Quase dois anos blogando. Bate uma sensação legal, agora. Na despedida de 2009. E aí, neste momento que também é de balanço (é meio ritual isso, eu sei, mas a gente termina caindo, ñão é?), eu queria dirigir algumas palavras aos que me visitam desde o início.
Este espaço, acreditem, me dá uma força danada. Nele, meus demônios saem da penumbra em qualquer hora. Logo eu, moleque matuto e desterritorializado, ainda menino nos meus quase cinqüenta anos, torno-me loquaz e meto-me em todos os assuntos. Aqui, minha timidez vai pro espaço...
Inicialmente, havia pensado neste como um blog de sociologia econômica. Um espaço para reflexões tímidas, comedidas e focadas. Não foi o caminho seguido.
O blog foi ganhando vida e devorando o blogueiro. Quando dei por mim, como diria o meu amigo Cadu, tinha me metamorfoseado em um Tom Zé. Não sei se, ao dizer isso, o Cadu faz-me um elogio. Como eu adoro o talentoso músico, fala para os meus botões que se trata, sim, de algo positivo. Mas, quando diz isso, Cadu refere-se, quero crer, ao fato de que me meto em todos os assuntos...
Mas, como eu ia dizendo, este espaço ganhou vida. E deu-me também energia vital. Nele, apontei o que pensava e me descobri sendo de tudo um pouco. Maravilha!
Tem gente que me gosta menos devido ao blog. Paciência! Esses, penso eu, não me gostavam mais; conheciam-me menos... Outros e outras, passaram a me fazer companhia. Seguem-me, de seus blogs. Mandam-me mensagens e escrevem para o meu e-mail. Ou comentam coisas aqui colocadas quando encontramo-nos em alguma esquina... São cúmplices, companheiros de jornada...
Um ano e meio de blog. E eu sinto com se tivesse começado ontem. Tanto há para dizer e fazer...
Como esta deve ser a minha última postagem de 2009, gostaria de desejar a todos que me visitaram um 2010 tudo de bom.
E é para vocês que eu coloco o vídeo abaixo. Trata-se de uma música que eu escutava, menino sertanejo, pelas ondas da Rádio Rural de Mossoró, no início da década de 70. Coisa do século passado! Mas, maIs atual do que nunca. Um convite à celebração... Uma aposta na vida.
quinta-feira, 31 de dezembro de 2009
Marcos Rolim, a ética e o panetone
Marcos Rolim, ex-vereador em Santa Maria (RS), ex-deputado estadual e ex-deputado federal pelo PT do RS, é um dos políticos mais inteligentes, críticos e honestos que eu tive oportunidade de conhecer. Quando o encontrei, há décadas, eramos, ambos, militantes de uma organização de esquerda já extinta. Em um ambiente pouco propício à reflexão, Rolim afirmava-se com as suas proposições e posicionamentos.
Para dizer a verdade, penso agora, era um quadro político com pouco futuro. Ético e intransigente na defesa dos seus princípios, Rolim não tinha mesmo muito lugar na realpolitik brasileira. Em 2o02, dizem-me conhecidos, tiraram o seu tapete e ele, apesar de mais de 70 mil votos, não conseguiu se reeleger para a Câmara dos Deputados. Pelo PT, partido ao qual pertencera por mais de duas décadas.
No PT, pelo que acompanhei de longe, ainda tentou articular uma corrente "humanista". Deu com a cara na parede. Percebeu, em algum momento da caminhada, que, no partido, não existia mais espaço para a política que sempre sonhou: alicerçada na disputa racional de posições.
Fora da política partidária, mas atuante, Rolim mantém um ótimo site (que você pode acessar aqui), e tem atuado como consultor na área de segurança pública. Etornou-se uma referência em relação à esta temática tão carente de reflexões sérias e inovadoras.
Fora do PT, tem contribuído com a candidatura da ex-ministra Marina Silva. Não o sigo nessa caminhada, mas, cá do meu canto provinciano, acompanho e partilho com muitos dos seus posicionamentos. Como não tenho a sua verve, transcrevo, abaixo, artigo em que ele comenta o Arrudagate. E fornece lições que vão além da denúncia moralista tão em voga na internet.
AO VENCEDOR, OS PANETONES
Marcos Rolim
I – O livro de Ori e Rom Brafmam, “A Força do Absurdo” (Objetiva, 228p.) me permitiu conhecer o professor do curso de Administração em Harvard Max Bazernan.
Ele inventou um jogo muito simples para demonstrar a irracionalidade de determinados comportamentos. No primeiro dia de aula, balançando uma nota de 20 dólares, ele propõe aos alunos um leilão por ela. Todos podem fazer ofertas, obedecendo a duas regras: a) os lances devem ser de um dólar e b) o vencedor leva a nota, mas aquele que ofereceu a penúltima oferta perde o valor de seu lance. Pela regra, então, o segundo colocado no leilão é o perdedor. Percebendo a chance de ganhar a nota por um pequeno valor, os estudantes começam a levantar as mãos. Há uma certa agitação até as ofertas alcançarem algo entre 12 e 16 dólares. Neste ponto todos desistem, menos os dois responsáveis pelas ofertas mais altas. Estes ficam em um beco sem saída. O próximo lance será de 17 dólares. A desistência do competidor que ofereceu 16 acarretará um prejuízo razoável, então ele faz o lance de $18 e, assim, sucessiva e alternadamente. Logo, os lances serão superiores a 20 dólares. É comum que, no jogo, os rivais cheguem a mais de 100 dólares e, em uma oportunidade, a disputa terminou em 204 dólares! Ou seja: quanto mais fundo é o buraco que cavam, mais eles cavam. O erro dos participantes é considerar apenas seus próprios interesses, sem se dar conta que o leilão conduzirá ambos à derrota. Não sei por que me lembrei desta história...
II- Quando tudo vai bem, somos todos muito bons. Temos princípios, claro. Mas conhecemos a realidade dos nossos valores quando as coisas vão mal. É sob pressão, nas condições mais estressantes ou atemorizadoras que emerge aquilo que temos de melhor ou de pior. Então, o gentil vizinho vira um delator sob a ditadura ou o garoto tímido e frágil é o herói da resistência ou o amor de tantos anos e juras se converte em lâmina na separação. Ser honesto é simples. Até um famoso banqueiro – ainda solto - te oferecer uma consultoria de 3 milhões. Então nos descobrimos. Por isso, demonstra conduta ética aquele que ignora ou coloca em risco seus próprios interesses para fazer o que julga ser sua obrigação. Aquele que age em conformidade com o dever, para usar a expressão kantiana. Agora comecei a me lembrar por que me pareceu importante falar disso...
III – Quincas Borba contou a Rubião sobre as duas tribos famintas que disputam uma pequena quantidade de batatas, suficiente apenas para alimentar uma tribo. Se dividirem a comida, nenhuma delas terá força para transpor a montanha e chegar, muito depois, à vertente onde há batatas em abundância. Para Quincas Borba, a paz, neste caso, é a destruição e a guerra, a salvação. Assim, sentencia: “ao vencido, ódio ou compaixão; ao vencedor as batatas”. A política no Brasil tem sido regrada pela mesma lei da selva em prol do mais forte. Há novidades, é claro. Afinal, agora os pufs são verdes, corruptos rezam e os panetones substituíram as batatas, triunfantes.
Para dizer a verdade, penso agora, era um quadro político com pouco futuro. Ético e intransigente na defesa dos seus princípios, Rolim não tinha mesmo muito lugar na realpolitik brasileira. Em 2o02, dizem-me conhecidos, tiraram o seu tapete e ele, apesar de mais de 70 mil votos, não conseguiu se reeleger para a Câmara dos Deputados. Pelo PT, partido ao qual pertencera por mais de duas décadas.
No PT, pelo que acompanhei de longe, ainda tentou articular uma corrente "humanista". Deu com a cara na parede. Percebeu, em algum momento da caminhada, que, no partido, não existia mais espaço para a política que sempre sonhou: alicerçada na disputa racional de posições.
Fora da política partidária, mas atuante, Rolim mantém um ótimo site (que você pode acessar aqui), e tem atuado como consultor na área de segurança pública. Etornou-se uma referência em relação à esta temática tão carente de reflexões sérias e inovadoras.
Fora do PT, tem contribuído com a candidatura da ex-ministra Marina Silva. Não o sigo nessa caminhada, mas, cá do meu canto provinciano, acompanho e partilho com muitos dos seus posicionamentos. Como não tenho a sua verve, transcrevo, abaixo, artigo em que ele comenta o Arrudagate. E fornece lições que vão além da denúncia moralista tão em voga na internet.
AO VENCEDOR, OS PANETONES
Marcos Rolim
I – O livro de Ori e Rom Brafmam, “A Força do Absurdo” (Objetiva, 228p.) me permitiu conhecer o professor do curso de Administração em Harvard Max Bazernan.
Ele inventou um jogo muito simples para demonstrar a irracionalidade de determinados comportamentos. No primeiro dia de aula, balançando uma nota de 20 dólares, ele propõe aos alunos um leilão por ela. Todos podem fazer ofertas, obedecendo a duas regras: a) os lances devem ser de um dólar e b) o vencedor leva a nota, mas aquele que ofereceu a penúltima oferta perde o valor de seu lance. Pela regra, então, o segundo colocado no leilão é o perdedor. Percebendo a chance de ganhar a nota por um pequeno valor, os estudantes começam a levantar as mãos. Há uma certa agitação até as ofertas alcançarem algo entre 12 e 16 dólares. Neste ponto todos desistem, menos os dois responsáveis pelas ofertas mais altas. Estes ficam em um beco sem saída. O próximo lance será de 17 dólares. A desistência do competidor que ofereceu 16 acarretará um prejuízo razoável, então ele faz o lance de $18 e, assim, sucessiva e alternadamente. Logo, os lances serão superiores a 20 dólares. É comum que, no jogo, os rivais cheguem a mais de 100 dólares e, em uma oportunidade, a disputa terminou em 204 dólares! Ou seja: quanto mais fundo é o buraco que cavam, mais eles cavam. O erro dos participantes é considerar apenas seus próprios interesses, sem se dar conta que o leilão conduzirá ambos à derrota. Não sei por que me lembrei desta história...
II- Quando tudo vai bem, somos todos muito bons. Temos princípios, claro. Mas conhecemos a realidade dos nossos valores quando as coisas vão mal. É sob pressão, nas condições mais estressantes ou atemorizadoras que emerge aquilo que temos de melhor ou de pior. Então, o gentil vizinho vira um delator sob a ditadura ou o garoto tímido e frágil é o herói da resistência ou o amor de tantos anos e juras se converte em lâmina na separação. Ser honesto é simples. Até um famoso banqueiro – ainda solto - te oferecer uma consultoria de 3 milhões. Então nos descobrimos. Por isso, demonstra conduta ética aquele que ignora ou coloca em risco seus próprios interesses para fazer o que julga ser sua obrigação. Aquele que age em conformidade com o dever, para usar a expressão kantiana. Agora comecei a me lembrar por que me pareceu importante falar disso...
III – Quincas Borba contou a Rubião sobre as duas tribos famintas que disputam uma pequena quantidade de batatas, suficiente apenas para alimentar uma tribo. Se dividirem a comida, nenhuma delas terá força para transpor a montanha e chegar, muito depois, à vertente onde há batatas em abundância. Para Quincas Borba, a paz, neste caso, é a destruição e a guerra, a salvação. Assim, sentencia: “ao vencido, ódio ou compaixão; ao vencedor as batatas”. A política no Brasil tem sido regrada pela mesma lei da selva em prol do mais forte. Há novidades, é claro. Afinal, agora os pufs são verdes, corruptos rezam e os panetones substituíram as batatas, triunfantes.
No apagar das luzes de 2009, uma crise... militar
Crise militar? Parece meio demodê, não é? Mas o assunto, ao que tudo indica, é grave. E tem todos os ingredientes para se constituir em um caldeirão político agora em janeiro. Logo em janeiro! Um mês tradicionalmente incolor do ponto de vista político. Pois é, os bivaques estão em polvorosa. E as vivandeiras, como dantes, em longínqua data, não se cansam de açular os quartéis. Aproveite e leia, abaixo, a análise sempre lúcida de Alon Feuerwerker sobre o imbroglio.
Uma "CPI" da ditadura (31/12)
Alon Feuerwerker
Desconfortável que a palavra “anistia”, resultado de belas e grandes lutas, vá sendo transformada em sinônimo de problema, esperteza, impunidade. Mas o fenômeno é com certeza passageiro.
É bom que o país tenha conhecimento da sua História. Mas isso deve ser visto à luz do interesse nacional. E quem define o interesse nacional? Costumam ser os poderes constituídos. Então, é natural que a busca da verdade histórica se submeta à lógica da luta política. Eis (mais) uma qualidade da alternância no poder: quando os diversos grupos se revezam no comando do Estado, ao fim de certo tempo haverá alguma democratização dos “podres” divulgados.
O governo federal acaba de tomar iniciativas para repor na agenda a revisão dos atos cometidos por autoridades, especialmente militares, ao longo da ditadura de 1964-1985, com o objetivo de lançar luz definitiva sobre aquele período e, eventualmente, responsabilizar por crimes. Essa segunda parte é inócua. Nenhuma legislação pode retroagir, e quem vai decidir se a Lei de Anistia e suas ampliações valeram ou não para os torturadores não são nem o presidente da República nem o Congresso Nacional: será o Supremo Tribunal Federal (STF).Por isso, é razoável concluir que o gesto presidencial, impulsionado pelas pastas dos Direitos Humanos e da Justiça, tenha também o objetivo de colocar pressão sobre o STF.
Mas não apenas: com a medida, o governo reabre uma frente de combate para enquadrar as Forças Armadas num figurino mais adequado aos atuais ocupantes do poder. Tentou isso na rebelião dos controladores de voo anos atrás, quando o Planalto operou para minar a autoridade da FAB. Deu errado, talvez por falta de apoio social à ideia de deixar o controle do espaço aéreo nacional nas mãos de um sindicato.Terá agora Lula força suficiente para empurrar as Forças Armadas contra o canto da parede? O presidente e o governo estão no ápice do poder, ou da sensação de poder. Afinal, se a guerra travada pelos que combatiam as organizações armadas foi em certas situações hedionda, tampouco a guerrilha de esquerda atuou como se colhesse rosas num jardim. Guerra bonita, só nos filmes. Mas o governo, aparentemente, julga que poderá passar a limpo apenas um lado da coisa, descascar apenas uma metade do abacaxi.
Os entes queridos dos mortos e desaparecidos na ditadura têm o direito inegável e inalienável de saber o que aconteceu. É um direito que em situação normal deveria ser buscado na Justiça. Mas o governo aparentemente considera que a situação não é normal, e que o assunto deve ser reaberto na esfera política, criando uma espécie de “CPI da ditadura”. Veremos no que vai dar.Mas uma vitória pelo menos o governo já colheu: cada vez que mexe no tema, a administração do PT coloca-se num planto moral supostamente acima. De um lado, os que desejam apurar os crimes contra os direitos humanos e punir os culpados; do outro, os que não querem, por mera conveniência política. Fácil de explicar, fácil de faturar.
As circunstâncias da Anistia conquistada no final dos anos 70 do século passado são conhecidas. Ela resultou de um amplo movimento democrático, que havia criado no país um ambiente político propício. Um ambiente que, entre outras coisas, permitiu a emergência do movimento sindical do ABC e de Lula. Boa parte dos grupos que confluiriam depois para o PT não apoiaram a Anistia, ainda que dela tenham se beneficiado. Assim como tampouco viriam a apoiar Tancredo Neves no colégio eleitoral. Assim como resistiriam depois a endossar a Constituição de 1988.O PT não parece se reconhecer como protagonista pleno da luta dos anos 70 e 80 pela redemocratização do país. Parece identificar-se melhor com as organizações que se levantaram em armas contra a ditadura nos anos 60, por projetos políticos que não necessariamente implicariam um desfecho como a Nova República, uma democracia representativa clássica.
É a política, e quem não tiver estômago que mude de ramo. Desconfortável, apenas, que a palavra “anistia”, resultado de belas e grandes lutas do povo brasileiro, vá sendo transformada em sinônimo de problema, de esperteza, de impunidade. Mas o fenômeno é passageiro. A ideologia –qualquer ideologia– é impotente para revogar os fatos. E todo poder que se considera absoluto um dia descobre que não é. Quando tem sorte, descobre a tempo.
Coluna (Nas entrelinhas) publicada nesta quinta-feira (31) no Correio Braziliense.
Uma "CPI" da ditadura (31/12)
Alon Feuerwerker
Desconfortável que a palavra “anistia”, resultado de belas e grandes lutas, vá sendo transformada em sinônimo de problema, esperteza, impunidade. Mas o fenômeno é com certeza passageiro.
É bom que o país tenha conhecimento da sua História. Mas isso deve ser visto à luz do interesse nacional. E quem define o interesse nacional? Costumam ser os poderes constituídos. Então, é natural que a busca da verdade histórica se submeta à lógica da luta política. Eis (mais) uma qualidade da alternância no poder: quando os diversos grupos se revezam no comando do Estado, ao fim de certo tempo haverá alguma democratização dos “podres” divulgados.
O governo federal acaba de tomar iniciativas para repor na agenda a revisão dos atos cometidos por autoridades, especialmente militares, ao longo da ditadura de 1964-1985, com o objetivo de lançar luz definitiva sobre aquele período e, eventualmente, responsabilizar por crimes. Essa segunda parte é inócua. Nenhuma legislação pode retroagir, e quem vai decidir se a Lei de Anistia e suas ampliações valeram ou não para os torturadores não são nem o presidente da República nem o Congresso Nacional: será o Supremo Tribunal Federal (STF).Por isso, é razoável concluir que o gesto presidencial, impulsionado pelas pastas dos Direitos Humanos e da Justiça, tenha também o objetivo de colocar pressão sobre o STF.
Mas não apenas: com a medida, o governo reabre uma frente de combate para enquadrar as Forças Armadas num figurino mais adequado aos atuais ocupantes do poder. Tentou isso na rebelião dos controladores de voo anos atrás, quando o Planalto operou para minar a autoridade da FAB. Deu errado, talvez por falta de apoio social à ideia de deixar o controle do espaço aéreo nacional nas mãos de um sindicato.Terá agora Lula força suficiente para empurrar as Forças Armadas contra o canto da parede? O presidente e o governo estão no ápice do poder, ou da sensação de poder. Afinal, se a guerra travada pelos que combatiam as organizações armadas foi em certas situações hedionda, tampouco a guerrilha de esquerda atuou como se colhesse rosas num jardim. Guerra bonita, só nos filmes. Mas o governo, aparentemente, julga que poderá passar a limpo apenas um lado da coisa, descascar apenas uma metade do abacaxi.
Os entes queridos dos mortos e desaparecidos na ditadura têm o direito inegável e inalienável de saber o que aconteceu. É um direito que em situação normal deveria ser buscado na Justiça. Mas o governo aparentemente considera que a situação não é normal, e que o assunto deve ser reaberto na esfera política, criando uma espécie de “CPI da ditadura”. Veremos no que vai dar.Mas uma vitória pelo menos o governo já colheu: cada vez que mexe no tema, a administração do PT coloca-se num planto moral supostamente acima. De um lado, os que desejam apurar os crimes contra os direitos humanos e punir os culpados; do outro, os que não querem, por mera conveniência política. Fácil de explicar, fácil de faturar.
As circunstâncias da Anistia conquistada no final dos anos 70 do século passado são conhecidas. Ela resultou de um amplo movimento democrático, que havia criado no país um ambiente político propício. Um ambiente que, entre outras coisas, permitiu a emergência do movimento sindical do ABC e de Lula. Boa parte dos grupos que confluiriam depois para o PT não apoiaram a Anistia, ainda que dela tenham se beneficiado. Assim como tampouco viriam a apoiar Tancredo Neves no colégio eleitoral. Assim como resistiriam depois a endossar a Constituição de 1988.O PT não parece se reconhecer como protagonista pleno da luta dos anos 70 e 80 pela redemocratização do país. Parece identificar-se melhor com as organizações que se levantaram em armas contra a ditadura nos anos 60, por projetos políticos que não necessariamente implicariam um desfecho como a Nova República, uma democracia representativa clássica.
É a política, e quem não tiver estômago que mude de ramo. Desconfortável, apenas, que a palavra “anistia”, resultado de belas e grandes lutas do povo brasileiro, vá sendo transformada em sinônimo de problema, de esperteza, de impunidade. Mas o fenômeno é passageiro. A ideologia –qualquer ideologia– é impotente para revogar os fatos. E todo poder que se considera absoluto um dia descobre que não é. Quando tem sorte, descobre a tempo.
Coluna (Nas entrelinhas) publicada nesta quinta-feira (31) no Correio Braziliense.
Uma análise interessante e interessada sobre as eleições de 2010
César Maia, ex-prefeito do Rio, do DEM, faz a sua análise prospectiva sobre as eleições de 2010. Como escreve de uma posição definida e interessada, a análise de César Maia pode e deve ser levada em conta por todos quantos queiram entender como está se armando o quadro para a disputa que já começou. Confira abaixo!
2009: AS ELEIÇÕES PRESIDENCIAIS DE 2010!
Ex-Blog do César Maia
1. Aqui sim Lula termina 2009 com um quadro muito mais favorável que o que iniciou 2009. Uma escolha açodada de candidata sem currículo e sem charme eleitoral terminou chegando ao ponto que Lula queria: acima dos 20%. E com cruzamentos em pesquisa que indicam que crescerá ainda mais nos meses iniciais de 2010.
2. A oposição se mostrou incapaz de entrar em campo com seu time escalado. A tática de ganhar tempo não só abriu caminho a Dilma, como afetou a situação em vários Estados importantes e ainda produziu feridas, que são certamente sanáveis, mas que sempre deixam uma casquinha ou outra.
3. Cabe a candidatura presidencial da oposição usar bem o primeiro trimestre de 2010 para curar as feridas, reerguer nomes em vários Estados e voltar ao quadro de favoritismo que apontava no início de 2009. Ainda há tempo. Mas nem tanto assim.
2009: AS ELEIÇÕES PRESIDENCIAIS DE 2010!
Ex-Blog do César Maia
1. Aqui sim Lula termina 2009 com um quadro muito mais favorável que o que iniciou 2009. Uma escolha açodada de candidata sem currículo e sem charme eleitoral terminou chegando ao ponto que Lula queria: acima dos 20%. E com cruzamentos em pesquisa que indicam que crescerá ainda mais nos meses iniciais de 2010.
2. A oposição se mostrou incapaz de entrar em campo com seu time escalado. A tática de ganhar tempo não só abriu caminho a Dilma, como afetou a situação em vários Estados importantes e ainda produziu feridas, que são certamente sanáveis, mas que sempre deixam uma casquinha ou outra.
