na avaliação do presidente, a formatura dos 126 alunos, sendo 110 negros, demonstra que o Brasil começou a mudar.

"A gente tem que acreditar que o Brasil começou a mudar, porque a gente não via um negro no banco há muito tempo, a não ser se fosse para depositar dinheiro para o seu patrão. A gente não via negro dentista nem médico. Poucos negros são advogados. Eu lembro o esforço que fiz para encontrar um negro para levar para a Suprema Corte desse país", afirmou Lula, em uma referência indireta ao ministro Joaquim Barbosa --o único negro a integrar o STF.

O presidente também criticou o fato de a imprensa sempre mostrar o negro em em situações constrangedoras. Segundo Lula, quando um negro aparece na televisão, "normalmente é sendo preso pela polícia".

"Quero que a imprensa consiga retratar a beleza e a cara desses jovens que estão recebendo seus canudos. Porque muitas vezes o povo não consegue nem conquistar a auto-estima porque algumas pessoas não querem deixar. Ou seja, quando mostram um negro na TV, normalmente, é sendo preso pela polícia", afirmou.

Lula ressaltou a importância de a imprensa registrar a conquista dos estudantes negros, porque, segundo ele o Brasil não é apenas "um mundo de criminalidade que aparece na televisão". "Existem outras coisas importantes que o negro e o pobre fazem nesse país mas que não têm o espaço necessário", disse.

Políticos

A cerimônia de formatura na Unipalmares começou ontem à noite e se estendeu até a madrugada desta sexta-feira. A solenidade reuniu diversos políticos no ginásio do Ibirapuera, em São Paulo. Entre as autoridades estavam o governador de SP, José Serra (PSDB), o prefeito Gilberto Kassab (DEM), o senador José Sarney (PMDB-AP), além de Lula e seis ministros: Fernando Haddad (Educação), Edson Santos (Igualdade Racial), Márcio Fortes (Cidades), Miguel Jorge (Desenvolvimento), Orlando Silva (Esportes) e Luiz Marinho (Previdência).

O ex-governador Geraldo Alckmin (PSDB-SP) e a secretária de Estado do Rio Benedita da Silva (PT) foram os paraninfos dos formandos.

A formatura também contou com a participação de artistas como os cantores Martinho da Vila e Sandra de Sá e o ator Milton Gonçalves.

Barak Obama para presidente do Brasil

Ainda da Folha Online de ontem.

Verissimo compara avanços na luta contra o racismo no Brasil e nos EUA; leia artigo .


As primárias do Partido Democrata ainda não estavam decididas quando Luís Fernando Verissimo escreveu o artigo "A Questão", usando a candidatura de Barack Obama para a presidência dos Estados Unidos como ponto de partida para comparar os avanços de Brasil e EUA na luta contra o racismo.

afirma no artigo que, ao contrário do que acontece no Brasil, a guerra por direitos iguais nunca foi "disfarçada ou desconversada" nos EUA. "A miscigenação entre nós não tem significado integração por vias naturais, e sim apenas outra forma de despolitizar e adiar a questão", diz.

O artigo, que pode ser lido na íntegra abaixo, faz parte da coleção de crônicas de Luís Fernando Verissimo selecionadas para o livro "O Mundo É Bárbaro - E o que Nós Temos a Ver Com Isso", da editora Objetiva, disponível na Livraria da Folha.

Em textos breves, Verissimo exibe olhar crítico sobre temas como racismo, política, economia, a ascensão chinesa, a guerra contra o terror, o passado e o futuro do Brasil e da América Latina.

Leia abaixo o artigo do autor sobre como os EUA e o Brasil lidam com o racismo.


A Questão

É difícil imaginar um negro como Barack Obama sendo eleito presidente - do Brasil. Dos Estados Unidos, talvez. Lá um negro já chegou a secretário de Estado, e foi substituído no cargo por uma negra. Desculpe: afro-descendente. Pelo menos não escrevi "um negão como Barack Obama", ou, para mostrar que não sou racista, "um negrinho".

A diferença entre um país e outro é essa. Lá o racismo é uma questão nacional. Aqui uma ficção de integração dilui a questão racial. E se a questão não existe, se ninguém é racista, por que nos preocuparmos com denominações corretas ou incorretas? Só quando a ficção é desafiada, como no caso das cotas universitárias, é que aparece o apartheid que não se reconhece.

Um dos marcos das relações raciais nos Estados Unidos não foi a primeira vez em que um negro interpretou um herói no cinema, provavelmente o Sidney Poitier. Nem a primeira vez em que um negro e uma branca, ou vice-versa, namoraram na tela. Foi a primeira vez em que um negro foi o vilão do filme. Colin Powell e Condoleezza Rice, que chegaram a secretários de Estado, e o próprio Obama, devem suas carreiras a esse vilão histórico, que significou o fim dos estereótipos e a aceitação, sem melindres, de que negro também pode ser ruim, igual a branco. Se a cor da pele não determinava mais que ele fosse sempre retratado como um inferior virtuoso ou uma vítima, também não o descriminava de outras maneiras. Powell e Rice levaram essa reversão de esteréotipos ainda mais longe. Os dois são do partido republicano. Como Clarence Thomas, único juiz negro da Suprema Corte americana que também é um dos seus membros mais conservadores.

Claro que a cor da pele vai ser um fato na eleição ou não do Obama, como o fato de ser mulher vai ajudar ou não a Hillary. Por isso mesmo, sua possível eleição seria uma prova dessa transformação da questão racial no país, uma vitória numa guerra por direitos iguais que lá - ao contrário do Brasil - nunca foi disfarçada, ou desconversada. Aqui a miscigenação significou que alguns quase-negros, ou só um pouco afro-descendentes, chegassem ao poder, mas miscigenação entre nós não tem significado integração por vias naturais, e sim apenas outra forma de despolitizar e adiar a questão.

Obama será o candidato dos democratas? Estão comparando sua campanha com a de Bob Kennedy, pelo entusiasmo que provoca numa faixa de idade que não se interessava tanto por política desde a mobilização contra a guerra do Vietnã. Li que 40 por cento dos americanos que podem votar este ano nunca conheceram outro presidente que não fosse um Bush ou o Clinton, e Hillary seria outro Clinton nessa dança de dinastias. Assim, Obama seria uma novidade em mais do que o sentido racial. Como se precisassem outros.

Na comparação com Bob Kennedy, claro, ninguém ainda lembrou (pelo menos não sem bater na madeira) que aquela novidade terminou numa poça de sangue, no chão de uma cozinha de hotel. Batamos todos na madeira.

Mais sobre preconceito racial

Mais um material destacando a pesquisa do DATAFOLHA sobre o preconceito racial. A matéria foi publicada na Folha Online de ontem.

Nova pesquisa Datafolha mostra que o racismo perdeu força no Brasil. Um novo levantamento reedita perguntas sobre o tema feitas há 13 anos e constata que uma fatia menor de pessoas declara seu preconceito contra negros (3% hoje contra 11% em 1995). No entanto, ainda há uma forte percepção de que o Brasil é um país racista (91%, praticamente a mesma porcentagem de 13 anos atrás). A reportagem completa está disponível apenas para assinantes da Folha de S.Paulo e do UOL.

A proporção dos entrevistados que se autodeclaram brancos caiu de 50% para 37%, enquanto a dos que se dizem pardos aumentou de 29% para 36%.

Indicadores de salário e escolaridade entre a população negra também tiveram melhora, contudo a média de anos de estudo de pretos e pardos é ainda menor que a de brancos em 1995.

Na questão de oportunidade de trabalho, cresceu a porcentagem dos pretos e pardos que dizem sofrer discriminação no trabalho/obtenção de emprego (de 45% em 1995 para 55% hoje). Também aumentou o número de entrevistados que se dizem discriminados no estudo/cultura (de 14% para 20%).

Sobre cotas

Transcrevo abaixo matéria publicada na Folha Online (aquela parte do material jornalístico do jornal Folha de São Paulo de acesso irrestrito). Trata-se de uma discussão sobre pesquisa realizada pelo DATAFOLHA a respeito do preconceito racial no Brasil.

Brasileiros vêem cota como essencial e humilhante, revela Datafolha
ANTÔNIO GOIS
da Folha de S. Paulo, no Rio


Polêmicas desde que começaram a ser implementadas, em 2002, no Brasil, as cotas para negros nas universidades continuam dividindo opiniões. Se, por um lado, 51% da população se diz a favor da reserva de vagas para negros, por outro, 86% concordaram com a afirmação de que as cotas deveriam beneficiar pessoas pobres e de baixa renda, independentemente da cor.

As respostas seguem contraditórias quando 53% dos brasileiros concordam que cotas são humilhantes para negros, mas, ao mesmo tempo, 62% dizem que elas são fundamentais para ampliar o acesso de toda a população à educação. Também 62% dizem que elas podem gerar atos de racismo.

Leituras diversas

Como era esperado, o resultado da pesquisa do Datafolha gerou leituras diversas de críticos e de pessoas favoráveis ao sistema.

A antropóloga Yvonne Maggie, contrária à reserva de vagas por cor ou raça, destaca a incoerência dos resultados do levantamento. Para ela, no entanto, é natural que, dependendo da forma como a pergunta é feita, a população concorde com a idéia de dar vantagens àqueles que se sentem mais discriminados.

"Quem vai negar vantagens aos que dizem ser mais discriminados? As pessoas, no entanto, acreditam no esforço pessoal e também são favoráveis ao mérito, até em percentual maior. Também acham que as cotas podem provocar racismo. Será que estão fazendo o cálculo de que é melhor racismo, contanto que as pessoas ganhem alguns privilégios?", questiona a antropóloga.

Aceitação

Renato Ferreira, do Laboratório de Políticas Públicas da Uerj (Universidade do Estado do Rio de Janeiro) e defensor do sistema, diz não ter dúvidas de que há uma aceitação à política de cotas.

"Os meios de comunicação, via de regra, se manifestam contrariamente. Se sai algo positivo, quase não comentam. Se é negativo, isso reverbera. Dentro desse contexto, acho significativo que a maioria da população hoje concorde com as cotas raciais", afirma.

Ferreira fez um levantamento que mostra que, no Brasil, já há 82 instituições públicas adotando algum critério de ação afirmativa no acesso ao vestibular, seja ele de cotas ou de bonificação extra para alunos por sua cor, renda ou tipo de escola cursada no ensino médio.

As ações afirmativas em exames de ingresso, no entanto, estão sendo contestadas numa ação que ainda não foi julgada pelo Supremo Tribunal Federal. Até agora, essas universidades têm conseguido manter nas instâncias inferiores da Justiça seus sistemas.

O STF, porém, ainda não julgou uma ação movida pela Confenen (Confederação Nacional dos Estabelecimentos de Ensino) contra o ProUni, programa do governo federal que adota ações afirmativas na distribuição de bolsas para estudo em instituições privadas. Caso declare inconstitucional esse critério, a decisão afetará as instituições públicas.

"A Constituição determina que ninguém terá tratamento desigual perante a lei e que o acesso ao ensino superior se dá por mérito. Na reserva de vagas, há uma discriminação ao contrário, e entendemos que isso é ilegal", diz Roberto Dornas, presidente da Confenen.

Qualidade

Enquanto não há decisão definitiva, as universidades que divulgaram resultados sobre o desempenho acadêmico dos cotistas têm defendido que isso não afetou a qualidade.

Ricardo Vieralves, reitor da Uerj, uma das pioneiras, diz que houve necessidade de criar aulas de reforço, mas que os alunos que se formam saem com a mesma qualidade. Ele afirma também que não foram registrados casos de racismo.

Adriana Pastor, 23, que entrou no curso de odontologia da Uerj graças às cotas, diz não ter percebido diferenças no desempenho entre cotistas e os demais. "Acho que fui uma das melhores alunas de minha turma e não percebi nenhum tipo de preconceito entre meus colegas. Para mim, a maior dificuldade do curso foi que o material era muito caro", diz.

A crise e o mundo em descontrole

Com o título "Um mundo em descontrole", postei, há alguns dias, um artigo, publicado no EL PAÍS, de autoria do Professor Daniel Innerarity, da Universidade de Zaragoza. Pois bem, recebi o Ex-Blog do César Maia e nele uma parte do interessante artigo está traduzido para o português. Para facilitar a sua leitura, transcrevo o artigo mais abaixo, alertando sempre que a tradução e organização do artigo é de responsabilidade daquele "ex-blog".


1. A idéia de um mundo interconectado, que nos serviu de lugar comum para designar a realidade da globalização, implica, em princípio, um mundo de responsabilidade limitada, porque não difunde o abertamente irresponsável, sobre o qual não se pode estabelecer nenhum controle e de que ninguém se ocupa.

2. A interconexão significa, por um lado, equilíbrio e contenção mútua, mas também se refere ao contágio, os efeitos em cascata e a amplificação dos desastres, como é o caso da recente crise financeira. O mundo interligado é também esse "mundo atrevido" de que falava Giddens na hora de qualificar os aspectos menos gratos da globalização. No entanto, não sabemos detectar, gestionar e comunicar os riscos globais. A globalização financeira é muito mais frágil do que a comercial.

3. Uma parte dos riscos havia sido dispersa no mercado, de maneira que as instituições financeiras apenas podiam medi-los e estimar seu impacto futuro. Quando o horizonte temporal se estreita e só é levado em conta o interesse mais imediato, é muito difícil evitar que as coisas evoluam catastroficamente. A crise financeira é, em última instância, uma crise de responsabilidade e o procedimento que melhor representou isso foi a extensão dos produtos financeiros, como a titulação (produção das correntes de derivativos), que traduziam a vontade de afastar os riscos até ao infinito, ou seja, aceitar os riscos sem querer assumir suas conseqüências.

4. Tratar-se-ia de algo que poderíamos denominar de "riscos sem riscos". A titulação atuou como um mecanismo global de "irresponsabilização", que disseminava e dissimulava ao mesmo tempo os riscos, tornando opacos os mercados. Este e outros produtos financeiros permitiam evitar ou neutralizar os riscos das operações de empréstimo, transferindo a responsabilidade para os mercados de natureza especulativa. A opacidade dos mercados impedia o controle e tolerava os riscos excessivos, títulos opacos cujos riscos ninguém era capaz de avaliar.

5. A isso se juntaram certas operações de resgate, que serão inevitáveis, mas que não servirão para promover condutas responsáveis. Beneficiaram-se de tais medidas aqueles atores econômicos que podem assumir riscos excessivos sem ter de sofrer as conseqüências das catástrofes em série que sua quebra poderia produzir no resto da economia.

6. Por isso tudo, deve-se limitar a titulação, ou seja, a opacidade dos riscos no mercado de produtos derivados, de maneira a que as dívidas não sejam instrumentos de especulação; responsabilidade dos acionistas, reservando o direito de voto aos que se comprometam de forma estável com a empresa para permitir-lhe conduzir uma verdadeira estratégia; responsabilidade dos Estados, que se devem entender sobre um sistema de paridades estáveis, impedindo, assim, as oscilações violentas de divisas, desconcertantes para os agentes econômicos; e responsabilidade dos bancos centrais.

7. Mas convém não perder de vista que estes compromissos foram conseguidos por meio de uma rede cada vez mais densa de dependências, onde as obrigações perderam visibilidade e nitidez. Ao mesmo tempo, um mundo de crescentes interdependências aumenta também o número de conseqüências das ações que não são fáceis de imputar. Este conjunto de circunstâncias e outras similares justificam a denominação de "irresponsabilidade organizada" (Ulrich Beck) na hora de qualificar nossas sociedades.

(*) Titulação consiste em converter um empréstimo ou um ativo não negociável (participações hipotecárias) num título negociável (bônus denominados hipotecários), etc...

domingo, 23 de novembro de 2008

Um tema fundamental para a NSE: as emoções nas transações econômicas

Uma das possibilidades de desenvolvimento da Nova Sociologia Econômica é investir na análise do papel das emoções nas tomadas de decisões na vida econômica. Se você se interessa por essa temática, aconselho-te a procurar mais informações sobre os trabalhos desenvolvidos pelo cientista social norte-americano Paul DiMaggio.

A “economia da grandeza”: um filão teórico para a análise da globalização

Não raro, as análises sobre a chamada globalização, mesmo aquelas que se pretendem sociológicas, escorregam em duas armadilhas comuns: a denúncia ou o discurso profético. Por isso, o empreendimento sociológico desenvolvido por Luc Boltansky e Laurent Thévenot, centrado na explicitação das gramáticas políticas e dos mundos morais nos quais estão encaixadas as transformações econômicas contemporâneas, é uma alternativa aos lugares-comuns. Unindo pesquisa empírica e refinadas referências teóricas, além de um sofisticado conhecimento filosófico, a “empresa” sociológica dos dois cientistas sociais franceses é um aporte fundamental para os que querem adentrar na seara da análise sociológica da vida econômica. Sem jogar os valores para debaixo do tapete, ou descartá-los como próprios da individualidade ou das normas, como é usual para muitos sociólogos e economistas, Boltansky e Thévenot fazem um exercício radical: tomam os valores que referenciam as práticas para compreender as transações efetuadas entre os atores. A idéia é a de que, especialmente nas disputas desenvolvidos pelos agentes sociais nas mais diversas esferas, estão em jogo valorações de si e dos outros (“grandezas”) que necessitam ser levadas em conta na análise sociológica. Essa “economia da grandeza”, posso afirmar sem medo, é o que há de mais promissor na sociologia contemporânea.

Uma entrevista com Saramago


Vamos direto ao ponto. Até porque Saramago dispensa apresentações. Trancrevo abaixo uma entrevista com o grande escritor, que completou 86 anos, publicada no jornal espanhol EL PAÍS.

"No me hablen de la muerte porque ya la conozco"

José Saramago siempre fue algo más que un escritor. "Un aprendiz", sería su respuesta. Así se presentó ante la Academia Sueca cuando recogió el Premio Nobel de Literatura, el primero concedido a un autor portugués, hace ahora 10 años. "Un maestro, el maestro", puntualizaría el crítico más exigente del universo, Harold Bloom. Para el autor de El canon occidental, Saramago, que este noviembre ha cumplido 86 años, es "el novelista vivo más talentoso del mundo" y "uno de los últimos titanes". Como un titán ha escrito su último libro, El viaje del elefante (Alfaguara). Un triunfo del lenguaje, la imaginación y el humor, arrancado literalmente a la muerte.

Capítulo I

Observaré lo que sucedió con el silencio con que las raíces de las plantas agujerean la tierra

(Mongane Wally Serote)

Un día de las navidades de 2007, José Saramago se fijó en sus ojos. Eran enormes. Se habían expandido como círculos concéntricos en su rostro. Y los ojos lo miraban a él. Con extrañeza. Con curiosidad. Con asombro. Parecían decirle: "Así que sigues por aquí, todavía aquí".

No es un episodio de El hombre duplicado (2002), una de sus novelas. Pero durante un tiempo sí que había un doble, otro Saramago, testigo de su lucha por salir con vida. El doble era un tipo sereno. Le corrigió. No, no han sido los ojos los que han crecido. Es la carne, la musculatura que ha desaparecido. Por eso con tu piel ocurre lo que con las momias, que se ha replegado y se ciñe a los huesos. Es eso lo que agranda los ojos. Siguen siendo lo que eran, pero el entorno ha cambiado. El doble lo conocía bien. Iba a añadir: son como astros resplandecientes en la ruina. Pero se atuvo al estilo más conciso, poético, sí, pero menos barroco del Saramago que volvió a abanear la narrativa contemporánea, no sólo la portuguesa, cuando publicó Ensayo sobre la ceguera (1995). La primera revolución en la forma de narrar había sido en 1980 con Levantado do chão (Levantado del suelo).

-Has perdido 20 kilos, Zé. Siempre has sido delgado, enjuto. Como el abuelo Jerónimo. Pero 20 kilos son muchos kilos. Mides 1,80. Tenías 71 kilos y ahora tienes 51. Piensa en las manzanas asadas. Y en lo que dijo Josefa.

El doble lo sabía todo. Sabía que el abuelo Jerónimo Merlinho, el de la aldea natal de Azinhaga, el marido de Josefa Caixinha, se había despedido de la vida abrazando cada uno de los árboles de la huerta. Jerónimo, el que enseñó al nieto a contar historias durmiendo en el verano bajo la higuera, será recordado como un clásico en toda la historia de los discursos de entrega de los Nobel. Así comenzó la intervención de Saramago: "El hombre más sabio que conocí en toda mi vida no sabía leer ni escribir". Sí, el doble lo conocía bien. ¿Qué había dicho Josefa? "El mundo es tan bonito y yo tengo tanta pena de morir".

José llevaba tiempo, unos años ya, con malestar físico. Un hipo interminable lo había debilitado. Pero lo ayudaban mucho las manzanas asadas. No había dejado de escribir como un titán. Ni de moverse por el mundo denunciando la globalización como "un nuevo totalitarismo" o con su cita preferida, la de La sagrada familia (la de Karl Marx): "Si el hombre es formado por las circunstancias, entonces es necesario formar las circunstancias humanamente". Las cosas de Saramago, decían los cínicos. En 2005 había escrito Las intermitencias de la muerte. No era tampoco una abstracción. La muerte era una presencia física, tangible. "Uno es creador de sus personajes", había escrito, "y al mismo tiempo, criatura de ellos". El personaje de la muerte pasó de lo invisible a lo visible. No era un juego. Venía para llevárselo. José Saramago lo recuerda bien. Pero él no estaba conforme. Una parte de su cuerpo sí parecía resignada. Aceptaba la crisis. Llegó a pararse de tal forma, que casi era imperceptible eso que llaman el hilo de la vida. Al principio, en la clínica de Lanzarote, llegaron a dudar de la conveniencia del ingreso.

-Supongo que no querían que aquél fuese el lugar del fin de Saramago. Les estoy muy agradecido. La muerte no me ha llevado. Era consciente, sabía, veía, sentía, que estaba al borde de pasar al otro lado. Más tarde decía: 'No me hablen de la muerte porque ya la conozco. De alguna forma ya la conozco'.