3. Cabe a candidatura presidencial da oposição usar bem o primeiro trimestre de 2010 para curar as feridas, reerguer nomes em vários Estados e voltar ao quadro de favoritismo que apontava no início de 2009. Ainda há tempo. Mas nem tanto assim.
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Dica de pesquisa e leitura enviada pela Professora Eliane Tânia
Eliane Tânia, professora do Departamento de Antropologia e dos programas de pós de antropologia e ciências sociais, enviou aos colegas o e-mail abaixo, com dicas de pesquisa e leitura. Repasso para você.
Pasta de textos no 4Share, aberta a novas colaborações. Tem muita coisa boa. Quem quiser pode explorar e pesquisar no link:
http://www.4shared.com/dir/16336925/86dedf15/ANTROPOLOGIA_SOCIAL_-_TANIA.html
Qualquer texto pode ser transferido (download) para seu computador. Estão em ordem alfabética (por autor, título ou assunto). Se tiver algum texto online que queira arquivar e compartilhar lá, é só fazer upload dele, do seu computador para a pasta online. Essa pasta recebe colaborações espontâneas dos membros da minha comunidade virtual de antropologia (do orkut).
Não deixe de divulgar entre seus alunos e orientandos. O principal objetivo é esse.
E feliz 2010 para todos vocês.
Tania
Pasta de textos no 4Share, aberta a novas colaborações. Tem muita coisa boa. Quem quiser pode explorar e pesquisar no link:
http://www.4shared.com/dir/16336925/86dedf15/ANTROPOLOGIA_SOCIAL_-_TANIA.html
Qualquer texto pode ser transferido (download) para seu computador. Estão em ordem alfabética (por autor, título ou assunto). Se tiver algum texto online que queira arquivar e compartilhar lá, é só fazer upload dele, do seu computador para a pasta online. Essa pasta recebe colaborações espontâneas dos membros da minha comunidade virtual de antropologia (do orkut).
Não deixe de divulgar entre seus alunos e orientandos. O principal objetivo é esse.
E feliz 2010 para todos vocês.
Tania
quarta-feira, 30 de dezembro de 2009
Música para quem ainda está trabalhando nesta reta final...
Trata-se de Melodia Romena, de Bruch. Quem toca? Michael Resetar, viola; Katherine Kohler, clarinete; e Sophie Luo, piano. Escute e esqueça os problemas...
Como medir o bem-estar da população?
No último número da revista Desafios do Desenvolvimento, publicada pelo IPEA, você encontra uma série de artigos sobre transportes e desenvolvimento urbano. Faço destaque, entretanto, para uma análise sobre a evolução dos índices utilizados para medir o bem-estar da população. Clique aqui e acesse o artigo (em pdf).
Será o fim da ditadura... da magreza?(mais uma nota)
Há alguns meses postei, por ocasião de uma edição especial de uma revista inglesa dedicada ao mundo da moda focada em modelos gordinhas, um comentário esperançoso de que aquele acontecimento fosse o prenúncio do fim da ditadura da moda. Agora, conforme se pode conferir no site da Veja, a modelo Fluvia Lacerda, com seus mais de cem quilos, e uma beleza singular, está arrasando no mundinho fashion. Que esse seja só o começo, então! E que todos, magros, gordos e nem uma coisa e nem outra, aceitem-se e aceitem os seus corpos e sejam felizes em 2010.
Músicas indicadas por Carlos Alberto
O Professor Carlos Alberto, do Departamento de Educação da UERN, amigo e irmão há décadas, indica, em mensagem de final de ano enviada para os seus amigos e amigas, as músicas abaixo. Trata-se de diferentes versões de "Smile", tema do filme "Tempos Modernos", de Chaplin. Há uma versão para o português, feita por ninguém menos do que João de Barro. Você a confere abaixo, na voz do Djavan. Depois, você dá um clique aqui e aqui e curte as versões (em inglês) nas vozes de Michael Jackson e Nat King Cole.
terça-feira, 29 de dezembro de 2009
Lula, personalidade da década para o Financial Times
Uma das publicações mais influentes do mundo, especialmente no campo do jornalismo econômico, o britânico Financial Times elegeu as 50 personalidades da décadas. Entre elas, quem? Lula. Que já foi elito personalidade do ano pelo espanhol El País e pelo francês Le Monde. Agora, oh, Deus!, a Nova Direita sofre um ataque do coração...
Entrevista com Ignacio Cano
Ignacio Cano, professor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro e pesquisador do Laboratório de Análises da Violência, da mesma instituição, é um dos mais destacados investigadores da criminalidade violenta no Brasil contemporâneo. Na edição de hoje do jornal espanhol El País, ele concede uma interessante entrevista. Nela, dentre outras coisas, posiciona-se em relação à legalização das drogas. Vale a pena conferir (em espanhol)! Acesse aqui.
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domingo, 27 de dezembro de 2009
A bolada que Padre Fábio recebeu nem é o mais grave...
O cantor Pare Fábio de Melo recebeu, da Prefeitura da cidade do Natal, nada menos que R$ 221.000,00 para um show realizado no dia 25, sexta-feira passada.
O fato passou a merecer críticas da imprensa norte-riograndense. Não é para menos, afinal o valor pago ao padre cantor é, no mínimo, quatro vezes maior do aquele pago a nomes consagrados da música brasileira, como Bibi Ferreira e Zé Ramalho.
Ontem, no RN TV, telejornal noturno da TV Cabugi (Rede Globo), um secretário municipal tentava justificar o injustificável. Em certa altura, comentou que vinte e cinco mil pessoas que estavam participando de uma missa assistiram ao show. Nesse momento, demo-nos conta de que a atividade musical estava incluída no conjunto de atividades de comemoração dos 100 anos da Arquidiocese de Natal. E que o problema é mais grave do que drenar rios de dinheiro público para a conta de um padre cantor...
Muito mais grave do que a quantia paga é o fato de uma prefeitura municipal pegar o meu, o seu, o nosso suado dinheirinho para financiar atividades de uma determinada religião. Mesmo quando essa religião tem, supostamente, a adesão da maioria dos municípes.
O atentado cometido pela gestão da Prefeita Micarla de Sousa foi não apenas contra o erário público, mas, o que é mais grave e prejudicial, contra o princípio republicano de separação entre Igreja e Estado.
Sobre essa questão, em artigo publicado hoje no jornal Folha de São Paulo, Dom Dimas Lira Barbosa, Secretário Geral da CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil), escreveu:
"A separação entre igreja e Estado, conquistada, no Brasil, com a proclamação da República, significou, para ambos, um ganho enorme em termos de autonomia e liberdade de ação. Nada, hoje, justificaria um retrocesso nesse campo."
Pois, em Natal, Igreja e Estado estão em conúbio e quem paga a conta do matrimônio é o distinto público,
O fato passou a merecer críticas da imprensa norte-riograndense. Não é para menos, afinal o valor pago ao padre cantor é, no mínimo, quatro vezes maior do aquele pago a nomes consagrados da música brasileira, como Bibi Ferreira e Zé Ramalho.
Ontem, no RN TV, telejornal noturno da TV Cabugi (Rede Globo), um secretário municipal tentava justificar o injustificável. Em certa altura, comentou que vinte e cinco mil pessoas que estavam participando de uma missa assistiram ao show. Nesse momento, demo-nos conta de que a atividade musical estava incluída no conjunto de atividades de comemoração dos 100 anos da Arquidiocese de Natal. E que o problema é mais grave do que drenar rios de dinheiro público para a conta de um padre cantor...
Muito mais grave do que a quantia paga é o fato de uma prefeitura municipal pegar o meu, o seu, o nosso suado dinheirinho para financiar atividades de uma determinada religião. Mesmo quando essa religião tem, supostamente, a adesão da maioria dos municípes.
O atentado cometido pela gestão da Prefeita Micarla de Sousa foi não apenas contra o erário público, mas, o que é mais grave e prejudicial, contra o princípio republicano de separação entre Igreja e Estado.
Sobre essa questão, em artigo publicado hoje no jornal Folha de São Paulo, Dom Dimas Lira Barbosa, Secretário Geral da CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil), escreveu:
"A separação entre igreja e Estado, conquistada, no Brasil, com a proclamação da República, significou, para ambos, um ganho enorme em termos de autonomia e liberdade de ação. Nada, hoje, justificaria um retrocesso nesse campo."
Pois, em Natal, Igreja e Estado estão em conúbio e quem paga a conta do matrimônio é o distinto público,
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Vergonha!
A cobertura dada pela mídia brasileira (mas, para ser honesto, também pela norte-americana) ao caso do menino Sean Goldman, para dizer o mínimo, foi vergonhosa. Não se tratava, nesse caso, de uma questão pública, e, sim, de uma disputa de família. A espetacularização desse drama foi triste.
Tem razão o jornalista Clóvis Rossi, articulista do jornal Folha de São Paulo, que, em sua coluna de hoje, comentando o caso, propõe uma separação entre "curiosidade pública" e "interesse público".
No final de seu texto, Rossi coloca o dedo na ferida:
"Nesse espetáculo acabamos por cometer um pecado grave: demos abrigo a uma acusação, feita pela avó materna, de que o Executivo e o Judiciário brasileiros venderam-se aos Estados Unidos pagando com Sean pela manutenção de vantagens comerciais.
Nenhum jornalista sério diria tal coisa por sua conta. Se o dissesse, correria o risco de purgar elevada pena. No entanto, no jornalismo-espetáculo, a acusação foi ao ar e ao papel. Incomoda, não?"
EM TEMPO: Agiu corretamente o Presidente do STF, Ministro Gilmar Mendes, ao acabar com o jogo de empurra no judiciário e garantir a guarda definitivo do menino ao seu pai.
Tem razão o jornalista Clóvis Rossi, articulista do jornal Folha de São Paulo, que, em sua coluna de hoje, comentando o caso, propõe uma separação entre "curiosidade pública" e "interesse público".
No final de seu texto, Rossi coloca o dedo na ferida:
"Nesse espetáculo acabamos por cometer um pecado grave: demos abrigo a uma acusação, feita pela avó materna, de que o Executivo e o Judiciário brasileiros venderam-se aos Estados Unidos pagando com Sean pela manutenção de vantagens comerciais.
Nenhum jornalista sério diria tal coisa por sua conta. Se o dissesse, correria o risco de purgar elevada pena. No entanto, no jornalismo-espetáculo, a acusação foi ao ar e ao papel. Incomoda, não?"
EM TEMPO: Agiu corretamente o Presidente do STF, Ministro Gilmar Mendes, ao acabar com o jogo de empurra no judiciário e garantir a guarda definitivo do menino ao seu pai.
sexta-feira, 25 de dezembro de 2009
Que a sua noite de Natal tenha sido ótima e que 2010 seja melhor ainda...
Devia ter postado ontem o clipe abaixo. Não deu! Faço isso agora. E te desejo felicidades mil... e que, em 2010, continue visitando este blog.
Onde está a verdade?
Transcrevo aí abaixo um relato pungente, escrito pela jornalista Eliane Brum, de encontros possíveis em qualquer grande cidade. Lembrei-me de um outro texto, também muito bom, escrito no início do século XX, por Georg Simmel. O título é "As grandes cidades e a vida do espírito". Foi traduzido para o português há umas três décadas. Está em uma coletânea organizada pelo antropólogo Gilberto Velho. Você pode encontrar uma tradução mais recente, publicada pela sempre ótima revista Mana. Clique aqui e leia-o. Mas, antes, acompanhe a narrativa abaixo. E tente, nesta manhã pós-céia de Natal, não se emocionar...
ESCOLHA O FINAL: Mesmo nas Histórias Reais, a Verdade Nunca é Simples
ELIANE BRUM
ebrum@edglobo.com.br
Da Revista Época
É curioso como acordamos com a ilusão de que sabemos o que vai acontecer. Numa manhã, dias atrás, eu tinha uma série de compromissos encadeados numa série que acabaria só tarde da noite. A parte leve do meu dia era um pit stop para fazer as unhas no salão aonde vou sábado sim, sábado não. Eu tinha acabado de superar o dilema feminino de escolher o esmalte, depois de oscilar entre cores e nomes que só os esmaltes são capazes de ter: Atrevida, Maçã, Paixão e Canoa. De repente, essa rotina segura foi rompida por um grito.
“A mulher está desmaiando”, gritou Elis, a moça que tinge, lava e seca os cabelos. Pela cortina, eu só vi as costas de uma mulher grande, sentada no banco diante da calçada, na Vila Madalena, em São Paulo. Ciça, a dona do salão, amparava o seu corpo. Tatiane, a recepcionista, correu a buscar um copo d’água. Rose, a manicure, arriscou um diagnóstico: “Pressão baixa”. Voltei a ler. A moça estava sendo cuidada. Eu tentava recuperar a palavra interrompida na página do jornal quando ela começou a falar.
O desespero na sua voz alcançou as cutículas da minha alma. Eu não entendia o que ela dizia, só escutava o desamparo. Pela cortina, via seus ombros sacudirem-se num choro convulso. Na porta, Tatiane narrava o que ouvia. Sua história vinha aos soluços, como no twitter. “O marido morreu”. “Ela saiu às 4h da manhã de casa”. “Foi despejada porque não tinha o dinheiro do aluguel”. “Deixou os filhos e suas coisas debaixo de uma árvore e veio procurar trabalho”. “O filho mais velho tem 12 anos e ficou chorando”. “Ela tem gêmeos de nove meses que amamenta”. “A vizinha ficou olhando os filhos”. “Ela está com fome”. “Ela está desesperada”.
No lado de dentro, nós éramos mulheres fazendo as unhas, tingindo e cortando os cabelos, num espaço do feminino distante do feminino dela. A dor da mulher entrava pela porta daquele santuário em que vivíamos nossas delicadezas no meio de uma cidade bruta. Cada uma com problemas que nos tentaculavam como polvos.
Algumas de nós cravaram os olhos em suas revistas de celebridades. Não porque fossem indiferentes ao drama, mas porque era dolorido demais entrar em contato. Tentavam se convencer de que aquilo não estava acontecendo. Se ficassem bem concentradas na polêmica sobre o vestido curto de Juliana Paes na cerimônia do Emmy, a voz terrível do lado de fora acabaria se calando. Uma delas nem percebeu que a revista estava de cabeça para baixo.
A certa altura, todas nós chorávamos. Uma mistura de compaixão e vergonha. Não por chorar, mas por não saber o que fazer. Éramos mulheres que davam duro para ganhar a vida e às vezes nos escondíamos ali para ficar bonitas. Fugíamos não só de nossas unhas roídas, mas da feiúra do mundo. E lá estava ela, à porta de nosso pequeno e frágil universo, chorando de fome e desespero. Cadê os seguranças, as cercas eletrificadas, o porteiro eletrônico, os vidros com insulfilm para nos proteger do desamparo alheio? Não havia.
Com braços espichados, pernas no colo da manicure, eu era um retrato patético da impotência. Depois de alguns minutos eternos consegui romper meu imobilismo. “Tati, quanto é o aluguel dela?”. Tati correu para fora. Voltou. “É cem reais.” A dona do salão ofereceu a ela um emprego em sua casa. Dei a ela o dinheiro do aluguel, para que pudesse reorganizar a vida e voltar a trabalhar.
A mulher quis entrar para me conhecer. O desamparo agora tinha corpo. Era negra, grande, os seios fartos de leite. O conjunto azul de saia e blusa revelava sua tentativa de estar apresentável para bater de porta em porta em busca de um emprego. Sempre me comovi com estes pequenos detalhes. O vestido puído, mas limpo, o paletó curto nas mangas, os sem-tetos que lavam as roupas nos parques para vesti-las embaixo de viadutos imundos.
Nos abraçamos ali, entre escovas, esmaltes e secadores de cabelo. Descobri que eu precisava tanto daquele abraço quanto ela. Duas estranhas abraçadas, cada uma com o nariz enfiado no pescoço da outra, misturando o sal das nossas lágrimas e do nosso suor. Duas mulheres em posições sociais diferentes, mas que se reconheciam no desamparo. Sem cercas para nos apartar, nos enxergávamos.
Quando percebi, eu dizia coisas para ela como: “A vida às vezes é bem dura, mas passa”. Ou: “Come antes de pegar o ônibus para não desmaiar”. Ou ainda: “Paga o aluguel, cuida dos teus filhos e depois volta”. Soube então que seu nome era Eliane. Éramos duas Elianes chorando abraçadas pela dor de ser mulher num mundo tão assustador.
Não era esmola o que dei ali. Nem era esmola o que ela aceitou. Era algo que nos igualava, que permitia que nos abraçássemos e chorássemos juntas. Ela achava que Deus tinha guiado os seus passos. “Eu ia por uma rua, mas Deus me mandou ir por outra”, disse ela. Já eu acredito mais nos pequenos milagres humanos. E acredito que eles acontecem quando vencemos nosso medo e nos reconhecemos nos olhos do outro. Toda violência, acho eu, começa quando deixamos de nos enxergar, erguendo – também literalmente – muros entre nós. Apartados uns dos outros, é óbvio que quando nos encontramos não há reconhecimento, só desconfiança.
Não foi por acaso que ela desabou naquela porta. O salão tem porta para a calçada e um banco onde é possível sentar. Sua arquitetura acolhe, não afasta. Deve ter sido o único banco que Eliane encontrou nos muitos quarteirões por onde andou arrastando a sua dor. Naquele mundo de mulheres ela chegou como estrangeira. Mas suas palavras foram ecoando em cada uma de nós, até que ultrapassaram a soleira da porta junto com ela. Ela então se tornou uma de nós, mulheres tentando desenredar a vida.
Salões de beleza, seja nos bairros nobres ou nas favelas, são universos onde os dramas do mundo feminino se desenrolam. Há uma força poderosa nesse desejo de se embelezar. Somos todas muito parecidas com os pés nus estendidos no colo de outra mulher. Essa trama delicada é tema de um filme bonito que está nas locadoras chamado Caramelo (Nadine Labaki, 2007).
Nele, as vidas de cinco mulheres se entrelaçam num salão de beleza de Beirute, no Líbano. Layale, amante de um homem casado, sonha com o dia em que ele vai se separar para ficar com ela; Nisrine está de casamento marcado, mas não é mais virgem e não sabe como contar isso ao noivo muçulmano; Rima sente atração por mulheres; Jamale tem medo de envelhecer; e Rose cuida da irmã mais velha.
Me senti num filme real naquele final de manhã. Um filme só de mulheres. Quando a outra Eliane partiu, ficamos fungando em silêncio. E Rose terminou de pintar minhas unhas com esmalte Maçã.
----------------------------------------------------------------
Eliane deveria voltar na terça-feira seguinte para começar a trabalhar na casa da dona do salão. Nunca apareceu.
O que teria acontecido? O final desta história não é simples.
A terça-feira em que ela deveria voltar, 8 de dezembro, foi o dia em que São Paulo parou por causa da chuva. Eliane disse que morava nos confins da Zona Leste. Teria ela sido acossada pela chuva? Ou alguma de suas crianças? Como acontece a cada ano, dezenas morrem de algo tão previsível quanto a chuva no estado mais rico do país. Só naquela terça-feira morreram pelo menos seis na Grande São Paulo. E centenas ficaram desabrigadas.
Fico de olho nas notícias sobre os mortos, mas até agora não encontrei ninguém com suas características. Ela pode estar ferida, o barraco pode ter desabado, um filho pode ter ficado doente. Ela não deixou nenhum endereço. Ficou apenas de voltar com certeza.
Ou seria um golpe? Aceitando essa hipótese plausível, teríamos nós, escoladas moradores da metrópole, caído numa velha pantomina. A favor de nós, para que nos sintamos um pouco menos idiotas, pode-se dizer que ela era uma grande atriz. Sim, porque estava gelada, suava frio, tremia muito e chorava lágrimas copiosas.
Há outras possibilidades. De que ela estivesse mesmo desesperada e com fome, mas precisou contar uma história mais trágica para nos sensibilizar. Ou ainda, que estivesse em síndrome de abstinência de algum tipo de droga, o que explicaria o quase desmaio, os tremores e o suor frio. Mas ninguém lhe daria dinheiro para comprar crack, por exemplo, se falasse a verdade. Neste caso, o desespero seria real, o motivo mentira.
A verdade nunca é fácil nem está toda no mesmo lugar.
Quando fazemos reportagens, precisamos duvidar de tudo. Vamos a todos os lugares, falamos com todos os envolvidos, checamos os documentos, ouvimos o contraditório e relatamos o que encontramos, para que os leitores possam chegar a suas próprias conclusões. Mas, na vida cotidiana, não temos esse tempo. As escolhas, em geral, precisam ser rápidas. Estender ou não a mão a alguém que pede ajuda?
Não há certezas. E, na dúvida, qual é o final que prefiro para esta história?
Por um lado, gostaria de não ter caído num golpe. Ninguém gosta de se sentir idiota. Por outro, se não era um golpe, ela pode estar morta ou ferida o suficiente para não poder ligar pedindo ajuda. Isso seria bem pior, obviamente. Por paradoxal que seja, o melhor é ter sido vítima de um golpe e feito um papel ridículo.
Possivelmente nunca saberei a verdade dela. Mas é importante conhecer a minha verdade. A pergunta que importa agora é: o que eu faria se algo assim acontecesse novamente?
Eu faria o mesmo.
Pertenço à parcela das pessoas que prefere deixar a porta aberta a se trancar atrás dela. Sempre há um risco de entrar um golpista pela porta, mas por ela também entra quem precisa de um colo, entra o novo e até o extraordinário. É uma convicção profunda que me move pela vida. E espero sempre ser capaz de escolher este final para a minha história.
ESCOLHA O FINAL: Mesmo nas Histórias Reais, a Verdade Nunca é Simples
ELIANE BRUM
ebrum@edglobo.com.br
Da Revista Época
É curioso como acordamos com a ilusão de que sabemos o que vai acontecer. Numa manhã, dias atrás, eu tinha uma série de compromissos encadeados numa série que acabaria só tarde da noite. A parte leve do meu dia era um pit stop para fazer as unhas no salão aonde vou sábado sim, sábado não. Eu tinha acabado de superar o dilema feminino de escolher o esmalte, depois de oscilar entre cores e nomes que só os esmaltes são capazes de ter: Atrevida, Maçã, Paixão e Canoa. De repente, essa rotina segura foi rompida por um grito.
“A mulher está desmaiando”, gritou Elis, a moça que tinge, lava e seca os cabelos. Pela cortina, eu só vi as costas de uma mulher grande, sentada no banco diante da calçada, na Vila Madalena, em São Paulo. Ciça, a dona do salão, amparava o seu corpo. Tatiane, a recepcionista, correu a buscar um copo d’água. Rose, a manicure, arriscou um diagnóstico: “Pressão baixa”. Voltei a ler. A moça estava sendo cuidada. Eu tentava recuperar a palavra interrompida na página do jornal quando ela começou a falar.
O desespero na sua voz alcançou as cutículas da minha alma. Eu não entendia o que ela dizia, só escutava o desamparo. Pela cortina, via seus ombros sacudirem-se num choro convulso. Na porta, Tatiane narrava o que ouvia. Sua história vinha aos soluços, como no twitter. “O marido morreu”. “Ela saiu às 4h da manhã de casa”. “Foi despejada porque não tinha o dinheiro do aluguel”. “Deixou os filhos e suas coisas debaixo de uma árvore e veio procurar trabalho”. “O filho mais velho tem 12 anos e ficou chorando”. “Ela tem gêmeos de nove meses que amamenta”. “A vizinha ficou olhando os filhos”. “Ela está com fome”. “Ela está desesperada”.
No lado de dentro, nós éramos mulheres fazendo as unhas, tingindo e cortando os cabelos, num espaço do feminino distante do feminino dela. A dor da mulher entrava pela porta daquele santuário em que vivíamos nossas delicadezas no meio de uma cidade bruta. Cada uma com problemas que nos tentaculavam como polvos.
Algumas de nós cravaram os olhos em suas revistas de celebridades. Não porque fossem indiferentes ao drama, mas porque era dolorido demais entrar em contato. Tentavam se convencer de que aquilo não estava acontecendo. Se ficassem bem concentradas na polêmica sobre o vestido curto de Juliana Paes na cerimônia do Emmy, a voz terrível do lado de fora acabaria se calando. Uma delas nem percebeu que a revista estava de cabeça para baixo.
A certa altura, todas nós chorávamos. Uma mistura de compaixão e vergonha. Não por chorar, mas por não saber o que fazer. Éramos mulheres que davam duro para ganhar a vida e às vezes nos escondíamos ali para ficar bonitas. Fugíamos não só de nossas unhas roídas, mas da feiúra do mundo. E lá estava ela, à porta de nosso pequeno e frágil universo, chorando de fome e desespero. Cadê os seguranças, as cercas eletrificadas, o porteiro eletrônico, os vidros com insulfilm para nos proteger do desamparo alheio? Não havia.
Com braços espichados, pernas no colo da manicure, eu era um retrato patético da impotência. Depois de alguns minutos eternos consegui romper meu imobilismo. “Tati, quanto é o aluguel dela?”. Tati correu para fora. Voltou. “É cem reais.” A dona do salão ofereceu a ela um emprego em sua casa. Dei a ela o dinheiro do aluguel, para que pudesse reorganizar a vida e voltar a trabalhar.
A mulher quis entrar para me conhecer. O desamparo agora tinha corpo. Era negra, grande, os seios fartos de leite. O conjunto azul de saia e blusa revelava sua tentativa de estar apresentável para bater de porta em porta em busca de um emprego. Sempre me comovi com estes pequenos detalhes. O vestido puído, mas limpo, o paletó curto nas mangas, os sem-tetos que lavam as roupas nos parques para vesti-las embaixo de viadutos imundos.
Nos abraçamos ali, entre escovas, esmaltes e secadores de cabelo. Descobri que eu precisava tanto daquele abraço quanto ela. Duas estranhas abraçadas, cada uma com o nariz enfiado no pescoço da outra, misturando o sal das nossas lágrimas e do nosso suor. Duas mulheres em posições sociais diferentes, mas que se reconheciam no desamparo. Sem cercas para nos apartar, nos enxergávamos.
Quando percebi, eu dizia coisas para ela como: “A vida às vezes é bem dura, mas passa”. Ou: “Come antes de pegar o ônibus para não desmaiar”. Ou ainda: “Paga o aluguel, cuida dos teus filhos e depois volta”. Soube então que seu nome era Eliane. Éramos duas Elianes chorando abraçadas pela dor de ser mulher num mundo tão assustador.
Não era esmola o que dei ali. Nem era esmola o que ela aceitou. Era algo que nos igualava, que permitia que nos abraçássemos e chorássemos juntas. Ela achava que Deus tinha guiado os seus passos. “Eu ia por uma rua, mas Deus me mandou ir por outra”, disse ela. Já eu acredito mais nos pequenos milagres humanos. E acredito que eles acontecem quando vencemos nosso medo e nos reconhecemos nos olhos do outro. Toda violência, acho eu, começa quando deixamos de nos enxergar, erguendo – também literalmente – muros entre nós. Apartados uns dos outros, é óbvio que quando nos encontramos não há reconhecimento, só desconfiança.
Não foi por acaso que ela desabou naquela porta. O salão tem porta para a calçada e um banco onde é possível sentar. Sua arquitetura acolhe, não afasta. Deve ter sido o único banco que Eliane encontrou nos muitos quarteirões por onde andou arrastando a sua dor. Naquele mundo de mulheres ela chegou como estrangeira. Mas suas palavras foram ecoando em cada uma de nós, até que ultrapassaram a soleira da porta junto com ela. Ela então se tornou uma de nós, mulheres tentando desenredar a vida.
Salões de beleza, seja nos bairros nobres ou nas favelas, são universos onde os dramas do mundo feminino se desenrolam. Há uma força poderosa nesse desejo de se embelezar. Somos todas muito parecidas com os pés nus estendidos no colo de outra mulher. Essa trama delicada é tema de um filme bonito que está nas locadoras chamado Caramelo (Nadine Labaki, 2007).
Nele, as vidas de cinco mulheres se entrelaçam num salão de beleza de Beirute, no Líbano. Layale, amante de um homem casado, sonha com o dia em que ele vai se separar para ficar com ela; Nisrine está de casamento marcado, mas não é mais virgem e não sabe como contar isso ao noivo muçulmano; Rima sente atração por mulheres; Jamale tem medo de envelhecer; e Rose cuida da irmã mais velha.
Me senti num filme real naquele final de manhã. Um filme só de mulheres. Quando a outra Eliane partiu, ficamos fungando em silêncio. E Rose terminou de pintar minhas unhas com esmalte Maçã.
----------------------------------------------------------------
Eliane deveria voltar na terça-feira seguinte para começar a trabalhar na casa da dona do salão. Nunca apareceu.
O que teria acontecido? O final desta história não é simples.
A terça-feira em que ela deveria voltar, 8 de dezembro, foi o dia em que São Paulo parou por causa da chuva. Eliane disse que morava nos confins da Zona Leste. Teria ela sido acossada pela chuva? Ou alguma de suas crianças? Como acontece a cada ano, dezenas morrem de algo tão previsível quanto a chuva no estado mais rico do país. Só naquela terça-feira morreram pelo menos seis na Grande São Paulo. E centenas ficaram desabrigadas.
Fico de olho nas notícias sobre os mortos, mas até agora não encontrei ninguém com suas características. Ela pode estar ferida, o barraco pode ter desabado, um filho pode ter ficado doente. Ela não deixou nenhum endereço. Ficou apenas de voltar com certeza.
Ou seria um golpe? Aceitando essa hipótese plausível, teríamos nós, escoladas moradores da metrópole, caído numa velha pantomina. A favor de nós, para que nos sintamos um pouco menos idiotas, pode-se dizer que ela era uma grande atriz. Sim, porque estava gelada, suava frio, tremia muito e chorava lágrimas copiosas.
Há outras possibilidades. De que ela estivesse mesmo desesperada e com fome, mas precisou contar uma história mais trágica para nos sensibilizar. Ou ainda, que estivesse em síndrome de abstinência de algum tipo de droga, o que explicaria o quase desmaio, os tremores e o suor frio. Mas ninguém lhe daria dinheiro para comprar crack, por exemplo, se falasse a verdade. Neste caso, o desespero seria real, o motivo mentira.
A verdade nunca é fácil nem está toda no mesmo lugar.
Quando fazemos reportagens, precisamos duvidar de tudo. Vamos a todos os lugares, falamos com todos os envolvidos, checamos os documentos, ouvimos o contraditório e relatamos o que encontramos, para que os leitores possam chegar a suas próprias conclusões. Mas, na vida cotidiana, não temos esse tempo. As escolhas, em geral, precisam ser rápidas. Estender ou não a mão a alguém que pede ajuda?
Não há certezas. E, na dúvida, qual é o final que prefiro para esta história?
Por um lado, gostaria de não ter caído num golpe. Ninguém gosta de se sentir idiota. Por outro, se não era um golpe, ela pode estar morta ou ferida o suficiente para não poder ligar pedindo ajuda. Isso seria bem pior, obviamente. Por paradoxal que seja, o melhor é ter sido vítima de um golpe e feito um papel ridículo.
Possivelmente nunca saberei a verdade dela. Mas é importante conhecer a minha verdade. A pergunta que importa agora é: o que eu faria se algo assim acontecesse novamente?
Eu faria o mesmo.
Pertenço à parcela das pessoas que prefere deixar a porta aberta a se trancar atrás dela. Sempre há um risco de entrar um golpista pela porta, mas por ela também entra quem precisa de um colo, entra o novo e até o extraordinário. É uma convicção profunda que me move pela vida. E espero sempre ser capaz de escolher este final para a minha história.
quinta-feira, 24 de dezembro de 2009
O mensalão do DEM, o voyeurismo e o espaço público
Se você digitar “Arruda” no you tube, tenho certeza!, vai se deparar com algumas dezenas de links direcionando-o para alguns dos vídeos nos quais o Governador demo do DF e alguns dos seus metem literalmente a mão em dinheiro de origem duvidosa. Também no you tube, você poderá se deparar com o vídeo com o qual um vereador de Curitiba pretendeu garantir um lugar na próxima edição do Big Brother, da TV Globo.
Gostem ou não os atores do campo (parlamentares, assessores, consultores, jornalistas e todo um conjunto de agentes que constroem e estruturam o nosso mundo político...), as atividades enquadradas na rubrica de “política”, cada vez mais, produzem imagens e narrativas que alimentam as relações que são consumidas da mesma forma que o são as performances das celebridades, as bizarrices dos esportistas milionários e as cenas de sexo de modelos e atrizes de terceira linha.
Se o espaço público tradicional sempre demarcou fronteiras entre o que “está na frente” (público) e o que fica nos “bastidores” (atrás), agora tudo mudou. O voyeurismo embaralhou as fronteiras e os políticos, assim como todas as outras celebridades, nos jogam na cara suas velhacarias mais íntimas. E há sempre uma câmera a registrar seja a atriz sem calcinha ou o deputado que coloca dinheiro na cueca... Por quê? Ora, não nos deliciamos todos com as cenas mais íntimas e depravadas. E as imagens não mentem, repetem os especialistas da mesmice. “Eu assisti tudo na TV”, dizem muitos. “Dei uma olhada na internet”, repetem outros.
Por outro lado, cada vez mais políticos, assim como jogadores de futebol, não dão um passo ou abrem a boca sem antes consultar um consultor de imagem pessoal. E todo ato público é pensado, teatralizado, como se fora uma performance teatral. Já que o distinto público quer consumir o que é distinto, então, tome distinção fabricada. E tome publicização da vida privada. Se brincar, teremos todo um bloco do principal telejornal da noite dedicado à vida da cadela do Presidente Barak Obama.
Por estas paragens, acreditem!, a coisa não é diferente. O blog dedicado ao jornalismo político no RN que recebe o maior número de visitas presenteia os internautas com fotos e mais fotos das festas de aniversários de políticos e seus familiares. Ou, quando se dedica a “cobrir” uma campanha política, ao “pé inchado” de um deputado.
Não por acaso, Sabrina Sato é a estrela do Senado. Todos os parlamentares querem aparecer no programa televisivo pilotado pela apresentadora. E esta, dizem os bem-informados, é namorada de um deputado cuja performance política é medida pelos casos amorosos que coleciona com celebridades...
E os novos mídias ajustam-se bem a essa transformação dos políticos em celebridades. Com o twitter, por exemplo, o voyeurismo avança um pouco mais. Propalado como uma das “ferramentas” responsáveis pela vitória democrata nos EUA, o programa passou a ser usado largamente pelos políticos brasileiros. Com essa “rede social”, dizem os especialistas, é possível acompanhar o “fazer político”. “Dá mais transparência”, ouvi um precoce candidato a conselheiro do Príncipe anunciar com a solenidade empolada dos medíocres.
O espaço público, pelo menos aquele tradicionalmente concebido por defensores da res publica e da polis, pressupunha discussão e deliberação. Na atualidade, com a força da TV e da internet, ele se transforma mais e mais em espaço de “revelação” de segredos, intimidades e bizarrices íntimas.
Bueno, e daí? Ora, a primeira lição a tirar do acima exposto é que aquela simpática (e, segundo Bourdieu, em seu cortante, “Meditações Pascalianas”, um tanto quanto cristã) idéia de uma esfera pública racional, propugnada pelo filósofo Jürgen Habermas, parece ter cada vez menos chão social para se firmar. Uma segunda lição é a de que aquelas cândidas elaborações sobre a internet como uma espécie de ágora pós-moderna é uma fantasia de conseqüências políticas danosas.
Isso não significa, longe de mim essa idéia pessimista!, assumir a proposição de que as novas tecnologias ameaçam a democracia. Pelo contrário! Elas podem ajudar, sim, a construir espaços democráticos. E, na medida em que têm ajudado efetivamente a formar opiniões e articular redes de opiniões, têm contribuído para, de alguma forma, dar sustentabilidade ao ideal democrático na contemporaneidade.
Entretanto, os ganhos acima mencionados se estiolam caso não estejamos vigilantes em relação às mazelas referidas mais acima.
Gostem ou não os atores do campo (parlamentares, assessores, consultores, jornalistas e todo um conjunto de agentes que constroem e estruturam o nosso mundo político...), as atividades enquadradas na rubrica de “política”, cada vez mais, produzem imagens e narrativas que alimentam as relações que são consumidas da mesma forma que o são as performances das celebridades, as bizarrices dos esportistas milionários e as cenas de sexo de modelos e atrizes de terceira linha.
Se o espaço público tradicional sempre demarcou fronteiras entre o que “está na frente” (público) e o que fica nos “bastidores” (atrás), agora tudo mudou. O voyeurismo embaralhou as fronteiras e os políticos, assim como todas as outras celebridades, nos jogam na cara suas velhacarias mais íntimas. E há sempre uma câmera a registrar seja a atriz sem calcinha ou o deputado que coloca dinheiro na cueca... Por quê? Ora, não nos deliciamos todos com as cenas mais íntimas e depravadas. E as imagens não mentem, repetem os especialistas da mesmice. “Eu assisti tudo na TV”, dizem muitos. “Dei uma olhada na internet”, repetem outros.
Por outro lado, cada vez mais políticos, assim como jogadores de futebol, não dão um passo ou abrem a boca sem antes consultar um consultor de imagem pessoal. E todo ato público é pensado, teatralizado, como se fora uma performance teatral. Já que o distinto público quer consumir o que é distinto, então, tome distinção fabricada. E tome publicização da vida privada. Se brincar, teremos todo um bloco do principal telejornal da noite dedicado à vida da cadela do Presidente Barak Obama.
Por estas paragens, acreditem!, a coisa não é diferente. O blog dedicado ao jornalismo político no RN que recebe o maior número de visitas presenteia os internautas com fotos e mais fotos das festas de aniversários de políticos e seus familiares. Ou, quando se dedica a “cobrir” uma campanha política, ao “pé inchado” de um deputado.
Não por acaso, Sabrina Sato é a estrela do Senado. Todos os parlamentares querem aparecer no programa televisivo pilotado pela apresentadora. E esta, dizem os bem-informados, é namorada de um deputado cuja performance política é medida pelos casos amorosos que coleciona com celebridades...
E os novos mídias ajustam-se bem a essa transformação dos políticos em celebridades. Com o twitter, por exemplo, o voyeurismo avança um pouco mais. Propalado como uma das “ferramentas” responsáveis pela vitória democrata nos EUA, o programa passou a ser usado largamente pelos políticos brasileiros. Com essa “rede social”, dizem os especialistas, é possível acompanhar o “fazer político”. “Dá mais transparência”, ouvi um precoce candidato a conselheiro do Príncipe anunciar com a solenidade empolada dos medíocres.
O espaço público, pelo menos aquele tradicionalmente concebido por defensores da res publica e da polis, pressupunha discussão e deliberação. Na atualidade, com a força da TV e da internet, ele se transforma mais e mais em espaço de “revelação” de segredos, intimidades e bizarrices íntimas.
Bueno, e daí? Ora, a primeira lição a tirar do acima exposto é que aquela simpática (e, segundo Bourdieu, em seu cortante, “Meditações Pascalianas”, um tanto quanto cristã) idéia de uma esfera pública racional, propugnada pelo filósofo Jürgen Habermas, parece ter cada vez menos chão social para se firmar. Uma segunda lição é a de que aquelas cândidas elaborações sobre a internet como uma espécie de ágora pós-moderna é uma fantasia de conseqüências políticas danosas.
Isso não significa, longe de mim essa idéia pessimista!, assumir a proposição de que as novas tecnologias ameaçam a democracia. Pelo contrário! Elas podem ajudar, sim, a construir espaços democráticos. E, na medida em que têm ajudado efetivamente a formar opiniões e articular redes de opiniões, têm contribuído para, de alguma forma, dar sustentabilidade ao ideal democrático na contemporaneidade.
Entretanto, os ganhos acima mencionados se estiolam caso não estejamos vigilantes em relação às mazelas referidas mais acima.
quarta-feira, 23 de dezembro de 2009
O PT de salto alto
Como eu tenho apontado aqui, as últimas pesquisas eleitorais apontam claramente para uma certa subida, nas intenções de votos, da candidata do PT e do presidente Lula, a ministra Dilma Roussef. Parece que isso bastou para uma parte do PT resgatar a sua velha arrogância. Que o diga a besteirada formulada pelo Senador Mercandante a respeito do Ciro Gomes!
Em 2008, na campanha de Fátima Bezerra, aqui em Natal, os petistas daqui usaram e abusaram do salto alto. Nofssa! Logo após o acordão com os caciques locais comportavam-se como se já tivessem ganho a eleição. Depois, bem depois, tiveram que calçar as sandálias da humildade... Para o bem da candidatura de Dilma, espera-se que a postura potiguar das eleições para prefeito não contamine o PT nacional.
Legalização das drogas: a posição corajosa do Deputado Paulo Teixeira (PT)
O Deputado Paulo Teixeira (PT-SP) tem assumido, com surpreendente coragem se levarmos em conta a média dos políticos brasileiros, a proposta de descriminalizar o uso das drogas. No vídeo abaixo, uma entrevista concedida pelo deputado ao jornalista Alon Feuerwerker. Feuerwerker, como vocês sabem, pilota um blog (Blog do Alon), é colunista do Correio Brasiliense e, de uns tempos prá cá, ancora o programa "Jogo do Poder", que é transmitido pela CNT, mas que você pode encontrar também no you tube.
Marcadores:
Drogas,
narcotráfico,
PT,
Violência
O potencial de crescimento da candidatura de Dilma Roussef
Na Folha de São Paulo de hoje, em uma análise objetiva, diretores do Datafolha apontam o potencial de crescimento da candidatura da Ministra Dilma Roussef.
ANÁLISE
"Votos" de Lula podem igualar Dilma a Serra
MAURO PAULINO
DIRETOR-GERAL DO DATAFOLHA
ALESSANDRO JANONI
DIRETOR DE PESQUISAS DO DATAFOLHA
A capacidade de transferência de votos que o presidente Lula demonstra ter elevando sua candidata Dilma Roussef (PT) ao atual patamar de 23% não se esgotou. Uma análise mais detalhada da última pesquisa Datafolha mostra que há 15% de brasileiros que manifestam o desejo de votar no candidato apoiado pelo presidente, mas não sabem ainda que Dilma é sua escolhida, deixando de optar por ela.
(...)
Para chegar a essa conclusão o Datafolha combinou os resultados de três perguntas: intenção de voto estimulada, grau de influência de Lula como cabo eleitoral e o conhecimento de Dilma como candidata do presidente.
Somando-se os que não escolhem Dilma, mas outro candidato (58%), os que optam por votar em branco ou anular (9%) e os que não sabem em quem votar (10%) chega-se a 77% da população adulta que não declara, neste momento, apoio à petista. Dentre estes, 21% afirmam que votariam com certeza em um candidato apoiado por Lula. Estes dividem-se em 6% que identificam Dilma como candidata de Lula e 15% que não sabem quem Lula apoia.
Há, portanto, 15% da população que, neste momento, não declara intenção de votar em Dilma, não sabe que ela é a candidata de Lula, mas afirma que votaria com certeza em um candidato apoiado pelo presidente.
(...)
A característica mais marcante desse estrato é a baixa escolaridade. Enquanto na média da população brasileira adulta, 48% têm grau de escolaridade fundamental, nesse segmento, essa taxa vai a 68%.
O mesmo ocorre com a renda. Na média, 43% dos brasileiros têm renda familiar de até dois salários mínimos. No segmento dos potenciais eleitores de Dilma, esse percentual vai a 59%. Além disso, 36% vivem no Nordeste e 20% no Norte ou Centro-Oeste, índices que superam a média em oito e cinco pontos percentuais, respectivamente.
ASSINANTE UOL LÊ A MATÉRIA COMPLETA AQUI.
ANÁLISE
"Votos" de Lula podem igualar Dilma a Serra
MAURO PAULINO
DIRETOR-GERAL DO DATAFOLHA
ALESSANDRO JANONI
DIRETOR DE PESQUISAS DO DATAFOLHA
A capacidade de transferência de votos que o presidente Lula demonstra ter elevando sua candidata Dilma Roussef (PT) ao atual patamar de 23% não se esgotou. Uma análise mais detalhada da última pesquisa Datafolha mostra que há 15% de brasileiros que manifestam o desejo de votar no candidato apoiado pelo presidente, mas não sabem ainda que Dilma é sua escolhida, deixando de optar por ela.
(...)
Para chegar a essa conclusão o Datafolha combinou os resultados de três perguntas: intenção de voto estimulada, grau de influência de Lula como cabo eleitoral e o conhecimento de Dilma como candidata do presidente.
Somando-se os que não escolhem Dilma, mas outro candidato (58%), os que optam por votar em branco ou anular (9%) e os que não sabem em quem votar (10%) chega-se a 77% da população adulta que não declara, neste momento, apoio à petista. Dentre estes, 21% afirmam que votariam com certeza em um candidato apoiado por Lula. Estes dividem-se em 6% que identificam Dilma como candidata de Lula e 15% que não sabem quem Lula apoia.
Há, portanto, 15% da população que, neste momento, não declara intenção de votar em Dilma, não sabe que ela é a candidata de Lula, mas afirma que votaria com certeza em um candidato apoiado pelo presidente.
(...)
A característica mais marcante desse estrato é a baixa escolaridade. Enquanto na média da população brasileira adulta, 48% têm grau de escolaridade fundamental, nesse segmento, essa taxa vai a 68%.