Había otras partes de su cuerpo que no estaban conformes. Ni el corazón, ni la cabeza. El corazón siguió latiendo con fuerza. La mente, durante un tiempo, dos días después de salir de la UCI, estableció unas coordenadas que ahora Saramago recuerda como un entrañable autorretrato vanguardista. "En aquel momento, que fue de los peores, se plantaba en mi cabeza algo que era un fondo negro con cuatro puntos luminosos que formaban un cuadrilátero irregular. Y yo tenía muy claro que ese cuadrilátero era yo".

Uno tiene una memoria corporal. ¿Qué relación ha tenido con su cuerpo José Saramago? Yo he aceptado mi cuerpo. No ha sido nunca el cuerpo de un Adonis. He tenido con la edad un cierto declive. No he sido nunca un hombre de músculos. Tengo un esqueleto estrecho. Lo acepté. Con una cierta vanidad, quizás sí, quizás no, me gusta que después de los cambios, y en este caso último la enfermedad, mi cuerpo siga presentando una cierta...armonía. Una buena apariencia física. En el fondo no estoy descontento. Pero pasar de ahí a una especie de adoración de mi propio cuerpo, cuidándolo mucho, nunca he caído en esa tentación. Ni siquiera puedo utilizar la palabra tentación porque nunca la he tenido.

Los ojos de Saramago, definitivamente, y al margen de la encarnadura de la cara, son enormes. Ojos que contienen ojos. Sus pausas al hablar no parecen destinadas al descanso, sino que ceden el lugar a la mirada como una avanzadilla del lenguaje. Esa clase de silencio con que las raíces avanzan en la tierra.

Capítulo II

Mi propia voz me animaba

(William Wordsworth)

Un día, a comienzos de 2008, José Saramago oyó de la boca de un médico la palabra "milagro". No suena mal en boca de la ciencia, pero él nunca se conforma con lo inexplicable. Él identificó el milagro con la profesionalidad del cuerpo médico, con los cuidados de su mujer, Pilar del Río ("Ganaremos la primavera"), con la lealtad del corazón ("un corazón estupendo") y con la emersión de una energía en principio extraña a su carácter. El humor. Un humor expansivo, impelente, incesante. Un humor que impresionó al doble, a aquel otro Saramago que permanecía sereno, algo perplejo, sí, observándolo todo. Nunca se había visto a sí mismo contando chistes.

-Me gustaría que hubieras estado en el hospital durante la visita de los médicos y que escucharas los diálogos. Yo, que estaba en una situación de riesgo, mal, muy mal, pero me sentía con una libertad de expresión exultante. El humor con el que yo me comunicaba en el diálogo con ellos me sorprendía, me emocionaba. Oía a ese que hablaba, el enfermo que yo era, y pensaba como un ser redoblado: ¿Cómo es que estoy hablando así con esta gente? No soy capaz de reproducir ningún diálogo. Era el tono. Mi tono era ése. Ellos se miraban. Sonreían. Yo seguía... No era algo premeditado. Yo no pensaba: tengo que demostrar a esta gente que estoy bien. Era todo lo contrario de lo que se pudiera esperar de una persona en mi estado.

Saramago, el hombre silencioso, el hombre serio, al que algún cáustico atribuyó una "gravedad 'cachimbal". [Sonríe] ¡Eso era cuando fumaba en pipa! Es verdad. Yo he sido, desde muy niño, callado, reservado, melancólico. Nunca he tenido la risa fácil. Incluso la sonrisa, para mí es algo que me cuesta trabajo. Y las alegrías o las tristezas en mí son interiores, no las manifiesto. Ya de niño era así.

Sin embargo, si hay una constante en su obra es la ironía, un tipo de humor muy profundo. El humor llega más tarde. En lo que escribía a los 23 años no había humor ninguno. El conocimiento propio, el conocimiento de los demás, ésa es la base del humor. El humor es una creación muy laboriosa.

Después de publicar 'Levantado del suelo', dijo: "No escribo para satisfacer dictámenes. Escribo un poco como quien respira, como quien habla". Tal vez el lenguaje acudió ahora en ayuda del cuerpo. Sin duda. Era como si me transportara, como si me apoyase en el lenguaje. Yo mal podía moverme en la cama, pero me sentía llevado por el lenguaje. Una mente que era consciente de la realidad de mi estado, de la situación límite, que a la vez era capaz de desdoblarse y funcionar como si no pasara nada, como si la libertad de la mente, del argumento irónico, no estuviera bajo la presencia constante de la enfermedad, eso ha contribuido muchísimo para salvarme. El humor, una capacidad de animación oral extraordinaria, ese funcionamiento de la mente. Y curiosamente, de todo esto yo he salido con un espíritu totalmente sereno, de una serenidad impresionante. No es como si no hubiese pasado nada, porque creo que esa sensación de serenidad total es también una consecuencia de la enfermedad. No porque yo hubiera aprovechado para hacer un examen de conciencia. Yo no he hecho ningún examen de conciencia. Quizá por la proximidad, por una proximidad casi tangible de la muerte, he salido con una serenidad que se mantiene hoy. Comparada con el centro del huracán, donde no pasa nada, donde el aire no sopla.

-Lo convencional es pensar que uno, en esas circunstancias, hace balance de la vida. De lo bueno y de lo malo. Calcular el peso del alma. Es cuando pronuncia una de esas grandes frases, como el Borges que decía: "He cometido el más grande pecado que un hombre puede cometer...No he sido feliz".

-Eso es una operación mental, que fabricas luego. Conmigo no ha ocurrido eso. Yo he regresado a la vida. He regresado con naturalidad y con esa serenidad total de la que hablaba. No podía moverme y no me movía. Quizá llegase el día... Y llegó. Un médico me ha dicho: usted necesita por lo menos un año para recuperar algo que se parezca a la normalidad. Bueno, ha sido todo más rápido, sorprendentemente rápido, pero, al mismo tiempo, duro. Ya que hablamos de humor, tal vez la frase apropiada para el momento sea una expresión francesa: Reculer por mieux sauter (Esperar el mejor momento).

En 'El viaje del elefante', el humor es gozoso. De la estirpe de Cervantes y Fellini. Después de la enfermedad, ¿podríamos hablar de un tercer Saramago, de una especie de catarsis? Quizá se pueda decir eso. Salí del hospital y me senté a trabajar. No podía con mi alma. Y los dos primeros días después de salir me dediqué a la corrección de lo que había escrito antes, unas cuarenta páginas. Y al tercer día ya estaba avanzando en El viaje del elefante. Ésa es una situación en la que tiene cierta lógica que uno se pregunte: ¿quién está haciendo esto por mí? Porque en principio no podrías. ¿Cómo vas a poder escribir en esas condiciones? Lo hacemos, pero nos parece tan sorprendente que hayamos podido hacerlo. Mi relación con este libro es ésta: ¿cómo es posible que lo haya podido hacer?

Samuel Beckett hablaba de una "extraña obligación" en ese seguir adelante... Yo había escrito 40 páginas de El viaje del elefante en 2007. La pauta ya estaba marcada. Tenía un punto de partida, unos datos históricos mínimos. El empeño del rey portugués João III de regalar a su primo el archiduque de Austria un elefante hindú que llevaba dos años en Lisboa, y la aventura que supone trasladar en comitiva ese animal hasta Viena. Hay una frase en el pórtico de la novela que pertenece al Libro de los itinerarios: "Siempre llegamos al sitio donde nos esperan". Tal vez ése es el secreto. Para mí escribir es también una función vital. También para mí es un viaje. Bueno, el caso es que sale algo que es, pero podría no ser. La composición de este libro es extraña. En el fondo yo no sé nada de este libro.

Si lo dijese otro autor me parecería una 'boutade'. A usted le creo. ¿Quién, en realidad, está narrando? No tengo ninguna respuesta. La asociación de ideas tiene para mi trabajo una importancia que no he podido calibrar. Me fío mucho de la asociación de ideas. Yo siempre he negado la existencia del narrador. Los estudiosos me decían: "¡Usted está equivocado!". Y yo les ponía un ejemplo: ¿dónde está el narrador en una obra de teatro? Cuando me puse a escribir esta historia, me dije: ¿queréis un narrador?, ¡pues aquí estoy! Así que estoy contando la historia como quien está sentado en la cocina de mi pueblo contando una historia. Y aquí podríamos decir el refrán: "A quien cuenta un cuento siempre le crece el cuento". Por lo demás, el libro es un homenaje a la lengua portuguesa.

Capítulo III

"Siempre he intentado vivir en una

torre de marfil, pero una marea

de mierda no deja de golpear sus

muros y amenaza con tirarla abajo"

(Gustavo Flaubert)

García Márquez decía recientemente que "sufría como un perro" cuando leía la prensa. ¿Usted también está enojado con el periodismo de hoy? Creo que Gabo dramatiza y yo ya no dramatizo nada. Tal vez es verdad que hay una cierta rebaja en la calidad de los escritos. Pero depende. ¿Cómo podemos decir que el periodismo de ahora es peor que el de antes? Pienso en Portugal, en España, con las dictaduras, cuando la información era intoxicación, y entonces, ya no sufro. Ni como un perro ni como nada.

No hace periodismo de redacción, pero vuelve a estar en primera línea. Un premio Nobel, un autor célebre, va y abre un sencillo 'blog' en la Red, 'Cuaderno de Saramago' (en portugués y castellano), como un aprendiz. Sus libros obtienen las mejores críticas en los principales medios de Estados Unidos, como 'The Washington Post' o 'New Yorker', sin importarles su posición política. Están en las librerías de todos los continentes. Podría publicar en los grandes medios de opinión. ¿Por qué ese 'blog'? ¿Por disidencia? Quizás es esa novedad de volver a empezar. Escribir sin ningún condicionamiento. Los medios te pagarían, claro está. Pero mira, ha ganado Obama, me felicito, y a continuación escribo un artículo en el que pido sin medias tintas el cierre de Guantánamo y el cese del bloqueo económico a Cuba. Y así, sobre lo que se me ocurre. En realidad, el sistema acaba por integrarte. En el fondo no eres más que una guinda en el pastel. Te toleran. Se ríen de ti. ¡Cosas de Saramago!

Lo que usted llama guindas pueden ser espacios de resistencia. Por lo que parece, el ridículo lo está haciendo el sistema. En un texto sobre Marcos Ana (en prisión franquista desde 1939 a 1961) usted hablaba de derrotar el cinismo, la indiferencia y la cobardía. Por supuesto. Para nada soy cínico. Lo que digo es que soy por definición muy escéptico. No es bueno, ya lo sé. Me gustaría entusiasmarme, pero no lo consigo. Hay una grave crisis, pero los ciudadanos no tenemos mecanismos para influir. Pero, por lo menos, deberían decir la verdad. Fíjese usted, António Guterres, cuando era primer ministro, declaró en una entrevista: "La política es el arte de no decir la verdad". ¡Y nadie se levantó para protestar! Aunque no queramos, a los ciudadanos nos arrastra la corriente. O la estampida. Ahora bien, hay que decir: no estoy de acuerdo. El escepticismo no es resignación. Yo nunca me resignaré. Cada vez me siento más como un comunista libertario. Hay tres preguntas que no podemos dejar de hacernos en la vida: ¿por qué?, ¿para qué?, ¿para quién?