O mesmo ocorre com a renda. Na média, 43% dos brasileiros têm renda familiar de até dois salários mínimos. No segmento dos potenciais eleitores de Dilma, esse percentual vai a 59%. Além disso, 36% vivem no Nordeste e 20% no Norte ou Centro-Oeste, índices que superam a média em oito e cinco pontos percentuais, respectivamente.
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terça-feira, 22 de dezembro de 2009
Um historiador da literatura...
A brisa que agora bate, após o calor do dia, torna a tarde agradável. E aqui, na periferia da urbe, só os sons da tarde. Nada de carro, sirenes e pessoas fazendo compras.
Bueno, aí vem uma preguiça danada. Preguiça, certo!,mas também vontade de te convidar para um passeio pela história da literatura. Então, pensei no historiador Antoine Campagnon. Acho que a Editora da UFMG publicou algumas obras dele. Ele coloca bons argumentos para você defender, dentre outras coisas, a existência do livro. Procure-o na grande rede, e encontre um pensamento crítico e vibrante sobre a literatura
.
Como pensar (e o que) além do “programa crítico”?
A questão acima entusiasma um amplo leque de pesquisadores das ciências humanas francesas da atualidade. Situados em campos disciplinares diversos, esses profissionais (eu estou fugindo, de propósito, da palavra “intelectual” neste post) têm buscado ir além da “filosofia da suspeita”, a marca registrada do “programa crítico”, que, como um furacão, arrebatou corações e mentes nas humanidades nas décadas de 60 e 70. Não, eles não rejeitam simplesmente os “achados” e “conquistas” dos “mestres” do pós-1968; eles procuram ir além.
Como “ir além”?, já escuto as vozes herdeiras do “pensamento 1968” bradando. É isso mesmo: ir além... A lógica subjacente ao que estou denominando “programa crítico” traduz-se, dentre outros, nos seguintes traços: denúncia, desconstrução e “crítica ideológica”. Para os “mestres” e seus seguidores (nem sempre tão criativos quanto os primeiros) o fundamental era descobrir/desvelar o que estava por trás, o que ocultava a essência das relações (de dominação, quase sempre...).
O exposto acima, em tradução claudicante, é parte da introdução de um artigo que considero de leitura obrigatória para todos quantos estejam cansados com os lugares-comuns animados por leituras de “mestres da suspeita”. O título do artigo é “Droit et cosmopolitique. Notes sur la contribution de Bruno Latour à la pensée du droit”. Como estou em casa, e aqui a internet é uma droga, não vou colocar o link do texto, que é de autoria de Laurent De Sutter e Serge Gutwirth, mas você, que navega tranqüilo no mundo virtual, vai digitar o título no Google e encontrar fácil, fácil. Não conseguindo, manda um e-mail para mim (edmilsonlj23@yahoo.com) que eu te envio o artigo.
Como “ir além”?, já escuto as vozes herdeiras do “pensamento 1968” bradando. É isso mesmo: ir além... A lógica subjacente ao que estou denominando “programa crítico” traduz-se, dentre outros, nos seguintes traços: denúncia, desconstrução e “crítica ideológica”. Para os “mestres” e seus seguidores (nem sempre tão criativos quanto os primeiros) o fundamental era descobrir/desvelar o que estava por trás, o que ocultava a essência das relações (de dominação, quase sempre...).
O exposto acima, em tradução claudicante, é parte da introdução de um artigo que considero de leitura obrigatória para todos quantos estejam cansados com os lugares-comuns animados por leituras de “mestres da suspeita”. O título do artigo é “Droit et cosmopolitique. Notes sur la contribution de Bruno Latour à la pensée du droit”. Como estou em casa, e aqui a internet é uma droga, não vou colocar o link do texto, que é de autoria de Laurent De Sutter e Serge Gutwirth, mas você, que navega tranqüilo no mundo virtual, vai digitar o título no Google e encontrar fácil, fácil. Não conseguindo, manda um e-mail para mim (edmilsonlj23@yahoo.com) que eu te envio o artigo.
Mineiro, o deputado
Fernando Mineiro (PT) foi um dos deputados mais votados para ser o Parlamentar do Ano pelos jornalistas que cobrem a Assembléia Legislativa do RN. Isso não é pouco. Mineiro não tem caneta que assine regalias e privégios. E nem está na direção da casa. É da base de apoio à governadora Vilma de Faria, mas é crítico e não deixa barato nada que atente contra os valores que defende. Em outras palavras, como dizem no interior, é árvore de pouca sombra...
E, mais importante, a lembrança do nome do deputado ocorreu antes do espetáculo deprimente de votação do orçamento (situação na qual, como já comentei aqui, os nobres parlamentares aprovaram emendas ao orçamento sem saber do que elas tratavam...). E, você sabe, Mineiro enfrentou, quase solitário, a armação feita pelos "colegas" e foi a reserva moral da casa.
Por isso mesmo, o reconhecimento que o deputado petista recebe agora não é fruto de uma impressão passageira. Longe disso! Mineiro, ao longo de sua atuação como parlamentar (lembre-se que ele foi vereador de Natal por algumas legislaturas) sempre buscou intervir propositivamente no debate público. Assim, os seus mandatos são sempre pautados em propostas e intervenções tecnicamente fundamentadas. Para isso, diga-se de passagem, conta com o apoio inestimável de sua Assessoria Parlamentar. Nesta, só entra gente qualificada. Quando você os encontra, descobre uma parte do segredo do sucesso do deputado: seus assessores são profissionais escolhidos sempre por critérios técnicos e não pela proximidade política...
Mas boa assessoria não garante um bom mandato. O parlamentar precisa trabalhar (e saber trabalhar!). E isso Mineiro faz com vontade e gosto. Um exemplo: durante os últimos sete anos tem trilhado as veredas do interior, contatando pessoas e sentido de perto o Brasil que está vindo. E, nessas viagens, trava conversas com lideranças de trabalhadores rurais e de pescadores, mas também com vereadores e prefeitos. Ou seja, faz política cotidianamente.
Por isso, para este blogueiro, em que pese as minhas discordâncias políticas com o deputado, e como não devo satisfações de minhas posições a não ser ao meu travesseiro, afirmo em alto e bom som que Mineiro é o PARLAMENTAR DO ANO.
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Armar uma rede
Não, não se trata de nenhuma rede social. E nem de uma rede pragmaticamente construída. Uma rede de balançar, entendeu? Nada como uma rede! O Câmara Cascudo, que lia e escrevia dentro de uma, é que sabia das coisas.
E é possível armar uma rede em qualquer espaço, não é? Basta ter disposição...
E quando cansar do trabalho (se é que você vai para uma para trabalhar!), convide alguém para a rede. Não, não, nem tudo que cai na rede é peixe. Mas, na rede, em companhia, você fica como peixe de água doce em lagoa...
E é possível armar uma rede em qualquer espaço, não é? Basta ter disposição...
E quando cansar do trabalho (se é que você vai para uma para trabalhar!), convide alguém para a rede. Não, não, nem tudo que cai na rede é peixe. Mas, na rede, em companhia, você fica como peixe de água doce em lagoa...
2010: a esquerda está na frente no Ceará, em Pernambuco e na Bahia
A pesquisa do Datafolha sobre a corrida aos governos dos estados aponta um quadro no qual os palanques locais de Dilma estão bem alicerçados. Vejamos!
No Ceará, Cid Gomes (PSB), apoiado pelo PT, tem 44% das intenções de votos contra 23% do Senador (e ex-governador) Tasso Jereissati (PSDB).
Em Pernambuco, Eduardo Campos (PSB) dá de capote em Jarbas Vasconcelos (PMDB): 57% contra 29%.
Na Bahia, o petista Jacques Wagner tem 39% das intenções contra 23% de seu principal oponente, o ex-governador Paulo Souto.
E, por fim, no DF, com as trapalhadas do Arruda (DEM), o Roriz (PMDB) alcança 45% das intenções. Sim, Roriz, aquele que ainda há pouco teve que renunciar ao Senado para não ser cassado... Ele não é de esquerda (longe disso!), mas é da parte do PMDB que deve apoiar a Dilma. Ou seja, é um "neo-companheiro"...
Bueno, listei acima governadores do PSB. O Ciro Gomes (PSB) sendo candidato eles não estarão com ele? Claro! Mas, vem cá, você acha mesmo que o Ciro será candidato?
No Ceará, Cid Gomes (PSB), apoiado pelo PT, tem 44% das intenções de votos contra 23% do Senador (e ex-governador) Tasso Jereissati (PSDB).
Em Pernambuco, Eduardo Campos (PSB) dá de capote em Jarbas Vasconcelos (PMDB): 57% contra 29%.
Na Bahia, o petista Jacques Wagner tem 39% das intenções contra 23% de seu principal oponente, o ex-governador Paulo Souto.
E, por fim, no DF, com as trapalhadas do Arruda (DEM), o Roriz (PMDB) alcança 45% das intenções. Sim, Roriz, aquele que ainda há pouco teve que renunciar ao Senado para não ser cassado... Ele não é de esquerda (longe disso!), mas é da parte do PMDB que deve apoiar a Dilma. Ou seja, é um "neo-companheiro"...
Bueno, listei acima governadores do PSB. O Ciro Gomes (PSB) sendo candidato eles não estarão com ele? Claro! Mas, vem cá, você acha mesmo que o Ciro será candidato?
A praga do plágio
Thadeu Brandão, que pilota o sempre bom Blog do Thadeu, enviou-me o comentário abaixo a respeito de postagem sobre plágio na Universidade. Dada a importância do que foi colocado na mensagem, acho que você deveria lê-la.
Caro Edmilson,
A praga do plágio e da preguiça intelectual hà muito frequenta o ambiente acadêmico. Nas IES particulares isso é uma constante, sem punições sérias e discussão do assunto. Compreendo que a internet nos possibilitou exelentes possibilidades, como o acesso à periódicos que antes teriamos um custo enorme para ter acesso. Possibilitou também o acesso a uma vasta gama de saber que se abre a cada dia. Mas, ao mesmo tempo, facilitou o jeitinho, a esperteza e a fraude intelectual.
O que fazer?
O mais significativo, para o professor de uma IES é estar presente no processo de elaboração do saber e da pesquisa. Ou seja, ser sempre uma constante com seus orientandos. Claro, isso não significa ficar no pé do sujeito. Mas um mímino de controle será cada vez mais necessário.
Concordo que confiança é a chave. Mas num momento histórico onde a confiança diminui, apelemos para as instituições.
Num mundo social da facilidade, para quê ler dezenas de textos, fichá-los e depois extrair deles reflexões? Para aprender uai! Mas, não é o que pretendem muitos, que instrumentalizam os títulos e as posições acadêmicas. O saber pelo prazer (orgiástico) do saber parece estar desaparecendo (será que estou sendo um anti-Bourdieu aqui?).
No mais, segue meu repúdio.
Um abraço,Thadeu Brandão.
Caro Edmilson,
A praga do plágio e da preguiça intelectual hà muito frequenta o ambiente acadêmico. Nas IES particulares isso é uma constante, sem punições sérias e discussão do assunto. Compreendo que a internet nos possibilitou exelentes possibilidades, como o acesso à periódicos que antes teriamos um custo enorme para ter acesso. Possibilitou também o acesso a uma vasta gama de saber que se abre a cada dia. Mas, ao mesmo tempo, facilitou o jeitinho, a esperteza e a fraude intelectual.
O que fazer?
O mais significativo, para o professor de uma IES é estar presente no processo de elaboração do saber e da pesquisa. Ou seja, ser sempre uma constante com seus orientandos. Claro, isso não significa ficar no pé do sujeito. Mas um mímino de controle será cada vez mais necessário.
Concordo que confiança é a chave. Mas num momento histórico onde a confiança diminui, apelemos para as instituições.
Num mundo social da facilidade, para quê ler dezenas de textos, fichá-los e depois extrair deles reflexões? Para aprender uai! Mas, não é o que pretendem muitos, que instrumentalizam os títulos e as posições acadêmicas. O saber pelo prazer (orgiástico) do saber parece estar desaparecendo (será que estou sendo um anti-Bourdieu aqui?).
No mais, segue meu repúdio.
Um abraço,Thadeu Brandão.
A cidade infernal
Acabei de chegar ao Campus da UFRN. Demorei nada menos que 1 hora e 20 minutos para chegar aqui. E fazendo malabarismos mil. Geralmente, em média, demoro vinte minutos. Natal está infernal. Até o final do ano, o melhor a fazer por aqui é ficar em casa mesmo.
segunda-feira, 21 de dezembro de 2009
Um blog para quem gosta de antropologia
Visite o bronislaw, um blog feito por quem faz (e gosta de) antropologia. Clique aqui para acessá-lo.
O potencial de Dilma
Tem muita gente analisando cuidadosamente os dados da última pesquisa feita pelo DATAFOLHA sobre as intenções de voto para as eleições presidenciais de 2010. Análises as mais disparatadas têm vindo a público. Tem gente fazendo contorcionismo lógico para tentar provar que Serra não está perdendo nada. Entretanto, por mais que isso contrarie a mídia nativa, o que a pesquisa indica é que, para a ministra Dilma Roussef, candidata do PT e do presidente Lula, uma larga avenida está se abrindo. Por que? Ora, confira, abaixo, a análise dos dados feita por César Maia, do DEM, e entenda o porquê. E César Maia é a última pessoa no mundo a torcer pela Dilma...
"Entre as pessoas de maior renda, Serra tem 38% e Dilma surpreendentes 30%. Entre os de menor renda, provavelmente os que menos acompanham este processo pré-eleitoral, Serra tem 35% e Dilma apenas 23%, número que tende a crescer com o envolvimento de Lula, pois aqui é onde sua aprovação é maior."
"Entre as pessoas de maior renda, Serra tem 38% e Dilma surpreendentes 30%. Entre os de menor renda, provavelmente os que menos acompanham este processo pré-eleitoral, Serra tem 35% e Dilma apenas 23%, número que tende a crescer com o envolvimento de Lula, pois aqui é onde sua aprovação é maior."
Evangélicos traficantes?
Ficastes espantado? Pois não se trata de ficção, o casamento entre neopentencostais e traficantes é o mais novo dado de determinadas partes do Rio de Janeiro. Confira aqui artigo publicado na Revista Plural, da USP, tratando do assunto.
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A pesquisa Datafolha e as miragens analíticas da Nova Direita
De vez em quando, visito o blog do Reinaldo Azevedo, no site da Veja. Mas, apresso-me em declarar, somente de vez em quando mesmo Gosto do meu fígado... O jornalista é o representante mais atilado da Nova Direita e o seu estilo já foi analisado, e copiado, por muitos. A agressividade conservadora contra tentativas, mesmo que mínimas, de substantivar a nossa frágil vida democrática é marca dele e dos seus imitadores. Diverte-me um pouco. O problema é que tem gente que o leva sério...
Bueno, faço esse comentário, pois, neste final de semana, o DataFolha divulgou pesquisa de intenções de votos para presidente na qual Dilma sobe para 23% e Serra cai para 37%. Com uma capacidade invejável de reverter o que aponta a realidade, o Reinaldo Azevedo quer, e porque quer, quer que todo mundo compre a idéia de que é o seu preferido, ou seja Serra, quem se sai melhor na pesquisa. Com os adversários agredindo a lógica, resta aos petistas comemorarem.
Mas, epa!, nem tudo é devaneio nas searas da Nova Direita. O César Maia, ex-prefeito do Rio e uma das lideranças do DEM, para surpresa geral, tem sido uma das vozes mais equilibradas na análise do quadro eleitoral de 2010. Por isso mesmo, pode apostar!, vale a pena ler a análise que ele fez da mesma pesquisa. A direção é bem diferente daquela tomada pelo Reinaldo Azevedo. Confira abaixo.
PESQUISA DATAFOLHA APONTA PARA POLARIZAÇÃO!
1. Sempre que os nomes apresentados em pesquisa são de amplo conhecimento público, os números relativos à intenção de voto "se as eleições fossem hoje", se aproximam da verdade de hoje. Especialmente numa pesquisa com mais de 11 mil eleitores, como essa realizada entre 14 e 18 de dezembro. Na pesquisa DataFolha de 25-27/03/2008, portanto mais de 20 meses atrás, Dilma tinha apenas 3%. Vem crescendo progressivamente, em função da divulgação de seu nome e o apoio de Lula: 3%, 8%, 11%, 16%, 16%, e 23%. Serra flutua no mesmo patamar: 38%, 41%, 41%, 38%, 37%, e 37%.
2. A diferença Serra-Dilma caiu de 18% e 19% nas duas pesquisas anteriores, para 14%. Para ela o dado mais importante que sua esperada ascensão com o apoio de Lula, é que a diferença num suposto primeiro turno e num segundo turno não muda. Com isso, isolando os dois no primeiro turno, Dilma tem 38% e no segundo 42%, com crescimento relativo maior que o de Serra, e absoluto igual, para uma taxa de conhecimento menor.
3. Entre as pessoas de maior renda, Serra tem 38% e Dilma surpreendentes 30%. Entre os de menor renda, provavelmente os que menos acompanham este processo pré-eleitoral, Serra tem 35% e Dilma apenas 23%, número que tende a crescer com o envolvimento de Lula, pois aqui é onde sua aprovação é maior.
4. Os números mostram que a tática do PSDB de ganhar tempo até março abriu espaço para o crescimento de Dilma, exatamente entre os eleitores potenciais de Serra. A entrevista do presidente do Banco Central, com destaque de capa no Globo de domingo, aponta nessa direção: assustar a classe média com hipotéticas mudanças.
5. Finalmente, imaginando que os 23% de Dilma entre os de menor renda suba para 30%, a diferença global cairia de 14 pontos para a metade. É um cenário provável. Claro, nas mesmas condições de hoje.
Bueno, faço esse comentário, pois, neste final de semana, o DataFolha divulgou pesquisa de intenções de votos para presidente na qual Dilma sobe para 23% e Serra cai para 37%. Com uma capacidade invejável de reverter o que aponta a realidade, o Reinaldo Azevedo quer, e porque quer, quer que todo mundo compre a idéia de que é o seu preferido, ou seja Serra, quem se sai melhor na pesquisa. Com os adversários agredindo a lógica, resta aos petistas comemorarem.
Mas, epa!, nem tudo é devaneio nas searas da Nova Direita. O César Maia, ex-prefeito do Rio e uma das lideranças do DEM, para surpresa geral, tem sido uma das vozes mais equilibradas na análise do quadro eleitoral de 2010. Por isso mesmo, pode apostar!, vale a pena ler a análise que ele fez da mesma pesquisa. A direção é bem diferente daquela tomada pelo Reinaldo Azevedo. Confira abaixo.
PESQUISA DATAFOLHA APONTA PARA POLARIZAÇÃO!
1. Sempre que os nomes apresentados em pesquisa são de amplo conhecimento público, os números relativos à intenção de voto "se as eleições fossem hoje", se aproximam da verdade de hoje. Especialmente numa pesquisa com mais de 11 mil eleitores, como essa realizada entre 14 e 18 de dezembro. Na pesquisa DataFolha de 25-27/03/2008, portanto mais de 20 meses atrás, Dilma tinha apenas 3%. Vem crescendo progressivamente, em função da divulgação de seu nome e o apoio de Lula: 3%, 8%, 11%, 16%, 16%, e 23%. Serra flutua no mesmo patamar: 38%, 41%, 41%, 38%, 37%, e 37%.
2. A diferença Serra-Dilma caiu de 18% e 19% nas duas pesquisas anteriores, para 14%. Para ela o dado mais importante que sua esperada ascensão com o apoio de Lula, é que a diferença num suposto primeiro turno e num segundo turno não muda. Com isso, isolando os dois no primeiro turno, Dilma tem 38% e no segundo 42%, com crescimento relativo maior que o de Serra, e absoluto igual, para uma taxa de conhecimento menor.
3. Entre as pessoas de maior renda, Serra tem 38% e Dilma surpreendentes 30%. Entre os de menor renda, provavelmente os que menos acompanham este processo pré-eleitoral, Serra tem 35% e Dilma apenas 23%, número que tende a crescer com o envolvimento de Lula, pois aqui é onde sua aprovação é maior.
4. Os números mostram que a tática do PSDB de ganhar tempo até março abriu espaço para o crescimento de Dilma, exatamente entre os eleitores potenciais de Serra. A entrevista do presidente do Banco Central, com destaque de capa no Globo de domingo, aponta nessa direção: assustar a classe média com hipotéticas mudanças.
5. Finalmente, imaginando que os 23% de Dilma entre os de menor renda suba para 30%, a diferença global cairia de 14 pontos para a metade. É um cenário provável. Claro, nas mesmas condições de hoje.
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Netinho de Paulo, do PCdo B, tem chances de ser senador por São Paulo
Netinho de Paula, cantor e apresentador de TV, aparece em recente pesquisa de intenções de votos para o Senado em São Paulo com nada menos que 22% de indicações. Filiado ao PCdoB, Netinho poderá ser mais um negro na mais alta casa legislativa do país. Não deixa de ser uma boa notícia para essa segunda-feira, que começou triste com a partida de Anchieta.
Morre Anchieta, ex-professor de Ciências Sociais da UFRN
Acabei de chegar ao Departamento de Ciências Sociais e fui confrontado com a notícia: o nosso colega Anchieta, que estava aposentado, faleceu de ontem prá hoje (ainda não sei bem se ontem ou hoje de madrugada...).
Anchieta, além de professor, foi, durante anos, um ativo militante do PCdoB. Designado pelo partido, chegou a ocupar cargos importantes. Depois, após uma crise pessoal, deixou a militância partidária, mas continuou ativo no movimento docente.
Não convivemos muito como colegas, Anchieta e eu. Logo que eu cheguei aqui, em 2002, ele sofreu um avc e foi precocemente aposentado. Tínhamos muitos contatos, entretanto.
Durante um tempo, quando nos encontravámos, ele me contava de seus planos de fazer uma pós-graduação. Eu, mesmo não apostando muito nisso, sustentava a conversa. Aí, vibrante, ele entrava nos detalhes e me informava: "você vai ser meu orientador!" E eu brincava: "o que diabos um marxista quer de orientação de um cara como eu, rapaz?".
Aconselhava-o a cursar disciplinas, mas ele nunca as fez. Os dois sabíamos que isso não iria acontecer, que ele não iria mesmo fazer doutorado, mas sempre falavamos disso. Era a nossa ponte... Algo que dava solidez aos nossos encontros e alimentava os nossos mais que humanos desejos de encontro e reconhecimento.
Geralmente, após esse papo de entrada, caso ele estivesse tranqüilo, tocávamos em outros assuntos. E a pauta era sempre a mesma: política.
Hoje, soube da sua morte. Infarto, disse-me Conceição, a secretária do Departamento. Começar o dia assim é, como já me disse alguém, carregar o peso do mundo logo de manhã.
Anchieta será mais uma ausência a pesar na minha vida nos tempos que virão. Esse é o ônus de envelhecer: ir perdendo pessoas...
Anchieta, além de professor, foi, durante anos, um ativo militante do PCdoB. Designado pelo partido, chegou a ocupar cargos importantes. Depois, após uma crise pessoal, deixou a militância partidária, mas continuou ativo no movimento docente.
Não convivemos muito como colegas, Anchieta e eu. Logo que eu cheguei aqui, em 2002, ele sofreu um avc e foi precocemente aposentado. Tínhamos muitos contatos, entretanto.
Durante um tempo, quando nos encontravámos, ele me contava de seus planos de fazer uma pós-graduação. Eu, mesmo não apostando muito nisso, sustentava a conversa. Aí, vibrante, ele entrava nos detalhes e me informava: "você vai ser meu orientador!" E eu brincava: "o que diabos um marxista quer de orientação de um cara como eu, rapaz?".
Aconselhava-o a cursar disciplinas, mas ele nunca as fez. Os dois sabíamos que isso não iria acontecer, que ele não iria mesmo fazer doutorado, mas sempre falavamos disso. Era a nossa ponte... Algo que dava solidez aos nossos encontros e alimentava os nossos mais que humanos desejos de encontro e reconhecimento.
Geralmente, após esse papo de entrada, caso ele estivesse tranqüilo, tocávamos em outros assuntos. E a pauta era sempre a mesma: política.
Hoje, soube da sua morte. Infarto, disse-me Conceição, a secretária do Departamento. Começar o dia assim é, como já me disse alguém, carregar o peso do mundo logo de manhã.
Anchieta será mais uma ausência a pesar na minha vida nos tempos que virão. Esse é o ônus de envelhecer: ir perdendo pessoas...
sexta-feira, 18 de dezembro de 2009
O que significou o Governo Vilma para o RN: uma avaliação a ser construída
O Governo Vilma de Faria vai chegando ao fim. Está no seu último ano. A governadora deverá sair mais cedo, em maio, para tentar uma cadeira de parlamentar. Alguns dizem que de senadora. Acho díficil. Como é quase provável que os senadores Garibaldi Filho e José Agripino confirmem às suas postulações, Vilma de Faria, que tem um feeling político invejável, não irá se aventurar a ser derrotada e ficar na planície por longos quatro anos. Arriscando-se ao impoderável, como, por exemplo, enfrentar ações do Ministério Público sem um foro privilegiado para se defender... Por isso, muito provavelmente, a governadora, apesar de todas as negativas, deverá mesmo concorrer a uma das oito vagas para a Câmara dos Deputados.
Mas as especulações sobre o futuro político da governadora não me interessam muito. O que merece atenção e importa ser tomado como objeto de reflexão é a possibilidade de uma governadora, reeleita, ficar de fora da disputa por uma das vagas para o Senado por temer uma derrota. O fato é emblemático e não pode ser desprezado em uma avaliação global do que foi o Governo Vilma de Faria.
Obviamente, essa apreensão não significa que o fato de a governadora não ter chances em uma disputa para o Senado traduza, imediatamente, uma avaliação negativa do seu governo. Há que se levar em conta também o fato de que os seus dois adversários, Garibaldi (PMDB) e Agripino (DEM), também já ocuparam, por oito anos, o governo do RN. E, por caminhos diversos, ocuparam espaços vistosos na política nacional. Agripino é a voz da oposição, tendo sido um dos mais atuantes parlamentares da fragilizada oposição ao Governo Lula. Garibaldi, como teria dito o "Comandante" Zé Dirceu, é um "gaiato" que chegou lá. Por "lá", você sabe, estou me referindo à Presidência do Senado.
A derrota antecipada na disputa pelo Senado é, entretanto, um dado importante, mas "diz pouco" em si mesmo.
Para uma avaliação mais objetiva e menos passional do PSB no RN talvez devessêmos tomar como referência não o acúmulo eleitoral, algo contingente e informado por aspectos como o carisma e a capacidade (e possibilidade) que um ator político tem de movimentar as peças no tabuleiro, mas, sim, dados mensuráveis. Refiro-me a indicadores concretos, como o Índice de Desenvolvimento Humano. Aí poderíamos fazer uma avaliação da evolução temporal da posição do RN no ranking do desenvolvimento humano durante os oito anos da gestão da governadora. Qual o lugar que o RN ocupava, dentre os estados do país, em 2002? Qual é essa posição agora?
Os indicadores educacionais, produzidos pelo INEP, também poderiam referenciar uma avaliação geral do Governo. Como estava o ensino médio do RN em 2002? Qual a sua situação no final de 2009? Os dados que subsidiarão a análise, para evitar a contaminação do debate político restairo, devem ser aqueles oriundos do Ministério da Educação.
Avaliações alicerçadas nos elementos acima mencionados poderiam "desfulanizar" o debate político local.
Mas as especulações sobre o futuro político da governadora não me interessam muito. O que merece atenção e importa ser tomado como objeto de reflexão é a possibilidade de uma governadora, reeleita, ficar de fora da disputa por uma das vagas para o Senado por temer uma derrota. O fato é emblemático e não pode ser desprezado em uma avaliação global do que foi o Governo Vilma de Faria.
Obviamente, essa apreensão não significa que o fato de a governadora não ter chances em uma disputa para o Senado traduza, imediatamente, uma avaliação negativa do seu governo. Há que se levar em conta também o fato de que os seus dois adversários, Garibaldi (PMDB) e Agripino (DEM), também já ocuparam, por oito anos, o governo do RN. E, por caminhos diversos, ocuparam espaços vistosos na política nacional. Agripino é a voz da oposição, tendo sido um dos mais atuantes parlamentares da fragilizada oposição ao Governo Lula. Garibaldi, como teria dito o "Comandante" Zé Dirceu, é um "gaiato" que chegou lá. Por "lá", você sabe, estou me referindo à Presidência do Senado.
A derrota antecipada na disputa pelo Senado é, entretanto, um dado importante, mas "diz pouco" em si mesmo.
Para uma avaliação mais objetiva e menos passional do PSB no RN talvez devessêmos tomar como referência não o acúmulo eleitoral, algo contingente e informado por aspectos como o carisma e a capacidade (e possibilidade) que um ator político tem de movimentar as peças no tabuleiro, mas, sim, dados mensuráveis. Refiro-me a indicadores concretos, como o Índice de Desenvolvimento Humano. Aí poderíamos fazer uma avaliação da evolução temporal da posição do RN no ranking do desenvolvimento humano durante os oito anos da gestão da governadora. Qual o lugar que o RN ocupava, dentre os estados do país, em 2002? Qual é essa posição agora?
Os indicadores educacionais, produzidos pelo INEP, também poderiam referenciar uma avaliação geral do Governo. Como estava o ensino médio do RN em 2002? Qual a sua situação no final de 2009? Os dados que subsidiarão a análise, para evitar a contaminação do debate político restairo, devem ser aqueles oriundos do Ministério da Educação.
Avaliações alicerçadas nos elementos acima mencionados poderiam "desfulanizar" o debate político local.
quinta-feira, 17 de dezembro de 2009
A farra na Assembléia Legislativa do Rio Grande do Norte
No começo desta semana os políticos do RN protagonizaram um espetáculo vergonhoso. Refiro-me à votação do orçamento estadual para 2010 na Assembléia Legislativa. A oposição, apoiada por parlamentares da base de apoio à Governadora Vilma, impôs restrições até bem-vindas aos gastos do executivo (embora, saibam até os tijolos da Praça André de Albuquerque que essas proposições têm objetivos menos nobres do que a limitação da gastança governamental...), mas, no meio das alterações ao projeto de orçamento enviado pela governadora, empurraram 300 emendas. Estas não foram lidas e nem discutidas, mas, pasmem todos!, foram incorporadas pelo deputado relator ao documento final submetido à votação .
A palavra que me vem à cabeça é uma só: deboche. Os nobres deputados aprovaram emendas ao Orçamento que sequer conheciam o conteúdo...
Uma farra só...
O espetáculo só não foi mais deprimente devido às intervenções do Deputado Fernando Mineiro (PT) . O parlamentar petista questionou duramente a direção da casa e a maioria dos deputados sobre o que estavam votando. E, com a veemência e percepção aguda da disputa política que o marcam, apontou como a Assembléia Legislativa estava contribuindo para rebaixar a vida parlamentar e a política no Rio Grande do Norte. Tal como João Batista, pregou no deserto...
A palavra que me vem à cabeça é uma só: deboche. Os nobres deputados aprovaram emendas ao Orçamento que sequer conheciam o conteúdo...
Uma farra só...
O espetáculo só não foi mais deprimente devido às intervenções do Deputado Fernando Mineiro (PT) . O parlamentar petista questionou duramente a direção da casa e a maioria dos deputados sobre o que estavam votando. E, com a veemência e percepção aguda da disputa política que o marcam, apontou como a Assembléia Legislativa estava contribuindo para rebaixar a vida parlamentar e a política no Rio Grande do Norte. Tal como João Batista, pregou no deserto...
quarta-feira, 16 de dezembro de 2009
O fantasma de Victor Jara assombrará a direita chilena?
Vistes os sites e blogs da Nova Direita? Estão em estado de graça com o resultado do primeiro turno das eleições presidenciais no Chile. O candidato da direita, o empresrário Sebastian Piñera, colocou um milhão de votos de dianteira em relação ao segundo colocado, o ex-presidente Frei, da Concertacion, agrupamento de centro-esquerda que governa o país desde o fim da ditadura de Pinochet.
O candidato da centro-esquerda é assim meio Alckimim, um picolé de chuchu. Isto é, um sujeito sem sal. E, em que pese a enorme popularidade da Presidenta Bachelet, o ex-presidente, que tem o seu apoio, é um candidato que não empolga o eleitorado chileno. Daí a possibilidade de que a direita, agora pelas eleições, volte a governar o Chile.
Mas, dizem-me alguns conhecidos, tudo pode mudar no segundo turno. Será? Bueno, sei que há um fato novo: o esclarecimento sobre as condições nas quais o cantor Victor Jara foi assassinado pelos militares quando do golpe de 1973. Um corajoso juiz decidiu, em meados do ano, exumar o cadáver do cantor. Agora, sabemos todos, ele foi assassinado covardemente com mais de 30 tiros.
Sabes quem é Victor Jara, suponho. Não? Clique aqui e confira. E, para ouvi-lo cantar, bastar assistir ao clipe abaixo. Poderia ter colocado um clipe de La Negra, Mercedes Sosa, mas optei pelo próprio Jara.
Em tempo: doze mil chilenos, no último dia 04 de dezembro, compareceram ao funeral póstumo do cantor e militante político.
O candidato da centro-esquerda é assim meio Alckimim, um picolé de chuchu. Isto é, um sujeito sem sal. E, em que pese a enorme popularidade da Presidenta Bachelet, o ex-presidente, que tem o seu apoio, é um candidato que não empolga o eleitorado chileno. Daí a possibilidade de que a direita, agora pelas eleições, volte a governar o Chile.
Mas, dizem-me alguns conhecidos, tudo pode mudar no segundo turno. Será? Bueno, sei que há um fato novo: o esclarecimento sobre as condições nas quais o cantor Victor Jara foi assassinado pelos militares quando do golpe de 1973. Um corajoso juiz decidiu, em meados do ano, exumar o cadáver do cantor. Agora, sabemos todos, ele foi assassinado covardemente com mais de 30 tiros.
Sabes quem é Victor Jara, suponho. Não? Clique aqui e confira. E, para ouvi-lo cantar, bastar assistir ao clipe abaixo. Poderia ter colocado um clipe de La Negra, Mercedes Sosa, mas optei pelo próprio Jara.
Em tempo: doze mil chilenos, no último dia 04 de dezembro, compareceram ao funeral póstumo do cantor e militante político.
Você precisa conhecer a música de Yofiyah
Você já imaginou o que pode resultar da união entre as músicas indiana e judaica? Não? Então confira o trabalho de Yofiyah.
Mais Rarindra Prakarsa para você
Nossa riqueza está no ar...
O Professor Hannah Safieh, uma analista apaixonada das possibilidades de desenvolvimento nos trópicos, provoca os seus interlocutores norte-riograndenses questionando-lhes sobre o que vêem como possibilidades de desenvolvimento e riqueza no RN. Não raro, depara-se com generalidades. Nessas situações, com paciência, mas sem abandonar a paixão, enumera os pontos que jusitificariam falar desta pequena província situada na esquina do Atlântico Sul como um Eldorado. Há dez anos, em uma longa conversa que tivemos, ele já mencionava as possibilidades de riqueza geradas pela energia eólica.
Não sei se o Professor Hannah tem acompanhado o debate sobre a regulamentação do setor (e vou procurar saber como ele está analisando o quadro), mas acho que, todos nós, deveríamos nos preocupar um pouco mais com a questão. Pensando nisso, reproduzo aí abaixo artigo de autoria do economista Celso Ming tratando do assunto (bem claro: energia eólica, não RN). Confira!
Riqueza do vento
Celso Ming
O Estado de São Paulo
A energia elétrica produzida pelos ventos (energia eólica) não usa combustíveis (como carvão, gás e outros derivados de petróleo queimados nas termoelétricas). Dispensa despesas com bloqueio de áreas e construção de reservatórios, como nas hidrelétricas. E não precisa de enormes linhas de transmissão porque pode ser instalada em áreas próximas dos centros de consumo. Mas, se é assim, por que é tão cara?
Por praticamente todos os parâmetros pelos quais se analisa, o leilão de venda de energia eólica, o primeiro no Brasil, foi um sucesso. Assegurou o preço médio do megawatt/hora (MWh) de R$ 148, ou 21% mais baixo do que o preço-teto fixado pelo governo. Esse valor já é equivalente ao custo de produção de energia térmica a partir do carvão nacional ou da biomassa. Dá até para se desconfiar de que poderá acontecer com os fornecedores de energia eólica o que já houve com alguns produtores de biodiesel: não serão capazes de entregar o produto aos preços contratados.
Mas, afinal, por que a energia produzida pelo vento é tão cara?
Em primeiro lugar, porque não é possível gerar energia correspondente a 100% da capacidade instalada. Ventos fracos ou inexistentes derrubam a produção assegurada à média de 40%. E isso significa que o custo do capital tem de ser diluído por menos produção. É por isso que a energia eólica desempenha papel complementar na oferta total: é tratada como de reserva; fica disponível para ser acionada quando for preciso.
No Brasil, o setor esbarra com outros multiplicadores de custo. Um deles é a carga tributária mais alta do que no exterior, que incide sobre a produção e venda do equipamento que forma o conjunto de turbinas e pás específicas, os enormes cata-ventos que aparecem nas fotos das fazendas eólicas. No momento, o setor está contemplado por uma redução temporária de impostos.
O outro são as cláusulas de conteúdo nacional do equipamento (obrigatoriedade de produção no País), que bloqueiam a importação de um produto mais barato. O especialista Adriano Pires calcula que a derrubada dessa exigência contribuiria com a redução em cerca de 20% dos custos. Por outro lado, a baixa escala de produção desse equipamento no Brasil é, por si só, fator de elevação de custos, que poderiam cair com um programa de apoio do setor. Enfim, o círculo vicioso “é caro porque não tem demanda e não tem demanda porque é caro” poderia ser quebrado por um empurrão análogo ao que, nos anos 70, foi dado ao Proálcool.
E também não dá para ignorar o impacto ambiental. As fazendas eólicas vêm sendo apontadas como elemento poluidor de paisagem ou como geradoras de ruídos, especialmente para eventuais moradores das regiões próximas às turbinas. Outro problema é a mortandade de morcegos e também de pássaros quando as hélices das turbinas são instaladas nas rotas migratórias. Esta é a razão pela qual os especialistas vêm recomendando que essas fazendas sejam transferidas para áreas no alto-mar, o que não deixa de ser novo fator de aumento de custos.
Em todo o caso, a energia eólica está listada entre as que mais preservam as condições ambientais e, no momento, essa característica pode ajudar a aumentar o interesse pelo setor.
Confira
É novidade que o ministro da Fazenda, Guido Mantega, esteja defendendo um certo déficit nas contas correntes do Brasil (contas externas fora o fluxo de capitais). Normalmente esse rombo é visto como risco de moratória e, portanto, de crise.
No entanto, se o déficit se aprofundar, a cobertura para esse rombo não pode ser feita com empréstimos em dólares (aumento da dívida externa), como no passado.
Se for compensado com aumento do investimento estrangeiro direto e com recursos destinados ao reforço de capital da empresa brasileira, não há o que temer.
Não sei se o Professor Hannah tem acompanhado o debate sobre a regulamentação do setor (e vou procurar saber como ele está analisando o quadro), mas acho que, todos nós, deveríamos nos preocupar um pouco mais com a questão. Pensando nisso, reproduzo aí abaixo artigo de autoria do economista Celso Ming tratando do assunto (bem claro: energia eólica, não RN). Confira!
Riqueza do vento
Celso Ming
O Estado de São Paulo
A energia elétrica produzida pelos ventos (energia eólica) não usa combustíveis (como carvão, gás e outros derivados de petróleo queimados nas termoelétricas). Dispensa despesas com bloqueio de áreas e construção de reservatórios, como nas hidrelétricas. E não precisa de enormes linhas de transmissão porque pode ser instalada em áreas próximas dos centros de consumo. Mas, se é assim, por que é tão cara?
Por praticamente todos os parâmetros pelos quais se analisa, o leilão de venda de energia eólica, o primeiro no Brasil, foi um sucesso. Assegurou o preço médio do megawatt/hora (MWh) de R$ 148, ou 21% mais baixo do que o preço-teto fixado pelo governo. Esse valor já é equivalente ao custo de produção de energia térmica a partir do carvão nacional ou da biomassa. Dá até para se desconfiar de que poderá acontecer com os fornecedores de energia eólica o que já houve com alguns produtores de biodiesel: não serão capazes de entregar o produto aos preços contratados.
Mas, afinal, por que a energia produzida pelo vento é tão cara?
Em primeiro lugar, porque não é possível gerar energia correspondente a 100% da capacidade instalada. Ventos fracos ou inexistentes derrubam a produção assegurada à média de 40%. E isso significa que o custo do capital tem de ser diluído por menos produção. É por isso que a energia eólica desempenha papel complementar na oferta total: é tratada como de reserva; fica disponível para ser acionada quando for preciso.
No Brasil, o setor esbarra com outros multiplicadores de custo. Um deles é a carga tributária mais alta do que no exterior, que incide sobre a produção e venda do equipamento que forma o conjunto de turbinas e pás específicas, os enormes cata-ventos que aparecem nas fotos das fazendas eólicas. No momento, o setor está contemplado por uma redução temporária de impostos.
O outro são as cláusulas de conteúdo nacional do equipamento (obrigatoriedade de produção no País), que bloqueiam a importação de um produto mais barato. O especialista Adriano Pires calcula que a derrubada dessa exigência contribuiria com a redução em cerca de 20% dos custos. Por outro lado, a baixa escala de produção desse equipamento no Brasil é, por si só, fator de elevação de custos, que poderiam cair com um programa de apoio do setor. Enfim, o círculo vicioso “é caro porque não tem demanda e não tem demanda porque é caro” poderia ser quebrado por um empurrão análogo ao que, nos anos 70, foi dado ao Proálcool.
E também não dá para ignorar o impacto ambiental. As fazendas eólicas vêm sendo apontadas como elemento poluidor de paisagem ou como geradoras de ruídos, especialmente para eventuais moradores das regiões próximas às turbinas. Outro problema é a mortandade de morcegos e também de pássaros quando as hélices das turbinas são instaladas nas rotas migratórias. Esta é a razão pela qual os especialistas vêm recomendando que essas fazendas sejam transferidas para áreas no alto-mar, o que não deixa de ser novo fator de aumento de custos.
Em todo o caso, a energia eólica está listada entre as que mais preservam as condições ambientais e, no momento, essa característica pode ajudar a aumentar o interesse pelo setor.
Confira
É novidade que o ministro da Fazenda, Guido Mantega, esteja defendendo um certo déficit nas contas correntes do Brasil (contas externas fora o fluxo de capitais). Normalmente esse rombo é visto como risco de moratória e, portanto, de crise.
No entanto, se o déficit se aprofundar, a cobertura para esse rombo não pode ser feita com empréstimos em dólares (aumento da dívida externa), como no passado.
Se for compensado com aumento do investimento estrangeiro direto e com recursos destinados ao reforço de capital da empresa brasileira, não há o que temer.
A farra do forró das prefeituras: o contraponto de Daniel Menezes
Daniel Menezes, doutorando em Ciências Sociais na UFRN, não se deixa levar pela corrente, e elabora posições críticas, não raro provocativas, sobre temas consensuais para os chamados "formadores de opinião". No texto abaixo, em realidade um comentário a uma postagem aqui colocada, ele, como diria minha prima, de forma weberiana, tenta apreender o sentido das ações dos prefeitos "farristas". Vou colocar aqui a posição do Daniel, mas, assim que possível, retorno ao tema... para rebater.
Caro Edmilson,
penso que a denominação "farra" não é a mais adequada para enquadrar o contexto que permite a perpetuação das festas de forró nos municípios do RN.
O denuncismo, apesar de sedutor, não é a estratégia mais adequada para enfrentar o tema.
Isto porque, do modo como você postou a notícia, fica parecendo que a coisa se processa, simplesmente, por pura "safadeza" dos prefeitos.
Acho que há uma cultura mais profunda, para além da simples e fácil explicação da "vilania" dos gestores.
Primeiro, há um "mercado" extremamente competitivo entre as prefeituras no sentido de promover determinadas festas.
As prefeituras que não promovem os shows de forró são tidas como "atrasadas" e são comparadas com relação a outras de modo pejorativo.
Para a gente que mora na capital pode parecer estranho, mas isto forja necessidades objetivas.
A prefeitura de São José, se não me falhe a memória, gastou, certo tempo atrás, cerca de 100 mil reais com um show de Zezé de Camargo e Luciano...
Ela foi severamente criticada por tal atitude. Porém, o prefeito não recuou um centímetro, já que não se preocupava com o que saia no diário de natal ou na tribuna do norte, mas sim com o seu público interno e com o que pensava os cidadãos das cidades vizinhas, já que postulava a cadeira de dep. estadual.
Pode não parecer, mas esses prefeitos não são bobos. Eles sabem que, se tiverem de "farrear", não farão isto na frente de todo mundo.
Um abraço.
Daniel Menezes
Caro Edmilson,
penso que a denominação "farra" não é a mais adequada para enquadrar o contexto que permite a perpetuação das festas de forró nos municípios do RN.
O denuncismo, apesar de sedutor, não é a estratégia mais adequada para enfrentar o tema.
Isto porque, do modo como você postou a notícia, fica parecendo que a coisa se processa, simplesmente, por pura "safadeza" dos prefeitos.
Acho que há uma cultura mais profunda, para além da simples e fácil explicação da "vilania" dos gestores.