¿Usted nunca se vendió? Quiero decir, ¿no tiene la sensación de haberse vendido nunca, por ejemplo, para un premio? No. Nunca me he vendido. No me he vendido. Ni material, ni simbólicamente. El Premio Nobel consagra algo que ya estaba ahí. En la, digamos, clase literaria hay una serie de gente que no me soporta.

¿Por qué existen estos odios entre escritores, a veces más intensos cuanto más vecinos? Eso que decía Jean Chapelain: "El escritor no lee a sus colegas, los vigila". Para mí resultan inexplicables. No sé. No creo que se trate de la persona, no creo haber dado motivos. Tal vez no se soporta eso que llaman el éxito, o la fama, el Nobel... Cuando yo aparecí en los años ochenta, el panorama literario estaba organizado, completo, cada uno en su

lugar. Y si había envidias, pues también estaban en su lugar. Yo no estaba previsto.

Manuel Vicent dice que en la cultura habita lo mejor y lo peor de la humanidad. En mi caso, creo que algunos simplemente se sintieron amenazados en su lugar. Pero lo que nadie puede decir es que haya escrito un libro malo.

Con odios o sin odios, no creo que tenga que preocuparse ya por los duelos en los salones literarios. Cuando me dieron la noticia del Premio Nobel estaba en la feria de Francfort. Di una rueda de prensa y dije: "Yo no he nacido para esto, pero esto me fue dado". Es verdad. No he nacido para esto. No nací para esto ni para aquello. Nadie puede decir que nadie nació para esto. [Al fin, sonríe] Tampoco Obama nació para ser presidente.

En sus obras hay personajes inolvidables, fascinantes, que pertenecen a la realidad inteligente. ¿No me diga que no se enamoró de Blimunda, la de 'Memorial del convento'? Blimunda... ¡Sería mucha mujer para mí! Aunque es sencilla. Tal vez la mujer del médico de Ensayo sobre la ceguera... Sí, tal vez ella.

Da la impresión de que, en la realidad, ha sido más amigo de las mujeres que de los hombres. Sí. Eso es verdad.

Hubo un tiempo en que se propagó que había elegido el exilio. Un exilio español. Y es verdad que tiene un hogar en la isla, en Lanzarote. Pero no parece usted un autoexiliado. Cuando estoy allá, también estoy aquí. Nunca me he ido. Expresé mi protesta a un Gobierno conservador por la actitud censora que tuvo con El Evangelio según Jesucristo. Y he criticado otras cosas de Portugal. Y de España también. Y de este mundo, que para tantos tiene la forma del infierno. Pero, ¿qué sería de un escritor sin la libertad de palabra?

Da la impresión de que su imagen en Portugal ha cambiado mucho en los últimos tiempos, de que es más querido, menos polémico, incluso para aquellos que mantienen opiniones políticas contrapuestas. Ya sé que no le gustan las grandilocuencias, pero digamos que es respetado por todos como un héroe portugués. Es verdad. Noto menos rechazo. Y un proceso de reencuentro, después de malentendidos. En fin. También hay gente que antes decía: "Es bueno, pero es comunista". Y ahora dice: "Es comunista, pero es bueno".

Pronto habrá una gran sede de la Fundación Saramago. Y en un lugar muy especial de Lisboa. La Casa dos Bicos, al pie de la Alfama. Eso sí que es un reencuentro. Sí. Es un edificio que cede la cámara municipal por 10 años. Constituye un gran reto. Tiene que ser una factoría creativa. La Casa dos Bicos fue construida en el siglo XVI, inspirada en el italiano Palacio de los Diamantes. En el siglo XX fue almacén de bacalao. La zona, en la Ribeira Velha, es muy popular. Una maravilla. Te voy a decir algo muy importante para mí. Llega un momento en que te crees que tal vez no es una utopía que te den el Nobel. Tu nombre empieza a ser barajado, junto a otros. Van pasando los años. El nombre se repite. Y piensas: bueno, pues, ¿por qué no? Tal vez me den el Nobel. Pero nunca, nunca, jamás soñé que la Casa dos Bicos pudiese ser sede de una fundación llamada José Saramago. ¡Las veces que pasé por delante desde niño! Soy poco expresivo, pero, a veces, sólo con pensarlo tiemblo de emoción con todo el cuerpo, de arriba abajo.

Capítulo IV

"El instante en que ya no sea

más que un escritor habré

dejado de ser un escritor"

(Albert Camus)

Eduardo Lorenço habla de Saramago como "la mano izquierda de Dios". Es ateo, pero crece empapado de cultura cristiana. ¿Para el erotismo, para el amor, ha tenido que luchar mucho contra el pecado? No. Cuando escribí El Evangelio según Jesucristo, que tuvo las consecuencias que sabemos, en el discurso de agradecimiento al jurado le puse un título que era El derecho al pecado. Uno de los grandes inventos de la Iglesia católica ha sido inventar el pecado, y después de inventar el pecado, inventar un instrumento de control de la gente. ¿Quién ha decidido lo que es pecado y lo que no lo es? Gran parte de la historia es un absurdo. Y la historia oficial, en la que la Iglesia ha tenido tanto que ver, es una sucesión de disparates. Pensemos en los muertos por la Inquisición. Incluso, en un grado menor, lo que ocurrió con el gran Camões. Tuvo que defender cada uno de sus versos para obtener el plácet del Santo Oficio. Escribí una obra de teatro sobre ese caso, Que farei com este livro?, que refleja el estado de permanente vigilia, peligro y prohibición en que ha vivido la literatura en nuestros países.

¿Qué ha significado para José Saramago su compromiso como comunista? Actualmente no tengo otra militancia que no sea la militancia indirecta de lo que escribo. Pero la participación política me ha dado algo muy importante. Un sentimiento solidario muy fuerte, la conciencia de tomar parte en una lucha por la humanidad, con todas las sombras históricas que esa lucha ha tenido. En estos asuntos es muy importante la memoria colectiva, pero también la personal. Recuerdo siempre a un camarada con el que yo trabajaba y que fue preso por la policía política. Lo sometieron a la tortura del sueño, la privación del sueño, durante dos semanas. En ese estado no me denunció, no habló, no dijo de mí ni una palabra. Asoció eso a la integridad humana. Ha habido mucha gente así sin esperar nada a cambio. No puedo imaginarme fuera del partido. Hace unos años, después de la revolución, Álvaro Cunhal (líder comunista portugués) tuvo que someterse a una grave operación y antes escribió unas cuantas cartas dirigidas a militantes del partido, cartas que podían ser entregadas a los destinatarios en el caso de que muriesen. No se murió entonces, las cartas han sido destruidas, pero yo sé que en la carta que me estaba destinada, Cunhal decía que estaba seguro de que yo no abandonaría el partido. Y tenía razón. Y la va a tener mientras yo viva.

Pero los partidos comunistas en Europa son una especie en extinción... En Portugal creo que no existe ese riesgo que menciona. El PCP tiene una base real. Todos lo demás han pasado por operaciones de cosmética, de nombre, de siglas. Y lo peor para ellos es que no están mejor por eso, por haber tratado de hacer ese transformismo.

Ha habido gente que le ha descalificado por esa fidelidad, interpretándolo como un rasgo estalinista. ¿Quién sería Saramago en la Rusia estalinista? Un hombre que tendría todos los problemas. Un régimen que había hecho de la subordinación del ciudadano un principio, pues estaba condenado a lo que ocurrió. La decadencia en todos los aspectos de la Unión Soviética fue debida a la separación entre el partido y el pueblo.

¿Por qué cree que es tan criticado, tanto en España como en Portugal, cuando habla de iberismo? Es delicado tocar ese asunto porque nos lleva al campo de los instintos, de las pasiones, y ahí no nos ponemos de acuerdo. Hay patriotas que no pueden ni oír la palabra España, porque tienen esa idea, esa experiencia histórica, de que de España siempre va a venir algo malo. Portugal está ahogado. Y España también, enredada en su propia noria, con asuntos que parecen eternizarse y que no se resuelven. Pero España tiene ya una experiencia de diversidad, con las autonomías, que puede servir para llegar con serenidad a fórmulas unitarias entre los dos Estados. España y Portugal necesitan ambas una convulsión positiva. Sé que esta opinión levanta ampollas, pero lo planteo con honestidad intelectual. Contribuiría a un multilateralismo ibérico. Por supuesto, respetando las culturas y las lenguas. Se enriquecería la situación de Iberia. Y también tendría un efecto positivo en Europa.

¿Significa algo que España y Portugal tengan un Gobierno de izquierda? No nos engañemos. Es cierto que tenemos en un lado y otro Gobiernos de izquierda, pero de una izquierda que no se nota mucho. A lo mejor no pueden hacer otra cosa. ¿Qué pasaría en Europa si se decantaran más hacia la izquierda? Hombre, no tenemos un Arias Navarro para decir: ¡Vamos a invadir Portugal! Hay que arrumbar de una vez esa idea, que tuvo justificación con Franco, una dictadura mucho más cruel que la nuestra, que hasta le hizo decir a los integristas portugueses: "Espanha, terra perigosa". El problema es que las izquierdas en Europa están casi desaparecidas. Por ejemplo, ¿qué hay en España con referencias intelectuales? Medianías. Están dejando solo al juez Garzón. Yo lo que veo son medianías.

O peso do narcotráfico no México

Ontem, ao comentar artigo, digamos, infeliz, publicado no jornal Folha de São Paulo, fiz um comentário rápido sobre o papel de desestabilização da vida social mexicana desempenhado pelo narcotráfico. Para uma melhor compreensão do assunto, transcrevo mais abaixo matéria publicada hoje no EL PAÍS. Trata-se de uma entrevista com o Procurador-Geral da República do México. Vale a pena conferir!

ENTREVISTA: EDUARDO MEDINA MORA Procurador general de la República
"El crimen organizado estaba tocando a las puertas del Estado"



No hace mucho, en un periódico mexicano apareció una viñeta en la que se veía al diablo muy preocupado, charlando con un colega sobre la situación de violencia que sufre el país. "Durante décadas", venía a decir, "temimos que se colombianizara México, ahora lo que nos da miedo es que se mexicanice el infierno...". Así que la primera pregunta, la que aquí se hace hasta el demonio, es obvia.

Pregunta. ¿Qué está pasando en México?

Respuesta. La situación actual responde a una evolución de dos fenómenos que, si bien no surgieron juntos, sí conviven de una manera un tanto perversa. De una parte, este país nunca se planteó con suficiente seriedad la construcción de instituciones policiales y de procuración de justicia realmente transparentes. En el pasado tuvimos circunstancias de seguridad pública que se percibían mejores, pero eso no necesariamente respondía a una estructuración institucional pertinente. El modelo funcionaba para algunos ciudadanos, pero era un modelo de delincuencia administrada. El crimen organizado desde el poder. Y ese modelo fue liquidado en los ochenta, pero no se sustituyó por unas instituciones sólidas. No las tenemos. La principal característica del problema de seguridad es su debilidad institucional. Otro factor que ha contribuido es resultado del proceso de evolución política, de la desconcentración del poder. El Ejecutivo anterior era muy fuerte, basado en las atribuciones que la Constitución le da al presidente pero también en poderes metaconstitucionales. Y cuando el país entró en una circunstancia democrática más clara, muchos de esas reglas dejaron de funcionar. El poder se descentralizó. No siempre en un sentido virtuoso. Por ejemplo, México tiene una enorme fragmentación policial. Este Estado es federal, y cada ayuntamiento, cada municipio tiene la potestad constitucional de construir su fuerza pública. Hay más de 1.640 corporaciones policiales en el país.