Primeiro, há um "mercado" extremamente competitivo entre as prefeituras no sentido de promover determinadas festas.
As prefeituras que não promovem os shows de forró são tidas como "atrasadas" e são comparadas com relação a outras de modo pejorativo.
Para a gente que mora na capital pode parecer estranho, mas isto forja necessidades objetivas.
A prefeitura de São José, se não me falhe a memória, gastou, certo tempo atrás, cerca de 100 mil reais com um show de Zezé de Camargo e Luciano...
Ela foi severamente criticada por tal atitude. Porém, o prefeito não recuou um centímetro, já que não se preocupava com o que saia no diário de natal ou na tribuna do norte, mas sim com o seu público interno e com o que pensava os cidadãos das cidades vizinhas, já que postulava a cadeira de dep. estadual.
Pode não parecer, mas esses prefeitos não são bobos. Eles sabem que, se tiverem de "farrear", não farão isto na frente de todo mundo.
Um abraço.
Daniel Menezes
segunda-feira, 14 de dezembro de 2009
Música para um começo de jornada...
Tarde quente em Natal. Mesmo aqui, na minha sala de trabalho na UFRN, a canícula é implacável. Ligar a máquina, ouvir uma boa música e trabalhar, eis a forma de enfrentar o clima. Faça isso também! Clique abaixo e fique em paz.
Lula, um protagonista mundial em 2009
Quem afirma é o mais importante jornal espanhol da atualidade, o El País.
Confira aqui (em espanhol).
Novo Jornal, um bom começo
Novo Jornal é o novo na imprensa local. Após a transformação editorial do Diário de Natal, que optou, seguindo a trilha de iniciativas empresariais vitoriosas em outras partes do país, por fazer um "jornalismo popular" (traduza-se: pouca substância e muito sensacionalismo), estavámos quase sem alternativas de leitura diária em Natal.
Além disso, os leitores que amam odiar (ou odeiam amar) Cassiano Arruda, mas são leitores cativos de sua coluna, estavam se sentido órfãos.
O Novo Jornal chegou em boa hora. Cassiano, com a sua Roda-Viva, está de volta. Com a linha de sempre, sem retoques e salamaleques. E com as mesmas posições políticas e ideológicas (isto é, bem mais à direita do que eu e você ....). E, no seu jornal, prá tornar mais apetitosa a leitura, o veterano jornalista partilha a parte de opinião e notas (ou fofocas, como queira) com a jornalista Renata Lo Prete, que traz para o veículo a coluna Painel, publicada pela Folha de São Paulo.
O Novo Jornal tem uma linha editorial que expressa tudo que faltava na imprensa por essas bandas nos últimos tempos: opinião, investigação e uma pauta aberta a temas espinhosos, dos quais os veículos tradicionais fogem. Assim, em uma de suas primeiras aparições, podemos ler uma impressionante reportagem sobre as ações dos grupos de extermínio nas áreas periféricas da Grande Natal. E ontem, como já apontei em postagem mais abaixo, uma matéria de boa qualidade tratando da farra que as prefeituras do interior do estado estão fazendo com o meu, o seu, o nosso suado dinheirinho.
Por tudo isso, e porque gosto de jornal bem escrito, tornei-me leitor diário do novo veículo. Não, não ganho nada para dizer isso. E, também não, não concordo com quase nada das opiniões escritas no jornal. Mas, por favor!, a essa altura do campeonato, vale a pena ter como critério de escolha de um jornal o fato de ele expressar sempre as suas opiniões?
Além disso, os leitores que amam odiar (ou odeiam amar) Cassiano Arruda, mas são leitores cativos de sua coluna, estavam se sentido órfãos.
O Novo Jornal chegou em boa hora. Cassiano, com a sua Roda-Viva, está de volta. Com a linha de sempre, sem retoques e salamaleques. E com as mesmas posições políticas e ideológicas (isto é, bem mais à direita do que eu e você ....). E, no seu jornal, prá tornar mais apetitosa a leitura, o veterano jornalista partilha a parte de opinião e notas (ou fofocas, como queira) com a jornalista Renata Lo Prete, que traz para o veículo a coluna Painel, publicada pela Folha de São Paulo.
O Novo Jornal tem uma linha editorial que expressa tudo que faltava na imprensa por essas bandas nos últimos tempos: opinião, investigação e uma pauta aberta a temas espinhosos, dos quais os veículos tradicionais fogem. Assim, em uma de suas primeiras aparições, podemos ler uma impressionante reportagem sobre as ações dos grupos de extermínio nas áreas periféricas da Grande Natal. E ontem, como já apontei em postagem mais abaixo, uma matéria de boa qualidade tratando da farra que as prefeituras do interior do estado estão fazendo com o meu, o seu, o nosso suado dinheirinho.
Por tudo isso, e porque gosto de jornal bem escrito, tornei-me leitor diário do novo veículo. Não, não ganho nada para dizer isso. E, também não, não concordo com quase nada das opiniões escritas no jornal. Mas, por favor!, a essa altura do campeonato, vale a pena ter como critério de escolha de um jornal o fato de ele expressar sempre as suas opiniões?
A farra do forró das prefeituras
Na edição de final de semana do Novo Jornal, publicada ontem, uma reportagem merece todo destaque. Trata-se de uma competente investigação jornalística sobre as contratações de bandas de forró que as prefeituras do RN estão fazendo neste final de ano. Com a alegação de que se trata de investimento no lazer de seus municípes, prefeitos estão pagando rios de dinheiro a bandas como "Cheiro de Menina" e similares. Para além das considerações estéticas - qual a contribuição cultural de bandas cujas músicas só se sustentam pelo apelo ao preconceito contra as mulheres e o culto ao machismo? -, importa ressaltar que essa farra está sendo feita no momento mesmo em que as prefeituras alegam que não dispõem de dinheiro para o pagamento dos salários de seus funcionários.
Algumas prefeituras chegam a contratar empresas (aí, com certeza, tem!)para cuidar de tudo (contato e contrato das bandas e arrumação do cenário...). Tem prefeitura gastando a bagatela de R$ 400.000,00 para garantir o, como direi?, "lazer" de sua população.
Bueno, talvez fosse o caso de uma ação do Ministério Público para monitorar essa farra...
Algumas prefeituras chegam a contratar empresas (aí, com certeza, tem!)para cuidar de tudo (contato e contrato das bandas e arrumação do cenário...). Tem prefeitura gastando a bagatela de R$ 400.000,00 para garantir o, como direi?, "lazer" de sua população.
Bueno, talvez fosse o caso de uma ação do Ministério Público para monitorar essa farra...
Agite o seu começo de jornada
Pois é. O Arruda não radicalizou. Bem que eu sugeri que ele fizesse isso. Seria bom para todos, especialmente para o distinto público que saberia, enfim, do que é feito as entranhas das vestais do DEM. Mas, fazer o quê? Radicalizemos nós, então. Um clipe ajuda? Então, tá! Se segura na cadeira e clique abaixo.
sexta-feira, 11 de dezembro de 2009
Música: uma dica de Guru
Augusto Max, o Guru, agora aluno da pós em antropologia da UFPE, está de volta. E, como também gosta da Joan Baez, embora esteja longe dos quarenta, indica-nos um clipe com uma música performada pela cantora e por Bob Dylan. Confira!
quinta-feira, 10 de dezembro de 2009
Uma boa cerveja cairia bem...
Putz! Que cansaço! A noite cobre o Campus da UFRN. E eu ainda atolado em coisas de trabalho. Em realidade, estou fazendo coisas, respondendo cobranças burocráticas... São experiências pouco significativas e que não valem muita coisa nas conversas que terei com amigos e familiares.
Lembro-me da análise de Walter Benjamim a respeito do soldados que voltavam silenciosos da primeira grande guerra. As suas eram experiências destituídas de sentido. Como muitas das nossas atualmente. N
essas horas, penso, somente uma boa cerveja nos salva...
Lembro-me da análise de Walter Benjamim a respeito do soldados que voltavam silenciosos da primeira grande guerra. As suas eram experiências destituídas de sentido. Como muitas das nossas atualmente. N
essas horas, penso, somente uma boa cerveja nos salva...
Quando poderemos assistir a este documentário?
Trata-se de um registro, a partir da ótica do filho, da vida do colombiano Pablo Escobar. Escobar, como sabes, tornou-se conhecido como o maior narcotraficante da segunda metade do século XX. Foi também o protagonista de uma guerra contra o Estado, na Colômbia, na primeira metade da década de 1980. Confira abaixo o trailer.
quarta-feira, 9 de dezembro de 2009
Mudanças climáticas globais: a conta não pode ser paga pelos de sempre...
Alon Feurwerker, como de costume, coloca os pingos nos "is" na discussão a respeito dos custos (ou seja, taxas e reduções de crescimento) necessários para fazer face às mudanças climáticas globais. De boas intenções e discursos politicamente corretos, não tenham dúvidas!, o inferno está abarrotado. Confira o texto do jornalista mais abaixo.
Os pobres, sem ter quem os defenda
Alon Feurwerker
Como nós, da elite, temos à disposição todos os confortos da civilização, podemos também confortavelmente mobilizar-nos por um mundo com menos civilização. Desde que para os outros
A Conferência do Clima na Dinamarca e a imensa mobilização em torno dela transformaram-se num gerador poderosíssimo de consensos. O aquecimento global é o mais grave problema planetário, dizem, e deve subordinar os demais assuntos. Entre eles o desenvolvimento. Como se trata de uma ameaça global, deve ser enfrentada globalmente. Abre-se caminho para a relativização da soberania das nações e para alguma modalidade de governança supranacional.
O presidente da República é mesmo um sujeito de sorte. Ao longo dos dois mandatos de Luiz Inácio Lula da Silva, o crescimento anual médio do Produto Interno Bruto (PIB) ainda persegue os 4%, o que para um país como o Brasil é pouco. Só não é menos graças à desaceleração demográfica. A estabilização populacional -produto da urbanização- impede a corrosão do PIB per capita. Por que Lula tem sorte? Porque a centralidade da agenda ambiental reduz as pressões pelo crescimento acelerado, que aliás corre o risco de virar bicho-papão.
O PT batia sem dó nem piedade no governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) porque o Brasil não crescia. Com Lula, o Brasil cresce um pouco mais, só que não chegou a dar o salto. Pode-se culpar a crise mundial das finanças, mas FHC também teve lá suas crises como desculpa. Lula pode argumentar que a dele foi mais aguda. Ao que FHC retrucará dizendo que as dele foram em maior quantidade e espalhadas no tempo. E seguirá o fascinante debate tucano-petista de sempre, enquanto o país patina. Mas como viramos os queridinhos da imprensa antes atacada como “imperialista”, então está tudo bem.
Fato é que nos dezesseis anos de ambos a China, por exemplo, cresceu bem mais do que nós. Apesar de todas as crises mundiais. Ainda bem que a China cresceu forte. Os combatentes do clima têm muito mais imprensa à disposição e melhores estratégias de comunicação -até por não lhes faltarem os recursos-, mas o desafio central da humanidade continua a ser o combate à pobreza e à desigualdade. E os chineses vêm sendo decisivos nessa luta. Mesmo ao custo de virarem alvo da ira mundial.
Não que as coisas na China corram sempre bem. Há um déficit democrático. E há problemas graves de poluição, de agressão ao meio ambiente. O tema adquire ali centralidade cada vez maior. Mas existe um consenso nacional básico. Ainda persistem centenas de milhões de chineses fora do mercado e da civilização moderna. Se a liderança ali ocupar-se demais em agradar ao público externo, sacrificará o interno e abrirá caminho para a desestabilização política do país. Óbvio que eles tentarão evitar isso por todos os meios.
Além do mais, a persistência do crescimento econômico acelerado na China vem sendo a grande responsável por o mundo sair da crise com menos danos do que previsto. Enquanto o Brasil festejará ao final do ano um crescimento do PIB de 1%, se tanto, a China terá expandido a economia a uma taxa oito vezes maior. O que não impedirá Lula de repetir que o Brasil foi o primeiro a sair da crise. Sem que seja questionado a sério, politicamente, pela audiência.
Por que Lula fala sozinho? Porque o discurso que deveria se contrapor ao dele, desenvolvimentista, é progressivamente empurrado para a criminalização.
Funciona aqui um mecanismo similar ao da escola pública. Como os filhos dos políticos, dos empresários, dos artistas e dos jornalistas estudam, em sua maioria, em escolas particulares, ninguém se ocupa a sério de oferecer ao filho do pobre uma escola pública de qualidade.
Como nós, da elite, temos à disposição todos os confortos da civilização, podemos também confortavelmente mobilizar-nos por um mundo com menos civilização. Desde que para os outros. Infelizmente, nesse debate sobre o aquecimento global os pobres não têm quem os defenda de verdade.
Poderia ser Lula, mas ele não mostra entusiasmo pelo papel. O Lula de 2009 pouco ou nada tem a ver com o de 2003.
(...)
Coluna (Nas entrelinhas) publicada hoje no Correio Braziliense.
Os pobres, sem ter quem os defenda
Alon Feurwerker
Como nós, da elite, temos à disposição todos os confortos da civilização, podemos também confortavelmente mobilizar-nos por um mundo com menos civilização. Desde que para os outros
A Conferência do Clima na Dinamarca e a imensa mobilização em torno dela transformaram-se num gerador poderosíssimo de consensos. O aquecimento global é o mais grave problema planetário, dizem, e deve subordinar os demais assuntos. Entre eles o desenvolvimento. Como se trata de uma ameaça global, deve ser enfrentada globalmente. Abre-se caminho para a relativização da soberania das nações e para alguma modalidade de governança supranacional.
O presidente da República é mesmo um sujeito de sorte. Ao longo dos dois mandatos de Luiz Inácio Lula da Silva, o crescimento anual médio do Produto Interno Bruto (PIB) ainda persegue os 4%, o que para um país como o Brasil é pouco. Só não é menos graças à desaceleração demográfica. A estabilização populacional -produto da urbanização- impede a corrosão do PIB per capita. Por que Lula tem sorte? Porque a centralidade da agenda ambiental reduz as pressões pelo crescimento acelerado, que aliás corre o risco de virar bicho-papão.
O PT batia sem dó nem piedade no governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) porque o Brasil não crescia. Com Lula, o Brasil cresce um pouco mais, só que não chegou a dar o salto. Pode-se culpar a crise mundial das finanças, mas FHC também teve lá suas crises como desculpa. Lula pode argumentar que a dele foi mais aguda. Ao que FHC retrucará dizendo que as dele foram em maior quantidade e espalhadas no tempo. E seguirá o fascinante debate tucano-petista de sempre, enquanto o país patina. Mas como viramos os queridinhos da imprensa antes atacada como “imperialista”, então está tudo bem.
Fato é que nos dezesseis anos de ambos a China, por exemplo, cresceu bem mais do que nós. Apesar de todas as crises mundiais. Ainda bem que a China cresceu forte. Os combatentes do clima têm muito mais imprensa à disposição e melhores estratégias de comunicação -até por não lhes faltarem os recursos-, mas o desafio central da humanidade continua a ser o combate à pobreza e à desigualdade. E os chineses vêm sendo decisivos nessa luta. Mesmo ao custo de virarem alvo da ira mundial.
Não que as coisas na China corram sempre bem. Há um déficit democrático. E há problemas graves de poluição, de agressão ao meio ambiente. O tema adquire ali centralidade cada vez maior. Mas existe um consenso nacional básico. Ainda persistem centenas de milhões de chineses fora do mercado e da civilização moderna. Se a liderança ali ocupar-se demais em agradar ao público externo, sacrificará o interno e abrirá caminho para a desestabilização política do país. Óbvio que eles tentarão evitar isso por todos os meios.
Além do mais, a persistência do crescimento econômico acelerado na China vem sendo a grande responsável por o mundo sair da crise com menos danos do que previsto. Enquanto o Brasil festejará ao final do ano um crescimento do PIB de 1%, se tanto, a China terá expandido a economia a uma taxa oito vezes maior. O que não impedirá Lula de repetir que o Brasil foi o primeiro a sair da crise. Sem que seja questionado a sério, politicamente, pela audiência.
Por que Lula fala sozinho? Porque o discurso que deveria se contrapor ao dele, desenvolvimentista, é progressivamente empurrado para a criminalização.
Funciona aqui um mecanismo similar ao da escola pública. Como os filhos dos políticos, dos empresários, dos artistas e dos jornalistas estudam, em sua maioria, em escolas particulares, ninguém se ocupa a sério de oferecer ao filho do pobre uma escola pública de qualidade.
Como nós, da elite, temos à disposição todos os confortos da civilização, podemos também confortavelmente mobilizar-nos por um mundo com menos civilização. Desde que para os outros. Infelizmente, nesse debate sobre o aquecimento global os pobres não têm quem os defenda de verdade.
Poderia ser Lula, mas ele não mostra entusiasmo pelo papel. O Lula de 2009 pouco ou nada tem a ver com o de 2003.
(...)
Coluna (Nas entrelinhas) publicada hoje no Correio Braziliense.
terça-feira, 8 de dezembro de 2009
Música para quem tem mais de quarenta anos...
Se você está na faixa etária dos primeiros "enta", tenho certeza!, curtiu em algum momento da caminhada a música de Joan Baez. Talvez,quem sabe?, você, em uma noite meio fria, na companhia de mais gente, deitado em um sofá velho e meio encharcado de alguma mistura alcoólica barata, não tentou acompanhar a música abaixo enquanto imagens lúdicas rodopiavam pela cabeça? Escute-a novamente. E, por favor, mantenha a compustura: não chore!
Causas, causos e uma oportunidade perdida
Minha irmã mora em um prédio no qual a caixa postal - eu tô falando de caixa de correio, uma coisa física, ok? - é de uso comum. Há alguns anos, quando a minha correspondência ainda ia para o seu endereço, eu pegava o molho de chaves do apartamento e ia lá conferir se tinha alguma coisa prá mim. Tinha, quase sempre. Mas, oh!, eram conta. Muitas contas, claro. Pelos correios, você sabe, a gente só recebe contas. Bueno, eu ia lá, pegava as minhas dolorosas e ficava olhando aquele montão de contas dos moradores do prédio. Nessas horas, secretamente, eu alimentava um projeto: vou escrever uma carta pessoal para cada um desses aí para que eles recebam algo além de contas. Eu pensava em tratar de alguma coisa, sei lá!, uma conversa sobre amores perdidos, sonhos realizados (ou, mais fácil e factível, roubados) e parentes esquecidos.
O tempo passou, deixei de usar a caixa de correios e de alimentar aquele projeto. Agora, nesse dias, tenho a mesma sensação de que preciso fazer algo assim. O objeto que me provoca é outro. Trata-se do meu e-mail. Ou, para ser mais exato, da minha caixa postal virtual. Novamente, tenho vontade de mandar, para algumas das pessoas que me rementem mensagens genéricas, algo realmente humano, que fale da vida ou coisas assim...
Quando ocorre esse delírio? Quando acesso à página de abertura do yahoo e confiro que tem correspondências novas me esperando. Nessas situações, por alguns instantes, fico em estado de excitação. "Pronto, é agora! Aí vem alguma coisa realmente endereçada a mim...". Mas, qual o quê! Quando vejo os títulos das mensagens, caio em desânimo. São correntes, comunicados políticos, pregações religiosos e muito ctrl+c e ctrl+v. Eu leio os títulos das mensagens, algumas até enviadas por conhecidos, e nem me animo a abri-las. Algumas vezes, confesso, até me comovo com algumas causas anunciadas nos títulos. Algumas bem politicamente corretas, como é o caso do combate à fome em algum recanto pobre do mundo. Outras, bem chiques, contra a morte de determinadas animais. E por aí vai... Mas, só dou uma espiada. Abrir e ler, que é bom, necas de pitibiriba.
Uma ou outra vez, meio constrangido, leio a mensagem enviada pelo conhecido e aí me deparo com algum causo ou piada. Pelo menos, divirto-me um pouco. Mas isso é raro...
Por isso, conferi agora mesmo, existem 2597 mensagens que eu ainda não li na minha caixa postal. Não me condene, por favor! É que eu fico adiando, sabe. Mais ou menos como aquela arrumada que a gente precisa fazer no local de trabalho. No meu caso, na minha sala na Universidade. Eu penso: "assim que eu tiver um tempo, eu arrumo tudo". Quer que eu te diga uma coisa com sinceridade? Eu já tive tempo e não arrumei. Ora, quando eu "tive tempo", fui ler. Um bom romance, aprendi isso desde menino, é a melhor companhia quando você "tem tempo". E aí, o que aconteceu? Deixei a tal arrumação prá depois. E, em que pese um cadinho de culpa, não me senti mais atrapalhado depois. A vida continuou correndo do mesmo jeito. Talvez apenas a colega que divide a sala comigo não ache muita graça nisso, mas ela não tem reclamado...
E as mensagens? "Tem coisas importantes que você não leu", você poderia me dizer. "Será mesmo?", eu atiro minha dúvida contra você. Olha só uma coisa: a minha mensagem não-lida mais velha é de 27 de dezembro de 1998 (conferi isso agora mesmo!). Sabe qual o título? "Uma grande oportunidade". É sério! Uma grande oportunidade... Ela vai completar onze anos. Pois é, há 10 anos, onze meses e 11 dias e mais algumas horas, eu, que não raro espero um grande acontecimento, não estou levando a sério a oferta de uma grande oportunidade. Devo ler a mensagem? Sinto uma preguiça danada de fazer isso.
A minha segunda mensagem não-lida mais velha é mais recente. Tem apenas 09 anos. O título diz tudo: "Reunião amanhã? Sim!!!!". Eu acho que não fui à reunião. Não devo ter perdido grande coisa. Não me lembro de nenhuma admoestação séria por tal ausência.
E a mensagem não-lida mais recente? O título, em letras garrafais, anuncia: MULHER IDEAL. Pronto! Não vou ler agora, deixo prá mais tarde. Nem que seja daqui há onze anos. Mulher ideal? Melhor não tocar em tal assunto agora...
Por que não deletar tais mensagens? Ora, eu deleto um bocadão. Mas sempre sobra aquelas que você, por alguma razão, diz para si mesmo: "essa daí, mais tarde, quando eu tiver mais tempo, vou ler..." Só que o tempo passa... Daí, como naquela mensagem da "grande oportunidade", você, de repente, descobre que tem uma mensagem não-lida que já é uma adolescente. E adolescente é problema, não é?