P. Muchas de ellas infiltradas por el narcotráfico...

R. Hay policías en algunas zonas de la frontera norte que directamente fueron privatizadas por el narcotráfico. El presidente Felipe Calderón ha dicho que las organizaciones criminales en algunas de esas zonas han disputado al Estado sus potestades básicas. El derecho exclusivo al uso legítimo de la fuerza. El derecho exclusivo de cobrar impuestos -básicamente con el fenómeno de extorsión- y en alguna ocasión el derecho exclusivo de dictar normas de carácter general. Esto se produjo porque, de forma paralela al debilitamiento del Estado, los cárteles mexicanos -que tradicionalmente tenían un papel de prestación de servicio a los colombianos, de porteadores de la droga- fueron adquiriendo más poder. Se beneficiaron de dos circunstancias. Por un lado, Estados Unidos consiguió cerrar la ruta del Caribe. Por otro, Colombia logró fragmentar y reducir el poder de los cárteles tradicionales -Pablo Escobar, los Ochoa, los Rodríguez Orihuela quedaron atrás-. Todo aquello le dio un enorme poder económico al narcotráfico en México, y como consecuencia un enorme poder corruptor y un enorme poder de intimidación. Por su parte, el Estado nunca le prestó suficiente atención a esta penetración lenta, paulatina pero muy potente en el marco institucional. Nunca valoró la capacidad del crimen para destruir instituciones, sobre todo al nivel local. Y ante este panorama -con una creciente confrontación entre las organizaciones y una enorme violencia- no tuvimos ninguna alternativa más que la de combatir sin cuartel a estos grupos.

P. Usted habla de la debilidad institucional. ¿Por qué el Estado no esperó a tener las armas necesarias? ¿Por qué se lanzó a esa guerra sin cuartel provocando la explosión de la violencia? ¿Era una cuestión tan urgente?

R. Era una cuestión absolutamente inaplazable.

P. ¿Por qué?

R. En primer lugar, la violencia ya estaba ahí. La violencia no comenzó con la Administración del presidente Calderón. La disputa de los territorios fue provocada porque el consumo de droga cambió en Estados Unidos. La demanda de cocaína bajó y subió la de estimulantes [metanfetaminas]. Los cárteles mexicanos empezaron a perder ingresos. Empezaron a no tener el suficiente dinero para sostener toda la infraestructura criminal que habían construido en todos estos años. Al ser el pastel más pequeño, se generó la lucha inicial, que luego se hizo más cruenta por otras circunstancias: alianzas precarias que se rompen, agravios y traiciones entre los mismos grupos.... El planteamiento del Gobierno no es terminar con el narcotráfico en la medida en que somos conscientes de que siempre habrá una demanda de sustancias ilícitas, sino quitarle a estas organizaciones el enorme poder de intimidación, el enorme poder de fuego que acumularon a lo largo de todos estos años y por consecuencia su capacidad de destruir instituciones y de secuestrar la tranquilidad de los ciudadanos.

P. Pero la sensación es justamente la contraria. Lo dice todo el mundo en la calle. Nunca México estuvo tan mal.

R. La percepción pública de la violencia responde primero a la manera en que ésta se presenta. Asesinatos, armas de alto poder, decapitaciones que potencian la percepción del fenómeno. No estoy desestimando el tamaño del problema, que es muy grave y así lo asumimos, pero sí hay que considerar que los niveles de violencia en el país comparado con otros países no son tan desfavorables. Hemos tenido este año un incremento muy significativo de los homicidios dolosos atribuibles a la delincuencia organizada, y que se potencia por la cobertura que los medios hacen. Porque la manera en que las organizaciones ejecutan su violencia también tiene un propósito mediático, también tiene un propósito de intimidación de la sociedad que es recogido por los medios. No es tanto el número, sino el esquema deliberado en el cual se realizan precisamente para que, recogidos por los medios, se potencie su aspecto intimidatorio. No nos comparamos tan mal con otros países. México tendrá este año alrededor de 12 asesinatos por cada 100.000 habitantes, Colombia va a llegar a 33 o 34, Guatemala o El Salvador, cerca de 50. La curva de la violencia se va a comportar como una curva de campana, todavía no hemos llegado al pico de máximo de violencia, y en la trayectoria descendente encontraremos también picos de violencia. En un futuro no demasiado lejano la violencia decrecerá.

P. ¿Hasta dónde había llegado para hacer tan urgente la lucha?

R. Las organizaciones de delincuencia organizada estaban tocando la puerta de las más importantes instituciones del Estado. Por eso tenía que darse una respuesta tan contundente, tan determinada. El principal error que sucedió en Colombia y nos han compartido como experiencia para no repetir, fue subestimar el poder corruptor del narcotráfico. Ciertamente, el narcotráfico ha tenido capacidad de infiltrar instituciones de seguridad y de procuración de justicia. Estamos realizando una investigación muy profunda que ha llevado a mandos muy importantes de la fiscalía y también de la policía federal a la cárcel. Hemos visto la capacidad del narcotráfico para lograr información anticipada de operaciones que se iban a realizar. Esto es lo que hemos llamado Operación Limpieza, apegada totalmente a derecho, en la que hemos podido judicializar casos en contra de mandos importantes. Y sobre esta base también separar de funciones a un número muy considerable de fiscales y de elementos. Aún tenemos pendiente el blindaje institucional para que la información no pueda salir

P. ¿Cómo se va a hacer?

R. En detalles muy concretos. Los computadores no deben tener USB o grabadores de discos compactos. No puede haber impresoras en papel y además hay que establecer alarmas de tal suerte que esta información no se disemine con la facilidad que nos hemos dado cuenta ahora que se hacía. El compromiso de la depuración es absoluto, y eso nos va a hacer más efectivos. El número de personas detenidas, el volumen de droga... Tengo aquí unos datos que demuestran nuestra eficacia. Del 1 de diciembre de 2006 en que tomó posesión el presidente Calderón hasta ahora, hemos confiscado 69,7 toneladas de cocaína. 3.655 toneladas de marihuana, alrededor de 40 toneladas de precursores químicos de la metanfetamina, 12.550 coches, 209 barcos, 315 aviones. También le hemos atacado al poder de fuego... Más de 27.000 armas, de las que 15.000 eran largas. Casi 2.000 granadas. Tres millones de municiones. Más armamentos de lo que se necesita para equipar a un Ejército. Hemos detenido a 38.247 personas. Líderes emblemáticos, 5; operadores financieros, 28; lugartenientes, 14; sicarios, 807; funcionarios públicos, 69... Se ha golpeado a todas y cada una de las organizaciones, sin excepción...

P. Pues aún así hay un 40% de la población, según las encuestas, que cree que la guerra se está perdiendo...

R. Los ciudadanos viven la conversación social, y la conversación social se construye no sólo en la vivencia cotidiana de cada uno, sino también en la versión que los medios dan del problema.

P. Hay otro 40% que estaría dispuesto a pactar con tal de que bajara el nivel de violencia.

R. No hay espacio para eso, en primer lugar porque eso es contrario a la ética política, a los valores democráticos, a los valores de respeto a la ley y a la Constitución. Y además en la dinámica en la que se ha entrado en términos de descomposición de las organizaciones, aunque tuviéramos la tentación no habría manera de llevarla a la práctica porque el deterioro y la fragmentación de las organizaciones hace imposible esto.

P. Aunque no haya sido parte de la estrategia, está en su agenda detener a los capos...

R. Lo está...

P. La gente se pregunta dónde están los narcotraficantes más famosos, el Chapo Guzmán...

R. Hay algunas figuras emblemáticas que son objetivo prioritario, pero no único de esta lucha. En los últimos 100 días se ha capturado a líderes muy importantes. Se han ido logrando estas capturas de figuras emblemáticas, pero lo que hace que la lucha sea exitosa será reducir la capacidad de ingresos y de capacidad de fuego, por eso el componente de armas es fundamental.

P. ¿Y de qué forma el éxito de esta lucha depende de EE UU?

R. El narcotráfico es un fenómeno transnacional. El mercado más importante del mundo es Estados Unidos, y México tiene 3.000 kilómetros de vecindad. EE UU tiene una legislación muy permisiva en materia de armas. Sus ciudadanos pueden adquirir legalmente las armas que deseen hasta de calibre 50. Un rifle, el barret, de calibre 50, es uno de los preferidos de los narcotraficantes mexicanos. Esa arma, que puede adquirir cualquier ciudadano, penetra blindaje, penetra paredes, ha llegado a alcanzar un objetivo a 2.400 metros de distancia. Sin duda en las cifras que le he dado de incautación de armas el abastecedor fundamental es Estados Unidos. Allí tienen alrededor de 107.000 establecimientos de ventas de armas. Algo más de 12.000 están en la frontera con México. Y precisamente son estos, los de la frontera, los que tienen como promedio de ventas anual el doble que el resto del territorio. Esto no puede ser casual, no puede ser accidental. La Constitución estadounidense en su segunda enmienda garantiza este derecho, y aunque a nosotros nos puede parecer absurdo que un ciudadano pueda comprar un [rifle] AK-47, un AR-15, o un barret 50, esa es la ley de la tierra.

P. Otra de las cuestiones de debate en México es si la policía sigue siendo operativa a pesar de las infiltraciones.

R. Sin duda. El tamaño y la capacidad institucional no se destruyó. El hecho de poder eliminar a estas personas no destruye a la institución. Son infiltrados, pero no hay colapso institucional en absoluto. Son las propias instituciones las que están ejecutando esta limpieza.

P. Pero hay casos en que la infiltración llegó muy alto -el ex jefe de la Interpol, el ex zar antidrogas-. Eso provoca una desconfianza creciente.

R. Yo creo que el efecto es el contrario. Cuando los ciudadanos miran que se afronta el problema, lo aplauden. Lo más grave en términos de confianza sería la negación, ignorar el problema. Los ciudadanos, y así lo estamos midiendo en nuestras encuestas, saben que estas acciones -difíciles, dolorosas, porque en algún caso era gente muy cercana a nosotros- están hechas con rigor y su efecto es que las instituciones salgan reforzadas.

P. ¿Se siente concernido por la sospecha generalizada hacia la clase política y, en especial, hacia los que como usted están en primera línea contra el narcotráfico?

R. Yo personalmente no tengo ninguna preocupación, nunca se me ha hecho ninguna imputación directa, porque no hay base para hacerla. No se me puede vincular con nada relacionado al crimen organizado.

P. ¿Cuándo se comenzará a ver la luz?

R. Se empieza a ver ya. El narcotráfico está perdiendo fuerza. En su caída están teniendo y tendrán reacciones de violencia inusitada. La situación de normalidad empezará a verse no muy lejos en el tiempo, aunque la batalla completa para ganar esta guerra sin duda es de largo plazo, y así lo planteó el presidente desde el primer día. Será una guerra larga, costosa, difícil. Pero la derrota es impensable porque es imposible. México tiene capacidad para derrotar al narcotráfico. No hay espacio para la derrota.

sábado, 22 de novembro de 2008

Fazer a tese e publicar: um guia para os jovens doutorandos.

Publique ou desapareça! Palavra de ordem em outras áreas acadêmicas, a consigna se torna em um espectro para os jovens doutorandos das ciências sociais, especialmente do Brasil. Uma cultura intelectual ainda fortemente alheia ao trabalho coletivo e, reconheçamos, modulada pela idéia do “grande intelectual” e da “grande obra”, tem contribuído para fazer da cobrança de produtividade algo próximo de um monstro. Tenho encontrado não poucas almas atormentadas com a exigência, cada vez mais institucionalizada, de um curriculum lattes “robusto”. Como traduções distorcidas dessa situação, temos a emergência de plágios e de muito faz-de-conta na produção intelectual (que o digam os arrumadinhos para fazer "render" um único trabalho).

Levando em conta o fato acima, sem dúvidas produtor de angústia para muitos, coloco aqui o link para um artigo (em francês) que detalha alguns conselhos sobre como publicar e fazer a tese ou, o que é mais interessante, publicar a tese já feita. Vale a pena.

PCC, DEA e o lengalenga de sempre na Folha de São Paulo

Inacreditável! Em artigo da segunda página da Folha de São Paulo, o correspondente do jornal em Caracas, Fabiano Maisonnave, seguindo a cantilena anti-Evo dominante na imprensa brasileira, perpetra algumas pérolas. Com o pretexto de comentar a suspensão das atividades da DEA (a conhecida agência anti-drogas norte-americana) na Bolívia, posição bancada pelo presidente boliviano, após a confirmação do envolvimento da não tão isenta e imparcial agência norte-americana em assuntos, digamos, “distantes” das drogas, o jornalista amontoa, em poucas linhas, um conjunto de lugares-comuns do “alinhamento automático” com os EUA. Repete aquele desdobramento retórico usual, muito presente na imprensa brasileira, no qual o questionamento de qualquer política norte-americana é tomado como expressão de anti-americanismo (algo que, concordamos, se desdobra e se alimenta, não raramente, de fundamentalismos vários). A relação da decisão de Evo com as ações do PCC é o coroamento de um texto, no mínimo, mal-intencionado.
Leia abaixo trechos do artigo. Entremeio alguns comentários (em itálico) aos trechos, digamos, mais "pesados".

Fiesta no PCC

O PCC NÃO deve caber em si de tantas boas notícias.
Principal comprador da cocaína boliviana, terá o seu negócio bem mais facilitado depois que Evo Morales expulsou a DEA do país.

O autor, de forma cavilosa, foge de algumas questões fundamentais: Por que o DEA foi expulso? O que ele tem promovido na Bolívia? O combate ao narcotráfico tem se traduzido em que custos sociais e ambientais na América Latina?
A perspectiva assumida não deixa de ser curiosa: a DEA aparece como estando acima do bem e do mal. Não pergunte a nenhum latino-americano, mas, sim, a um norte-americano medianamente informado e ele se apresentará muito mais crítico em relação à agência do que o jornalista.


Em menos de um ano, receberá uma estrada novinha em folha que pavimenta a sua mais importante rota do pó, entre Santa Cruz e Corumbá (MS). Mas a cereja do bolo é que, a partir de agora, o Brasil será o principal parceiro da Bolívia no combate às drogas.

Risível! Mas tudo vale para combater o Evo, não é mesmo? Mas, sabemos bem, se a tal estrada não fosse construída, o Governo Evo seria considerado incompetente. Já que a construiu, nada de elogios, se fez é porque era para servir ao narcotráfico

(...)

A falta de preocupação do Brasil ganhou contornos surreais na semana passada, na visita a Brasília do ministro de Governo, Alfredo Rada, ao colega Tarso Genro (Justiça). Toda a iniciativa veio do lado boliviano. O ministro brasileiro e seus assessores engoliram a lengalenga de que coca não é cocaína (o mesmo que dizer que laranja não é suco de laranja) e se limitaram a ouvir e aceitar as propostas de revisar os inócuos acordos bilaterais e ampliar a cooperação policial.
Genro poderia ter questionado, no mínimo, por que Morales -que acumula os cargos de presidente da República e do sindicato dos cocaleiros- decidiu aumentar a área legal de coca de 12 mil para 20 mil hectares, embora 6 mil hectares bastem para o uso tradicional.

Coca está para cocaína assim como a laranja está para o suco de laranja? Meu Deus! O que será que esse cara fez antes de escrever o artigo. Hum, sei lá, mas... Sem comentários!



Tanta inércia condiz com a estratégia maior da diplomacia lulista de evitar brigas com o vizinhos e assim despontar como "big player" mundial. Mesmo que isso traga o risco de transformar o Brasil num cenário de guerra parecido ao que ocorre hoje no México. Que o diga Botucatu, onde uma quadrilha acaba de explodir uma delegacia para roubar cocaína "made in Bolívia".

Lula, sempre ele!, é o culpado! Ora, ora, onde já se viu coisa mais sem sentido do que essa de querer que o Brasil seja um player global, não é? Parece complexo de vira-lata do jornalista, mas, creio eu, não é. É que é muito difícil afirmar alguma coisa diferente, crítica e independente na dita Grande Imprensa.

O final do texto é melancólico. A comparação com o ocorrido em Botucatu funciona como uma chantagem: impeçam o Evo de fazer essa "loucura" (se livrar da DEA, lembrem!) ou isso aqui se transforma no México. Tudo se passa como se o florescimento dos cartéis mexicanos não tivesse ocorrido em meio a uma guerra que teve exatamente a DEA como um dos seus atores. Qual o papel do DEA na guerra da droga no México? Até a indústria cinematográfica norte-americana já explorou esse filão. Ontem mesmo, no EL PAÍS, podia-se ler a notícia de que o ex-czar anti-drogas mexicano (treinado onde? ajudado por qual agência) fora preso por suspeitas de envolvimento com o narcotráfico.


Assinante UOL lê o artigo completo aqui.

sexta-feira, 21 de novembro de 2008

Wallerstein, Obama e a crise.

O Profesor Ivonaldo Neres Leite, meu amigo e ex-colega, ex-professor da UERN, agora da UFPE, manda-me uma dica de link para uma entrevista com Immanuel Wallerstein. Trata-se de um áudio em inglês. Leia o comentário de Ivonaldo:

É uma abordagem, penso eu, equilibrada, realçando limites e possibilidades e, acima de tudo, compromissada com a análise social autônoma, sem ceder aos holofotes ou as modas acadêmicas. O que não é surpresa para aqueles que, como eu, conhecem o seu tour de force analítico de londa data. Tomei contacto com os seus textos a partir do meu interesse por Fernand Braudel, nos anos juvenis, e desde cedo convenci-me que a interpenetração entre história e sociologia não permite disputa corpotativa entre estes dois campos. Mais tarde, frequentei um seminário dele em Coimbra, por ocasião do Relatório da Gulbekian ("Para Abrir as Ciências Sociais"), e não me decepcionei. A menção feita por ele ao Brasil, na entrevsita, creio que seja algo a ter em conta.


Você pode baixar o áudio aqui.

quinta-feira, 20 de novembro de 2008

Um mundo em descontrole

O título do post corresponde ao título de uma obra de Anthony Giddens. Em parte, corresponde ao texto que transcrevo abaixo, publicado hoje no El País. Está em espanhol. Faça um exercício e o leia. Vale a pena! Trata-se de uma discussão sobre a globalização que foge um pouco aos lugares-comuns.


¿Un mundo fuera de control?
Por Daniel Innerarity

La idea de un mundo interconectado, que nos ha servido como lugar común para designar la realidad de la globalización, implica, en principio, un mundo de responsabilidad limitada, cuando no difusa o abiertamente irresponsable, sobre el que no puede establecerse ningún control y del que nadie se hace cargo. La interconexión significa, por una parte, equilibrio y contención mutua, pero también alude al contagio, los efectos de cascada y la amplificación de los desastres, como es el caso de la reciente crisis financiera. El mundo interconectado es también ese "mundo desbocado" del que hablaba Giddens a la hora de calificar los aspectos menos gratos de la globalización.

En el caso concreto de la reciente crisis financiera la irresponsabilidad ha comenzado por la imprevisión. Han funcionado muy mal los sistemas de advertencia y prevención de riesgos. Las autoridades correspondientes han tenido una mala percepción de la gravedad de la crisis. Esta falta de anticipación revela no tanto un problema moral o político cuanto una grave deficiencia cognoscitiva, pues es difícil entender por qué no se sacan las conclusiones lógicas de una historia saturada de burbujas especulativas con consecuencias desastrosas. Tenemos muy reciente la crisis de la nueva economía y no hemos aprendido la lección: entonces se nos anunciaba una nueva era económica muy prometedora. Cuando domina la euforia financiera la hipótesis de una crisis parece lejana y por tanto incapaz de provocar las reacciones que aconsejaría la prudencia. La primera explicación antropológica de esta inadvertencia es que los profetas de las malas noticias no son nunca bienvenidos. Pero hay también una explicación ideológica y es que los defensores de la teoría de la eficiencia financiera llevan mucho tiempo diciendo que el mercado no se equivoca nunca y celebrando "la sabiduría de las masas" (Surowiecki). Y eso desincentiva la creación de instrumentos de regulación.

No sé si es una falta de memoria financiera, como ha dicho alguno, o una ceguera ante el desastre. En cualquier caso, está claro que prevenimos muy mal los desarrollos catastróficos y eso que no andamos faltos de cálculos matemáticos sofisticados. No disponíamos de una cartografía precisa de los riesgos que permitiera anticipar su encadenamiento irracional. Una parte de los riesgos había sido dispersada en el mercado, de manera que las instituciones financieras apenas podían medirlos y estimar su impacto futuro. Cuando el horizonte temporal se estrecha y sólo es tenido en cuenta el interés más inmediato es muy difícil evitar que las cosas evolucionen catastróficamente. Tanto desde el punto de vista informativo como de control, los mecanismos de autorregulación se han revelado como insuficien-tes. Lo que todo esto pone de manifiesto es que no sabemos todavía detectar, gestionar y comunicar los riesgos globales.

La crisis financiera es, en última instancia, una crisis de responsabilidad y el procedimiento que mejor lo ha representado ha sido la extensión de productos financieros como la titulización, que traducían la voluntad de desplazar los riesgos hacia el infinito, es decir, aceptar riesgos sin querer asumir las consecuencias. Se trataría de algo que podríamos denominar como "riesgos sin riesgos". La titulación ha actuado como un mecanismo global de irresponsabilización, que diseminaba y disimulaba a la vez los riesgos, haciendo opacos los mercados. Éste y otros productos financieros permitían evacuar o neutralizar los riesgos de las operaciones de préstamo transfiriendo la carga hacia los mercados de naturaleza especulativa. La opacidad de los mercados impedía el control y toleraba riesgos excesivos, títulos opacos cuyos riesgos nadie era capaz de evaluar. De este modo se ha constituido un mercado financiero global en el que los accionistas minoritarios de las empresas han presionado para obtener unas tasas de rentabilidad cada vez más elevadas. La irrealidad de los intercambios económicos ha revelado que la globalización financiera es mucho más frágil que la globalización comercial.