E agora? Fiquei com uma bruta vontade de ler a mensagem. Mas, fico aterrorizado, e se ali, após clicar no negrito do título, aparecer algo, uma informação ou uma senha, que tivesse me levado, há uma década, a uma redefinição completa da minha vida. Nossa! Eu poderia ter atravessado essa fase pré-outonal da minha vida (isto é, essa fase dos quarenta anos), sei lá!, dirigindo uma BMW naquelas estradas sinuosas da Riviera Francesa. Ou, mais promissor, poderia ter me tornado dono de uma pousada na Praia de Imbassaí e agora eu estaria lá, no meio da Reserva da Mata de São João, balançando-me em uma rede durante o dia e meditando: hoje, mais tarde, vou tomar banho na Cachoeira de Dona Zilda, na foz do Rio ou no mar? À noite, iria ao Jerimum Café, degustaria uma boa cerveja (uma Original, of course!)e pediria uma das massas da casa. Para completar, na sobremesa, atacaria um petit-gateau. Voltaria caminhando para a minha pousada, ouvindo os barulhos da noite, e, para relaxar, cairia na piscina da pousada para, quando fosse para cama, ir bem leve.
Tranquiliza-me, mais uma vez, a idéia: mais tarde, quando tiver tempo, eu lerei a tal mensagem. E, mesmo tarde, descobrirei, enfim, essa grande oportunidade que a internet está, há uma década, me oferecendo e eu, bestalhão que sou, deixando-a de lado...
O tempo passou, deixei de usar a caixa de correios e de alimentar aquele projeto. Agora, nesse dias, tenho a mesma sensação de que preciso fazer algo assim. O objeto que me provoca é outro. Trata-se do meu e-mail. Ou, para ser mais exato, da minha caixa postal virtual. Novamente, tenho vontade de mandar, para algumas das pessoas que me rementem mensagens genéricas, algo realmente humano, que fale da vida ou coisas assim...
Quando ocorre esse delírio? Quando acesso à página de abertura do yahoo e confiro que tem correspondências novas me esperando. Nessas situações, por alguns instantes, fico em estado de excitação. "Pronto, é agora! Aí vem alguma coisa realmente endereçada a mim...". Mas, qual o quê! Quando vejo os títulos das mensagens, caio em desânimo. São correntes, comunicados políticos, pregações religiosos e muito ctrl+c e ctrl+v. Eu leio os títulos das mensagens, algumas até enviadas por conhecidos, e nem me animo a abri-las. Algumas vezes, confesso, até me comovo com algumas causas anunciadas nos títulos. Algumas bem politicamente corretas, como é o caso do combate à fome em algum recanto pobre do mundo. Outras, bem chiques, contra a morte de determinadas animais. E por aí vai... Mas, só dou uma espiada. Abrir e ler, que é bom, necas de pitibiriba.
Uma ou outra vez, meio constrangido, leio a mensagem enviada pelo conhecido e aí me deparo com algum causo ou piada. Pelo menos, divirto-me um pouco. Mas isso é raro...
Por isso, conferi agora mesmo, existem 2597 mensagens que eu ainda não li na minha caixa postal. Não me condene, por favor! É que eu fico adiando, sabe. Mais ou menos como aquela arrumada que a gente precisa fazer no local de trabalho. No meu caso, na minha sala na Universidade. Eu penso: "assim que eu tiver um tempo, eu arrumo tudo". Quer que eu te diga uma coisa com sinceridade? Eu já tive tempo e não arrumei. Ora, quando eu "tive tempo", fui ler. Um bom romance, aprendi isso desde menino, é a melhor companhia quando você "tem tempo". E aí, o que aconteceu? Deixei a tal arrumação prá depois. E, em que pese um cadinho de culpa, não me senti mais atrapalhado depois. A vida continuou correndo do mesmo jeito. Talvez apenas a colega que divide a sala comigo não ache muita graça nisso, mas ela não tem reclamado...
E as mensagens? "Tem coisas importantes que você não leu", você poderia me dizer. "Será mesmo?", eu atiro minha dúvida contra você. Olha só uma coisa: a minha mensagem não-lida mais velha é de 27 de dezembro de 1998 (conferi isso agora mesmo!). Sabe qual o título? "Uma grande oportunidade". É sério! Uma grande oportunidade... Ela vai completar onze anos. Pois é, há 10 anos, onze meses e 11 dias e mais algumas horas, eu, que não raro espero um grande acontecimento, não estou levando a sério a oferta de uma grande oportunidade. Devo ler a mensagem? Sinto uma preguiça danada de fazer isso.
A minha segunda mensagem não-lida mais velha é mais recente. Tem apenas 09 anos. O título diz tudo: "Reunião amanhã? Sim!!!!". Eu acho que não fui à reunião. Não devo ter perdido grande coisa. Não me lembro de nenhuma admoestação séria por tal ausência.
E a mensagem não-lida mais recente? O título, em letras garrafais, anuncia: MULHER IDEAL. Pronto! Não vou ler agora, deixo prá mais tarde. Nem que seja daqui há onze anos. Mulher ideal? Melhor não tocar em tal assunto agora...
Por que não deletar tais mensagens? Ora, eu deleto um bocadão. Mas sempre sobra aquelas que você, por alguma razão, diz para si mesmo: "essa daí, mais tarde, quando eu tiver mais tempo, vou ler..." Só que o tempo passa... Daí, como naquela mensagem da "grande oportunidade", você, de repente, descobre que tem uma mensagem não-lida que já é uma adolescente. E adolescente é problema, não é?
E agora? Fiquei com uma bruta vontade de ler a mensagem. Mas, fico aterrorizado, e se ali, após clicar no negrito do título, aparecer algo, uma informação ou uma senha, que tivesse me levado, há uma década, a uma redefinição completa da minha vida. Nossa! Eu poderia ter atravessado essa fase pré-outonal da minha vida (isto é, essa fase dos quarenta anos), sei lá!, dirigindo uma BMW naquelas estradas sinuosas da Riviera Francesa. Ou, mais promissor, poderia ter me tornado dono de uma pousada na Praia de Imbassaí e agora eu estaria lá, no meio da Reserva da Mata de São João, balançando-me em uma rede durante o dia e meditando: hoje, mais tarde, vou tomar banho na Cachoeira de Dona Zilda, na foz do Rio ou no mar? À noite, iria ao Jerimum Café, degustaria uma boa cerveja (uma Original, of course!)e pediria uma das massas da casa. Para completar, na sobremesa, atacaria um petit-gateau. Voltaria caminhando para a minha pousada, ouvindo os barulhos da noite, e, para relaxar, cairia na piscina da pousada para, quando fosse para cama, ir bem leve.
Tranquiliza-me, mais uma vez, a idéia: mais tarde, quando tiver tempo, eu lerei a tal mensagem. E, mesmo tarde, descobrirei, enfim, essa grande oportunidade que a internet está, há uma década, me oferecendo e eu, bestalhão que sou, deixando-a de lado...
domingo, 6 de dezembro de 2009
Mangabeira Unger aponta o que debater nas eleições de 2010
Mangabeira Unger é um dos intelectuais criativos deste país. Como político é, como diria?, uma inconstância. Mas, quem é perfeito, não é? Bueno, aproveito para colocar aí abaixo texto de sua lavra apontando tópicos para um debate sobre o futuro do Brasil. Trata-se de uma pauta para dar substância ao debate político de 2010. Confira!
OITO OPÇÕES QUE DEFINIRÃO O RUMO DO BRASIL
Roberto Mangabeira Unger
A tarefa do Brasil agora é começar a construir modelo de desenvolvimento baseado em ampliação de oportunidades para aprender, para trabalhar e para produzir. Modelo que faça da ampliação de oportunidades econômicas e educativas o motor do crescimento e que afirme a primazia do interesses do trabalho e da produção.
A construção deste modelo é a maneira -- a única maneira eficaz -- de superar a contradição que continua a acorrentar o Brasil. Num país que exibe vitalidade criativa e empreendedora desmesurada, a maior parte dos brasileiros continua sem ter os instrumentos para criar ou empreender. Por consequinte, desperdiça-se muito desta energia humana.
Para definir e desbravar e abrir este caminho, temos de resistir a uma tentação. Vista de um ângulo, é a tentação do rentismo. Por conta do grande rentismo financeiro, quem malogra como produtor pode continuar a prosperar como rentista. É a inversão da máxima de Keynes: a eutanásia dos produtores ocupa o lugar da eutanásia dos rentistas. Por conta do pequeno rentismo social, quem não consegue empregar-se ou qualificar-se ao menos não morre de fome porque recebe as migalhas dos programas sociais (justos e imprescindíveis como ponto de partida, porém inaceitáveis como ponto de chegada). Descobriram muitos que a combinação do grande rentismo financeiro e do pequeno rentismo social ganha eleições. Só que mata o país: desvia-nos do que haveria de ser a prioridade nacional: assegurar ao dinanismo brasileiro os instrumentos de que ele continua a carecer.
Considerada de outra perspectiva, é a tentação do açúcar. Na política brasileira, sobram partidos, mas faltam alternativas. Quase todos se apresentam como social-democratas ou social-liberais. O social arrisca ser o açúcar com que se doura a pílula do modelo econômico. Se o povo brasileiro vislumbrar oportunidade para reconstruir o existente, não se dará por satisfeito com o acúcar como substituto da reconstrução.
J[a existe a base social para erguer o novo modelo de desenvolvimento. É o desejo da maioria dos brasileiros de seguir o caminho da nova vanguarda de batalhadores e de emergentes que surgiu entre nós: classe média surpreendente, vinda de baixo, que encarna aos olhos da maioria de trabalhadores pobres, que lhe quer seguir o exemplo, o espírito da auto-ajuda e da iniciativa. Não o poderão seguir se deixarmos de inovar em nossas instituições, inclusive aquelas que constituem o mercado e a democracia.
Se existe base social para o projeto necessário ao país, ainda não está claro o caminho político. Os dois partidos que, a partir de seu centro de gravidade em São Paulo, polarizaram, nas últimas décadas, a disputa do poder central -- o PSDB e o PT -- pretendem-se arautos da modernidade. Atuaram com frequênciacomo agentes do atraso. Foram eles que chefiaram no Brasil a idéia hegemônica em nossa política: a inexistência de alternativas institucionais na organização da economia e da política, a conveniência da aliança entre o grande rentismo financeiro e o pequeno rentismo social, a redução do social ao papel do açúcar. O resultado, apesar da aparente bonança econômica, foi colocar-nos no caminho de virar combinação de grande fazenda, grande mina e montadora média.
Fora do eixo PSDB-PT, os partidos, grandes e pequenos, não acalentaram a alternativa do modelo de desenvolvimento que fizesse prevalecer os interesses do trabalho e da produção e que assegurasse a capacitação do povo brasileiro. Entregaram-se, as mais das vezes, a uma política programaticamente mesquinha e moralmente anárquica.
Em meio a esta abdicação generalizada, promoveu o governo Lula grandes avanços em cinco áreas principais. Consolidou a estabilidade macroeconômica, contra o espectro da hiper-inflação. Tirou milhões da pobreza extrema, ainda que não haja conseguido diminuir substancialmente a desigualdade. Abriu para outros milhões de jovens as portas da universidade e da escola técnica. Fêz obras indispensáveis ao desenvolvimento do país. Começou a construir escudo de defesa, orientado neste esforço pela Estratégia Nacional de Defesa, que promulgou.
Acima de todos estes avanços, ocorreu algo imensamente importante, ainda que impalpável. Ao se identificar com Lula, o povo brasileiro aceitou-se a si mesmo.
Tudo isso cria condições para a execução da tarefa diante da nação: a construção de modelo de desenvolvimento que dê à maioria os meios educativos e econômicos de que ela precisa para soerguer-se. Nada disso, porém, executa a tarefa. O tema da eleição de 2010 não é o passado. É o futuro.
Enumero oito série de opções que, encadeadas, definem o rumo do modelo de desenvolvimento que convém ao Brasil.
1.A posição do Brasil na divisão internacional do trabalho. Temos de optar contra um caminho, como o da Nova Zelândia ou do Chile, que pretenda combinar economia de produção e de exportação de produtos primários com elite internacionalizada de serviços. O Brasil é grande demais para isso. Não deve abandonar sua vocação industrial.
Ao manter-se fiel a ela, entretanto, precisa também optar contra estratégia como a que a China seguiu na maior parte de sua economia: apostar, por muito tempo, em trabalho e desqualificado. Não prosperaremos como uma China com menos gente. O Brasil está ameaçado, como qualquer país de renda média, de ficar preso numa prensa entre países de trabalho barato e países de alta produtividade. Interessa-nos escapar da prensa pelo lado alto, da escalada de produtividade e da qualificação do trabalho, não pelo lado baixo, do aviltamento salarial.
2.O financiamento interno de nossa estratégia de desenvolvimento. O capital estrangeiro é tanto mais útil quanto menos se precisa dele. Tratemos de dividir ao meio a seudo-ortodoxia econômica que os governos brasileiros abraçaram em décadas recentes. A parte boa -- o realismo e a responsabilidade fiscais -- haverá de ser vigorosamente reafirmada, mesmo à custa de adiar os instrumentos de uma política contra-cíclica. (As esquerdas que perderam a fé no marxismo costumam abraçar, para substitui-lo, o Keynesianismo bastardo.) A parte nociva -- a tolerância de um nível baixo de poupança pública e privada e a consequente dependência do capital estrangeiro para financiar nosso desenvolvimento -- deve ser repudiada. Nosso nível de poupança sempre esteve abaixo de 20%; o das economias asiáticas que admiramos sempre acima de 40%.
É verdade que em teoria o nível de poupança é mais efeito do que causa do crescimento. Essa verdade teórica, entretanto, não leva em conta o significado estratégico da sequência: a mobilização inicial dos recursos nacionais representa condição para a rebeldia nacional -- para fazer o que nos convém e não o que os mercados financeiros querem. Instaurado cíclo de crescimento, o capital estrangeiro vem por acréscimo e em sua melhor forma; o país que mais recebe investimento estrangeiro é a China, que sempre primou por desrespeitar a religião dos mercados.
A elevação da poupança pública exige o fortalecimento da disciplina fiscal. Já para elevar a poupança privada teríamos de construir incentivos e obrigações capazes de assegurar poupança previdenciária progressivamente proporcional à renda dos cidadãos.
A elevação da poupança privada e pública pode, porém, ser indiferente ou nociva se não fôr complementada pela construção de mecanismos que canalizem a poupança de longo prazo para o investimento produtivo de longo prazo e não permitam que seu potencial produtivo se dissipe num casino financeiro. Uma de nossas preocupações deve ser mobilizar parte da poupança previdenciária para fazer o trabalho do “venture capital”: o investimento em empreendimentos emergentes. E para fazê-lo sob gestão profissional e competitiva, longe do conúbio entre o Estado e as grandes empresas.
3.O projeto estratégico da agricultura. Agropecuária continua a ser a principal atividade econômica do Brasil. Pode virar vanguarda e paradigma, ao exemplificar o vínculo entre diversificação da produção e democratização das oportunidades. Para isso, precisa pautar-se por três objetivos entrelaçados. O primeiro objetivo é superar o contraste, meramente, ideológico, entre agricultura empresarial e agricultura familiar. Assegurar atributos empresarias à agricultura familiar, sem que com isso ela tenha de perder seu vínculo com a policultura e seu compromisso com a democratização da propriedade da terra. Não há duas agriculturas no mundo; só há uma. O segundo objetivo é aprofundar a industralização rural, a agregação de valor aos produtos agropecuários no campo. Evitar o contraste entre cidade cheia e campo vazio. E promover vida rural variada e vibrante. O terceiro objetivo é construir em todo o país, não apenas no Sul, classe média rural forte como vanguarda de massa de trabalhadorea agrícolas mais pobres que avançara atrás dela.
O projeto agrícola orientado por tais objetivos poderá vingar no contexto da solução do maior problema físico de nossas agricultura: a recuperação de pastagens degradadas que hoje formam grande parte do território nacional. (No Brasil, para cada hectar sob lavoura há quatro entregues à pecuária extensiva.) Se recuperarmos parte desta área, dobraremos em pouco tempo a área cultivada e triplicararemos nosso produto agrícola sem tocar uma única árvore.
4. A reorientação da política industrial. A política industrial do Brasil consiste, há muito, tempo em entregar o dinheiro do trabalhador, açambarcado no FAT, a umas vinte grandes empresas, por mãos do BNDES, sob o pretexto de transformá-las em campeãs mundiais. O discurso é francês. A prática é koreana.
Se, ao contrário, tratássemos de abrir para as pequenas e médias empresas o acesso ao crédito, à tecnologia, ao conhecimento, aos mercados globais, criaríamos o que mais quer o país: dínamo de crescimento includente. São elas a parte mais importante de nossa economia; é ali que se gera a maior parte do produto e é ali que está a vasta maioria dos empregos.
O objetivo maior é organizar fora dos centros industriais uma travessia direta do pré-Fordismo industrial para o pós-Fordismo industrial, sem que o todo o país tenha de penar no purgatório de um paradigma de produção -- produção em grande escala de bens e sereviços padronizados, por meio de mão de obra semi-qualificados e processos produtivos rígidos e hierárquicos -- que já se vai tornando superado no mundo e que inibe nossa ascensão na escalada da produtividade. O Brasil todo não deve ter de virar a São Paulo de meados do século passado para depois tornar-se outra realidade.
O objetivo subsidiário é dotar nossas maiores empresas, parte indispensável de nossa estratégia de desenvolvimento, da periferia que lhes falta, de empresas menores porém vanguardista. Pois é nesta periferia, mais do que nas grandes empresas, que se costumam acalentar, em todo o mundo, as inovações tecnológicas e organizativas mais arrojadas.
5. Trabalho e capital. Não se toma no Brasil grande iniciativa institucional em matéria de relações entre trabalho e capital desde Vargas. Precisamos tomar, se quisermos fazer justiça aos trabalhadores e apostar em trabalho valorizado e qualificado como base de nosso desenvolvimento: a maior parte do povo brasileiro está fora do regime legal, de uma forma ou outra. Quase metade da população economicamente ativa continua presa na economia informal, obrigada a trabalhar nas sombras da ilegalidade. E parte crescente dos empregados na economia formal encontra-se em situações precarizadas, de trabalho temporário, terceirizado ou autônomo.
Nenhum dos dois discursos disponíveis a respeito do trabalho e do capital resolve o problema. O discurso neoliberal da flexibilização é corretamente interpretado pelos trabalhadores como eufemismo para descrever a corrosão de seus direitos. O discurso corporativista-sindical do direito adquirido resguarda a minoria que está dentro, porém não a maoiria que está fora.
O lugar para começar é a construção, ao lado do regime estabelecido de leis trabalhistas, de segundo corpo de regras, destinado a proteger, a organizar e a representar os trabalhadores inseguros das economias informal e formal. É obra cujo êxito depende de sua convergência com a reorientação das políticas agrícola, industrial e educativa.
6. Capacitação do povo brasileiro. Pelo menos tão importante quanto a democratização das oportunidades econômicas é a democratização das oportunidades educativas. Há duas prioridades.
A primeira prioridade é reconciliar, num país grande, desigual e federativo, a gestão local das escolas pelos estados e municípios com padrões nacionais de investimento e qualidade: federalizar -- na prática, não apenas na lei -- os padrões. A qualidade do ensino que uma criança recebe não deve depender do acaso do lugar onde ela nasce. Para reconciliar gestão local com padrões nacionais, não basta ter sistema nacional de avaliação, como já temos, e mecanismo para redistribuir recursos de lugares mais ricos para lugares mais pobres, como estamos começando a ter. É preciso forjar instrumento para consertar redes de escolas locais que caiam repetidamente abaixo do patamar mínimo aceitável de qualidade. O meio é associar os três níveis da federação em órgãos conjuntos que possam vir em socorro destas escolas, assumi-las temporariamente, confiá-las a gestores profissionais independentes (como se faria com empresas em processo de recuperação falimentar) e devolvê-las consertadas.
A segunda prioridade é mudar a maneira de aprender e de ensinar no Brasil. Substituir ensino ainda pautado por decoreba por ensino analítico e capacitador, com foco no básico: análise verbal e análise numérica. Não há por que escolher entre o enciclopedismo informativo superficial e os modismos pedagógicos.
O lugar para iniciar esta obra é o elo fraco do sistema escolar: a escola média. E o instrumento mais promissor é escola secundáriacom fronteira aberta entre o ensino geral de orientação analítica e ensino técnico que priorize o domínio de capacitações práticas flexíveis e genéricas em vez de priorizar a aprendizagem de ofícios rígidos.
Esta reorientação do paradigma pedgógico em todos os níveis do ensino, a partir da escola média, há de ocorrer em paralelo a esforço para avançar na pré-escola. Resgatar milhões de crianças pobres de uma insuficiência alimentar e cognitiva de efeitos duradouros.
Premissa para tudo isso é a formação de carreira nacional de professor, construída por colaboração federativa e comprometida com a requalificação periódica dos quadros.
7.A reconstrução do Estado. Não existe ainda no Brasil o Estado capaz de executar o programa que aqui se esboça. Nosso Estado continua a ser balofo e incapaz.
Há três agendas de gestão pública a executar. Embora estejam associadas a três séculos diferentes, não nos podemos contentar em executá-las em sequência, aguardando a execução de cada uma para iniciar a execução da seguinte. Precisamos executá-las simultaneamente, ainda que passo por passo, porque todas três são necessárias ao avanço desta alternativa nacional.
A primeira agenda, a do profissionalismo burocrático, é a obra incompleta do século 19 em matéria de administração pública. Temos ilhas de profissionalismo no Estado que continuam a flutuar em oceano de discricionariedade política.
A segunda agenda, a da eficiência administrativa, está associada ao século 20. Reinventar para o setor público práticas de gestão tradicionalmente empregadas no setor privado: padrões de desempenho, garantias de transparência, mecanismos, dentro e fora do Estado, para avaliar, incentivar e cobrar resultados. Transformar radicalmente o direito e o processo administrativos. Metade do que temos é camisa-de-força, baseada em desconfiança. A outra metade é o oposto: a delegação de poderes discricionários a potentados administrativos. Ambas as metades teriam de ser substituídas por regras e procedimentos que subordinassem, de maneira flexível, a objetivos definidos o trabalho da administração pública em cada campo.
A terceira agenda, a tornar-se cada vez mais importante no curso do século 21, é a do experimentalismo na maneira de prover e de qualificar os serviços públicos, inclusive de educaçaõ e de saúde. Nada de escolher apenas entre a provisão burocrática de serviços padronizados de baixa qualidade e a privatização destes serviços em favor de empresas orientadas por objetivo de lucro. Há terceira possibilidade: o Estado ajudar a organizar, a equipar, a financiar, a coordenar e a monitorar a sociedade civil independente para que ela participe da provisão competitiva e experimental dos serviços prestados pelo Estado ao cidadão. É a melhor maneira de qualificá-los.
8. O aprofundamento da democracia brasileira por meio da institucionalização da cultura republicana. Há dois pontos de partida.