Todo ello no hubiera sucedido si, al mismo tiempo, no hubiera habido una dejación de responsabilidad por parte de los Estados, de los bancos centrales y las instituciones financieras mundiales. Los dirigentes económicos y financieros han cometido el error de confiar absolutamente en la capacidad autorreguladora de los mercados financieros y han aceptado esta irresponsabilidad de los mercados de crédito, sometidos al mismo modelo de comportamiento que el que funciona en las Bolsas. A esto se han añadido unas operaciones de rescate que serán inevitables pero que no van a servir para promover las conductas responsables. Se han beneficiado de esas medidas aquellos actores económicos que pueden asumir riesgos excesivos sin tener que sufrir las consecuencias en virtud de las catástrofes en serie que su quiebra podría producir en el resto de la economía.

La crisis nos exige construir una nueva responsabilidad financiera, algo que se llevará a cabo más a través del control y la supervisión que mediante la regulación normativa. Nuestros dirigentes deberían comprender que les corresponde poner a los grandes actores económicos y financieros cara a sus responsabilidades: responsabilidad de los prestamistas, limitando la titulización, es decir, la opacidad de los riesgos en el mercado de los productos derivados, de manera que las deudas no sean instrumentos de especulación; responsabilidad de los accionistas, reservando el derecho de voto a quienes se comprometen establemente con la empresa para permitirle llevar una verdadera estrategia; responsabilidad de los Estados que se deben entender sobre un sistema de paridades estables, impidiendo así las oscilaciones violentas de divisas, desconcertantes para los agentes económicos; responsabilidad de los bancos centrales, que deben aceptar someter su gestión a la aprobación de los Estados democráticos, con la preocupación de tomar en cuenta todos los grandes parámetros decisivos para la marcha de las economías: producción, empleo, precios, endeudamiento, saldo presupuestario y saldo exterior.

Pero conviene no perder de vista que estos compromisos han de conseguirse en medio de una red cada vez más densa de dependencias, donde las obligaciones pierden visibilidad y nitidez. Al mismo tiempo, un mundo de crecientes interdependencias aumenta también el número de consecuencias de las acciones que no resultan fáciles de imputar. Este conjunto de circunstancias y otras similares justifican la denominación de "irresponsabilidad organizada" (Ulrich Beck) a la hora de calificar a nuestras sociedades, aunque también cabe preguntarse si no se trata más bien de una falta de organización, de que no hemos sido capaces de organizar socialmente la responsabilidad a la vista de que algunas de esas dinámicas contradicen claramente muchos de nuestros derechos y nuestros deberes. La debilitación del sentido de responsabilidad no es una cuestión que pueda achacarse únicamente a los políticos o a la desafección ciudadana, sino que resulta más bien de esa mezcla de debilidad institucional y fatalismo que caracteriza a nuestros compromisos democráticos. Se pueden organizar muchas cosas para identificar la responsabilidad y transformar dinámicas ciegas en procesos gobernables.

Han cambiado las condiciones en las que se pensaba y ejercía la responsabilidad política. El problema estriba en cómo representar esa responsabilidad en un momento en el que ha perdido evidencia la relación entre mi comportamiento individual (como prestamista, consumidor, accionista, votante o cliente) y los resultados globales. La ilustración de esta nueva articulación entre lo propio y lo común sólo se conseguirá si desarrollamos un concepto de responsabilidad que haga justicia a la actual complejidad social y corresponda a nuestras expectativas razonables de conseguir un mundo que pueda ser gobernado, del que nos hagamos cargo.

Daniel Innerarity es profesor de Filosofía en la Universidad de Zaragoza y autor de El nuevo espacio público.

quarta-feira, 19 de novembro de 2008

A crise

Etnografia política: um texto de Javier Auyero

Ja falei de Javier Auyero aqui (veja o post Violência e pobreza na Argentina). Trata-se de um cientista social detentor de uma grande capacidade analítica. Merecia ser mais conhecido no Brasil. Indico agora a leitura de uma entrevista sua sobre etnografia política. Acesse aqui (em espanhol).

O PT e o suposto conservadorismo de São Paulo: uma análise de Leôncio Martins Rodrigues

Hoje, no Estadão, um artigo de autoria do sociólogo Leôncio Martins Rodrigues sobre a, digamos, relação de amor e ódio do PT com a cidade de São Paulo.

São Paulo, cidade conservadora?

Leôncio Martins Rodrigues


Confirmada a derrota de Marta Suplicy para a Prefeitura da capital paulista, alguns intelectuais petistas atribuíram a vitória de Gilberto Kassab (de "direita") a suposto conservadorismo e preconceitos do eleitorado paulistano. Na interpretação petista, esses setores conservadores e preconceituosos estariam localizados basicamente nas classes médias e altas, porque, como se sabe, as classes populares não têm preconceitos nem são conservadoras. Em outras palavras: transferiu-se a responsabilidade pela derrota a um segmento do eleitorado que não teria nenhum motivo válido para rejeitar a candidata do PT. Está implícito que os paulistanos não saberiam votar. Na visão petista, a cidade mais cosmopolita, moderna e dinâmica do País seria fundamentalmente conservadora e preconceituosa.

Entendem-se a frustração e o ressentimento dos que são derrotados, mas a interpretação petista parece-nos dificilmente sustentável e não ajudará o PT em futuras disputas. Façamos em breve retrospecto dos resultados anteriores nas disputas pelo controle do Poder Executivo paulistano. Tanto em termos das fontes sociais de recrutamento para a classe política como do ponto de vista dos partidos e coligações vencedoras, as elites paulistas quatrocentonas foram perdendo espaço no sistema de poder para elites vindas das classes empresariais de imigração recente e das classes médias e trabalhadoras. Em outros termos: o sistema político paulistano vem-se tornando mais democrático e mais plural. As disputas tornaram-se mais competitivas, mais "técnicas", mais "profissionais" e dominadas pelo marketing político. Fortuna pessoal, origem familiar, cor da pele, status social e outros signos dignificantes, em São Paulo, não são mais garantia de êxito para nenhum político.

Não há nada de extraordinário nessa evolução do sistema político paulistano. De modo geral, a distribuição do poder na cidade de São Paulo seguiu a rota habitual da circulação das elites analisada por muitos sociólogos e cientistas políticos. Repete-se aqui o movimento observado em outras democracias. À medida que nos encaminhamos em direção a uma sociedade de massas e a um sistema eleitoral de participação total, o poder tende a passar do círculo restrito das famílias patrícias para os empresários self-made men, os homens de negócios. Numa terceira etapa, o sistema político abre-se para os ex-plebeus vindos das classes médias ou das classes trabalhadoras - uso aqui os termos de Robert Dahl usados em sua pesquisa sobre a circulação do poder na cidade de New Haven, EUA, (Who Governs? Democracy and Power in an American City), Yale University, 1961.

Em São Paulo, com exceção do caso de Antônio da Silva Prado - indicado prefeito pela Câmara Municipal e que governou de 1899 a 1911 -, houve cinco prefeitos eleitos por voto "popular", todos vindo de famílias da chamada oligarquia paulista. A Revolução de 30 pôs fim à prática de eleições para o governo da cidade. De 1930 até 1953 os prefeitos foram nomeados pelos interventores e, depois, pelos governadores. Mas continuaram a vir das famílias paulistas tradicionais.

Em 1953 o Congresso restabeleceu o sistema de eleição popular para a Prefeitura. Jânio Quadros, do PDC, venceu a eleição com o apoio de um pequeno partido, o PSB. A vitória de Jânio, político vindo das classes médias, que nem paulista era, representou a primeira brecha no poder oligárquico e inaugurou, em São Paulo, o estilo populista de fazer política, com muita demagogia orientada para capturar principalmente eleitores de baixa renda.

Depois de 1953, o voto popular vigorou até 1969, quando, sob o regime militar, os prefeitos voltaram a ser escolhidos formalmente pelo governador. Paulo Salim Maluf foi o primeiro prefeito nomeado (1969) e Mário Covas, o último (1983). O enfraquecimento do poder oligárquico paulista prosseguiu sob o regime militar. A presença de prefeitos de famílias paulistas tradicionais diminuiu, enquanto ascendiam os de origem sírio-libanesa e italiana. Mas todos vinham das classes ricas. De 1955 a 1986, revezaram-se no poder municipal patrícios e empresários, para seguir com os termos do cientista político norte-americano. Citemos alguns nomes, sem preocupação de ordem cronológica: Figueiredo Ferraz, Olavo Setúbal, Reynaldo de Barros, por um lado; Paulo Salim Maluf, Miguel Colasuonno, Salim Curiati, por outro.

Localizando sociológica e ideologicamente (e de modo extremamente esquemático) os que foram vencedores, o resultado é uma lista política e socialmente heterogênea: um professor de colégio, mato-grossense de nascimento, de classe média e difícil definição ideológica e partidária (Jânio da Silva Quadros); uma candidata de "esquerda", de classe média pobre, solteira, nascida em Uiraúna, na Paraíba (Luiza Erundina de Souza); um rico empresário paulistano de "direita", de origem árabe (Paulo Salim Maluf); um candidato negro de classe média alta, também de "direita" (Celso Roberto Pitta do Nascimento); uma candidata de "esquerda", de classe alta tradicional (Marta Teresa Smith de Vasconcelos Suplicy); um candidato de "centro", de classe média baixa, de origem italiana (José Chirico Serra); e por fim um candidato de "direita", de classe média alta, de origem árabe (Gilberto Kassab).

O exame da relação dos políticos eleitos depois do retorno da eleição popular para prefeito não revela a predominância, na capital paulista, de um eleitorado preconceituoso e conservador, mas sim de um eleitorado politicamente volátil, que tem passado por cima das classificações ideológicas usuais e de preconceitos vinculados às características pessoais dos políticos, como etnia, gênero, renda, origem familiar, local de nascimento, etc. Esse eleitorado, que tem variado em suas escolhas, pode ser tudo, menos conservador ou preconceituoso, a não ser que esses termos fiquem reservados para classificar os que não votam nos candidatos petistas.



Leôncio Martins Rodrigues é professor aposentado dos Departamentos de Ciências Políticas da USP e da Unicamp

terça-feira, 18 de novembro de 2008

Base de dados pessoais, vigilância e controle

Estamos ainda tateando, nas ciências sociais brasileiras, na discussão sobre o significado político e social da emergência, tanto em instituições públicas quanto privadas, de bancos de dados pessoais. Quais os seus impactos sobre a vigilância e o controle das pessoas? Há pouca discussão sobre isso. Não é, nesse sentido, mero acaso a banalidade com que lidamos com as notícias a respeito de grampo nos telefones.

Aproveito para indicar aqui a leitura de um texto instigante sobre o assunto. Publicado na revista Culture & Conflits, o artigo Bases de données personnelles et politiques de sécurité : une protection illusoire?, de autoria de Sylvia Preuss-Laussinotte, é um bom começo para quem quer aprofundar essa discussão.