O primeiro ponto de partida é a reconstrução de nosso federalismo, pela qual passam quase todas as soluções de nossos problemas nacionais. Substituir federalismo de repartição rígida de competências entre os três níveis da federalismo por um federalismo cooperativo que os associe em ações conjuntas e em experimentos compartilhados. Substituiremos o velho movimento pendular -- mais poder para o governo central ou para os estados e municípios -- por mudança na natureza da relação.
O segundo ponto de partida é a adoção de medidas que comecem a tirar a política da sombra corruptora do dinheiro. A primeira medida é o financiamento público das campanhas eleitorais, que por sí acordo com a variabilidade da receita, para que o orçamento deixe de ser o só diminui a influência do dinheiro privado. A segunda medida é a revisão do processo orçamento: o orçamento para valer, ainda que com partes variáveis de acordo com a variabilidade da receita pública, para que o orçamento deixe de serpalco pantanoso da negociação entre os grandes interesses do país. A terceira medida é a substituição da grande maioria dos cargos comissionados, de nomeação política, por carreiras de Estado.
Estas oito séries de opções, que juntas definem rumo nacional capaz de basear o desenvolvimento na ampliação de oportunidades, têm seu complemento e sua contrapartida em grandes iniciativas regionais. A tarefa é abordar as grandes regiões não resolvidas do país -- o Nordeste, a Amazônia e o Centro-Oeste --, que compõem de longe a maior parte do território nacional, não como regiões atrasadas a mendigar favores senão como vanguardas potenciais na reoreintação da estratégia de desenvolvimento.
No Nordeste, que não tem projeto abrangente há cinquenta anos e onde vive um terço dos brasileiros, começar pela instrumentalização das duas maiores forças construtivas que já atuam: um emprendendorismo emergente encarnado em redes de pequenas e médias empresas, inclusive e sobretudo no semi-árido, e uma inventividade tecnológica popular, difusa porém desequipada. Entender que assim como não há caminho para o Brasil sem caminho para o Nordeste, não há solução para o Nordeste sem solução para o semi-árido.
Na Amazônia, tanto da floresta como cerrado, teimar em dar conteúdo prático ao consenso abstrato em favor de um desenvolvimento que seja ao mesmo tempo sustentável e includente. Em toda a Amazônia, persistir na dinâmica, já iniciada, da regularização fundiária e ambiental -- a base de tudo. Na Amazônia da floresta, lutar pelo soerguimento do extrativismo madereiro e não madereiro, montado na conjunção de ciência e tecnologia avançadas com escala econômica. O bioma amazônico não pode ser salvo pela polícia; só pode ser salvo por alternativas. Na Amazônia do cerrado, começar pela recuperação de pastagens degradadas e, portanto, pelo resgate do cerrado.
No Centro-Oeste, não permitir que esta versão concentrada do dinamismo brasileiro se transforme em celeiro maculado por desigualdades extremas. Insistir na combinação de diversificação produtiva, com agregação de valor aos produtos agropecuários, e democratização de oportunidades. Substituir progressivamente a pecuária extensiva por pecuária intensiva, agricultura de alto valor agregado, muitas escalas de propriedade e de produção, agrocombustíveis e manejo florestal sustentável. Trabalhar por rede de cidades médias e pela disponibilidade de serviços públicos e privados de alta qualidade. Junto com o aprofundamento da indstrialização rural, construirão as bases de sociedade diversificada e democrática no planalto.
Utopia? Tudo isso é factível com instrumentos que já temos à mão. Nada disso é mero amontoado de iniciativas desconcexas. Estas opções setoriais e regionais demarcam um rumo para o Brasil. E propõem os primeiros passos.
O objetivo que as unifica é dar braços, asas e olhos à vitalidade brasileira.
OITO OPÇÕES QUE DEFINIRÃO O RUMO DO BRASIL
Roberto Mangabeira Unger
A tarefa do Brasil agora é começar a construir modelo de desenvolvimento baseado em ampliação de oportunidades para aprender, para trabalhar e para produzir. Modelo que faça da ampliação de oportunidades econômicas e educativas o motor do crescimento e que afirme a primazia do interesses do trabalho e da produção.
A construção deste modelo é a maneira -- a única maneira eficaz -- de superar a contradição que continua a acorrentar o Brasil. Num país que exibe vitalidade criativa e empreendedora desmesurada, a maior parte dos brasileiros continua sem ter os instrumentos para criar ou empreender. Por consequinte, desperdiça-se muito desta energia humana.
Para definir e desbravar e abrir este caminho, temos de resistir a uma tentação. Vista de um ângulo, é a tentação do rentismo. Por conta do grande rentismo financeiro, quem malogra como produtor pode continuar a prosperar como rentista. É a inversão da máxima de Keynes: a eutanásia dos produtores ocupa o lugar da eutanásia dos rentistas. Por conta do pequeno rentismo social, quem não consegue empregar-se ou qualificar-se ao menos não morre de fome porque recebe as migalhas dos programas sociais (justos e imprescindíveis como ponto de partida, porém inaceitáveis como ponto de chegada). Descobriram muitos que a combinação do grande rentismo financeiro e do pequeno rentismo social ganha eleições. Só que mata o país: desvia-nos do que haveria de ser a prioridade nacional: assegurar ao dinanismo brasileiro os instrumentos de que ele continua a carecer.
Considerada de outra perspectiva, é a tentação do açúcar. Na política brasileira, sobram partidos, mas faltam alternativas. Quase todos se apresentam como social-democratas ou social-liberais. O social arrisca ser o açúcar com que se doura a pílula do modelo econômico. Se o povo brasileiro vislumbrar oportunidade para reconstruir o existente, não se dará por satisfeito com o acúcar como substituto da reconstrução.
J[a existe a base social para erguer o novo modelo de desenvolvimento. É o desejo da maioria dos brasileiros de seguir o caminho da nova vanguarda de batalhadores e de emergentes que surgiu entre nós: classe média surpreendente, vinda de baixo, que encarna aos olhos da maioria de trabalhadores pobres, que lhe quer seguir o exemplo, o espírito da auto-ajuda e da iniciativa. Não o poderão seguir se deixarmos de inovar em nossas instituições, inclusive aquelas que constituem o mercado e a democracia.
Se existe base social para o projeto necessário ao país, ainda não está claro o caminho político. Os dois partidos que, a partir de seu centro de gravidade em São Paulo, polarizaram, nas últimas décadas, a disputa do poder central -- o PSDB e o PT -- pretendem-se arautos da modernidade. Atuaram com frequênciacomo agentes do atraso. Foram eles que chefiaram no Brasil a idéia hegemônica em nossa política: a inexistência de alternativas institucionais na organização da economia e da política, a conveniência da aliança entre o grande rentismo financeiro e o pequeno rentismo social, a redução do social ao papel do açúcar. O resultado, apesar da aparente bonança econômica, foi colocar-nos no caminho de virar combinação de grande fazenda, grande mina e montadora média.
Fora do eixo PSDB-PT, os partidos, grandes e pequenos, não acalentaram a alternativa do modelo de desenvolvimento que fizesse prevalecer os interesses do trabalho e da produção e que assegurasse a capacitação do povo brasileiro. Entregaram-se, as mais das vezes, a uma política programaticamente mesquinha e moralmente anárquica.
Em meio a esta abdicação generalizada, promoveu o governo Lula grandes avanços em cinco áreas principais. Consolidou a estabilidade macroeconômica, contra o espectro da hiper-inflação. Tirou milhões da pobreza extrema, ainda que não haja conseguido diminuir substancialmente a desigualdade. Abriu para outros milhões de jovens as portas da universidade e da escola técnica. Fêz obras indispensáveis ao desenvolvimento do país. Começou a construir escudo de defesa, orientado neste esforço pela Estratégia Nacional de Defesa, que promulgou.
Acima de todos estes avanços, ocorreu algo imensamente importante, ainda que impalpável. Ao se identificar com Lula, o povo brasileiro aceitou-se a si mesmo.
Tudo isso cria condições para a execução da tarefa diante da nação: a construção de modelo de desenvolvimento que dê à maioria os meios educativos e econômicos de que ela precisa para soerguer-se. Nada disso, porém, executa a tarefa. O tema da eleição de 2010 não é o passado. É o futuro.
Enumero oito série de opções que, encadeadas, definem o rumo do modelo de desenvolvimento que convém ao Brasil.
1.A posição do Brasil na divisão internacional do trabalho. Temos de optar contra um caminho, como o da Nova Zelândia ou do Chile, que pretenda combinar economia de produção e de exportação de produtos primários com elite internacionalizada de serviços. O Brasil é grande demais para isso. Não deve abandonar sua vocação industrial.
Ao manter-se fiel a ela, entretanto, precisa também optar contra estratégia como a que a China seguiu na maior parte de sua economia: apostar, por muito tempo, em trabalho e desqualificado. Não prosperaremos como uma China com menos gente. O Brasil está ameaçado, como qualquer país de renda média, de ficar preso numa prensa entre países de trabalho barato e países de alta produtividade. Interessa-nos escapar da prensa pelo lado alto, da escalada de produtividade e da qualificação do trabalho, não pelo lado baixo, do aviltamento salarial.
2.O financiamento interno de nossa estratégia de desenvolvimento. O capital estrangeiro é tanto mais útil quanto menos se precisa dele. Tratemos de dividir ao meio a seudo-ortodoxia econômica que os governos brasileiros abraçaram em décadas recentes. A parte boa -- o realismo e a responsabilidade fiscais -- haverá de ser vigorosamente reafirmada, mesmo à custa de adiar os instrumentos de uma política contra-cíclica. (As esquerdas que perderam a fé no marxismo costumam abraçar, para substitui-lo, o Keynesianismo bastardo.) A parte nociva -- a tolerância de um nível baixo de poupança pública e privada e a consequente dependência do capital estrangeiro para financiar nosso desenvolvimento -- deve ser repudiada. Nosso nível de poupança sempre esteve abaixo de 20%; o das economias asiáticas que admiramos sempre acima de 40%.
É verdade que em teoria o nível de poupança é mais efeito do que causa do crescimento. Essa verdade teórica, entretanto, não leva em conta o significado estratégico da sequência: a mobilização inicial dos recursos nacionais representa condição para a rebeldia nacional -- para fazer o que nos convém e não o que os mercados financeiros querem. Instaurado cíclo de crescimento, o capital estrangeiro vem por acréscimo e em sua melhor forma; o país que mais recebe investimento estrangeiro é a China, que sempre primou por desrespeitar a religião dos mercados.
A elevação da poupança pública exige o fortalecimento da disciplina fiscal. Já para elevar a poupança privada teríamos de construir incentivos e obrigações capazes de assegurar poupança previdenciária progressivamente proporcional à renda dos cidadãos.
A elevação da poupança privada e pública pode, porém, ser indiferente ou nociva se não fôr complementada pela construção de mecanismos que canalizem a poupança de longo prazo para o investimento produtivo de longo prazo e não permitam que seu potencial produtivo se dissipe num casino financeiro. Uma de nossas preocupações deve ser mobilizar parte da poupança previdenciária para fazer o trabalho do “venture capital”: o investimento em empreendimentos emergentes. E para fazê-lo sob gestão profissional e competitiva, longe do conúbio entre o Estado e as grandes empresas.
3.O projeto estratégico da agricultura. Agropecuária continua a ser a principal atividade econômica do Brasil. Pode virar vanguarda e paradigma, ao exemplificar o vínculo entre diversificação da produção e democratização das oportunidades. Para isso, precisa pautar-se por três objetivos entrelaçados. O primeiro objetivo é superar o contraste, meramente, ideológico, entre agricultura empresarial e agricultura familiar. Assegurar atributos empresarias à agricultura familiar, sem que com isso ela tenha de perder seu vínculo com a policultura e seu compromisso com a democratização da propriedade da terra. Não há duas agriculturas no mundo; só há uma. O segundo objetivo é aprofundar a industralização rural, a agregação de valor aos produtos agropecuários no campo. Evitar o contraste entre cidade cheia e campo vazio. E promover vida rural variada e vibrante. O terceiro objetivo é construir em todo o país, não apenas no Sul, classe média rural forte como vanguarda de massa de trabalhadorea agrícolas mais pobres que avançara atrás dela.
O projeto agrícola orientado por tais objetivos poderá vingar no contexto da solução do maior problema físico de nossas agricultura: a recuperação de pastagens degradadas que hoje formam grande parte do território nacional. (No Brasil, para cada hectar sob lavoura há quatro entregues à pecuária extensiva.) Se recuperarmos parte desta área, dobraremos em pouco tempo a área cultivada e triplicararemos nosso produto agrícola sem tocar uma única árvore.
4. A reorientação da política industrial. A política industrial do Brasil consiste, há muito, tempo em entregar o dinheiro do trabalhador, açambarcado no FAT, a umas vinte grandes empresas, por mãos do BNDES, sob o pretexto de transformá-las em campeãs mundiais. O discurso é francês. A prática é koreana.
Se, ao contrário, tratássemos de abrir para as pequenas e médias empresas o acesso ao crédito, à tecnologia, ao conhecimento, aos mercados globais, criaríamos o que mais quer o país: dínamo de crescimento includente. São elas a parte mais importante de nossa economia; é ali que se gera a maior parte do produto e é ali que está a vasta maioria dos empregos.
O objetivo maior é organizar fora dos centros industriais uma travessia direta do pré-Fordismo industrial para o pós-Fordismo industrial, sem que o todo o país tenha de penar no purgatório de um paradigma de produção -- produção em grande escala de bens e sereviços padronizados, por meio de mão de obra semi-qualificados e processos produtivos rígidos e hierárquicos -- que já se vai tornando superado no mundo e que inibe nossa ascensão na escalada da produtividade. O Brasil todo não deve ter de virar a São Paulo de meados do século passado para depois tornar-se outra realidade.
O objetivo subsidiário é dotar nossas maiores empresas, parte indispensável de nossa estratégia de desenvolvimento, da periferia que lhes falta, de empresas menores porém vanguardista. Pois é nesta periferia, mais do que nas grandes empresas, que se costumam acalentar, em todo o mundo, as inovações tecnológicas e organizativas mais arrojadas.
5. Trabalho e capital. Não se toma no Brasil grande iniciativa institucional em matéria de relações entre trabalho e capital desde Vargas. Precisamos tomar, se quisermos fazer justiça aos trabalhadores e apostar em trabalho valorizado e qualificado como base de nosso desenvolvimento: a maior parte do povo brasileiro está fora do regime legal, de uma forma ou outra. Quase metade da população economicamente ativa continua presa na economia informal, obrigada a trabalhar nas sombras da ilegalidade. E parte crescente dos empregados na economia formal encontra-se em situações precarizadas, de trabalho temporário, terceirizado ou autônomo.
Nenhum dos dois discursos disponíveis a respeito do trabalho e do capital resolve o problema. O discurso neoliberal da flexibilização é corretamente interpretado pelos trabalhadores como eufemismo para descrever a corrosão de seus direitos. O discurso corporativista-sindical do direito adquirido resguarda a minoria que está dentro, porém não a maoiria que está fora.
O lugar para começar é a construção, ao lado do regime estabelecido de leis trabalhistas, de segundo corpo de regras, destinado a proteger, a organizar e a representar os trabalhadores inseguros das economias informal e formal. É obra cujo êxito depende de sua convergência com a reorientação das políticas agrícola, industrial e educativa.
6. Capacitação do povo brasileiro. Pelo menos tão importante quanto a democratização das oportunidades econômicas é a democratização das oportunidades educativas. Há duas prioridades.
A primeira prioridade é reconciliar, num país grande, desigual e federativo, a gestão local das escolas pelos estados e municípios com padrões nacionais de investimento e qualidade: federalizar -- na prática, não apenas na lei -- os padrões. A qualidade do ensino que uma criança recebe não deve depender do acaso do lugar onde ela nasce. Para reconciliar gestão local com padrões nacionais, não basta ter sistema nacional de avaliação, como já temos, e mecanismo para redistribuir recursos de lugares mais ricos para lugares mais pobres, como estamos começando a ter. É preciso forjar instrumento para consertar redes de escolas locais que caiam repetidamente abaixo do patamar mínimo aceitável de qualidade. O meio é associar os três níveis da federação em órgãos conjuntos que possam vir em socorro destas escolas, assumi-las temporariamente, confiá-las a gestores profissionais independentes (como se faria com empresas em processo de recuperação falimentar) e devolvê-las consertadas.
A segunda prioridade é mudar a maneira de aprender e de ensinar no Brasil. Substituir ensino ainda pautado por decoreba por ensino analítico e capacitador, com foco no básico: análise verbal e análise numérica. Não há por que escolher entre o enciclopedismo informativo superficial e os modismos pedagógicos.
O lugar para iniciar esta obra é o elo fraco do sistema escolar: a escola média. E o instrumento mais promissor é escola secundáriacom fronteira aberta entre o ensino geral de orientação analítica e ensino técnico que priorize o domínio de capacitações práticas flexíveis e genéricas em vez de priorizar a aprendizagem de ofícios rígidos.
Esta reorientação do paradigma pedgógico em todos os níveis do ensino, a partir da escola média, há de ocorrer em paralelo a esforço para avançar na pré-escola. Resgatar milhões de crianças pobres de uma insuficiência alimentar e cognitiva de efeitos duradouros.
Premissa para tudo isso é a formação de carreira nacional de professor, construída por colaboração federativa e comprometida com a requalificação periódica dos quadros.
7.A reconstrução do Estado. Não existe ainda no Brasil o Estado capaz de executar o programa que aqui se esboça. Nosso Estado continua a ser balofo e incapaz.
Há três agendas de gestão pública a executar. Embora estejam associadas a três séculos diferentes, não nos podemos contentar em executá-las em sequência, aguardando a execução de cada uma para iniciar a execução da seguinte. Precisamos executá-las simultaneamente, ainda que passo por passo, porque todas três são necessárias ao avanço desta alternativa nacional.
A primeira agenda, a do profissionalismo burocrático, é a obra incompleta do século 19 em matéria de administração pública. Temos ilhas de profissionalismo no Estado que continuam a flutuar em oceano de discricionariedade política.
A segunda agenda, a da eficiência administrativa, está associada ao século 20. Reinventar para o setor público práticas de gestão tradicionalmente empregadas no setor privado: padrões de desempenho, garantias de transparência, mecanismos, dentro e fora do Estado, para avaliar, incentivar e cobrar resultados. Transformar radicalmente o direito e o processo administrativos. Metade do que temos é camisa-de-força, baseada em desconfiança. A outra metade é o oposto: a delegação de poderes discricionários a potentados administrativos. Ambas as metades teriam de ser substituídas por regras e procedimentos que subordinassem, de maneira flexível, a objetivos definidos o trabalho da administração pública em cada campo.
A terceira agenda, a tornar-se cada vez mais importante no curso do século 21, é a do experimentalismo na maneira de prover e de qualificar os serviços públicos, inclusive de educaçaõ e de saúde. Nada de escolher apenas entre a provisão burocrática de serviços padronizados de baixa qualidade e a privatização destes serviços em favor de empresas orientadas por objetivo de lucro. Há terceira possibilidade: o Estado ajudar a organizar, a equipar, a financiar, a coordenar e a monitorar a sociedade civil independente para que ela participe da provisão competitiva e experimental dos serviços prestados pelo Estado ao cidadão. É a melhor maneira de qualificá-los.
8. O aprofundamento da democracia brasileira por meio da institucionalização da cultura republicana. Há dois pontos de partida.
O primeiro ponto de partida é a reconstrução de nosso federalismo, pela qual passam quase todas as soluções de nossos problemas nacionais. Substituir federalismo de repartição rígida de competências entre os três níveis da federalismo por um federalismo cooperativo que os associe em ações conjuntas e em experimentos compartilhados. Substituiremos o velho movimento pendular -- mais poder para o governo central ou para os estados e municípios -- por mudança na natureza da relação.
O segundo ponto de partida é a adoção de medidas que comecem a tirar a política da sombra corruptora do dinheiro. A primeira medida é o financiamento público das campanhas eleitorais, que por sí acordo com a variabilidade da receita, para que o orçamento deixe de ser o só diminui a influência do dinheiro privado. A segunda medida é a revisão do processo orçamento: o orçamento para valer, ainda que com partes variáveis de acordo com a variabilidade da receita pública, para que o orçamento deixe de serpalco pantanoso da negociação entre os grandes interesses do país. A terceira medida é a substituição da grande maioria dos cargos comissionados, de nomeação política, por carreiras de Estado.
Estas oito séries de opções, que juntas definem rumo nacional capaz de basear o desenvolvimento na ampliação de oportunidades, têm seu complemento e sua contrapartida em grandes iniciativas regionais. A tarefa é abordar as grandes regiões não resolvidas do país -- o Nordeste, a Amazônia e o Centro-Oeste --, que compõem de longe a maior parte do território nacional, não como regiões atrasadas a mendigar favores senão como vanguardas potenciais na reoreintação da estratégia de desenvolvimento.
No Nordeste, que não tem projeto abrangente há cinquenta anos e onde vive um terço dos brasileiros, começar pela instrumentalização das duas maiores forças construtivas que já atuam: um emprendendorismo emergente encarnado em redes de pequenas e médias empresas, inclusive e sobretudo no semi-árido, e uma inventividade tecnológica popular, difusa porém desequipada. Entender que assim como não há caminho para o Brasil sem caminho para o Nordeste, não há solução para o Nordeste sem solução para o semi-árido.
Na Amazônia, tanto da floresta como cerrado, teimar em dar conteúdo prático ao consenso abstrato em favor de um desenvolvimento que seja ao mesmo tempo sustentável e includente. Em toda a Amazônia, persistir na dinâmica, já iniciada, da regularização fundiária e ambiental -- a base de tudo. Na Amazônia da floresta, lutar pelo soerguimento do extrativismo madereiro e não madereiro, montado na conjunção de ciência e tecnologia avançadas com escala econômica. O bioma amazônico não pode ser salvo pela polícia; só pode ser salvo por alternativas. Na Amazônia do cerrado, começar pela recuperação de pastagens degradadas e, portanto, pelo resgate do cerrado.
No Centro-Oeste, não permitir que esta versão concentrada do dinamismo brasileiro se transforme em celeiro maculado por desigualdades extremas. Insistir na combinação de diversificação produtiva, com agregação de valor aos produtos agropecuários, e democratização de oportunidades. Substituir progressivamente a pecuária extensiva por pecuária intensiva, agricultura de alto valor agregado, muitas escalas de propriedade e de produção, agrocombustíveis e manejo florestal sustentável. Trabalhar por rede de cidades médias e pela disponibilidade de serviços públicos e privados de alta qualidade. Junto com o aprofundamento da indstrialização rural, construirão as bases de sociedade diversificada e democrática no planalto.
Utopia? Tudo isso é factível com instrumentos que já temos à mão. Nada disso é mero amontoado de iniciativas desconcexas. Estas opções setoriais e regionais demarcam um rumo para o Brasil. E propõem os primeiros passos.
O objetivo que as unifica é dar braços, asas e olhos à vitalidade brasileira.
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