Violência e criminalidade na Palestina



Matéria interesante sobre o enfrentamento da violência e criminalidade na Palestina. Foi publicada no El País. Vale a pena conferir.


La nueva cara de Yenín

Un masivo despliegue policial ataja el delito pero despierta el rechazo por su persecución de palestinos en colaboración con Israel
JUAN MIGUEL MUÑOZ | Yenín 18/11/2008

Las principales ciudades palestinas de Cisjordania se debatían en la anarquía hace sólo unos meses. Individuos pertrechados con todo tipo de armas se chuleaban ante sus conciudadanos e imponían una ley del más fuerte que sólo servía a las mafias, ligadas o no a los clanes políticos. Nunca se sabe si en el futuro se volverá a las andadas. Pero en Hebrón, Nablus, Yenín o Tulkarem impera ahora un orden que alaban muchos ciudadanos. No todos, ni mucho menos. Porque si los robos de vehículos y el delito en general está de capa caída, el despliegue masivo de policías y militares en las calles despierta recelo entre infinidad de lugareños, que consideran a los agentes colaboradores de Israel.

El año pasado, la Autoridad Nacional Palestina y el Gobierno de Salam Fayad se propusieron atajar el desmadre. Comenzaron por las Brigadas de los Mártires de Al Aqsa, la milicia de Al Fatah, que accedió a su desarme a cambio de reducidas condenas, de algunos perdones de las autoridades israelíes, e incluso del ingreso en los nuevos cuerpos de seguridad. A día de hoy, han desaparecido. Por el contrario, reclamar a los milicianos de Hamás o Yihad Islámica que entreguen sus arsenales es un brindis al sol.

La céntrica calle El Barid de Yenín era uno de esos lugares prohibidos a la gente corriente a partir de la caída de la noche. El paraíso de los matones. "Desde las cinco de la tarde, las milicias tomaban la calle. Los coches robados circulaban sin problemas. Todo eso ha terminado", comenta el oficial Kasem. Sus colegas, a mediodía, vigilan en cada esquina. Las patrullas se mueven por toda la ciudad.

Wasim Jayousi es el jefe de la policía de Yenín. A su cargo, más de 700 uniformados de azul para una población de 50.000 habitantes. En su amplio despacho, ante un enorme grabado del difunto Yaser Arafat, Jayousi explica que su cometido fundamental es combatir la delincuencia. Sucede, sin embargo, que buena parte de los palestinos de Cisjordania no cuentan entre los delincuentes a los milicianos de Hamás o Yihad Islámica, que rechazan entregar las armas. "Somos responsables", precisa el mando policial, "de que se cumpla la ley palestina y de que nadie pueda abusar del poder porque el poder es nuestro. También podemos detener a milicianos, y ya hemos capturado a gente de Hamás y de otros movimientos. Si alguien alza un arma va a la cárcel".

Y así surge el descontento. Un desencanto y una impotencia que no esconde al agente Kasem. Porque ahora soldados israelíes y policías palestinos, aunque el recelo entre ambos no se ha desvanecido, están a partir un piñón. "Hace cinco días militares israelíes encubiertos detuvieron a un chico en el campo de refugiados. Vinieron en un coche de matrícula palestina. No pudimos hacer nada. Nuestra obligación sería impedir que se llevaran al chaval. Pero no pudimos hacer nada", repite. "Lógicamente, hay gente que nos considera colaboracionistas de Israel. Mucha gente", añade. Entre otros motivos porque es una policía a tiempo parcial. Rige para ellos una suerte de toque de queda: a partir de la medianoche, el centro de las ciudades es competencia de los militares israelíes, cuyas operaciones observan los agentes palestinos desde sus cuarteles.

Porque además, en la guerra que libran Hamás -dueño y señor de Gaza- y la Autoridad Palestina -que a toda costa intenta impedir que suceda en Cisjordania lo mismo que en la franja? vale todo. El Movimiento islamista y algunas ONG denuncian que son más de 400 los miembros de Hamás que habitan hoy las prisiones palestinas. Y gran parte de ellos nada que tienen que ver la milicia. Eran los dirigentes de asociaciones caritativas, directores de hospitales, profesores de escuela y universitarios, líderes estudiantiles y de la red social y política de Hamás. Nadie lo ignora. Anteanoche, nada más abandonar una prisión israelí, tras 30 meses entre rejas, uno de los líderes islamistas entró directamente en otro centro penitenciario palestino.

En Hebrón y en Nablus, desde hace pocos meses, se han desplegado también las fuerzas de la Seguridad Nacional. Visten de verde militar. "Son un Ejército", admite Jayousi. Son más de medio millar de hombres en cada ciudad entrenados en Jordania bajo el mando de un general estadounidense. Nadie desconoce cuál es su misión: desmantelar la infraestructura de las milicias islamistas en Cisjordania. Los generales israelíes han mostrado su satisfacción por el desempeño de estos flamantes militares, pero a diferencia de la policía de azul, vista con buenos ojos por los palestinos de a pie, el nuevo cuerpo de seguridad despierta enorme rechazo en gran parte de los cisjordanos.

Benício del Toro fala sobre Che




Você também deve estar ansioso pelo lançamento do filme sobre Che Guevara no Brasil(acontecerá em maio de 2009!). Na foto acima, você tem Benício del Toro o ator que interpreta o mitológico guerrilheiro. Caso se interesse, assista aqui, no site do El País, uma entrevista na qual Del Toro fala do Che.

Negros cubanos estão entusiasmados com Obama



A Obamania varre a Ilha. Leia abaixo reportagem publicada hoje no jornal espanhol El País. A matéria faz um retrato não muito animador da situação dos negros em Cuba. Vale a pena conferir!


El 'efecto Obama' sacude la isla

La victoria del demócrata Barack Obama en Estados Unidos ha tenido considerable repercusión en Cuba, y no sólo por razones políticas. Que el presidente electo norteamericano sea negro y descendiente directo de un emigrante keniano ha tocado la sensibilidad de muchos cubanos que desde hace años vienen denunciando que el racismo es todavía un problema grave en su país, aunque no se refleje en los medios oficiales.

Medio siglo después del triunfo de la revolución, que convirtió en bandera de la lucha contra la discriminación racial, los negros en Cuba siguen ocupando los peores trabajos, viviendo en las peores casas y llenando las cárceles, según diversos estudios.

El poeta y ensayista cubano Víctor Fowler escribía a los pocos días del triunfo de Obama: "Todavía siento un susto en pleno pecho. Lo que se empoza en mis ojos son lágrimas de orgullo y de un profundo alivio. Oigo a Barack Obama. (...) Miro mi piel, miro las de mis hijos, lloro y sonrío".

Las palabras de Fowler, de 48 años y ganador de varios premios literarios en su país, resumen el sentimiento de buena parte de la población negra y mestiza de Cuba, y probablemente de todo el mundo. La elección de Obama ha servido de revulsivo antirracista en todas partes, también en la isla.

"Nada va a cambiar, es sólo un símbolo. Pero saca a la luz un problema que en este país sigue siendo un gran tabú, pues supuestamente la discriminación acabó con la revolución", dice Ana, una profesional negra que asegura tener amigos que han sido rechazados en trabajos de responsabilidad en el sector turístico "por el color de su piel". "Por supuesto, sin que nadie lo admita", dice.

La denuncia es dura, pero no tan difícil de demostrar. Las estadísticas oficiales confirman que entre los dirigentes, profesionales y técnicos del sector turístico las proporciones de negros y mestizos no superan el 5%. Y lo mismo sucede en otros sectores emergentes de la economía, en los que hay mayores posibilidades de conseguir dólares y pocos directivos de piel oscura.

En el año 2006, los investigadores Rodrigo Espina y Pablo Rodríguez Ruiz, del Centro de Antropología, publicaron en la revista Temas uno de los pocos trabajos científicos conocidos sobre el asunto del racismo en la Cuba actual. Arrojaron datos reveladores: en el turismo, los negros se ubican principalmente en puestos de trabajo no relacionados directamente con el turista, hacia el interior de las instalaciones, y reciben 1,6 veces menos propinas que los blancos; la población negra y mestiza ocupa las peores viviendas, y trabajan fundamentalmente como obreros; y las remesas de dinero que envían familiares del extranjero llegan 2,5 veces más a blancos que a negros.

Según el más reciente censo de población, realizado en 2002, de los 11,2 millones de cubanos, 65% son blancos, 10% negros y 25% mestizos. Muchos investigadores cuestionan la confiabilidad de estos datos -obtenidos mediante la simple declaración de los encuestados- y colocan muy por encima la proporción de la población de raza negra y mestiza: la elevan al 50% del total. "Aquí casi todo el mundo tiene la sangre mezclada, pero el que sólo tiene una pintica se declara blanco", asegura la antropóloga Natalia Bolivar.

En el Parlamento cubano, cerca del 65% de los diputados son blancos, el 19% negros y el 16% mestizos. En el Consejo de Estado, máxima instancia del Gobierno, 11 de sus 31 miembros son negros y mestizos, mientras que en el Buró Político del Partido Comunista la proporción es 5 de 24.

Según Bolívar, "en Cuba no existe racismo institucional, pero no es fácil borrar 300 años de historia". Cuba fue la última colonia en abolir la esclavitud, en 1886, hay que recordarlo. Esteban Morales, investigador del Centro de Estudios de Estados Unidos, publicó este año Desafíos de la problemática racial en Cuba, un libro en el que plantea que si bien desde las instituciones del Gobierno se ha luchado activamente contra el racismo, todavía sobrevive "la discriminación, apoyándose en los estereotipos negativos sobre los negros y las formas de supervivencia de estos prejuicios".

En Cuba, cuando un negro destaca en su trabajo o es elegante, se bromea: "Parece blanco". Y las profesiones que la sociedad parece reservar a negros y mulatos son las de músicos, deportistas y policías, aunque hay decenas de miles de médicos y profesionales de raza negra. En la televisión prácticamente no aparecen presentadores negros, y los papeles que realizan los actores negros o mulatos en las telenovelas casi nunca son protagónicos.

"La limitada presencia de cuadros de dirección, negros sobre todo, y mestizos, en las estructuras de dirección del Estado y de las empresas, en particular dentro de las corporaciones y el turismo, es preocupante", asegura Morales en su libro. A juicio de este autor, la crisis económica de la década de 1990, tras el derrumbe de la Unión Soviética, fue un golpe demoledor que perjudicó a los sectores más desfavorecidos, sobre todo a los negros, e hizo rebrotar la discriminación.

Ello puso en evidencia que los que "idealistamente" creían resuelto el problema del racismo en Cuba estaban equivocados. Morales y otros investigadores, como Fernando Martínez Heredia, señalan que durante demasiado tiempo el tema se ha eludido precisamente por considerar que las heridas raciales podían suponer una "debilidad" y un "riesgo" de división para la revolución.

Ahora se trata de que el problema del racismo se discuta abiertamente, a la luz pública y sin edulcorantes, pues es muy serio. El Partido Comunista creó a principios de este año una comisión -que preside Heredia- para rescatar la memoria histórica de los que siempre, hasta hoy, han llevado la peor parte. Pero aún falta mucho camino por andar.